Breves considerações sobre a regulação de horários da propaganda volante pelos municípios

13/12/2023 às 12:16
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Resumo: Este artigo propõe fazer breves considerações acerca da regulamentação de horários de funcionamento das chamadas propagandas volantes tendo por referências as principais leis de referência no País que podem afetar a atividade.

Palavras chaves: limitação de horários; propaganda volante; perturbação ao sossego.

Abstract:This article proposes to make brief considerations about the regulation of opening hours of so-called flyer advertisements, taking as references the main reference laws in the country that may affect the activity.

Keywords: time limitations; flyer advertising; disturbance to the peace.

Abordagem geral

Na atividade de Procurador Municipal comumente inquirem sobre a possibilidade de edição de normas de caráter regulatório para melhor instruir a atuação fiscal. Sendo o trânsito uma das principais áreas de atuação do Poder Público Municipal, sobreveio necessidade de regular limitação de horários, locais e tráfego de veículos de propaganda volante, tendo em mente melhorar o bem estar da comunidade ante a perturbação que isso pode causar aos cidadãos.

Não é incomum que anúncios sejam precedidos de músicas ou temas que visem chamar a atenção do transeunte, donas de casa e trabalhadores para a mensagem comercial ou propagandas eleitorais. Volumes de som elevados podem exceder em muito os limites sonoros razoáveis aos ouvidos. A qualidade dos equipamentos também podem produzir ruídos imperceptíveis, mas que podem causar danos aos ouvidos de pessoas e animais. Tentar-se-á averiguar possível regulamentos suplementares para essas atividades.

Nos termos do art. 5º, inciso II, da Constituição, nenhum cidadão pode ser compelido a fazer ou deixar de fazer nada se não em virtude de lei. O princípio da legalidade é a tônica do Estado Democrático de Direito no qual os cidadãos e o próprio Estado estão submissos à vontade da lei editada de forma participativa no sistema representativo da democracia cuja estrutura é em certa medida “liberal” [1].

Mesmo assim, é razoável compreender que esta liberdade para atividades em geral está sujeita a regulação, fiscalização e fomento do Estado como comando de uma ordem econômica sujeita à intervenção estatal (na inteligência do art. 174, CF)

O poder estatal de regulamentar leis foi apreciado pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 1.435-8 apontando quatro requisitos para que o regulamento fosse assim tipificado: 1) lei prévia; 2) decreto que assegure a execução da lei; 3) agentes da administração pública como destinatários; 4) ausência de estipulação de direito ou obrigação. Essa fala é importante porque se aplica a qualquer ato regulamentar e não apenas aos problemas da “perturbação” que a “propaganda volante” pode causar.

Tratemos inicialmente que a edição de leis que regulam o trânsito só podem ser objeto de legiferância pelo poder central da União (art. 22, inciso XI, CF), ainda que se reserve aos Municípios algum caráter suplementar a lei federal “nos assuntos de interesse local” lhe permitindo alguma autonomia (art. 30, inciso I) [2].

O trânsito, por sua vez, foi regulamentado pelo Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97), estabelecendo a responsabilidade do “órgão” de trânsito dos municípios o “regulamentar” e “operar” o trânsito do “âmbito de sua circunscrição” (art. 24, II). Isso deve ser visto em contraste com a expressão “fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito” (inciso I). Aqui há outorga para regulamentação, inclusive para órgãos de trânsito municipais [3].

Interessante, no entanto, é que os códigos de posturas dos municípios tendem a legislar acerca do estabelecimento e o funcionamento da atividade econômica de “propaganda volante”, com regime de horários, locais impedidos, limites de ruídos, etc. De fato, esta norma seria a mais adequada ao tratar mais amplamente das relações de funcionamento das atividades econômicas em geral dentro de qualquer município, desde que não avancem sobre a legislação de trânsito.

Portanto, nos parece que uma ação administrativa das Superintendências Municipais de Trânsito, além de delimitadas por leis municipais específicas para suas competências, deve ser exercida nos limites da leis supra mencionadas, considerando o que dispõe o art. 37, da Constituição (princípio da legalidade estrita).

Desta feita, a edição de normativas internas (instruções, atos executivos, circulares, portarias, etc.) para os órgãos de trânsito locais, as quais valem preferencialmente aos administradores nos termos da decisão do STF, devem ser editadas com o propósito exclusivo de dar efetividade ao cumprimento da lei e nos seus limites, sendo o marco referencial as disposições previstas no Código de Trânsito conjugadas com o código de postura local.

Mas há uma questão ambiental adjacente: o meio ambiente saudável para pessoas e animais em contraste com ruídos exagerados. De fato, muitos órgãos públicos estão em relacionamento direto nas diversas atividades econômicas, não excluindo-se entre si. Por óbvio que perturbar o sossego público com ruidosas propagandas sonoras pode ser um problema civil, criminal e administrativo, sendo este último uma questão de trânsito, posturas e ambiental. Contudo, as competências para licenciamento ambiental são mais afetas às Secretarias do Meio Ambiente e suas leis de simplificação de licenças, não devendo o órgão de trânsito penetrar-lhe as atribuições quando da criação de normas regulamentares para a regulamentação da atividade em apreço.

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Isso não impede o SMT de cobrar a documentação de licença ambiental previamente no seu procedimento de apuração da qualidade sonora do veículo a ser liberado para “propaganda volante”, ou, ainda, limitadas suas competências, informar a ausência dela ao órgão ambiental. Aqui há uma prática de cooperação administrativa desejável.

Essa dinâmica deve ser observada à luz do art. 170, inciso IX, da Constituição, que instituiu tratamento mais favorável aos pequenos negócios. Tanto que o art. 4º, da Lei Complementar nº 123/2006 (Lei do Simples Nacional) impôs uma regra geral para os Administradores Públicos que devem buscar “integrar procedimentos”, de modo a evitar “duplicidade de exigências” e “garantir linearidade de processo”, sempre em favor do usuário. Pressupõe-se que a atividade de propaganda volante seja geralmente exercida por microempreendores, o que exige bastante sensibilidade para a promoção do desenvolvimento econômico destes trabalhadores.

O ideal é que o empreendedor de “propaganda volante” se dirigisse a uma única repartição que lhe informasse todas as exigências e documentos para iniciar suas atividades[4] e que seu processo de pedido de inscrição de atividade caminhasse internamente sem nenhuma provocação do usuário, primeiramente para questões fiscais (documentações pessoais, cadastro eletrônicos, tributos, etc.), depois para as fiscalizações de posturas (verificações de segurança urbana, poluições visuais e orientaçõesde posturas)[5] , trânsito (vistorias, conformidades veiculares e orientações de tráfego) e meio ambiente (qualidade sonora das emissões ou de poluentes, etc.). Ao fim deste processo restaria ao empreendedor pagar as taxas (se necessário) e retirar seu alvará, isso tudo poderia ser feito pela internet.

Considerações finais

Por fato que a regulação das atividades não é simples e depende de acurado senso prático para compreensão das necessidades de uma convivência social harmônica e equilibrada, não sendo a regulação uma mera atuação de descrição textual de enunciados normativos sem qualquer significado real. As leis existentes, embora não sejam perfeitas, podem nortear satisfatoriamente a regulação das atividades sem maiores obstáculos à execução de uma fiscalização eficiente que permita o exercício da atividade sem comprometer a tranquilidade e o bem estar da sociedade.


[1] SCHEFFER, Andréia, et al (coordenadores). Direito de Trânsito. V. I. Rio Grande do Sul: OAB/PR, 2018, p. 35.

[2] DA SILVA, José Afonso. Direito Urbanístico Brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 180.

[3] Idem

[4] Essas informações deveriam estar disponibilizadas em sítio eletrônico (art. 5º, LCP 123/2006)

[5] O uso da expressão “orientações” não é sem razão, uma vez que as fiscalizações em geral devem ter o caráter orientador nos termos do art. 55, da LCP 123/2006

Sobre o autor
Renato Luiz Barbosa Brandão

Advogado, Procurador Jurídico do Município de Jataí-Goiás, Pós-graduado em Direito e Direito Processual Civil. Professor do Curso de Direito da Universidade Federal de Jataí-Goiás, Ex-Professor do Curso de Direito do Centro de Ensino Superior de Jataí, membro da Comissão Especial de Regularização Fundiária do Município de Jataí.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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