Resumo: O presente trabalho tem por objetivo estudar e contextualizar a Aposentadoria Especial, instituída pelos art. 201, § 1º da Constituição da República Federativa do Brasil e 57 da Lei 8.213/91, em razão da exposição ao agente nocivo radiação (ionizante e não-ionizante) em cotejo com a legislação, a doutrina e jurisprudência. Para que haja um melhor entendimento dos temas tratados abordou-se os conceitos e fundamentos dos institutos destacados, quais sejam o Direito Previdenciário, a Aposentadoria Especial e, claro, os agentes nocivos que ensejam o reconhecimento da condição especial que geram o direito ao benefício em comento. Destaca-se que o argumento crítico utilizado na presente pesquisa foi de que o melhor Direito, consubstanciado na proteção a dignidade da pessoa humana e da salubridade do trabalho, demonstra o interesse em assegurar o direito à Aposentadoria Especial àqueles expostos a radiação ionizante. Por fim, conclui-se com a apresentação de um panorama dos institutos tratados e da possível contextualização de ambos com o escopo de alcançar o bem comum idealizado em nossa Carta Magna.
Palavras-chave: Previdenciário. Aposentadoria Especial. Radiação. Ionizante.
Sumário: Introdução. Previdência Social. 2. Do instituto da Aposentadoria Especial. 2.1. Das Condições Especiais de Trabalho. 2.3 Da Radiação Ionizante. 2.3.1 Da Radiação Ionizante e a Segurança do Trabalho. 2.3.2 Da Radiação Ionizante e a Proteção Previdenciária. 2.4 Da Redução Do Tempo De Contribuição Em Exposição A Radiação Ionizante. 3. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal em seu Artigo 201, parágrafo 1o estabelece parâmetros constitucionais da Aposentadoria Especial na medida em que havendo atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do obreiro surge a possibilidade de se afastar a vedação à adoção de critérios e requisitos diferenciados para a concessão da aposentadoria.
A Lei 8.213/91 veio para regulamentar tal dispositivo constitucional em seu Artigo 57 e seguintes, com rígidas regras a respeito dos critérios e condições para a concessão de tal Aposentadoria Especial.
Nesse contexto, com a busca a análise da radiação ionizante como agente nocivo gerador, em razão de expor o obreiro a condições especiais, do direito à Aposentadoria Especial e a redução do tempo mínimo de contribuição especial para concessão deste benefício.
Nesse sentido, cumpre analisar quais são os principais riscos oferecidos pela radiação ionizante para o obreiro. Com base nisso, buscar-se-á analisar a viabilidade jurídica, política e social para assegurar a concessão do multicitado benefício àqueles que laboram sob esse referido agente nocivo em um espaço menor de tempo.
1. PREVIDÊNCIA SOCIAL:
Frederico Amado leciona que a Previdência Social:
“Em sentido amplo e objetivo, especialmente visando abarcar todos os planos de previdência básicos e complementares disponíveis no Brasil, a previdência social pode ser definida como um seguro com regime jurídico especial, pois regida por normas de Direito Público, sendo necessariamente contributiva, que disponibiliza benefícios e serviços aos segurados e seus dependentes” (AMADO, 2016, p. 176)
Como se depreende da fala do doutrinador supra destacada, verifica-se que a Previdência Social como sendo uma espécie sui generis de seguro nos quais são disponibilizados benefícios aos seus segurados e dependentes em contrapartida a contribuições pecuniárias.
A Previdência Social, segundo Ivan Kertzman (Kertzman, 2017, p. 32) se estrutura sob forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
Na fala dos previdenciaristas supra destacados verifica-se que a Previdência Social visa proteger o indivíduo dos eventos certos ou não que envolvem a capacidade para o trabalho e a subsistência deste e de seus dependentes.
Dentre os benefícios da Previdência Social destaca-se o instituto da Aposentadoria, talvez o mais evidenciado dentre aqueles, consistente em garantir ao segurado a proteção previdenciária em caso de inatividade em razão da idade avançada ou do tempo de trabalho ao longo da vida, nesse caso, a Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Ainda no tocante a Aposentadoria por Tempo de Contribuição, foi instituída a Aposentadoria Especial por Tempo de Contribuição em razão da exposição à Agentes Nocivos no ambiente de trabalho.
Sobre tal espécie de benefício previdenciário aprofundar-se sua análise no tópico a seguir.
2.1. DO INSTITUTO DA APOSENTADORIA ESPECIAL:
O direito a Aposentadoria Especial está insculpido na Constituição Federal nos seguintes termos:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
(...)
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.(grifou-se)
Conforme estatui o texto constitucional, salvo exceções previstas na legislação, não pode haver o estabelecimento de requisitos e critérios diferenciados para a concessão da Aposentadoria aos beneficiários do regime geral da previdência social, comportando ali apenas duas exceções, dentre estas a Aposentadoria Especial àqueles obreiros que exercerem seu labor expostos a condições que prejudiquem a sua saúde e a integridade física.
Regulamentando tal previsão constitucional, a Lei 8.213/91 firmou em seu Art. 57 o seguinte:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
A legislação infraconstitucional estabeleceu a limitação temporal para a concessão do citado benefício especial, no caso quantos anos de contribuição sob exposição a condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física do obreiro são necessários para a concessão do benefício em questão.
Na definição de Kertzman:
A aposentadoria especial será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual este somente quando cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante 15, 20 ou 25 anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou integridade física. Percebe-se que os segurados que tem direito a esta modalidade de aposentadoria são, justamente, os que, de alguma forma, geram contribuição para o seu custeio (KERTZMAN, 2017, p. 404)
Na fala de Ivan Kertzman verifica-se que a fundamentação da aposentadoria especial encontra-se em proteger o segurado que tenha exercido labor sujeito a condições especiais de trabalho, quais sejam, em exposição à agentes nocivos que prejudiquem a integridade física ou a saúde do trabalho.
Frederico Amado leciona o seguinte
Será devida a aposentadoria especial ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos de contribuição, observada a carência de 180 contribuições, ressalvada a tabela de transição de carência do artigo 142, da Lei 8.213/91, para aqueles segurados filiados ainda no regime previdenciário pretérito. (AMADO, 2016, p. 705)
O autor em destaque traz ponto importante a ser destacado, qual seja, a necessidade da carência mínima de 180 meses, que se confunde com o tempo mínimo de contribuição sob condições especiais para a concessão da Aposentadoria Especial, para a concessão deste benefício.
Maria Helena Carreira Alvim traz a essência da Aposentadoria Especial:
É correto definir a aposentadoria especial como benefício que visa garantir ao segurado uma compensação pelo desgaste resultante do trabalho prestado em condições prejudiciais à saúde ou integridade física. (ALVIM, 2018, p. 24)
No excerto doutrinário acima vislumbra-se aquela que é sintetiza da melhor forma a essência da Aposentadoria Especial, qual seja, a garantia ao obreiro de uma aposentação relativamente precoce em contrapartida ao seu exercício de atividade laboral exposta a condições que ofereçam prejuízo à sua saúde e/ou integridade física.
Conforme se vê da legislação e doutrina acima expostas a aposentadoria especial deve obedecer a duas condicionantes para sua concessão, quais sejam, o critério temporal de contribuição, sempre inferior ao período de contribuição exigido para a Aposentadoria Normal por Tempo de Contribuição, e a comprovação da exposição a condições de labor sujeitos a fatores prejudiciais à saúde e a integridade física do segurado.
2.2. DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO:
Conforme legislação trabalhista e previdenciária existem uma extensa gama de agentes que tornam o labor periculoso ou insalubre, ensejando a configuração das condições especiais de labor.
Nesse sentido, cumpre destacar lição de Frederico Amado:
O enquadramento das atividades especiais é feito pelo anexo IV, do RPS, que enumera os casos de aposentadoria especial com 15, 20 e 25 anos de contribuição, conforme os agentes nocivos a que estão expostos os segurados (...), consideram-se condições especiais que prejudiquem a saúde e a integridade física aquelas nas quais a exposição ao agente nocivo ou associação de agentes presentes no ambiente de trabalho esteja acima dos limites de tolerância estabelecidos segundo critérios quantitativos ou esteja caracterizada segundo os critérios da avaliação qualitativa (AMADO, 2016, p. 705).
Assim sendo, o Regulamento da Previdência Social normatiza quais os critérios quantitativos e qualitativos para reconhecer a especialidade do labor e quais daqueles ensejam o reconhecimento o direito a minoração do tempo de contribuição para 15, 20 ou 25 anos.
Kertzman traz as espécies do gênero agentes nocivos na seguinte categorização:
O Segurado deverá comprovar a efetiva exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.
A legislação previdenciária define os seguintes agentes:
I – físicos – os ruídos, as vibrações, o ar comprimido, o calor, a umidade, a eletricidade, as pressões anormais, as radiações ionizantes, as radiações não ionizantes;
II – químicos – os manifestados por: névoas, neblinas, poeiras, fumos, gases, vapores de substâncias nocivas presentes no ambiente de trabalho, absorvidos pela via respiratória, bem como aqueles que forem passíveis de absorção por meio de outras vias;
III – biológicos – os microorganismos como bactérias, fungos, parasitas, bacilos, vírus e ricketesias, dentre outros (KERTZMAN, 2017, p. 406).
Essa divisão facilita tanto o enquadramento previdenciário quanto trabalhista no sentido de listar de maneira pormenorizada quais os agentes nocivos e seus efeitos face ao obreiro.
Na listagem dos agentes nocivos são trazidos por ampla legislação previdenciária, dentre as quais destacam-se os Decretos 53.891/64, 83.080/79, 2.172/97 e 3.048/99, nos quais estão previstos quais os agentes nocivos e as atividades que ensejam o reconhecimento de tempo especial de contribuição.
Dentre os agentes nocivos elencadas destaca-se a Radiação Ionizante, listada nos Código 1.1.4 do Anexo do Decreto 53.891/64, o Código 1.1.3 do Anexo I do Decreto 83.080/79, o Código 2.0.3 do Anexo IV Decreto 2.172/97 e o Código 2.0.3 do Anexo IV do Decreto 3.048/99.
2.3. DA RADIAÇÃO IONIZANTE:
Conforme leciona Walter Paes Siqueira apud Maria Helena Carreira Alvim Ribeiro:
A radiação ionizante é, basicamente, uma forma de energia. Esta pode se apresentar sob a forma de partículas ou ondas eletromagnéticas que transportam energia de um ponto a outro no espaço (...) Há diferentes tipos de radiação ionizante, com características distintas, e que levam a diferentes mecanismos de interação com a matéria. Isso quer dizer que os diferentes tipos de radiação podem transferir a energia que carregam de maneiras diferentes, levando a efeitos biológicos diferentes, que por sua vez, implicam que os riscos associados são diferentes (PAES, 2017, p. 22 apud ALVIM, 2018, p. 80).
Conforme se depreende da lição doutrinária acima exposta, a radiação ionizante consiste em uma forma de energia que pode se propagar através de ondas ou partículas e em sua interação com a matéria tem o condão de causar diversos efeitos biológicos.
No tocante aos efeitos da radiação ionizante sobre o homem, cumpre destacar artigo cientifico do Conselho Nacional de Energia Nuclear:
Efeitos Estocásticos: são aqueles cuja probabilidade de ocorrência é função da dose, não existindo limiar, como é o caso do câncer. Assim, para qualquer indivíduo irradiado há uma chance de que certos efeitos atribuíveis à radiação se manifestem, mas só depois de um período de tempo longo (dezenas de anos) a partir do momento que ocorreu o evento de irradiação. Efeitos Determinísticos: são aqueles que surgem num curto espaço de tempo (dias, horas, minutos) a partir de um valor de dose limiar e sua gravidade é função do aumento dessa dose. Estes efeitos incluem inflamação e ulceração da pele, náusea, vômito, anorexia, diarréia, queda de cabelos, anemia, hemorragia, infecções, etc. Esses efeitos são atribuídos, principalmente, à morte celular ou perda de capacidade de reposição de células de vida biológica relativamente curta, ou seja, aquelas que devem se manter em permanente estado de reprodução como as da medula óssea, as das camadas mais internas dos tecidos de recobrimento (pele, revestimento do sistema gastrintestinal, recobrimento de glândulas) e aquelas da linhagem germinativa. Alguns efeitos determinísticos esperados para intervalos de doses absorvidas pelo indivíduo adulto estão ilustrados na Tabela 2.1. (MORO, 2009).
Conforme artigo do CNEN no tocante a segurança e proteção radiológica, a exposição a radiação ionizante traz diversas consequências ao obreiro, sendo estes mediatos, decorrentes da exposição por longos períodos em doses menores, e os imediatos, decorrentes em função da exposição a dose limiar.
Como efeito mediato, destaca-se as amplas possibilidades de desenvolvimento de câncer.
Em que pese todos esses riscos, tal espécie de da radiação é fundamental para a sociedade moderna:
É compreensível a importância da radiação ionizante para diagnósticos e tratamentos médicos; a grande maioria dos procedimentos tem finalidade diagnóstica, e há procedimentos que possuem finalidade terapêutica; entretanto, não deve ignorado o risco à exposição pelos segurados, e maior preocupação dos profissionais que não podem ignorar suas normas e limites (...) O objetivo do legislador, ao assegurar o direito à aposentadoria especial aos trabalhadores expostos a esses agentes, considera a importância da utilização da radiação ionizante para a saúde, pesquisas, ciência e tecnologia, representando enorme benefício para a humanidade (...) (ALVIM, 2018, p. 82).
Consoante expõe a professora Maria Helena a utilização da radiação ionizante é de suma importância para a sociedade contemporânea, especialmente face ao seu uso com finalidade de diagnóstico e tratamento médico.
Nessa senda, destaca também a necessidade da percepção do risco que tal radiação oferece aos obreiros que se encontram em contato diário com tal forma de energia, logo, estes devem ter proteção da legislação previdenciária e trabalhista em razão do perigo ao qual se submetem em prol do benefício da sociedade como um todo.
2.3.1 DA RADIAÇÃO IONIZANTE E A SEGURANÇA DO TRABALHO:
Além da legislação previdenciária, que estabelece quais as possibilidades de enquadramento da exposição da radiação ionizante como agente nocivo ensejador do reconhecimento da condição especial de labor, a legislação trabalhista estabelece os parâmetros para que tal agente passe a ser reconhecido como oferecedor de risco laboral.
Nesse sentido, destaca-se o que prevê a Norma Regulamentadora N° 15, em seu anexo V:
Nas atividades ou operações onde trabalhadores possam ser expostos a radiações ionizantes, os limites de tolerância, os princípios, as obrigações e controles básicos para a proteção do homem e do seu meio ambiente contra possíveis efeitos indevidos causados pela radiação ionizante, são os constantes da Norma CNEN-NE-3.01: "Diretrizes Básicas de Radioproteção", de julho de 1988, aprovada, em caráter experimental, pela Resolução CNEN n.º 12/88, ou daquela que venha a substituí-la. (Parágrafo dado pela Portaria n.º 04/1994).
A citada norma regulamentadora trabalhista
Complementando a NR 15, vem as Diretrizes Básicas de Proteção Radiológica (Norma CNEN NN 3.01) estabelecer os limites da exposição a radiação ionizante por parte de indivíduos ocupacionalmente expostos, mensurados em milésimos de Sievert (mSv - unidade que mede os efeitos biológicos da radiação):
A absorção do radionuclídeo no sistema gastrintestinal e no sistema respiratório é dependente da forma química do composto incorporado. A Tabela 1 apresenta os fatores de transferência do sistema gastrintestinal (f1), para diferentes compostos, usados para avaliação da incorporação por ingestão. A Tabela 2 apresenta a classificação dos compostos quanto à absorção pelo sistema respiratório e os correspondentes valores de f1. Quando a informação sobre o composto químico não estiver disponível, deve ser usado o valor mais restritivo, para fins de comparação com limites ou restrições de dose. Com a finalidade de demonstrar conformidade com limites de dose efetiva, deve ser empregada a soma da dose efetiva devida à exposição externa no período especificado com a dose efetiva comprometida devida a incorporações de substâncias radioativas no mesmo período.
Tal diretriz estabelece a limitação das doses que podem ser absorvidas, pelos obreiros que lidam com a radiação ionizante, através do sistema gastroinstestinal e respiratório dentro de um espectro de segurança laboral.
Tal enquadramento ocorre quando ultrapassar o limite de tolerância que corresponde à dose individual, aferida por meio de dosímetros, não devendo ultrapassar, conforme o Tópico 5.4.2.1 das Diretrizes Básicas de Proteção Radiológica, 20mSv na dose anual efetiva sobre corpo inteiro ou, em dose anual equivalente, a 150mSv sobre o cristalino e 500mSv sobre pele, mãos e pés, isso no caso do individuo ocupacionalmente exposto.
Logo, tais parâmetros estão diretamente vinculadas a consequência na seara previdenciária, na medida em que estabelece a partir de qual dose pode ser entendido o oferecimento de risco efetivo ao indivíduo em razão da sua exposição a fontes de radiação em razão da sua ocupação laboral.
2.3.2 DA RADIAÇÃO IONIZANTE E A PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA:
Cumpre trazer mais uma vez a luz lição de Maria Helena Arruda Alvim Ribeiro:
A exposição aos agentes relacionados no Código 1.14 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/1964, o trabalho em atividade e exposição aos agentes relacionados no Código 1.1.3 do Anexo I do Decreto 83.080/1979, e exposição aos agentes relacionados no Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e no anexo IV do Decreto 3.048/1999, asseguram ao trabalhador o direito à aposentadoria especial, quando desempenhado durante o prazo mínimo fixado na legislação (25 anos), bem como asseguram o cômputo como tempo especial, quando o trabalho tenha sido exercido alternadamente com atividades comuns (Parágrafo dado pela Portaria n.º 04/1994).
Conforme já exposto, a legislação previdenciária estabelece a radiação ionizante como um agente nocivo ensejador do reconhecimento de tempo especial de contribuição e, também, elenca uma série de atividades laborais nas quais estaria o exposto o obreiro ao agente nocivo citado.
Cumprindo esclarecer que, em razão da Lei 9.032/95, não basta apenas a comprovação do exercício de atividade dentre as listadas na fala da eminente previdenciarista, mas faz-se necessária a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo radiação ionizante, para fins de reconhecimento de labor sob condições especiais.
Assim sendo, tais atividades listadas tem apenas serventia de direcionar a atuação dos operadores do direito previdenciário e dos envolvidos com a segurança do trabalho com fito em descortinar com mais facilidade quais situações podem estar concretizada a exposição a radiação ionizante.
Especificamente quanto ao tempo mínimo de contribuição sob a exposição da radiação ionizante para a concessão da Aposentadoria Especial, o Decreto nº 3.048/99 traz no seu Código 2.03. do Anexo IV que tal parâmetro temporal é de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição.
A jurisprudência, como não poderia ser diferente, tem entendimento no sentido de ser viável o reconhecimento da especialidade em razão da exposição ao agente nocivo radiação:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. OPERADOR DE RAIO X E TÉCNICO DE ANÁLISES CLÍNICAS. EXPOSIÇÃO A RADIAÇÃO IONIZANTE E AGENTES BIOLÓGICOS INFECTOCONTAGIOSOS. CÓDIGOS 2.0.3 E 3.0.1 DO ANEXO IV DOS DECRETOS 2.172/97 E 3.048/99. EPI EFICAZ. IRRELEVÂNCIA. CONSECTÁRIOS LEGAIS INCIDENTES SOBRE A CONDENAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. (AMS https://arquivo.trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=00057552420124013814, JUIZ FEDERAL HENRIQUE GOUVEIA DA CUNHA, TRF1 - 2ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 DATA:12/06/2018 PAGINA) (grifo nosso)
ADMINISTRATIVO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS . PERICULOSIDADE. CONTAGEM ESPECIAL. POSSIBILIDADE. STF. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO RGPS. ART. 57 DA LEI 8.213/91. APELAÇÃO P ROVIDA. 1. Apelação cível em face de sentença que julgou improcedente o pedido autoral objetivando a contagem especial do tempo de serviço para fins de aposentadoria, tendo em vista o exercício de atividades em condições perigosas, mais e specificamente submetidas à radiação ionizante. (...) (AC 01814467320144025101, JOSE EDUARDO NOBRE MATTA, TRF2 - 5ª TURMA ESPECIALIZADA.) (grifo nosso)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E RADIAÇÃO IONIZANTE. FORNECIMENTO E USO DE EPI EFICAZ. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL. SENTENÇA MANTIDA. (AC https://arquivo.trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=00025447320134013804, JUIZ FEDERAL HENRIQUE GOUVEIA DA CUNHA, TRF1 - 2ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 DATA:12/06/2018 PAGINA) (grifo nosso)
Conforme se vê dos julgados expostos, a jurisprudência previdenciária segue o melhor Direito na medida em que, em consonância com a legislação previdenciária e trabalhista, com vistas a proteção do obreiro, assegura o reconhecimento de condição especial de trabalho em razão à exposição ao agente nocivo radiação ionizante.
2.4 DA REDUÇÃO DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM EXPOSIÇÃO A RADIAÇÃO IONIZANTE:
Inicialmente, cumpre expor que a exposição do obreiro ao Asbesto (amianto) por um período de 20 (vinte) anos já é suficiente para a concessão da Aposentadoria Especial, conforme Código 1.0.2 do Anexo IV do Decreto 3.048/99. Ademais, conforme Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos - LINACH 1, tal agente nocivo está classificado como Confirmado Como Carcinogênico para Humanos.
Diante de tal situação e face ao agente nocivo radiação ionizante estar classificado no mesmo grupo na LINACH e, conforme todo o exposto neste trabalho, ter o condão de alterar a estrutura celular o ser humano, questiona-se a possibilidade de trazer à equivalência de tempo de contribuição especial aqueles sujeitos à radiação ionizante ao da exposição ao amianto/asbesto, qual seja, 20 (vinte anos).
Nesse sentido, cumpre destacar fala de Fábio Zambitte Ibrahim:
A Previdência Social impõe ao interprete e aplicador a lei previdenciária a consciência de que a lei deve sempre ser subsumida de maneira a atender, na maior medida possível, as expectativas da clientela protegida, atendendo-se em conjunto outras restrições de ordem legal ou constitucional. Somente vedação expressa em lei ou oriunda da própria Constituição poderá frustrar as expectativas dos beneficiários da Previdência Social, sob pena de violação da Constituição Cidadã. (IBRAHIM, 2011, p. 21)
As restrições constantes, no presente caso, no Regulamento da Previdência Social não podem se sobrepor ao que estabelece a Lei 8.213/91 e, especialmente, a Constituição Federal, que tem como seus princípios norteadores no âmbito previdenciário a dignidade da pessoa humana, igualdade e isonomia.
Ademais, o custeio da ampliação ao direito a Aposentadoria Especial em razão da possível redução do tempo mínimo de contribuição sob exposição a radiação ionizante se daria com a majoração da contribuição complementar de 6% para 9%, acréscimo este, que cremos, relativamente palatável para setor que exige investimento intensivo de capital, quais sejam, atendimento a saúde e indústria nuclear.
Ora, se o critério material para a concessão da Aposentadoria Especial é o lapso temporal em atividades prejudicial ao labor do obreiro, não há por que diferenciar a consequência temporal em razão de exposição a agentes nocivos diversos, mas que oferecem o mesmo prejuízo a saúde do trabalhador, qual seja, condição carcinogênica tanto da radiação ionizante quanto do asbesto/amianto.
3. CONCLUSÃO:
A presente pesquisa buscou compreender os institutos da Aposentadoria Especial no tocante a exposição ao agente nocivo Radiação Ionizante, especialmente no tocante aos riscos oferecidos a saúde, e ao fato do agente nocivo amianto.
Essa contextualização teve como finalidade estabelecer parâmetros para uma possível redução do tempo de contribuição em condições especiais de exposição a Radiação Ionizante para 20 (vinte) anos.
Este trabalho fundamentou-se basicamente na análise bibliográfica (doutrinária), legal e jurisprudencial com fito em alcançar a análise dos da radiação ionizante e das suas implicações à saúde do obreiro e buscar demonstrar sua equivalência com os riscos ocasionados pelo asbesto/amianto.
A principal dificuldade para o desenvolvimento da presente pesquisa constituiu-se na pouca produção acadêmica e de pesquisas práticas a respeito da Radiação Ionizante, em razão da sua pouca busca frente ao Judiciário.
Nessa senda restou demonstrado os efeitos maléficos da Radiação Ionizante sob a saúde do trabalhador e que há espaço para a revisão do previsto no Regulamento da Previdência Social no sentido de reduzir o tempo mínimo de contribuição exposto à Radiação Ionizante para a concessão da Aposentadoria Especial em consonância com o melhor Direito, em seu todo, e a Constituição Federal, em especifico.
REFERÊNCIAS:
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AMADO, Frederico. Curso de direito e processo previdenciário. 8. ed. Salvador, Editora Juspodivm, 2016.
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______.Decreto n° 2.172, de 05 de março de 1997. Aprova o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2172.htm>. Acesso em: 31 maio 2018.
______.Decreto n° 3.048, de 06 de maio de 1999. Regulamento da Previdência Social. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm>. Acesso em: 31 maio 2018.
______.Decreto n° 53.891, de 25 de março de 1964. Dispõe sobre a aposentadoria especial. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d53831.htm>. Acesso em: 01 junho 2018.
______.Decreto n° 83.080, de 24 de janeiro de 1979. Aprova o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D83080.htm>. Acesso em: 31 maio 2018.
______.Lei n° 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 05 maio 2018.
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KERTZMAN, Ivan. Curso prático de direito previdenciário. Ed 5. Niterói, Editora Impetus, 2011.
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