É possível lavrar a Ata Notarial para Adjudicação Compulsória Extrajudicial em qualquer Tabelionato de Notas?

23/10/2023 às 17:23
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A ATA NOTARIAL é um importante meio de prova com base legal fincada no art. 384 do Código de Processo Civil de 2015. Ela pode ter uso tanto na esfera judicial quanto na esfera extrajudicial, e rotineiramente tem sido vista na mídia ilustrando diversos casos, principalmente sua utilização em casos envolvendo o aplicativo WHATSAPP em demandas que se discutem fatos ocorridos nos meios eletrônicos. De acordo com o artigo 384 do CPC, temos acerca da Ata Notarial que

"Art. 384. A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial".

Sobre o festejado meio de prova (que já tinha previsão também na Lei de Notários e Registradores, por exemplo - inciso III do art. 7º) esclarece o ilustre Professor e Ministro do STF, LUIZ FUX (Curso de Direito Processual Civil. 2022):

"Trata-se de MEIO PROBATÓRIO cuja utilização tem sido cada vez mais relevante - notadamente a partir de situações advindas do meio digital - na medida em que oportuniza, por exemplo, comprovação do conteúdo de sites, a documentação de conversas de WHATSAPP e a formalização das informações contidas em um E-MAIL, com dados de quem envia e recebe, IP do computador e data e horário do envio. Assim, a lavratura da ata notarial torna possível impedir que alguma informação deixe de ser documentada caso determinada foto, vídeo ou página da internet seja retirada do ar, por exemplo. Alia-se, assim, a FÉ PÚBLICA que o Cartorário detém com a FUGACIDADE de certos fatos, nos tempos correntes. Basta pensar em um post em rede social, que poderá ter seu conteúdo documentado pelo agente, resguardando o direito à sua prova em futuro processo, ainda que venha a ser excluído da respectiva mídia digital. Igualmente, poderá o Tabelião atestar imagens e sons em dispositivos eletrônicos, como áudios enviados por aplicativos de mensagens. Ao cabo, o fato será levado a juízo pela via documental".

Um grande problema em muitos casos tem sido o ALTO CUSTO DA ATA NOTARIAL. Aqui no Rio de Janeiro, com base nas regras apregoadas pela atual Portaria de Custas a ATA NOTARIAL pode ser cobrada na modalidade SEM CONTEÚDO ECONÔMICO e COM CONTEÚDO ECONÔMICO, sendo certo que, nesse último caso (que se aplica para os casos onde ela é obrigatória como na USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL e na ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA EXTRAJUDICIAL) elas observarão o valor do imóvel objeto do ato notarial, valendo nessas hipóteses inclusive a aplicação da regra da observação 20 que permite com que a base de cálculo seja o MAIOR VALOR que representará, naturalmente, o maior CUSTO para o ato. Enfim, custos elevados são sempre algo que acaba desestimulando a adoção da facultativa via extrajudicial e algo com o qual os operadores do Extrajudicial deveriam se preocupar com mais carinho e atenção.

De toda forma, um questionamento pertinente se faz presente especialmente depois da edição do PROVIMENTO CNJ 149/2023 que instituiu o "Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça - Foro Extrajudicial (CNN/ CN/CNJ-Extra)": posso lavrar a ATA NOTARIAL para fins de Adjudicação Compulsória em qualquer Cartório de Notas?

A resposta é POSITIVA mas com ressalvas. Segundo a regra estabelecida pelo artigo 440-F do referido CNN editado pelo CNJ, caso haja necessidade de diligências ao local do imóvel (ou seja, nem sempre será necessário, especialmente tendo em vista a natureza do procedimento de Adjudicação Compulsória Extrajudicial que é bem diferente da Usucapião Extrajudicial), será preciso então que seja lavrada pelo Tabelião da região do imóvel:

"Art. 440-F. A ata notarial (inciso III do § 1º do art. 216-B da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973) será lavrada por tabelião de notas de ESCOLHA DO REQUERENTE, salvo se envolver diligências no local do imóvel, respeitados os critérios postos nos arts. 8º e 9º da Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994, e observadas, no caso de ata notarial eletrônica, as regras de competência territorial de que trata este Código Nacional de Normas".

No procedimento de Adjudicação Compulsória Extrajudicial a produção probatória não deve visar a comprovação/atestação da POSSE, como acontece na Usucapião. Por tal razão, não se mostra necessário a rigor que haja diligência ao local do imóvel. Bastará na verdade a "justificação" perante o Tabelião ou seu preposto dos requisitos exigidos para a Adjudicação Compulsória e, como sabemos bem, nenhum deles é a POSSE DO IMÓVEL, como acontece na Usucapião.

Para os que não estão ainda familiarizados com o Extrajudicial - principalmente aqui no Rio de Janeiro - é necessário destacar que a lavratura de qualquer ato notarial fora da sede do Cartório (ou seja, com diligência) importa em oneração ainda maior do ato, conforme destacam as observações seguintes:

12ª) Nos atos sem valor declarado, lavrados fora do horário normal ou fora do tabelionato, os emolumentos serão cobrados em dobro, fazendo o tabelião circunstanciada menção na escritura, sem prejuízo do reembolso das despesas com condução.

12.1) Nos atos com valor declarado, lavrados fora do horário normal ou fora do tabelionato, os emolumentos serão acrescidos, no ano de 2023, do valor de R$ 264,75 (duzentos e sessenta e quatro reais e setenta e cinco centavos), sem prejuízo dos valores necessários ao transporte.

12.2) Nos atos extraprotocolares realizados em diligência, o valor dos emolumentos será acrescido das despesas de locomoção".

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Ousamos inclusive sugerir o enfrentamento e o questionamento (e se for o caso inclusive requerer a suscitação de dúvida com base no art. 198 da LRP) para as hipóteses onde o ilustre Tabelião exigir a DILIGÊNCIA ao local do imóvel, já que isso não é o que se deve buscar na Ata Notarial para a Adjudicação Compulsória, inclusive como reforça a doutrina especializada (ARNALDO MARTMITT. Adjudicação Compulsória. 1995):

"Prova-se a existência do contrato de promessa de compra e venda com a exibição do próprio instrumento, que necessariamente há de ser inserido nos autos. Os demais requisitos e pressupostos, como a realização do registro, o pagamento integral do preço, inexistência de contraprestação, a injustificada recusa em outorgar a Escritura, e outros, podem ser positivados por todos os meios permitidos por Lei. Para obter êxito em sua pretensão, o proponente da causa deverá incumbir-se da produção de outras provas, que em resumo assim podem ser elencadas:

a) que é credor de obrigação prometida pelo demandado, e consistente na outorga de escritura definitiva de imóvel, objeto da transação entre eles estabelecida;

b) que de sua parte inexiste contraprestação exigível, porque já adimpliu todas elas, ou porque o devam ser concomitantemente com a outorga da escritura, ou posteriormente a ela, após feito o registro no cartório competente, ou em outra oportunidade;

c) que o contrato não prevê cláusula de arrependimento, ou, existente ela, o réu não pode mais exercer seu direito, pelo fato de já ter sido pago inteiramente;

d) que o crédito do postulante advém de promessa de compra e venda devidamente registrada, geradora de direito real 'erga omnes'. Entre estes terceiros inclui-se o demandado, sendo-lhe imposto o dever de entregar a propriedade adquirida;

e) que o demandado, embora tendo recebido todo o pagamento, recusa-se de modo injustificado a outorgar a escritura de compra do imóvel objeto da promessa celebrada entre ambos".

Ademais, como deixa claro a norma do CNJ, sendo o caso de Ata Notarial lavrada exclusivamente de forma ELETRÔNICA como autoriza do CNN CNJ (já que hoje em dia os atos notariais como Escrituras, Procurações e também as Atas Notariais podem ser feitos ainda tanto no formato tradicional presencialmente na Serventia, em PAPEL quanto no formato ELETRÔNICO, remotamente) deverão ser observadas as regras de COMPETÊNCIA de que trata o art. 302 do referido CNN e, se a opção for pela lavratura no formato tradicional, presencial, o Tabelião ainda que da escolha das partes não poderá violar o disposto na sua Lei Orgânica, sob pena de NULIDADE do ato, como reconhece por exemplo a jurisprudência paulista:

" TJSP. 0004731-30.2015.8.26.0417. J. em: 28/10/2021. RESPONSABILIDADE CIVIL – TABELIONATO – AÇÃO MOVIDA EM FACE DO CARTÓRIO – INEXISTÊNCIA DE PERSONALIDADE JURÍDICA – PRECEDENTES DO S.T.J. – EXTINÇÃO MANTIDA. ESCRITURAS PÚBLICAS DE PROCURAÇÃO E DOAÇÃO – COLHEITA DA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE POR PARTE DO TABELIÃO EM MUNICÍPIO DIVERSO DE SUA ATRIBUIÇÃO – INVALIDADE – VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 9º DA LEI Nº 8935/94 E ART. 215 DO C.C. – INVALIDADE DECRETADA – DANO MORAL NÃO RECONHECIDO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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