Em 23 de agosto de 2023, um importante marco em direitos civis foi alcançado na Alemanha, com a aprovação da "Lei da Autodeterminação de Gênero".
Essa legislação revolucionária traz mudanças significativas no processo de alteração de nomes e gêneros no registro civil, eliminando a necessidade de um laudo pericial e simplificando consideravelmente o procedimento.
A lei anterior, em vigor há quatro décadas, obrigava as pessoas trans a enfrentarem um longo e complexo processo legal. Isso incluía recorrer à justiça e apresentar pareceres de especialistas como requisitos para realizar as mudanças necessárias em seus documentos pessoais.
A nova "Lei da Autodeterminação de Gênero" alemã coloca um fim a essa burocracia e oferece uma abordagem mais inclusiva e sensível às necessidades das pessoas trans.
Sob os termos da nova lei, qualquer pessoa maior de 18 anos pode solicitar diretamente a alteração de seu nome e gênero no cartório de registro civil. A mudança de nome valerá após 90 dias e um novo pedido de alteração pode ser feito após um ano.
Essa flexibilidade permite que as pessoas tenham maior controle sobre sua identidade de gênero, refletindo uma compreensão mais contemporânea e progressista do tema.
Disposições para menores de idade
A lei também contempla disposições específicas para menores de idade. A partir dos 14 anos, os adolescentes têm o direito de solicitar a mudança com a concordância de seus pais ou responsáveis legais.
Para aqueles com menos de 13 anos, a alteração pode ser realizada pelos pais, desde que julguem ser apropriada, previsão muito criticada por psicólogos e profissionais da saúde, que consideram muito cedo para discernimento quanto a mudança de gênero.
Essas medidas são voltadas para assegurar os direitos das crianças, promovendo a liberdade de expressão de sua identidade de gênero desde os primeiros anos de vida.
Proibição de divulgação do gênero anterior
Um aspecto crucial da nova lei é a proibição da divulgação do gênero anterior de uma pessoa sem seu consentimento, visando proteger a privacidade e a dignidade das pessoas trans e evitar que sejam expostas a situações constrangedoras ou discriminatórias.
Há penalidades estipuladas para quem violar essa disposição, demonstrando o compromisso do governo alemão com a proteção dos direitos individuais.
A abordagem adotada pela Alemanha segue o princípio da autodeterminação de gênero, que já foi implementado com sucesso em vários outros países europeus, incluindo Bélgica, Espanha, Irlanda, Luxemburgo e Dinamarca.
Isso reflete uma compreensão crescente de que a identidade de gênero é uma questão pessoal e individual e as leis devem refletir essa realidade.
Tratado Internacional do Pacto de São José da Costa Rica
A legislação alemã não apenas simplifica o processo para adultos, mas também estende essas medidas a crianças e adolescentes, incluindo pessoas intersexo e não binárias, alinhando-se ao Tratado Internacional do Pacto de São José da Costa Rica, que reflete a evolução do pensamento jurídico em relação à identidade de gênero.
No Brasil, o Pacto entrou em vigor em 25 de setembro de 1992, quando o Decreto 678/1992 foi promulgado, consolidando-se como um dos fundamentos da proteção dos direitos humanos no país, abrangendo não apenas direitos políticos e civis, mas também os que dizem respeito à integridade pessoal, à liberdade e ao acesso à justiça.
Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e Resolução do Conselho Nacional de Justiça
Em 2018, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 4275 deu interpretação de acordo com o artigo 58 da Lei de Registros Públicos (6.015/1973), em decisão histórica do Supremo Tribunal Federal, abrindo precedente para a adequação dos registros de gênero diretamente no registro civil, sem a necessidade de intervenção judicial ou requisitos médicos
O Pacto de São José da Costa Rica desempenhou um papel fundamental nessa decisão, que foi seguida pelo Conselho Nacional de Justiça, que seis meses após a decisão do STF, editou o Provimento 73/2018, regulamentando os procedimentos a serem observados pelos registradores civis para garantir que as pessoas trans tenham seus direitos respeitados.
A aprovação da "Lei da Autodeterminação de Gênero" na Alemanha é um passo significativo em direção à igualdade e ao respeito pelos direitos das pessoas trans, porque demonstra o compromisso em criar sociedades mais inclusivas, onde todos têm a liberdade de serem quem são, sem a imposição de barreiras legais ou sociais.
Qual a sua opinião sobre essa nova lei alemã?