Minha escritura foi registrada com erro no Cartório do RGI. E agora? Como resolver? Quais são meus direitos?

11/12/2023 às 16:19
Leia nesta página:

RETIFICAÇÃO DE REGISTRO é um assunto usual em sede de direito notarial e registral, assim como no direito imobiliário. Como acontece com diversas outras atividades/ramos, nas atividades notariais e registrais a regra será o acerto, a perfeição; tudo que é produdizo no âmbito das atividades notariais e registrais é passível de erros naturalmente pois nela atuam pessoas; pessoas erram, por mais que a cada dia que passa a AUTOMATIZAÇÃO esteja muito mais presente em praticamente tudo. A regra é o acerto, o erro a exceção que foge ao padrão de excelência que esperamos todos dos Serviços Cartorários. Ainda assim, é importante saber que a Lei 6.015/73 sempre previu o modo de correção de erros, servindo o art. 212 que trata do RGI sendo importante ressalvar que qualquer registro público (e não só o RGI) pode ser corrigido:

"Art. 212. Se o registro ou a averbação for omissa, imprecisa ou não exprimir a verdade, a retificação será feita pelo Oficial do Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, por meio do procedimento administrativo previsto no art. 213, facultado ao interessado requerer a retificação por meio de procedimento judicial.

Parágrafo único. A opção pelo procedimento administrativo previsto no art. 213 não exclui a prestação jurisdicional, a requerimento da parte prejudicada".

A respeito do referido dispostivo comenta o ilustre professor e Advogado, Dr. WALTER CENEVIVA em sua indispensável obra ( Lei dos Registros Publicos Comentada. 2009):

"RETIFICAR, nos arts. 212 a 214, é a ação de averbar correção de assento que não exprimia, não exprime ou deixou de exprimir a realidade do bem imóvel ou do negócio jurídico que lhe corresponda, observadas as alternativas indicadas nos três dispositivos mencionados. A RETIFICABILIDADE é um dos elementos distintivos dos sistemas brasileiros e alemão do registro de imóveis, como também se vê na abertura do comentário do art. 214. A LRP dá efeitos subsistentes ao registro até que julgado o último dos recursos possíveis, oferecido em defesa de sua validade (art. 259), habilitando-o a repercutir plenamente na esfera do direito, enquanto não cancelado, ainda que por outra maneira se prove desfazimento, anulação, extinção ou rescisão do título (art. 252). Ao admitir RETIFICAÇÃO, a lei adota meio-termo compatível com a realidade brasileira (...). Não é viável entre nós a PRESUNÇÃO DE VALIDADE ABSOLUTA do assentamento imobiliário".

Não se pode deixar de pontuar que, como destaca com acerto o par. único do referido art. 212, a retificação pode se dar (em alguns casos, mas não todos) diretamente em Cartório sem necessidade de judicialização. Ainda assim, naqueles onde a correção pode se dar administrativamente, não pode ser negada à parte o direito de postular a correção na via judicial. Tudo deve ser ponderado com auxílio necessário do ADVOGADO ESPECIALISTA, pois, como se percebe, o registro público deve exprimir a verdade, deve ser preciso pois só assim conferirá a necessária SEGURANÇA JURÍDICA que a sociedade espera do sistema registral confiado a particulares (art. 236 da CRFB/88).

O procedimento extrajudicial de retificação (quando cabível a opção administrativa) não exige a presença de Advogado, embora seja de todo muito recomendável; diferentemente, a retificação postulada na via judicial exige a representação por Advogado, conforme regras do Estatuto da Advocacia (art. 1º, inc. I da Lei Federal 8.906/94).

Ainda acerca do extenso assunto retificação de atos notariais/registrais (que por óbvio não se esgota num breve ensaio e precisará ser sempre aprofundado, de acordo com as nuances de cada caso concreto) é preciso observar também no que diz respeito à cobrança de emolumentos que por força de Lei não deve ser feita quando o ato tiver que ser praticado em razão de erro atribuído aos Serviços Notariais ou de Registro. Reza a Lei 10.169/2000:

"Art. 3º. É vedado:

(...)

IV – cobrar emolumentos em decorrência da prática de ato de retificação ou que teve de ser refeito ou renovado em razão de erro imputável aos respectivos serviços notariais e de registro;"

Recentemente resolvemos questão interessante que dizia respeito à correção de ato registral (RGI) que foi feito incorretamente em decorrência de erro na Escritura lavrada junto ao Tabelionato de Notas: por conta de uma Escritura lavrada com erro, o cartório do RGI acabou realizando um ato registral equivocado. A declaração de vontade das partes contidas na Escritura estava viciada. Nesse caso, um erro que se deu por conta de outro. Para casos assim o recente Código de Normas aqui do Estado do Rio (par.4º do art. 1.376) já prevê regras que se aplicam com perfeição ao caso, dispensando nessa hipótese a necessidade de um Processo Judicial:

"§ 4º. Quando houver ERRO NO TÍTULO que originou o assento registral, primeiro se deve buscar a retificação naquele, para depois neste se promover a retificação, exceto quando se tratar de erro material evidente, quando então poderá o oficial, sob sua exclusiva responsabilidade, efetuar a retificação, à vista da documentação comprobatória".

O erro em questão não tratava de mero erro material evidente, mas sim erro na declaração de vontade. Nesses contextos a retificação da Escritura deve observar as mesmas formalidades (acrescidas, é claro, das formalidades que estiverem vigentes ao tempo da retificação já que sabemos, a todo momento as regras mudam), com o obrigatório comparecimento de todas as partes. Quando uma das partes já não puder comparecer (como acontece com o falecimento de alguma delas, por exemplo) a solução será judicial como aponta com precisão o mestre, Advogado Especialista e Desembargador Aposentado, Dr. NARCISO ORLANDI NETO (Registro de Imóveis. 2023):

"(...) E não se podem modificar declarações de vontade senão por seus emitentes. Em outras palavras, uma escritura só pode ser retificada por outra escritura, com o comparecimento das mesmas partes que, na primeira, manifestaram sua vontade e participaram do negócio jurídico que tiver sido instrumentalizado. (...) Se aquele que deve participar da escritura de retificação tiver falecido, cumprirá pedir ao juízo das sucessões que, ouvidos todos os interessados, autorize o inventariante (se houver inventário) ou outra pessoa a comparecer à escritura de retificação e, em nome do espólio, manifestar sua vontade para ratificar o negócio feito pelo 'de cujus' e retificar o erro que impediu o registro. Se a parte tiver desaparecido, ou se se recusar imotivadamente a comparecer à escritura de retirratificação, terá o interessado ação para suprir a falta do consentimento".

Ve-se, portanto, que de fato o registro deve sempre exprimir a verdade e, quando essa premissa não for cumprida, terá sempre lugar a retificação do registro público, sendo facultado aos interessados ainda que a hipótese seja de retificação administrativa (mais célere na grande maioria dos casos) optar pela via judicial ainda que essa certamente seja mais demorada, como confirma a acertada decisão do TJMG que cassou a sentença do Juiz de piso:

"TJMG. 10313130081943001. J. em: 27/05/2014. CIVIL - APELAÇÃO - RETIFICAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO - ART. 213, I, DA LEI N. 6.015/73 - INTERESSE DE AGIR -PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO - FACULDADE - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL - SENTENÇA CASSADA. 1 - A retificação de registro tem como objetivo precípuo a adequação da inscrição do imóvel na serventia competente às reais dimensões da propriedade. 2 - É cabível o ajuizamento de ação de retificação de registro de imóvel para a correção de erro na área constante no registro imobiliário (art. 212, da Lei n. 6.015/73). 3 - Nos termos do parágrafo único, do art. 212, da LRP,"a opção pelo procedimento administrativo previsto no art. 213 não exclui a prestação jurisdicional, a requerimento da parte prejudicada". Precedentes deste Tribunal. 4 - Sentença de extinção do processo, por ausência de interesse processual do autor, cassada. Recurso provido".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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