Já quitei a Promessa de Compra e Venda e moro há muitos anos mas até hoje não tenho Escritura nem Registro. Como regularizar?

17/01/2024 às 15:40
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TRABALHANDO EM CARTÓRIO é muito comum ouvir quase que diariamente falar em "Escritura Definitiva". Buscando a compreensão do adjetivo "definitiva" chegaremos ao caso rotineiro que envolve a negociação preliminar de imóveis com a expectativa de ao final se obter a "Escritura definitiva". Nesse contexto é possível arriscar que a "Escritura Definitiva" pressupõe a existência de um "Contrato Preliminar" e ambas as figuras desenharão uma forma de adquirir imóveis que inclusive tem pleno respaldo legal como aponta o artigo 463 do Código Reale:

"Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive" .

Um belo exemplo de contrato preliminar - que antecede o "definitivo" - é a Promessa de Compra e Venda de Imóveis. Os mestres ROSENVALD e FARIAS (Curso de Direito Civil. Vol. 4. 2023) conceituam o instrumento como,

"Aquele em que as partes se comprometem a efetuar, posteriormente, um segundo contrato, que será o contrato principal. Por meio do contrato preliminar, os promitentes antecedem e preparam o contrato definitivo, obrigando-se mais tarde a celebrá-lo".

É muito comum - o que nem de longe pode significar correto e adequado - a situação onde o promitente comprador já tenha quitado o preço ajustado na promessa de compra e venda, inclusive habitando no imóvel (que muitas vezes ele mesmo pagou às suas custas para construir já que quase sempre o objeto da promessa é um TERRENO e não uma CASA já edificada) mas permaneça ao longo de muitos anos na marginalidade, sem Escritura e sem o Registro. Nesse contexto não restam dúvidas que a situação é de evidente IRREGULARIDADE REGISTRAL, uma vez que não restam dúvidas de que há um direito ao imóvel, todavia, como se sabe, por força de Lei, o imóvel ainda pertencerá àquele que figurar no Cartório do Registro de Imóveis como"titular":

"Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1º. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel".

Ora, a transmissão imobiliária desejada com o contrato de Promessa de Compra e Venda, por tudo que se viu, deve ser efetivada com a lavratura da ESCRITURA PÚBLICA [DEFINITIVA] de Compra e Venda. No caso de RECUSA ou IMPOSSIBILIDADE da outorga da "Escritura Definitiva" a solução deverá vir através da AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA, desde que é claro sejam comprovados perante o Juiz os requisitos necessários: a) Pagamento integral do preço; b) Contrato preliminar contendo todos os elementos necessários ao contrato definitivo; c) Recusa ou impossibilidade injustificada do promitente vendedor em outorgar a Escritura Definitiva e d) Inexistência da cláusula de arrependimento.

Uma novidade inaugurada com a Lei Federal 14.382/2022 e regulamentada pelo Provimento CNJ 149/2023 é a ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA EXTRAJUDICIAL a ser realizada diretamente nos Cartórios de Notas e do Registro de Imóveis, sem a necessidade de intervenção judicial, com a devida assistência de ADVOGADO. A "mens legis" aqui é a mesma que deu tônica à Usucapião Extrajudicial e ao Inventário Extrajudicial: solução rápida e desburocratizante, sem assoberbar ainda mais a via Judicial já tão atormentada com tanta demanda. Reza o artigo 216-B da Lei Registral:

"Art. 216-B. Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo".

A regularização da aquisição de imóveis baseada em Promessa de Compra e Venda mas que ainda não possuam Escritura Definitiva e muito menos Registro, como se percebe, pode se dar tanto pela via judicial quanto pela via extrajudicial, não devendo mais os interessados padecerem por anos e anos na Justiça, especialmente em casos onde o paradeiro dos vendedores seja desconhecido (o que é muito comum!) - uma vez que inclusive para esses casos a via extrajudicial já está aparelhada para alcançar a solução, da mesma forma como sempre aconteceu com tranquilidade na via judicial:

"TJMG. 10105130320119001. J. em: 05/11/2019. APELAÇÃO CÍVEL - ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA - CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - SUCESSIVAS TRANSMISSÕES COMPROVADAS - QUITAÇÃO INTEGRAL DO PREÇO - PROPRIETÁRIOS - LOCAL INCERTO E NÃO SABIDO - OUTORGA DA ESCRITRA PÚBLICA DEFINITIVA - IMPOSSIBILIDADE - ADJUDICAÇÃO CABÍVEL. A ação de adjudicação compulsória constitui o meio próprio para que o adquirente de bem imóvel obtenha a escritura pública definitiva em caso de recusa ou de impossibilidade de outorga pelos vendedores. Comprovada a celebração do contrato de compra e venda entre parte autora e os réus, a quitação integral do preço e a ocorrência de sucessivas transmissões do imóvel, iniciada pelos proprietários originários e encerrada com a negociação feita com a parte autora, bem como, restando evidenciada a impossibilidade de os proprietários originários outorgarem a escritura pública definitiva à requerente, pelo fato de possuírem PARADEIRO DESCONHECIDO, há que ser acolhida a pretensão adjudicatória formulada na inicial".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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