ALVARÁ representa uma alternativa [supostamente] rápida para resolver bens deixados por pessoas falecidas, de modo a dispensar a realização do "Inventário", inclusive o Extrajudicial de que tanto falamos, baseado na Lei 11.441/2007, recepcionada pelo CPC/2015. A boa doutrina esclarece e sinaliza que "Alvará" tem o significado de "autorização" para a prática de certos atos. Assim lecionam os ilustres Desembargadores aposentados do TJSP, hoje Advogados, Drs. EUCLIDES DE OLIVEIRA e SEBASTIÃO AMORIM (Inventário e Partilha - Teoria e Prática. 2020):
"É a ordem escrita, emanada de uma autoridade judicial ou administrativa, para que se cumpra um despacho ou se possa praticar determinado ato. (...) Há situações que dispensam a abertura de inventário ou de arrolamento, em face da natureza dos bens deixados à sucessão, ou de seu reduzido valor. A previsão é do artigo 666 do Código de Processo Civil, com expressa referência à Lei 6.858, de 24 de novembro de 1980, que dispõe sobre o pagamento, aos dependentes ou sucessores, de valores não recebidos em vida pelos respectivos titulares. (...) Na falta de dependentes habilitados perante a Previdência Social, farão jus ao recebimento dos valores os sucessores do titular, previstos na lei civil, mediante ALVARÁ JUDICIAL".
Como destacado pela doutrina, o artigo 666 do Código de Processo Civil informa a dispensa de arrolamento ou inventário nos casos da citada Lei 6.858/80:
"Art. 666. Independerá de inventário ou de arrolamento o pagamento dos valores previstos na Lei nº 6.858, de 24 de novembro de 1980".
A referida Lei Federal 6.858/1980, por sua vez, está relacionada apenas a "valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS- PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares", assim como "restituições relativas ao imposto de renda e outros tributos, recolhidos por pessoa física, e, não existindo outros bens sujeitos a inventário, aos saldos bancários e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento de valor até 500 (quinhentas) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional". Seria uma alternativa o chamado "ALVARÁ INDEPENDENTE" ou "ALVARÁ AUTÔNOMO" para por exemplo a regularização da sucessão onde o autor da herança tenha deixado, diferentemente do expressamente destacado pela Lei 6.858/80, apenas UM VEÍCULO de baixo valor?
Nos parece que a resposta é NEGATIVA, sendo necessário nesse caso qualquer das modalidades de INVENTÁRIO JUDICIAL ou EXTRAJUDICIAL, sendo muitas vezes o caso de se resolver via arrolamento sumário, desde que é claro preenchidos seus requisitos legais. Sobre as modalidades de Inventário à luz do CPC/2015 já discorremos em artigo anterior , e efetivamente entendemos que lançar mão do ALVARÁ deve ser apenas para os casos onde estejam presentes os requisitos da referida Lei, já que se trata de uma exceção à regra. Nesse sentido é também a doutrina especializada assinada pelo ilustre Advogado, Dr. MARIO ROBERTO FARIA (Inventários e Testamentos - Direito das Sucessões - Teoria e Prática. 2023):
"O 'Requerimento de Alvará', também denominado 'Súplica de Alvará', não está previsto no Código de Processo Civil. Trata-se de uma PRAXE FORENSE. É o 'Requerimento de Alvará' um procedimento mais simples, mais rápido e menos oneroso para as partes. Deve ser utilizado, principalmente, para recebimento das quantias decorrentes da Lei 6.858/80, quando não haja dependentes declarados junto à Previdência Social, ou existindo sejam menores ou incapazes. O requisito essencial para a utilização desse procedimento é a INEXISTÊNCIA DE OUTROS BENS. Deixando o 'de cujus' qualquer outro bem impõe-se o processamento dos autos de INVENTÁRIO".
Ainda assim, evidenciado que o Alvará é medida excepcional, não desconhecemos que a jurisprudência tem autorizado, em determinadas situações - mesmo sem enquadramento na Lei 6.858/80 - a utilização do ALVARÁ, inclusive para quando o autor da herança tenha deixado por exemplo, APENAS UM VEÍCULO como herança:
"TJRJ. 00039814620218190212. J. em: 31/08/2022. Pedido de expedição de ALVARÁ JUDICIAL transferência de veículo do FALECIDO genitor. Sentença de INDEFERIMENTO da petição inicial por INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, nos termos do artigo 485, incisos I e VI, do NCPC. Inconformismo do Requerente. Entendimento desta Relatora quanto à necessidade de ANULAÇÃO DA SENTENÇA vergastada. Cuida-se de pedido de alvará judicial para transferência de um veículo Ford/Fiesta/GL, ano 2001, placa MTM5777-RJ, único bem deixando pelo genitor do Requerente, Sr. Almir Fontes, falecido em 16/12/2018. Neste passo, conforme preconizado no artigo 666 do NCPC, o pagamento dos valores previstos na Lei n.º 6.858/1980 não depende de inventário ou de arrolamento, bastando o pedido de alvará judicial. Ademais, a Lei 6.858/1980 dispõe sobre o pagamento aos dependentes e sucessores de valores não superiores a 500 ORTNs, não recebidos em vida pelos titulares, por meio de simples pedido de ALVARÁ JUDICIAL, independentemente de abertura de inventário ou arrolamento. Não obstante, os citados artigos referirem-se apenas ao PAGAMENTO DE VALORES, a jurisprudência tem entendimento acerca da possibilidade de MITIGAÇÃO do disposto no artigo 666 do NCPC, a fim de PERMITIR A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ para transferência de veículo de baixo valor (inferior 500 ORTNs) DESDE QUE NÃO HAJA OUTROS BENS a inventariar e todos os herdeiros sejam maiores e capazes. Sendo assim, o juiz ao analisar o caso, em observância aos PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAL, os fins sociais das citadas normas e, por se tratar de procedimento de jurisdição voluntária, pode adotar a SOLUÇÃO MAIS EFICIENTE E OPORTUNA, conforme autorizado pelo § único do artigo 723 do NCPC. Na presente hipótese, o Requerente é filho único, não há outros herdeiros, e o de cujus deixou tão somente o veículo supracitado, cujo valor, segundo a Tabela FIPE, é de aproximadamente R$ 8.819,00. Portanto, estão presentes as condições que viabilizam a mitigação das hipóteses previstas no artigo 666 do NCPC, sendo possível a transferência do veículo por meio de alvará judicial. Desse modo, não há que se falar em inadequação da via eleita, razão pela qual a Sentença que indeferiu a inicial deve ser anulada, para prosseguimento, com as intimações e diligências cabíveis. Precedentes do E. TJERJ. CONHECIMENTO E PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO PARA ANULAR A SENTENÇA, determinando-se o prosseguimento do feito".