SIM, existem diversas formas de evitar o fatídico problema - muito comum por sinal - da construção no terreno dos outros (especialmente quando esse outro é seu pai/mãe ou seu (sua) sogro (a). De toda forma, antes de sugerir uma solução interessante, é preciso destacar que esse problema costuma ser resolvido judicialmente através de uma ação indenizatória, nos termos do art. 1.255 do Código Civil (quando houver boa-fé, diga-se de passagem). O referido artigo trata das "plantações e construções" dentro do tópico da aquisição da propriedade imobiliária por "Acessão", sendo "plantações ou construções" apenas uma das formas dela (inciso V). Segundo o referido artigo,
"Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio PERDE, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e CONSTRUÇÕES; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização".
Pois bem, se efetivamente a compra e venda de um terreno próprio não for uma alternativa e muito menos outras soluções como o parcelamento do solo e posterior doação ou venda, pode ser viável aos interessados se socorrerem, por exemplo, do instituto da "Superfície", que tem base no artigo 1.369 do Código Civil que assevera:
"Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis".
Passando longe da discussão sobre a coexistência de dois regimes jurídicos da Superfície (do art. 21 e seguintes do Estatuto da Cidade e do referido art. 1.369 do CCB - especialmente no que diz respeito à duração do referido direito real - se por "tempo determinado" apenas ou se possível também por "tempo indeterminado") - temos que a estipulação do Direito real de Superfície pode ser uma das soluções para o caso de se permitir a construção no terreno alheio, buscando evitar problemas futuros. Com toda certeza a consulta a um Advogado Especialista poderá sugerir, de acordo com as peculiaridades do caso concreto, outras alternativas. Como deixa claro o referido artigo 1.369, sua constituição deve ser feita por ESCRITURA PÚBLICA (em qualquer Cartório de Notas) sendo necessário o seu REGISTRO no Cartório do RGI responsável pela região onde se encontrar o imóvel. Sem obedecer a tais regras não haverá o nascimento do referido DIREITO REAL, nos moldes do que determina o art. 1.227 do mesmo Código Civil:
"Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código".
Os ilustres professores CRISTIANO CHAVES DE FARIAS e NELSON ROSENVALD (Curso de Direito Civil. 023) esclarecem com maestria sobre o instituto em análise:
"Em princípio, as construções e plantações são ACESSÕES CONTÍNUAS, caracterizadas por uma união exógena de coisas, por força da qual tudo o que se planta ou constrói-se em solo alheio é de propriedade definitiva do DONO DO SOLO. É o princípio da gravitação jurídica, pelo qual o acessório segue o principal. Trata-se da regra 'superficies solo cedit', estampada no art. 1.255 do Código Civil (...) Essa regra cederá no modelo do DIREITO DE SUPERFÍCIE, pois haverá suspensão temporária dos efeitos da acessão, à medida que a propriedade da construção ou plantação efetivada em solo alheio será daquele que a realizou, permanecendo a propriedade do solo com o seu proprietário".
Necessário destacar que, encerrada a concessão do "Direito de Superfície" o proprietário do terreno passará a ter a propriedade plena sobre o terreno, construção/edificações ou plantações, independentemente de qualquer indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário"na Escritura, como aduz o art. 1.375 do CCB.
POR FIM, é preciso observar que, uma vez regulamente constituído com seu TÍTULO REGISTRADO no Cartório de Imóveis o"Direito de Superfície"não só poderá como deverá integrar o Espólio do"superficiário"a ser resolvido partilhado entre seus herdeiros em caso de seu falecimento, como destaca o art. 1.372 do CCB que autoriza a transmissão"causa mortis"do referido direito - todavia, se não houver sua regular constituição outro caminho não restará senão a incorporação das edificações/plantações ao patrimônio do titular do LOTE, ou aquele que seria o"concedente"- havendo inclusive transmissão dessas em favor dos seus hedeiros no caso do seu falecimento, como esclarece com acerto a jurisprudência mineira - uma vez não afastada a regra"superficies solo cedi", como dito:
"TJMG. 10567110001383001. J. em: 16/02/2022. APELAÇÕES PRINCIPAL E ADESIVA - AÇÃO ORDINÁRIA - PRETENSÃO DE EXCLUSÃO DO ACERVO HEREDITÁRIO DE IMÓVEIS ERIGIDOS EM TERRENO PERTENCENTE AO ESPÓLIO - ACESSÃO FÍSICA - "SUPERFICIES SOLO CEDIT" - EDIFICAÇÃO QUE SE INCORPORA AO SOLO - INVIABILIDADE DE CISÃO DA PROPRIEDADE - RECURSO PRINCIPAL PROVIDO - APELO ADESIVO PREJUDICADO - A acessão configura modo de aquisição originária da propriedade, a partir da qual, por força da máxima "superficies solo cedit", o proprietário de um dado bem adquire a titularidade de tudo aquilo que a ele se incorpora - A construção erigida em propriedade alheia constitui acessão física e passa a integrar o patrimônio do proprietário do imóvel, nos termos do artigo 1.255, do Código Civil - Demonstrada a realização de edificações em terreno pertencente ao espólio, não se faz possível a exclusão do monte partilhável das construções, posto que integradas ao bem imóvel - Recurso principal provido. Pedido inicial julgado improcedente. Apelo adesivo prejudicado".