Casamos sem casa própria e resolvemos construir no terreno da Sogra. Será que foi boa ideia?

13/09/2023 às 10:53
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CONSTRUIR NO TERRENO ALHEIO - principalmente de sogros - pode parecer uma aparente "solução" que na verdade pode esconder um grande problema na vida de um casal, principalmente quando esse casal está vivenciando uma separação, um divórcio ou mesmo uma situação envolvendo um inventário em decorrência do falecimento de algum dos envolvidos na questão, como os sogros por exemplo - donos do terreno. A construção levantada sobre terreno costuma ter tratamento legal com base nas regras dos artigos 1.248 e seguintes do CCB, especialmente aquelas dos artigos 1.253 e seguintes. Trata-se da AQUISIÇÃO POR ACESSÃO que se dá, no caso, por construções (parte final do inciso V). A lição é do clássico jurista, ex-Desembargador e atualmente Advogado, Dr. ARNALDO RIZZARDO (Direito das Coisas. 2021):

"Trata-se de um modo originário de aquisição. Através dele, passa a pertencer ao proprietário tudo quanto se une ou adere ao seu bem. É uma forma de aquisição da propriedade em virtude da qual uma coisa, que se une ao solo de outrem, torna-se propriedade do dono do mesmo. Da palavra 'acessão' deriva o termo 'acessório'. Daí poder se afirmar que as coisas acessórias são aquelas que advém ao bem, ou seja, são coisas postas ao serviço da coisa principal de um modo permanente. Acrescentam-se à 'res principalis'. (...) Há a incorporação de um bem a um outro".

Se não for o caso do nem sempre abordado explorado"Direito de Superfície"(art. 1.369 e seguintes do CCB)- que revela verdade EXCEÇÃO temporária e possível solução à regra da acessão e precisa ser formalizado por ESCRITURA e REGISTRO - temos que de fato não haverá outro direito para o casal além da indenização, como inclusive aponta o art. 1.255 do CCB:

"Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou EDIFICA EM TERRENO ALHEIO perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a INDENIZAÇÃO".

Por sua vez, o citado artigo 1.369 esclarece:

"Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o DIREITO DE CONSTRUIR ou de plantar em seu terreno, por TEMPO DETERMINADO, mediante ESCRITURA PÚBLICA devidamente REGISTRADA no Cartório de Registro de Imóveis".

Como se viu, não sendo o caso de Direito de Superfície e havendo BOA-FÉ, quem edificar em terreno alheio terá direito à indenização pela edificação levantada e, tanto no caso do desenlace matrimonial como no Inventário, este que titularizar o direito à indenização deverá valer-se das vias próprias em face do titular do terreno que serviu de base para buscar seu direito, caso não seja devidamente reembolsado amigavelmente. Outra não é a orientação da afinada doutrina do ilustre professor DIMAS MESSIAS DE CARVALHO (Direito das Famílias. 2020) para quem,

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"Hipótese muito comum entre casais é a construção de moradia em terreno de terceiros, normalmente um imóvel do pai de um deles, e a necessidade de partilhar. Nos termos do art. 1.255 do Código Civil, a construção percente ao proprietário do terreno, cabendo ao ex-cônjuge ou ex-companheiro a metade do valor da construção, recebendo o valor do ex-consorte, que queira ficar com a totalidade da benfeitoria, ou ajuizar ação própria de indenização em face do proprietário do terreno. Assim, estabelece-se uma compensação patrimonial das benfeitorias, já que o imóvel em si não é partilhável".

POR FIM, importante decisão do TJMG que, ainda sob a égide do CC/1916 esclarece a questão da indenização devida pelo Espólio proprietário do terreno em favor do construtor, em sede de Inventário diante do falecimento do titular do terreno:

TJMG. 2963620/MG 2.0000.00.296362-0/000. J. em: 22/02/2000. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - CASA EDIFICADA EM TERRENO ALHEIO, DE PROPRIEDADE DO PAI E SOGRO DOS LITIGANTES - BOA-FÉ - ACESSÃO - PERDA EM FAVOR DO PROPRIETÁRIO DO SOLO - IMPOSSIBILIDADE DE PARTILHAMENTO - INDENIZAÇÃO DEVIDA. "O dono do solo adquire, efetivamente, a construção feita, com a obrigação de indenizar, tratando-se de construtor de boa-fé. Para esse efeito, a doutrina e a jurisprudência fixaram o entendimento de que benfeitorias e acessões têm conceitos análogos, confundindo-se na sua terminologia, reconhecendo-se a ambas o direito de indenização e de retenção" Construída pelos cônjuges casa residencial sobre a laje da residência de propriedade do pai de um deles, comprovada a boa-fé e, ao ensejo do falecimento do patriarca, passando o imóvel ao domínio do espólio, terá o construtor direito de ser ver indenizado pelo que efetivamente gastou na construção, sendo que a partilha decorrerá do inventário".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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