Nossa Igreja funciona há muitos anos mas não temos registro. É possível obter o registro no Cartório mesmo nessas condições?

20/11/2023 às 18:03
Leia nesta página:

A REGULARIZAÇÃO das pessoas jurídicas de direito privado (art. 44 do Código Civil de 2002: Associações, Sociedades, Fundações, ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS e Partidos Políticos) exige o REGISTRO no Cartório do RCPJ do local de sua sede (art. 45, CC). No momento atual de avanço das Centrais Eletrônicas de Registros Públicos e convênios dos RCPJ do Brasil é possível inclusive que imediatamente ao registro seja feito diretamente na Serventia Extrajudicial a realização do Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas (CNPJ) fazendo com que o interessado economize TEMPO e dinheiro.

Como costuma ser muito comum no "mundo real" as Associações e Organizações Religiosas podem na prática começar suas atividades sem a imediata regularização registral e cadastral nos Cartórios, Receita Federal e demais órgãos. É natural - porém é preciso compreender que a regularização junto aos órgãos estabelecidos é necessária e importante para o correto proceder dessas entidades (inclusive afastar eventual responsabilização pessoal dos seus dirigentes), principalmente no caso das ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS (como inclusive prevê a Bíblia em passagem conhecida que determina a obediência às leis estabelecidas). Nesse sentido, ainda que o início das atividades já tenha ocorrido há algum tempo (anos, inclusive) estando à margem da legalidade registral, sempre será possível a REGULARIZAÇÃO em prestígio inclusive ao "PRINCÍPIO DO ACESSO AO REGISTRO" como ensina o mestre SERPA LOPES (Tratado dos Registros Públicos. 1955) em lição voltada ao Registro de Imóveis mas que se amolda com perfeição também ao REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS:

"Um princípio devem todos ter em vista, quer Oficial de Registro, quer o próprio Juiz: em matéria de Registro de Imóveis toda a interpretação deve tender para FACILITAR e não para dificultar o ACESSO dos títulos ao Registro, de modo que toda propriedade imobiliária, e todos os direitos sobre ela recaídos fiquem sob o amparo do regime do Registro Imobiliário e participem dos seus benefícios”.

No sofisticado e elogiado CÓDIGO DE NORMAS EXTRAJUDICIAIS do Rio de Janeiro (Provimento CGJ/RJ 87/2022) vemos com clareza a incorporação do referido princípio no artigo 1.092 que - repisamos - tem plena aplicação também a todos os demais REGISTROS PÚBLICOS e não só o Registro de imóveis:

"Art. 1.092. No âmbito dos serviços de registro de imóveis, a interpretação e o agir do oficial devem considerar a importância do acesso dos títulos ao registro buscando assegurar que toda propriedade imobiliária, e todos os direitos que sobre ela recaiam, fiquem sob o amparo do regime registral imobiliário e participem dos seus benefícios".

EFETIVAMENTE no caso concreto, quando ficar apurada pela DATA da documentação apresentada que a entidade teve sua fundação há tempo suficiente que já exija a realização de Assembleias de Eleição e Posse e a consequente apresentação, por exemplo, de ATAS DE ELEIÇÃO E POSSE (em virtude dos tempos de mandato já decorridos ou mesmo substituição extemporânea de membros) fica claro que juntamente com a documentação que busque a regularização inicial deverão ser apresentadas as referidas Atas para arquivamento (e realizados os necessários recolhimentos de emolumentos, um a um), já que as regras do Estatuto aprovado por certo deverão ser observadas já que fazem lei entre os associados e, em sede de exame de qualificação, deverão ser exigidas pelo Oficial Registrador, como aponta com acerto a decisão do Egrégio Conselho da Magistratura do TJRJ:

" TJRJ. Proc. 0000563-87.2015.8.19.0058. J. em: 21/10/2021. CONSELHO DA MAGISTRATURA. REMESSA NECESSÁRIA. DÚVIDA SUSCITADA PELO OFICIAL DO OFÍCIO ÚNICO DA COMARCA DE SAQUAREMA/RJ. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE ATA DA ASSEMBLÉIA GERAL DA ASSOCIAÇÃO PORTO DA ROÇA FUTEBOL, REALIZADA EM 20/12/2013. NEGATIVA DE REGISTRO SOB O FUNDAMENTO DA NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DE TODOS OS TÍTULOS ANTERIORES PREVISTOS EM LEI E NO ESTATUTO, BEM COMO ADEQUAR O ESTATUTO AO CÓDIGO CIVIL EM VIGOR. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA DÚVIDA. REMESSA DOS AUTOS AO CONSELHO DA MAGISTRATURA. ARTIGO 48,§ 2º DA LODJ. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE REGISTRAL. NECESSIDADE DE REGISTRO DOS TÍTULOS ANTECEDENTES. IMPERIOSA NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO DO ESTATUTO AO CÓDIGO CIVIL EM VIGOR. EXPRESSA DISPOSIÇÃO LEGAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 54, 59 E 2.031 DO CÓDIGO CIVIL. SEGURANÇA JURÍDICA QUE SE VISA PRESERVAR".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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