Considerando que a nova economia se baseia no uso dos dados para monetização, e que parte desses nossos dados são adquiridos sem que você ao menos saiba, e que muitas empresas hoje ganham com o uso dos seus dados, sem que você receba um só centavo, está mais do que na hora de você saber esse valor. Logo você pode estar se perguntando, qual o valor dos seus dados? Quanto vale saber tudo que você faz diariamente? E se tivéssemos códigos de barra em nosso corpo, ou chips implantados comunicando tudo que fazemos, em plena estratégia de rastreio? Onde vamos? O que comemos? O que gostamos? De quem gostamos? Bem a maioria dessas informações nós já repassamos de forma gratuita, e sem perceber, e claro totalmente de graça.
Tente imaginar diariamente quando você caminha com o seu celular, ele segue procurando sinais de wi-fi, e com isso vai registrando seu trajeto com a identificação do seu IP, exato inúmeras empresas sabem diariamente por onde você anda, por quanto tempo fica e com que rotina, tudo isso sem ter lhe pedido, tudo pelo simples fato da configuração do seu celular e devido aos inúmeros convênios comerciais estabelecidos entre operadoras e empresas que distribuem “gratuitamente “o sinal de wi-fi e onde algum dia você já se cadastrou.
Com tantos dados fornecidos sem que você ao menos saiba, como podemos cobrar por isso, e se a legislação nos garantisse o Direito de vender esses dados?
Nos próximos dias o Congresso vai analisar projeto de lei complementar que cria um mercado de informações pessoais dos cidadãos, que poderão vender esses dados para empresas e, em troca, obter benefícios econômicos, como descontos em produtos ou remuneração.
Inicialmente com o infeliz nome de “Lei Geral de Empoderamento de Dados, o projeto quer permitir que indivíduos tenham propriedade sobre seus dados e possam “monetizá-los” por meio, claro de plataformas intermediadoras.
No corpo da justificativa do projeto, se exemplifica a necessidade do mesmo, na hipótese de usuários que poderão vender informações como histórico de navegação e de compra na internet para empresas do “setor financeiro, de previdência complementar, seguros privados, saúde suplementar, comércio eletrônico, transporte aéreo, varejo em geral”.
Dessa maneira, se aprovada, o novo diploma normativo acabaria com o modelo atual, em que a titularidade dos dados dos usuários fica sob posse das empresas que cuidam do armazenamento e tratamento deles.
Logo imagine que companhias como Microsoft, Google, Amazon e Meta, por exemplo, não teriam mais o controle dessas informações, que poderiam ser repassadas apenas de acordo com a vontade do usuário.
O projeto se inspira no “open finance” (sistema aberto financeiro), projeto do Banco Central (BC) para garantir a transferência de dados bancários de usuários entre instituições financeiras. Em vigor no País desde 2022, os clientes devem autorizar a transferência dessas informações, respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
A Lei Geral de Empoderamento de Dados pretende ir além do open finance, pois ela pretende regular não só as instituições financeiras, mas varejistas, marketplaces, plataformas e aplicativos coletores de dados, de modo geral. Ainda segundo o projeto, quem deve definir a autoridade reguladora é o Poder Executivo, não parece claro que já temos a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), bastando apenas ampliar suas competências?
O projeto prevê a criação de “carteiras digitais”, ou “poupança de dados”, para que os cidadãos possam administrar essas informações em um mercado digital. Com isso, empresas intermediárias administradoras dessas carteiras podem atuar como plataformas, nas quais os dados são guardados e vendidos.
Curiosamente, em seu texto, a Lei Geral de Empoderamento de Dados cita que a intermediação pode ser feita pela startup DrumWave, fundada pelo brasileiro André Vellozo na Califórnia, nos Estados Unidos. Atualmente, o presidente é Fernando Teles, que teve passagem pela Visa e Itaú. Esse é um ponto no mínimo polêmico.
Lembro que no último mês de junho, a empresa apresentou ao mercado a carteira digital dWallet, cujo aplicativo permite reunir, certificar e precificar as informações de usuários tiradas das empresas parceiras da startup.
Ainda segundo os cálculos da DrumWave, cada titular de dados pode obter uma remuneração média de US$ 50 mensais, com possibilidade de aumento com o tempo. No total, a companhia estima que esse mercado pode valer até US$ 1,8 trilhão.
QUESTIONAMENTOS. Especialistas do ramo de privacidade e dados pessoais ouvidos pelo Estadão questionam a proposta. “Esse projeto é um maremoto no que entendemos como privacidade de dados”, afirma o advogado e diretor da organização sem fins lucrativos Data Privacy Brasil, Rafael Zanatta. “É uma contestação do modelo vigente dos últimos anos.”
O projeto é bastante polêmico, pois subverte a lógica atual, em que o direito à privacidade é inalienável e, portanto, não pode ser comercializado, isso é claro em uma interpretação bastante restritiva, pois se o titular autoriza que seus dados virem um produto para comercialização qual seria o impedimento, uma vez que os dados pertencem ao cidadão?
A legislação atual entende os dados pessoais como direito inalienável de um ser humano, o que impediria que essas informações sejam
Scott McNealy, fundador da Sun Microsystems, fabricante de computadores pessoais e semicondutores e software no Vale do Silício nos anos 1980 e 1990, em recente entrevista foi categórico: “Você não tem privacidade. Supere”. “As companhias se tornaram tão grandes que influenciam o dia a dia das pessoas”, para ele há “excesso de poder” para poucas empresas no mercado de tecnologia.
Se toda essa informação faz parte dos nossos bens digitais de que forma podemos faturar sobre isso?
A consolidação e unificação dessa base de dados para o controle do cidadão deve ser o primeiro passo, junto com o registro de movimentação de nossos dados. Quem fala de você e trata seus dados nesse instante?
Vejamos no setor público onde o progresso nessa área é sempre positivo, uma vez que o acesso às informações do setor público é um elemento valioso de apoio ao tráfego comercial e, com ele, ao crescimento econômico. O reaproveitamento dos dados tratados pela Administração contribui, sem dúvida, para melhorar o funcionamento do mercado, disponibilizando à iniciativa privada uma ferramenta de grande valor para identificar, antecipadamente, as tendências e necessidades do momento e, assim, poder cobri-los de forma ágil e eficiente. De fato, o acesso a esses dados permite que os operadores econômicos façam um diagnóstico precoce e mais preciso da situação nos setores e mercados em que atuam em tempo real. Isso facilita a tomada de decisão com base em informações atualizadas o mais completas possível, o que, por sua vez, contribui para uma alocação eficiente de recursos e resulta em uma melhor oferta de produtos e serviços ao público em geral, porém respeitando a sua privacidade e estabelecendo uma via de duas mãos entre quem trata e quem é o dono dos dados.
Nesse sentido, as mudanças introduzidas pelas novas regulamentações são, um bom início uma vez que parte delas , resultam em facilitar o acesso em tempo real aos dados dinâmicos tratados pela Administração, por meio de meios técnicos adequados, e na especificação e desenvolvimento dos dados aos quais esse acesso deve ser permitido.
É evidente que quando necessário, os órgãos do setor público devem fornecer dados por meios eletrônicos, em formatos abertos, legíveis, acessíveis, fáceis de localizar e reutilizáveis juntamente com seus metadados. Além dessas notáveis melhorias nas condições de reutilização das informações da Administração, amplia-se o catálogo de valiosos dados públicos para reutilização, inclusive como novidade para as empresas públicas. E especifica-se a definição daqueles considerados como “dados de alto valor”, que está vinculado à sua capacidade de gerar benefícios socioeconômicos e favorecer um grande número de usuários, com especial atenção às OMS, uma herança desses tempos pandêmicos
Sem dúvida, essas novidades representam melhorias muito relevantes na matéria, uma vez que proporcionam concretude e um quadro de ação prática ajustado à realidade atual, elementos essenciais para que o reaproveitamento de dados do setor público possa, efetivamente, agregar valor à sociedade.
No entanto quem trata e por qual razão? Quando você é comunicado desse tratamento e de que forma e constância?
Obviamente, nem todas as informações mantidas por esses órgãos podem ser compartilhadas, mas não é compreendida, em nossa opinião, uma restrição geral, sem exceções ou nuances. Não contestamos a natureza reservada (e, portanto, não suscetíveis ao acesso) dos dados próprios pessoais dos indivíduos que essas administrações possuem em sua posse para o exercício de sua função de coleta. No entanto, entendemos que, por exemplo, os dados brutos – ou, caso contrário, com o maior nível possível de desagregação – que sejam obtidos como resultado dos acordos periódicos de impostos e contribuições feitas pelas empresas espanholas devem ser acessíveis.
Esse tipo de dados representa o conceito de dados dinâmicos (devido à sua atualização periódica) e de alto valor, e sua reutilização teria um impacto positivo indubitável no tecido empresarial.
A possibilidade de acesso a essas informações, com adequadas salvaguardas de confidencialidade e proteção de dados, estaria em conformidade com as normas propostas pela diretiva, e contribuiria para o desenvolvimento de nossa economia.
Mas em que pese a importância desse compartilhamento para maior eficiência, Quantas empresas já lhe perguntaram se você quer vender seus dados? Quanto dos seus dados produzidos em cookies e em formulários foram coletados e revendidos sem que você recebesse absolutamente nada por isso?
Como usuários, o que devemos fazer é simplesmente usar um dedo: tanto para clicar e negar a essas empresas a possibilidade de nos seguir e nos espionar, e para enfrentá-los e explicar-lhes o que pensamos de seus abusos.
O uso dos dados e a quebra da nossa privacidade, lança um novo desafio aos padrões éticos, o qual as ferramentas jurídicas da LGPD e o RGPD na Europa, tentam estabelecer limites, aliados as ações indenizatórias.
Vivemos em um mundo onde os padrões éticos das empresas caíram bem abaixo dos mínimos razoáveis e é preciso refundar esses padrões subindo a régua de corte, pois o lucro não pode servir de justificativa para tudo. Um ambiente sem marcos regulatórios claros, criado pelas próprias empresas em que a mitigação de ser construído praticamente em tempo real, poderia existir como resultado de sua própria atividade, mas em que a irresponsabilidade de muitas dessas empresas está sendo completamente brutal e selvagem.
Um mundo em que os usuários têm mais controle sobre o que as empresas sabem sobre eles, sobre se seus movimentos e interesses são espionados a cada momento, é decididamente um mundo melhor.