Posso converter o processo de Usucapião Judicial em Extrajudicial para resolver mais rapidamente?

26/09/2023 às 18:09
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Desde 2015, por ocasião do Novo Código de Processo Civil (Lei Federal 13.105/2015) tornou-se possível regularizar a situação registral/jurídica de imóveis no Brasil sem processo judicial, com assistência obrigatória de Advogado direto nos Cartórios Extrajudiciais, sem a necessidade de um longo e complexo (e porque não dizer, oneroso) processo judicial. Não é preciso ser Advogado Especialista na área para supor que processos como Inventários e Usucapião são espécies de causas das que mais demoram para ter solução na via judicial. A propósito o mito de que a via extrajudicial será sempre mais rápida deve ser desde já desfeito, especialmente considerando que não são todos os casos que são solúveis pela via extrajudicial e até os que são admitidos podem ter lenta resolução por conta de diversas variantes. Se não podemos garantir resultado, o tempo do processo/procedimento da mesma forma é um ponto que está fora do controle de qualquer Advogado e o usuário precisa ter ciência disso, assim como dos demais riscos do processo/procedimento.

A USUCAPIÃO até então tinha rito específico no CPC/1973 (arts. 941 a 945). Com o advento do CPC/2015 o rito específico já não subsiste, como esclarecem os ilustre autores MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO e JOSÉ ROBERTO MELLO PORTO (Posse e Usucapião - Direito Material e Direito Processual. 2020):

"No CPC/73, o pleito judicial de reconhecimento da usucapião ocorria por rito especial. Basicamente, as particularidades eram as seguintes: intervenção obrigatória do Ministério Público, juntada da planta do imóvel como documento obrigatório, intimação postal dos entes públicos para que se manifestem quanto a eventual interesse no bem, edital convocatório dos eventuais interessados e citação regular dos confinantes". O Código Fux, seguindo a linha da SIMPLIFICAÇÃO PROCEDIMENTAL, extinguiu o procedimento especial, fazendo tramitar o pedido de declaração da aquisição pela usucapião pelo RITO COMUM".

De fato, considerando que o rito anterior agora já não mais existe e na mesma tacada o CPC/2015 inaugurou um novo cenário com a introdução do art. 216-A na Lei de Registros Publicos, descortinando a possibilidade da USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL, nos parece mesmo que a via administrativa/extrajudicial agora é a regra e o rito comum da via judicial a exceção - todavia não podemos nos esquecer jamais que ninguém pode ser obrigado à adotar a via extrajudicial ou mesmo ficar restrita a via judicial apenas quando houver óbice declarado na via extrajudicial (como inclusive propunha equivocadamente o Enunciado nº. 108 do TJ/CEDES 22/2015 que só admitia Ação de Usucapião quando houvesse óbice ao pedido na esfera extrajudicial). A inafastabilidade da jurisdição tem base constitucional e não pode muito menos aqui ser desprestigiada.

Como esclarece a redação do art. 216-A da LRP ("sem prejuízo da via jurisdicional") fica claro que o procedimento da Usucapião Extrajudicial é facultativo. Inobstante, parece que exatamente para os que não conseguiram vislumbrar o alcance da norma, foi editado o PROVIMENTO CNJ 65/2017 (hoje revogado pelo PROVIMENTO CNJ 149/2023, como dito a seguir) que no par.2º do seu artigo 2º espancava as dúvidas:

"§ 2º. Será facultada aos interessados a opção pela via judicial ou pela extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão do procedimento pelo prazo de trinta dias ou a desistência da via judicial para promoção da via extrajudicial".

Mais recentemente o CÓDIGO NACIONAL DE NORMAS DA CORREGEDORIA NACIONAL DA JUSTIÇA DO CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA - FORO EXTRAJUDICIAL (Provimento CNJ 149/2023) ratificou a regulamentação do Provimento CNJ 65/2017 reprisou a orientação nos par.2º e 3º do seu artigo 399 que determina:

"§ 2º. Será facultada aos interessados a opção pela via judicial ou pela extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão do procedimento pelo prazo de 30 dias ou a desistência da via judicial para promoção da via extrajudicial.

§ 3º. Homologada a desistência ou deferida a suspensão poderão ser utilizadas as provas produzidas na via judicial".

Da mesma forma como acontece com o INVENTÁRIO JUDICIAL que pode ser convertido para o EXTRAJUDICIAL, também na USUCAPIÃO será possível a conversão, como assevera o dispositivo acima citado. É importante observar que tudo que foi processado na via judicial poderá ser aproveitado na via extrajudicial (principalmente citações e manifestações dos entes públicos ou mesmo a ausências delas), com a ressalva natural e óbvia de que as regras da via extrajudicial deverão ser cabalmente observadas e satisfeitas, inclusive no que diz respeito à cobrança. Sim - para os que ainda não sabem - é importante considerar que na via extrajudicial, via de regra, o pagamento dos EMOLUMENTOS deverá ser feito ao final do procedimento, diferentemente da via judicial onde a regra é que o pagamento seja feito no INÍCIO. Outro ponto também importante a se levar em consideração é a necessidade da ATA NOTARIAL na via extrajudicial - documento que na via judicial é completamente desnecessário. A Ata Notarial (que tem alto custo, como a grande maioria dos atos extrajudiciais em muitos Estados) no procedimento extrajudicial se destina a comprovar a POSSE QUALIFICADA que se presta para Usucapião. No procedimento judicial essa prova é feita através de outros meios e jamais o CPC/1973 (e mesmo o CPC/2015) exigiu para a via judicial esse tipo de prova.

POR FIM, mais do que nunca é preciso considerar o processo como um todo e tudo que já se avançou na tramitação do feito judicialmente já que nem sempre a conversão poderá ser vantajosa; diversos pontos deverão ser analisados pelo Advogado Especialista para de fato apontar se a conversão será mesmo a melhor solução, especialmente considerando que a via extrajudicial não tem toda a envergadura que a via judicial possui para dirimir os diversos impasses que podem acontecer em um procedimento da complexidade da Usucapião e pode até mesmo apresentar mais dificuldade do que a própria via judicial, especialmente se o Advogado condutor do procedimento não dominar bem as regras da via extrajudicial.

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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