Dos poderes administrativos

11/09/2023 às 15:11
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Resumo: O presente trabalho tem por escopo a temática dos poderes conferidos à Administração Pública para fins de execução da função administrativa. Abordar-se-á cada um destes, bem como controvérsias relacionadas ao tema.

Palavras-chave: Poderes Administrativos. Poder Normativo. Poder Regulamentar. Poder Hierárquico. Poder de Polícia. Poder Disciplinar. Vinculação. Discricionariedade.

  1. Introdução

A atuação da Administração Pública deve ser pautada na busca pelo interesse coletivo, sendo certo que para a execução da função administrativa se faz necessário o respeito aos deveres inerentes a esta, valendo-se também das prerrogativas que lhe são fornecidas.

Há que se mencionar que para a Doutrina Moderna as prerrogativas e sujeições da Administração Pública estão instrumentalizadas nos princípios administrativos e são materializadas por meio dos poderes administrativos.

Desta feita, para que se torne possível a realização de medidas e atos administrativos a Administração Pública se vale dos chamados poderes administrativos, os quais, de maneira resumida, são considerados instrumentos para que entidades da Administração Pública executem suas tarefas, voltadas ao interesse público.

  1. Da vinculação e discricionariedade

Para fins de análise dos poderes administrativos, necessário se faz abordar os chamados poder vinculado e poder discricionário. De pronto, necessário se faz esclarecer que não há aceitação, de forma unânime quanto a esta classificação.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro assim preceitua: “quanto aos chamados poderes discricionário e vinculado, não existem como poderes autônomos; a discricionariedade e vinculação são, quando muito, atributos de outros poderes ou competência da Administração”.1

Já Hely Lopes Meirelles prevê:

(…) Dentro dessa diversidade, são classificados, consoante a liberdade da Administração para a prática de seus atos, em poder vinculado e poder discricionário; segundo visem ao ordenamento da Administração ou à punição dos que a ela se vinculam, em poder hierárquico e poder disciplinar; diante de sua finalidade normativa, em poder regulamentar; e, tendo em vista seus objetivos de contenção dos direitos individuais, em poder de polícia. 2

Logo, verifica-se que parte da doutrina considera a vinculação e discricionariedade como poderes autônomos, enquanto que parcela não aceita tal classificação considerando-os meros atributos de outros poderes.

Há que se realçar que qualquer atuação administrativa estará necessariamente vinculada à lei, logo, esta não se resumirá ao poder vinculado.

Segundo aduzem Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

O denominado poder vinculado é aquele de que dispõe a administração para a prática de atos administrativos em que é mínima ou inexistente a sua liberdade de atuação, ou seja, é o poder de que ela se utiliza quando pratica atos vinculados.3

Desta feita, a lei estabelece todos os elementos para a atuação da Administração, sem que essa possa exercer um juízo quanto a conveniência e oportunidade da prática do ato.

Com efeito, preenchidos os requisitos legais, o administrador estará obrigado a prática do ato, não podendo valorar se o pratica ou deixa de praticar. Em razão disto, Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo complementam:

É fácil constatar que o assim denominado “poder vinculado” não é exatamente um poder, mas sim um dever da administração pública. Quando pratica um ato vinculado – ou mesmo quando observa os elementos vinculados de um ato discricionário – a administração está muito mais cumprindo um dever do que exercendo uma prerrogativa.4

Neste sentido, podemos utilizar do exemplo de um agente de trânsito que, presenciando uma infração terá o dever de punir o infrator, não podendo valorar acerca da personalidade daquele, se o infrator possui ou não condições de pagamento da infração, dentre outros.

Já com relação ao Poder Discricionário incumbe mencionar que este possibilita à Administração Pública uma margem de opção, ou seja, há a possibilidade de análise do caso concreto conforme a conveniência e oportunidade.

Segundo afirma Matheus Carvalho:

Com efeito, a lei estipula os limites do chamado mérito administrativo e o agente estatal tem um poder de escolha, somente, nos limites da lei. Daí, dizer-se que a discricionariedade não se confunde com a arbitrariedade e não confere ao agente público uma ilimitada margem de escolha em relação à atuação do Estado. 5

Insta mencionar que a discricionariedade do ato administrativo praticado referir-se-á aos seguintes elementos do ato: objeto e motivo.

Por fim, incumbe aduzir que o juízo de valoração quanto ao mérito administrativo poderá ocorrer quando da prática do ato ou posteriormente, em eventual análise quanto a revogação deste, acaso deixe de conter conveniência e oportunidade para a Administração.

3. Dos poderes administrativos

Os poderes administrativos são: (i) poder normativo ou regulamentar; (ii) poder hierárquico; (iii) poder de polícia e (iv) poder disciplinar.

A seguir abordar-se-ão cada um destes.

3.1. Poder Normativo ou Poder Regulamentar

Há que se mencionar que a doutrina tradicional aborda a temática nomeando-o como poder regulamentar, contudo, mostra-se mais adequada a utilização do termo poder normativo, tendo em vista que a nomenclatura em questão não resume este poder a somente um dos atos que representa.

Segundo bem preceitua Matheus Carvalho:

O Poder Normativo se traduz no poder conferido à Administração Pública de expedir normas gerais, ou seja, atos administrativos e abstratos com efeito erga omnes. Não se trata de poder para a edição das leis, mas apenas um mecanismo para a edição de normas complementares à lei.6

Com efeito, infere-se que o poder normativo é utilizado para facilitar o entendimento da lei e garantir a sua correta aplicação.

Há que se mencionar que o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, inciso II da Constituição Federal prevê que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. Diante disto, constata-se que somente a lei poderá instituir ou extinguir direitos e obrigações, sendo esta uma fonte originária.

Já o art. 84, inciso IV da Constituição Federal assim prevê:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

(…)

IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;

Assim, constata-se que o chefe do Poder Executivo está autorizado, em competência privativa, a editar decretos e regulamentos que abordem direitos e obrigações que sejam objeto de prévia lei, ou seja, que possibilitarão a sua fiel execução.

Há que se mencionar que pelo princípio da simetria o poder regulamentar é extensivo aos demais chefes do executivo (governadores e prefeitos).

Incumbe realçar a supremacia da lei com relação aos atos administrativos normativos, sendo certo que estes apenas advêm para possibilitar a execução daquela, mas sem alterar ou desrespeitar os preceitos legais.

Segundo lecionam Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

Nota-se que o poder regulamentar é uma espécie do gênero poder normativo, porém, como aquele é exclusivo do Chefe do Poder Executivo, é mais frequente, quando nos referimos a essa autoridade, falarmos em poder regulamentar. Deve ficar claro, apenas, que ao praticar atos com base no poder regulamentar (espécie), o Chefe do Poder Executivo não deixa de estar exercendo o poder normativo da administração pública (gênero).7

O poder normativo poderá ser implementado por meio da expedição de regulamentos, instruções normativas, ordens de serviço, regimento interno e outros.

A princípio, abordar-se-á tão somente o regulamento. Segundo afirma Matheus Carvalho:

Primordialmente, saliente-se que Regulamento e Decreto são referências ao mesmo ato normativo. Isso porque o Regulamento é o ato normativo privativo do chefe do Poder Executivo e Decreto é a sua forma. Em outras palavras, pode-se dizer que o Regulamento é expedido por meio de um Decreto. 8

Ultrapassada esta análise, abordaremos as espécies de regulamentos conforme dispõe a doutrina.

A princípio há que se mencionar a divisão entre regulamentos executivos e regulamentos autônomos.

O regulamento executivo, resumidamente, é editado para propiciar a execução da lei. Este é uma norma geral, uma vez que, não possui destinatários determinados, bem como, abstrato, posto referir-se a hipóteses que quando verificadas no mundo concreto gerarão as consequências que neste haviam sido previstas.

Há que se mencionar que não poderão inovar a lei, tão somente aplicar os direitos e obrigações nesta previstos.

Segundo preceitua Matheus Carvalho: “a submissão à lei é inerente a esses atos, inclusive, em respeito ao disposto no art. 5º, inc. II da Carta Magna que proíbe a qualquer ato normativo, que não a lei, a inovação jurídica com a criação e extinção de direitos”. 9

Já os regulamentos autônomos, os quais também são chamados de independentes, como a própria nomenclatura indica, não visam apenas detalhar a lei, ao contrário, são independentes destas e criados sem uma legislação prévia, podendo inová-la.

Há que se mencionar, ainda, que considerando serem criados sem legislação prévia, atuam como substitutos da lei.

Acerca do assunto, insta acrescer entendimento de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

Até a promulgação da EC 32/2001 era francamente predominante na doutrina o entendimento de que a Constituição de 1988 operara completa a abolição do decreto autônomo em nosso ordenamento. O texto constitucional somente aludia à expedição de decretos regulamentares, explicitando que tais atos devem assegurar a fiel execução da lei (art. 84, IV). Portanto, o constituinte originário realmente parece ter albergado no direito pátrio somente a figura do decreto de execução.

Todavia, a partir da EC 32/2001, passou a existir autorização expressa no inciso IV do art. 84 da Constituição para a edição de decretos autônomos pelo Presidente da República, específica e unicamente para dispor sobre:

a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos (art. 84, VI, “a”);

b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos (art. 84, VI, “b”).10

Ressalta-se que o Presidente da República poderá delegar as atribuições constantes do art. 84, inciso VI, alíneas “a” e “b”, aos Ministros de Estado, ao Procurador Geral da República ou ao Advogado Geral da União, conforme parágrafo único do indigitado artigo.

Há que se salientar, ademais, que a atuação normativa nestes casos se sujeitará ao controle do próprio ente, bem como, dos Poderes Judiciário e Legislativo.

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3.2. Poder Hierárquico

A hierarquia refere-se a uma característica típica da estrutura da Administração Pública.

Segundo Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

Hierarquia caracteriza-se pela existência de níveis de subordinação entre órgãos e agentes públicos, sempre no âmbito de uma mesma pessoa jurídica. Deve-se frisar que subordinação só existe no âmbito de uma mesma pessoa jurídica, é estabelecida entre agentes e órgãos de uma mesma entidade, verticalmente escalonados, como decorrência do poder hierárquico. 11

Desde já há que se mencionar que não haverá hierarquia entre pessoa jurídica da administração direta e pessoa jurídica da administração indireta, bem como, não há hierarquia entre diferentes pessoas jurídicas.

Desta feita, resumidamente, nota-se que o Poder Hierárquico estrutura internamente um determinado ente administrativo, não podendo ser utilizado para ordenação de pessoas jurídicas distintas.

Acerca do tema Matheus Carvalho aduz:

Importante ressaltar, portanto, a ausência de hierarquia entre os diferentes entes federativos, quais sejam, a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios, ou entre os entes da administração direta e os entes da administração indireta, pois, não obstante a existência de controle e fiscalização, não há relação de hierarquia ou de subordinação, haja vista se tratarem de pessoas jurídicas diferentes.12

Outrossim, incumbe trazer a deslinde que na estrutura administrativa a Carta Magna confere prerrogativas e sujeições distintas de acordo com o nível hierárquico ocupado, desta feita, um superior hierárquico possuirá mais prerrogativas, enquanto que aquele que ocupa nível hierárquico inferior possuirá mais subordinações.

Dentre tais prerrogativas, as mais importantes são as seguintes: (i) o superior hierárquico tem o poder de controlar e rever de ofício os atos e decisões emanados de seus subordinados, sendo certo que poderá anular os ilegais ou revogar de ofício aqueles inoportunos ou inconvenientes; (ii) o superior tem a prerrogativa de editar e decretar normas de funcionamento interno, tais quais, circulares, avisos, portarias; (iii) o superior tem o poder de dar ordens de acatamento obrigatório, sendo certo que, excepcionar-se-ão as manifestamente ilegais.

Há que se mencionar que diante da relação de subordinação existente, aquele que ocupa nível inferior está submetido a maiores sujeições, dentre as quais, o dever de obediência perante seu superior, sendo certo que não poderá recusar a execução do ato, questionar ou deixar de cumprir ordens, sob pena de insubordinação, salvo quando tais foram manifestamente ilegais.

Com efeito, acaso seja emanada ordem manifestamente ilegal surge para o destinatário desta, ou seja, o subordinado, o dever de representação contra tal ilegalidade.

Nesse sentido, o superior hierárquico poderá controlar as atividades de órgãos inferiores, poderá avocar ou delegar competências, enquanto que o subordinado terá o dever de obediência para com seu superior.

Segundo aduzem Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo:

O controle hierárquico é irrestrito, permanente e automático, isto é, não depende de lei que expressamente o preveja ou que estabeleça o momento de seu exercício ou os aspectos a serem controlados. O controle hierárquico permite que o superior aprecie todos os aspectos dos atos de seus subordinados (quanto à legalidade e quanto ao mérito administrativo) e pode ocorrer de ofício ou, quando for o caso, mediante provocação dos interessados, por meio de recursos hierárquicos.13

Há que se mencionar, ademais, que a lei expressamente proíbe a delegação de competências em três situações, quais sejam: (i) para a decisão de recurso hierárquico; (ii) para a edição de atos normativos e (iii) em caso de competência exclusiva.

Por fim, importante se faz mencionar que a hierarquia está diretamente relacionada com a atividade administrativa do Estado, sendo exercida tipicamente pelo Poder Executivo.

Acerca da temática Matheus Carvalho assim acrescenta:

Na função legislativa, a prática dos atos obedece a um sistema de competência que decorre de repartição constitucional, deixando claramente definidas as atribuições de cada um dos entes federativos. O desrespeito a essa norma de distribuição de competência legislativa enseja violação ao texto constitucional. Em relação ao Poder Judiciário, no exercício da função jurisdicional vigora a regra do livre convencimento motivado e da independência e imparcialidade do juízo, não ficando um magistrado sujeito às decisões emanadas pelas cortes superiores. Com a criação da Súmula Vinculante por meio de emenda à Constituição Federal, em 2004, há uma mitigação dessa regra de autonomia, contudo, a sujeição às decisões sumuladas não se confunde, em nenhum momento, com a hierarquia administrativa.14

Desta feita, verifica-se que para o exercício da atividade jurisdicional, a Carta Magna prevê a todos os membros da magistratura os mesmos níveis de prerrogativas e sujeições, da mesma forma que ocorre com os membros do Legislativo, encontrando-se estes em mesmo nível de horizontalidade.

3.3. Poder de Polícia

No exercício da atividade administrativa o Estado realiza a fiscalização do gozo dos direitos individuais dos cidadãos para que nenhum destes empregue direito próprio em prejuízo ao interesse público.

Desta feita, o poder de polícia refere-se ao poder de fiscalização do Estado, o qual deve recair em face de todos, de forma geral e ininterrupta.

O conceito legal do poder de polícia está previsto no art. 78 do Código Tributário Nacional, que assim prevê:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Com efeito, o poder de polícia pode limitar ou disciplinar um direito, contudo, jamais poderá extingui-lo.

Há que se mencionar que o poder de polícia pode referir-se a atuação na área administrativa ou judiciária.

Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

A principal diferença que se costuma apontar entre as duas está no caráter preventivo da polícia administrativa e no repressivo da polícia judiciária. A primeira terá por objetivo impedir as ações antissociais, e a segunda, punir os infratores da lei penal.

A diferença não é, no entanto, absoluta, pois a polícia administrativa tanto pode agir preventivamente (como, por exemplo, proibindo o porte de arma ou a direção de veículos automotores), como pode agir repressivamente (a exemplo do que ocorre quando apreende a arma usada indevidamente ou a licença do motorista infrator). No entanto, pode-se dizer que, nas duas hipóteses, ela está tentando impedir que o comportamento individual cause prejuízos maiores à coletividade; nesse sentido, é certo dizer que a polícia administrativa é preventiva. Mas, ainda assim, falta precisão ao critério, porque também se pode dizer que a polícia judiciária, embora seja repressiva em relação ao indivíduo infrator da lei penal, é também preventiva em relação ao interesse geral, porque, punindo-o, tenta evitar que o indivíduo volte a incidir na mesma infração.15

Outrossim, com relação as diferenças existentes entre a polícia administrativa e judiciária há que se mencionar que a primeira incide sobre bens e direitos, enquanto que a polícia judiciária incidirá sobre pessoas. Ademais, a polícia administrativa condiciona bens e direitos para o interesse da coletividade, enquanto que, a polícia judiciária atuará evitando e punindo infrações penais.

Importante se faz mencionar as características principais do poder de polícia, quais sejam: (i) discricionariedade, (ii) autoexecutoriedade e (iii) coercibilidade.

Quanto a discricionariedade incumbe dizer que, via de regra, o poder de polícia será exercido conforme os critérios de oportunidade e conveniência. Isso se dá, vez que, em determinados casos a lei possibilita uma margem de liberdade de apreciação, posto que impossível ao legislador prever toda e qualquer atuação do dever de polícia.

Desta feita, utilizando de critérios de oportunidade e conveniência, torna-se possível a Administração verificar modos adequados de atuação, eventuais sanções cabíveis, dentre outros.

Já a autoexecutoriedade refere-se a possibilidade de a Administração, em regra, não depender do Judiciário para decretar e executar seus atos de polícia. Assim, a Administração vale-se dos seus próprios meios para executar as suas decisões.

Com relação a coercibilidade, incumbe mencionar que o Estado pode empregar sua força pública para efetivar seus atos de polícia, não se admitindo resistência ou efetiva recusa do particular. Assim, a coercibilidade tornará o ato obrigatório, sendo certo que a Administração poderá se valer de meios coercitivos indiretos para o cumprimento pelo cidadão.

Ademais, há a característica da imperatividade, a qual prevê que, em regra, a Administração não necessitará da concordância ou ainda da participação dos particulares para decretação e execução de seus atos, uma vez que estes são imperativos.

A título de exemplo da manifestação do poder de polícia podemos indicar: a concessão de licença para construção de imóvel, a fiscalização sanitária em estabelecimentos comerciais, o controle de trânsito de veículos automotores, dentre outros.

Por fim, abordar-se-á a seguir o poder disciplinar.

3.4. Poder Disciplinar

O poder disciplinar é aquele que se refere a atribuição da Administração Pública em apurar infrações e aplicar sanções aos sujeitos que estejam inseridos em seu regime jurídico ou que tenham vínculo de natureza especial com o Estado.

Segundo Di Pietro:

O poder disciplinar é discricionário, o que deve ser entendido em seus devidos termos. A Administração não tem liberdade de escolha entre punir e não punir, pois, tendo conhecimento de falta praticada por servidor, tem necessariamente que instaurar o procedimento adequado para sua apuração e, se for o caso, aplicar a pena cabível. Não o fazendo, incide em crime de condescendência criminosa, previsto no artigo 320 do Código Penal e em improbidade administrativa, conforme artigo 11, inciso II, da Lei n.º 8.429, de 2-6-92.16

Há que se mencionar que para a doutrina majoritária os atos do Poder Disciplinar são, em regra, praticados no exercício de competência discricionária. Contudo, tal discricionariedade não é ampla, posto que, conforme acima mencionado, a Administração não tem liberdade de escolha em aplicar ou não a sanção, devendo instaurar o procedimento para apuração e então decidir acerca de eventual sanção cabível.

Incumbe mencionar que o superior hierárquico que deixar de cumprir o poder disciplinar poderá responder por: (i) infração disciplinar grave; (ii) improbidade administrativa, caso preencha cargo de chefia ou poder ou quando for o superior máximo de determinado órgão; e (iii) crimes de prevaricação e condescendência criminosa.

Com efeito, há que se realçar que qualquer aplicação de sanção necessariamente deverá ser precedida de regular processo administrativo, no qual se possibilite o contraditório e a ampla defesa.

Conforme dispõe Matheus Carvalho:

Por fim, insta salientar que a punição administrativa pelo ilícito praticado pelo agente público não impede que haja responsabilização, pelo mesmo fato, na esfera penal e na esfera civil, caso a conduta do agente também se configure infração nessas duas instâncias. Nesses casos, a regra a ser observada é a incomunicabilidade das instâncias, uma vez que a decisão do processo administrativo não deverá influenciar o julgamento civil e criminal. Excepcionalmente, o ordenamento jurídico, seguido pela jurisprudência dos tribunais superiores, define que a absolvição criminal que decorra da inexistência do fato ou negativa de autoria, enseja absolvição na esfera administrativa automaticamente, configurando-se exceção à independência das instâncias. Essa é a leitura do artigo 126 da Lei 8112/1990.17

Resumidamente, verifica-se que a responsabilização administrativa em nada impede a apuração do fato na esfera criminal e cível. Contudo, a jurisprudência prevê que acaso a absolvição criminal decorra da inexistência do fato ou negativa de autoria do investigado, logo, haveria também a absolvição administrativa.

Conclusão

A temática dos poderes administrativos é de suma importância no estudo do Direito Administrativo, uma vez que, conforme suscitado, estes são instrumentos utilizados pela Administração Pública para a consecução de seus atos, visando atingir o interesse público e bem da coletividade.

Cabe realçar que os poderes administrativos são instrumentos de que se valem autoridades públicas, de modo que devem respeitar os limites previstos em lei.

Referências Bibliográficas

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo – 27 ed., São Paulo: Atlas, 2014.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro – 42 ed. – São Paulo: Malheiros, 2016.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional descomplicado. 25 ed. São Paulo: Método, 2017.

CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo – 2 ed.- Salvador: Juspodivm, 2015.

BRASIL. Código Tributário Nacional. Brasília: Congresso Nacional. Disponível em < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm> Acesso em 04 de Setembro de 2023.


  1. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo – 27 ed., São Paulo: Atlas, 2014, p. 91.

  2. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro – 42 ed. – São Paulo: Malheiros, 2016, p.137.

  3. PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional descomplicado. 25 ed. São Paulo: Método, 2017, p. 271.

  4. Id, 2017, p. 271.

  5. CARVALHO, Matheus. Manual de direito administrativo – 2 ed.- Salvador: Juspodivm, 2015, p. 119.

  6. Id., 2015, p. 120-121.

  7. Op. cit.., 2017, p. 282.

  8. Op. cit.., 2015, p. 121.

  9. Id., 2015, p. 122.

  10. Op. cit.., 2017, p. 285.

  11. Op. cit.., 2017, p. 276.

  12. Op. cit.., 2015, p. 124.

  13. Op. cit., 2017, p. 277-278.

  14. Op. cit., 2015, p. 126.

  15. Op. cit., 2014, p. 125.

  16. Ibid, p. 96.

  17. Op. cit., 2015, p. 128.

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