Apenas o vazamento de dados pessoais gera direito à indenização?

18/11/2023 às 17:26
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Quando ocorre algo tão grandemente grave a alguém, de maneira que a lesão moral é clara e inquestionável, chamamos a isso, no juridiquês, de dano moral "in re ipsa".

Ou seja, associamos a isso quando se dispensa a prova do prejuízo pelo ofendido ou mesmo a comprovação da culpa pelo ofensor, sendo suficiente a simples demonstração de que o fato aconteceu e que ocasionou o resultado grave à vítima.

Esse tema é relevante e muito debatido pelos tribunais. Por quê? Porque, nesses casos, o dano moral será automaticamente presumido, gerando o dever de o ofensor indenizar a vítima, sem qualquer necessidade de produção de provas sobre os prejuízos sofridos.

Então, nasce a pergunta: isso ocorre no âmbito da proteção dos dados pessoais? Não. Ou seja, aqui, o simples vazamento de dados não gerará a obrigação de indenizar o titular desses dados. Apesar de se tratar de uma situação de muito desconforto, o vazamento, por si, não é capaz de gerar indenização automática. Para existir a obrigação de indenizar, deverá ocorrer a prova de que o vazamento dos dados pessoais gerou, de fato, prejuízos morais e/ou materiais, financeiros, danos à imagem, à honra do titular desses dados etc.

Por exemplo, quando ocorre a calúnia, a difamação ou a negativação do nome diante de instituições de crédito, é desnecessária a produção de provas do dano, porque é evidente que o prejuízo aconteceu para a vítima. Nessas situações, presumem-se os danos, e o ônus da prova ficará invertido, ou seja, em vez de a vítima ter que provar qualquer prejuízo, ao ofensor cairá o dever de provar a não ocorrência ou a existência de circunstâncias que justifiquem a sua conduta.  

Por exemplo, em São Bernardo do Campo, julgou-se procedente o pedido para condenar a concessionária de energia elétrica a reparar os danos causados pelo vazamento dos dados pessoais do titular, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Entendeu-se que a ré tinha responsabilidade objetiva e que não havia indícios de prova de culpa exclusiva do titular dos dados no evento danoso. Fixou-se uma indenização de R$ 10.000,00, para tornar a LGPD eficaz.

Porém, insatisfeita com a decisão, a concessionária recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo que lhe deu ganho de causa. A justificativa baseou-se na observância de que o simples vazamento de dados pessoais básicos não representa automaticamente dano moral. Ou seja, se fosse o caso de provas de um real prejuízo de ordem moral, por exemplo, a concessionária teria saído perdedora.

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Por fim, consideramos que a postura adotada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo se mostrou prudente e adequada, já que contribui para evitar uma expansão indiscriminada de casos de divulgação não autorizada de informações pessoais, sem, entretanto, prejudicar a integridade pessoal e material do titular pelo incidente de segurança. E, para reforçar, esse é também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, isto é, entende esta corte que, apesar de ser uma falha indesejável, o vazamento de dados não tem a capacidade de, por si só, gerar dano moral indenizável. Dessa maneira, em eventual pedido de indenização, faz-se necessária a prova do efetivo prejuízo ocasionado pela exposição dessas informações. Vemos, assim, um empenho do Judiciário em equilibrar a aplicabilidade da LGPD com um controle de ações desarrazoadas.

Sobre a autora
Juliana Vasconcelos de Castro

Possui mestrado e especialização em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa onde atualmente estuda doutoramento em Direito Privado Romano. Membro da Associação Nacional de Advogados de Direito Digital, onde atua em grupos de trabalho em startups, healthtechs e relações de trabalho digital. Sócia-fundadora do Juliana Vasconcelos Advogados, nas áreas de Direito Digital e de Startups. Compliance officer. Palestrante, docente e autora de e-books e de livros jurídicos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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