Este artigo aborda a complexa questão no âmbito do Direito de Família sobre se o pagamento parcial da obrigação alimentar é suficiente para afastar a possibilidade de prisão civil. Exploraremos essa indagação à luz do conceito de adimplemento substancial, analisando sua aplicação específica nas relações familiares.
Introdução
No âmbito do Direito de Família, a obrigação alimentar representa uma das questões mais sensíveis e cruciais, visando assegurar o sustento e o bem-estar dos dependentes. Contudo, surge uma indagação relevante: o pagamento parcial da obrigação alimentar afasta a possibilidade de prisão civil? Este artigo se propõe a analisar esse questionamento, explorando o conceito de adimplemento substancial e sua aplicação no Direito de Família.
O que significa Adimplemento Substancial?
O adimplemento substancial refere-se ao cumprimento significativo ou substancial de uma obrigação contratual, onde a parte devedora executa uma parte expressiva do que foi acordado, mesmo que não tenha cumprido integralmente o contrato. Em outras palavras, o adimplemento substancial ocorre quando a inexecução de uma pequena parte do contrato não é tão relevante a ponto de justificar a rescisão do acordo ou a aplicação de penalidades.
Esse conceito está associado aos princípios da boa-fé e da função social do contrato. A ideia é evitar que uma parte possa se beneficiar da rescisão contratual por motivos mínimos, quando a essência do acordo já foi cumprida. Isso promove a justiça contratual, levando em consideração não apenas as estritas formalidades do contrato, mas também o cumprimento efetivo das obrigações pactuadas.
O adimplemento substancial é frequentemente discutido em contextos contratuais, mas sua aplicação pode variar dependendo da jurisdição e do tipo de contrato. Em alguns sistemas jurídicos, existem dispositivos legais específicos que regulam ou reconhecem o adimplemento substancial, enquanto em outros, o princípio pode ser interpretado e aplicado pelos tribunais com base nos princípios gerais do direito contratual.
Nesse contexto, o Enunciado 361 da IV Jornada de Direito Civil destaca que o adimplemento substancial decorre dos princípios gerais contratuais, priorizando a função social do contrato e a boa-fé objetiva. Essa perspectiva implica na análise da importância da parcela inadimplida em relação à totalidade da obrigação.
O adimplemento substancial pode ser aplicado ao Direito de Família, ou seja, caso a maior parte do débito seja paga isso será suficiente para ilidir a prisão civil?
Como visto, a teoria do adimplemento substancial é perfeitamente aplicável ao direito contratual. No entanto, sua aplicação no âmbito das relações familiares é controversa.
Isso porque, o Superior Tribunal de Justiça entende que a teoria do adimplemento substancial, possui aplicação estrita no direito contratual, razão pela qual não é aplicável de forma direta nas obrigações alimentares, especialmente quando se trata de vínculos familiares, de modo que o pagamento parcial da obrigação alimentar, mesmo que atinja um percentual significativo, não afasta a possibilidade de prisão civil. Confira:
“HABEAS CORPUS. DIREITO DE FAMÍLIA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. NÃO INCIDÊNCIA. DÉBITO ALIMENTAR INCONTROVERSO. SÚMULA N. 309/STJ. PRISÃO CIVIL. 12 LEGITIMIDADE. PAGAMENTO PARCIAL DA DÍVIDA. REVOGAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. NÃO CABIMENTO. IRRELEVÂNCIA DO DÉBITO. EXAME NA VIA ESTREITA DO WRIT. IMPOSSIBILIDADE. 1. A Teoria do Adimplemento Substancial, de aplicação estrita no âmbito do direito contratual, somente nas hipóteses em que a parcela inadimplida revela-se de escassa importância, não tem incidência nos vínculos jurídicos familiares, revelando-se inadequada para solver controvérsias relacionadas a obrigações de natureza alimentar. 2. O pagamento parcial da obrigação alimentar não afasta a possibilidade da prisão civil. Precedentes. 3. O sistema jurídico tem mecanismos por meio dos quais o devedor pode justificar o eventual inadimplemento parcial da obrigação (CPC/2015, art. 528) e, outrossim, pleitear a revisão do valor da prestação alimentar (L. 5.478/1968, art. 15; CC/2002, art. 1.699). 4. A ação de Habeas Corpus não é a seara adequada para aferir a relevância do débito alimentar parcialmente adimplido, o que só pode ser realizado a partir de uma profunda incursão em elementos de prova, ou ainda demandando dilação probatória, procedimentos incompatíveis com a via estreita do remédio constitucional. 5. Ordem denegada.” (STJ, HC 439.973/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. para Acórdão Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, julgado em 16/08/2018, DJe 04/09/2018).
Como se vê, o tribunal ressalta que o sistema jurídico oferece mecanismos para o devedor justificar o inadimplemento parcial, como previsto no CPC/2015 (art. 528), e possibilita a revisão do valor da prestação alimentar conforme a Lei 5.478/1968 (art. 15) e o Código Civil de 2002 (art. 1.699). Assim, mister concluir que o pagamento parcial não é suficiente para evitar as sanções da prisão civil.
Conclusão
Ante exposto, o adimplemento substancial, embora tenha relevância no contexto contratual, não possui o mesmo peso nas obrigações alimentares no Direito de Família. A jurisprudência reforça que o pagamento parcial não é suficiente para afastar a possibilidade de prisão civil, mantendo a necessidade de uma análise casuística que considere o princípio do melhor interesse da criança ou do alimentado.
Referências:
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“prisão civil?”, “Brasília - DF” “advogado família”. “alimento”. Disponível em: https://advocaciablima.jusbrasil.com.br/?_gl=1*1xakotv*_ga*MTQ1NDkxMjg2MS4xNjkyMzk4OTcx*_ga_QCSXBQ8XPZ*MTcwMDQwNzc4Mi40MS4xLjE3MDA0MDk5MDAuNjAuMC4w. Acesso em: 19/11/2023.
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