A crescente utilização do substantivo “colaborador” significa um retrocesso nas relações de emprego.
Colhe-se no dicionário de Aurélio Buarque de Holanda:
“Colaborador : “(De colaboraro + dor.)Adj 1. Que colabora. SM.2 Aquele que colabora. 3.V. co-autor” (Novo Dicionário da Língua Portuguesa)
Por seu turno, Antonio Houaiss em seu Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa denomina da seguinte forma:
“colaborador/ô/adj.s.m.(1836)1.que ou que colabora ou que ajuda outrem em suas funções.2. que ou quem produz com outro(s) qualquer trabalho ou obra ,coautor;3. que ou aquele que escreve artigos, para uma publicação periódica sem pertencer ao corpo permanente de seus redatores”
Etimologicamente, o que Houaiss distingue como sendo a origem e evolução das palavras, confunde-se neste uso, em “vulgata” , com a pretendida supressão do uso das expressões empregado e empregador, pretendendo-se assim, numa linguagem educada, mas não técnica, a substituição das relações de emprego por substantivo masculino que não tem a amplitude de sua origem e significado, pretendendo-se assim, a substituição de conquista aliás, assegurada na Constituição Federal em seu artigo 7º, verbis:
“ Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:”
Logo, temos uma definição imediata de trabalhadores e não de colaboradores na própria teoria mista da relação de trabalho que é majoritária , pois define a relação de emprego como sendo aquela que assegura que o Direito do Trabalho sendo o conjunto de princípios e normas que regulam , principalmente, as relações imediatas ou mediatamente ligadas ao trabalho remunerado livre, privado e subordinado, e, ainda, aspectos relativos à existência dos que o executam”.
Iniciemos nosso raciocino e demonstração do equívoco, lembrando que a mais elementar forma de “colaboração” depende de remuneração , pois caso contrário teríamos a escravidão. Neste caso, estamos diante das características do contrato de trabalho: sinalagmático , oneroso, com subordinação, isto é com poder diretivo, obediência, e não meramente disposição de colaborar. Pois a colaboração tem sempre um conteúdo de liberalidade do colaborador e não de mero altruísmo em prol da instituição ou empresa.
A teoria contratualista do contrato de trabalho, também de plano, afasta a concepção que se pretende moderna , na boca dos que ousam ser legisladores de plantão, criando fatos,valores e normas de corar a teoria tridimensional do direito. O fato é que os valores são outros, tais como subordinação, o que difere de plano, portanto, de mera colaboração. É pegar ou largar na relação de emprego.
O colaborador não está sujeito portanto à falta disciplinar na relação de emprego, pois sua relação a rigor, não seria de emprego, por vergonha da terminologia jurídica, mais ampla que a terminologia léxica.
Confundem os apedeutas da expressão colaborador, muito utilizada no serviço público do Estado do Rio de Janeiro, com a liberdade contratual. Nela há formação bilateral de vontade e na colaboração há formação de vontade sem subordinação porque o arquétipo da lógica não jurídica é de natureza não obrigatoriamente subordinada .
Por isto há que se retroceder no tempo. As relaçoes humanas não eram apenas sociais , mas comerciais e precisavam ser remuneradas e se subdividiram em “locatio conductio rei (arrendamento da coisa – uma verdadeira forma de colaborador), e “locatio conductio operis (aqui a locação e da mão de obrra, origem da expressão obreiro) e por último locatio conductio operaum, na nossa moderna concepção.
Vemos aqui que há três tipos de labor. E que cada um deles tem aspectos próprios, históricos, que indicam a existência de trabalho subordinado, sinalagmático e comutativo.
Na atuação de voluntariado temos obrigatoriamente os colaboradores, que comparecem em hospitais, em casas de saúde, em asilos, por exemplo e contribuem de forma voluntária para o serviço. Essa seria a expressão adequada para o emprego léxico de voluntariado. Ou colaborador.
Note-se ainda, que durante a idade média colhemos a existência de tipos de trabalho separados em aprendiz, companheiro e mestre, sendo aqui enlaçados com outra modalidade, dos “servos da gleba”. Esta forma veio a ser suprimida pela LEI CHAPELIER, que as revogou, na revolução francesa, tanto quanto a Constituição Federal de 1891, a primeira , republicana, também revogou tais formas de associação.
Coube a Robert Owen,na Nova Escócia, ser o pai do direito do trabalho durante a revolução industrial, estabeleceu limite de trabalho para menores, até 10 anos, limite de jornada de trabalho, caixa de previdência para a velhice e assistência médica.
Ao Brasil coube ser o pai do trabalhismo brasileiro ao saudoso GETULIO VARGAS, cuja origem da CLT como diploma legal consolidado com a inserção de diversos direitos há que se reconhecer como dádiva histórica.
Logo, a expressão “colaboradores” é expressão que etmologicamente, se tomada tão somente pela língua portuguesa pode ser compreendida como coautoria, como participação os resultados, mas nas relações trabalhistas, existem denominações mais amplas e que asseguram o gozo de direitos estabelecidos até como cláusulas pétreas no artigo 7º da Constituição Federal.
Há ainda, que se distinguir o trabalho de equipe com o trabalho de colaboração pois no trabalho há vínculo e no de colaoração este não é de forma alguma obrigatório, data máxima vênia.
“Contrato de equipe ou plurimo é aquele que firmado com um grupo de empregados, que se reúnem espontaneamente para a realização de um serviço comum e afim, sendo que o trabalho só se efetiva mediante os esforços de todos os membros da equipe.” Na verdade caracteriza-se por um feixe de contratos individuais”, como define Délio Maranhão. Esse tipo de contrato de trabalho é formado por contratos de trabalho individuais autônomos e independentes, cada qual anotado na CTPS de cada membro pois o grupo não tem personalidade jurídica.”
(pag. 520. , VÓLIA BONFIM, DIREITO DO TRABALHO, 11ª. Edição – Editora Método).
Com o implemento da reforma trabalhista e prevalência do legislado sobre o negociado (artigo 611-A),mais uma vez, a teoria mista das relações de trabalho se comprova.
Alguns princípios do direito do trabalho ,assegurados pelos artigos 9 e 468 da CLT, asseguram que é nula toda cláusula ou condição de trabalho , que afete direitos adquiridos dos empregados.
Sendo assim,indispensável, à empresa e a toda relação de trabalho que esta seja inicialmente definida quanto à sua basilar característica, se cuida de uma relação de emprego ou de relação de colaboração.
Na relação de emprego o vínculo é subordinado,na colaboração não há tal exigência, como se depreende das disposições dos artigo2 e 3 da CLT,verbis:
Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.
§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
§ 3º Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.
Denominar de “colaborador “ o empregado, ao contrário do que se imagina , importa em retrocesso social, porque não há nenhuma forma de distinção na relação de emprego. Logo é paradoxo, vez que havendo relação de emprego não há relação sem ser de emprego.
A irrenunciabilidade na relação de emprego, a irredutibilidade salarial, a proibição de retrocesso social e a proteção da dignidade do trabalhador são motivos suficientes para que rejeite a expressão não acadêmica de colaborador no lugar de empregado e empregador.
A relação de emprego é uma história de conquistas
Portanto, de plano, rejeita-se a tipologia de tratamento que muito mais se assemelha a um regime de trabalho no qual nem mesmo se reconhece a existência de um diploma legal, no caso, ou a CLT ou o estatuto do servidor público, revelando-se assim, um retrocesso às normas protetivas do direito do trabalho.
Estes são os esclarecimentos que são devidos com relação àqueles que pretendem passar borracha na história das conquistas do trabalhador na humanidade.
A colaboração é apenas um dos atributos da relação de emprego, pois nem todo colaborador é empregado e nem todo empregado é um colaborador pois até mesmo etmologicamente, fere conceitos de liberdade profissional do bom empregado, que deve sempre ressalvar o mau uso dessa característica frente a eventual desvio da lei.
Logo, se houver desvio da lei, com certeza não termos um colaborador.
Temos assim, que a expressão até implica num “capitis diminutio” na relação de emprego e na segurança jurídica das relações ético-profissionais, importando em educado retrocesso social nas relaçoes de emprego.
Como extraímos aqui , por diversidade de raciocínio e de argumentos jurídicos, temos que a expressão “colaborador’ não atende em síntese à lei e consiste em forma anômala de se legislar, de se criar norma jurídica contrariando a própria norma que foi interpretada, antes de ser criada. E é claro , depois de sua criação é objeto de análise frente a institutos diversos.
Nada mais infeliz juridicamente, que a expressão colaborador. Educada, gentil, mas juridicamente limitada.