Trabalho além das Fronteiras: Conflitos entre aplicabilidade de leis nacionais e internacionais.

18/01/2024 às 12:38
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MUST UNIVERSITY

TRABALHO ALÉM DAS FRONTEIRAS: CONFLITOS ENTRE APLICABILIDADE DE LEIS NACIONAIS E INTERNACIONAIS.

FLORIDA – USA 2023

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas. OIT – Organização Internacional do Trabalho. TST – Tribunal Superior do Trabalho.

OEA – Organização dos Estados Americanos. TRT – Tribunal Regional do Trabalho.

PJ – Pessoa Jurídica

LINDB – Lei de Introdução ao Direito Brasileiro. CC- Código Civil

TICS - Tecnologia da Informação e Comunicação

RESUMO

O presente trabalho possui foco especial na aplicação da legislação brasileira em relações trabalhistas estrangeiras. Iniciamos, abordando sobre a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) como referências para a proteção dos direitos dos trabalhadores no cenário nacional e internacional. Em seguida, abordamos os princípios que orientam o Direito do Trabalho no Brasil, alinhando-os com os princípios estabelecidos pela OIT. Abordaremos a pejotização trabalhista, como um fenômeno global, verificando sua dimensão nacional e internacional e sua incidência aos direitos humanos, levantando as preocupações sobre a dignidade, igualdade e segurança no trabalho. Exploramos também o Código Bustamante e sua relação com os conflitos de leis trabalhistas, juntamente com a teoria do conglobamento mitigado, que busca conciliar diferentes leis trabalhistas em situações de conflito. Ao lidar com os conflitos transnacionais na área trabalhista, discutimos os desafios enfrentados e possíveis soluções para garantir a proteção dos direitos dos trabalhadores em âmbito global. O teletrabalho transnacional é analisado como um exemplo contemporâneo de desafio, destacando os conflitos entre normas nacionais e internacionais que podem surgir nesse contexto. Finalmente, ilustramos os conceitos discutidos por meio da análise de caso prático nos tribunais, demonstrando como esses desafios são tratados no sistema legal. Ao concluir, enfatizamos a complexidade dessas questões e a importância de abordá-las de maneira integrada e interdisciplinar, considerando não apenas o aspecto legal, mas também os princípios fundamentais dos direitos humanos. O trabalho destaca a necessidade de soluções que promovam a justiça social e garantam a proteção dos direitos dos trabalhadores em um contexto cada vez mais globalizado. A metodologia utilizada inclui revisão bibliográfica, análise de legislação e jurisprudência e a análise de casos. A abordagem será interdisciplinar, considerando aspectos do Direito Internacional, Direito do Trabalho e Direitos Humanos.

Palavras-chave: Princípios. Trabalho. Transnacional. Proteção.

ABSTRACT

This work has a special focus on the application of Brazilian legislation in foreign labor relations. We begin by addressing the International Labor Organization (ILO) and the Consolidation of Labor Laws (CLT) as references for the protection of workers' rights on the national and international scene. Next, we address the principles that guide Labor Law in Brazil, aligning them with the principles established by the ILO. We will address labor pejotization as a global phenomenon, verifying its national and international dimension and its impact on human rights, raising concerns about dignity, equality and safety at work. We also explore the Bustamante Code and its relationship with labor law conflicts, along with the theory of mitigated conglobation, which seeks to reconcile different labor laws in conflict situations. When dealing with transnational conflicts in the labor area, we discuss the challenges faced and possible solutions to ensure the protection of workers' rights globally. Transnational teleworking is analyzed as a contemporary example of challenge, highlighting the conflicts between national and international norms that can arise in this context. Finally, we illustrate the concepts discussed through the analysis of practical cases in the courts, demonstrating how these challenges are handled in the legal system. In concluding, we emphasize the complexity of these issues and the importance of approaching them in an integrated and interdisciplinary manner, considering not only the legal aspect, but also the fundamental principles of human rights. The work highlights the need for solutions that promote social justice and guarantee the protection of workers' rights in an increasingly globalized context. The methodology used includes bibliographic review, analysis of legislation and jurisprudence and case analysis. The approach will be interdisciplinary, considering aspects of International Law, Labor Law and Human Rights.

Keywords: Principles. Work. Transnational. Protection

TRABALHO ALÉM DAS FRONTEIRAS: CONFLITOS ENTRE APLICABILIDADE DE LEIS NACIONAIS E INTERNACIONAIS.

DAYANE LANGE MAGALHÃES

SUMÁRIO

  1. INTRODUÇÃO 1

  2. A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO - OIT E A CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS – CLT 3

  3. PRINCÍPIOS NO ÂMBITO DO DIREITO DO TRABALHO BRASILEIRO E DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO TRABALHO (OIT) 5

  4. O FENÔMENO DA PEJOTIZAÇÃO TRABALHISTA EM UMA PERSPECTIVA NACIONAL E GLOBAL E OS SEUS DESAFIOS AOS DIREITO HUMANOS 9

    1. Introdução aos Direitos Humanos Universal 9

    2. Dos Direitos Humanos Regionais 10

4.2 O fenômeno da Pejotização 13

  1. CÓDIGO BUSTAMANTE E O CONFLITOS DE LEIS TRABALHISTAS NO ESPAÇO. 17

  2. A TEORIA DO CONGLOGAMENTO MITIGADO NA RELAÇÃO TRABALHISTA INTERNACIONAL. 19

  3. CONFLITOS ENTRE AS LEIS NACIONAIS E ESTRANGEIRAS NA SEARA TRABALHISTA: DESAFIOS E SOLUÇÕES 21

  4. TELETRABALHO TRANSNACIONAL E SEU DESAFIO MEDIANTE AOS CONFLITOS ENTRE NORMAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS 30

  5. ANÁLISE DE CASOS PRÁTICOS NOS TRIBUNAIS: ASSIMILANDO OS DESAFIOS E SOLUÇÕES LEGAIS 35

  6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 42

  7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 44

INTRODUÇÃO

A globalização e a evolução tecnológica estão crescendo de forma acelerada, proporcionando que as relações de trabalho atravessem as fronteiras nacionais, criando um ambiente complexo e multifacetado, no qual demanda um cuidado especial dos legisladores, juristas e organizações internacionais. Nesse sentido, a interação entre a Organização Mundial do Trabalho – OIT e a Consolidação das Leis Trabalhista – CLT brasileira surge como um campo de estudo importante para a compreensão e abordagem dos desafios do direito do trabalho internacional.

A convergência e, por vezes, divergência de princípios entre o Direito do Trabalho Brasileiro e as diretrizes estabelecidas pela OIT lançam luz sobre a busca contínua por uma legislação trabalhista justa e equitativa. Esses princípios, tanto em nível nacional quanto internacional, buscam garantir os direitos fundamentais dos trabalhadores, enquanto também respondem às necessidades das economias em evolução e das mudanças nas dinâmicas laborais. Não obstante, é oportuno analisar como a pejotização afeta os direitos humanos dos trabalhadores. A pejotização é um fenômeno que tem ganhado destaque nas discussões sobre direitos humanos e relações de trabalho nas últimas décadas. Ela se refere à prática de empresas contratarem trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ), em vez de mantê-los como funcionários formais, visando reduzir encargos trabalhistas e previdenciários. Essa estratégia tem levantado preocupações em relação aos direitos humanos, uma vez que muitos trabalhadores acabam sendo privados de garantias e benefícios essenciais. As implicações dessa prática, entra na seara da dignidade, da igualdade e da segurança dos indivíduos, bem como gera diversos desafios

para a proteção de direitos fundamentais no ambiente de trabalho.

Outrossim, a análise das complexidades do Código Bustamante, assim como a sua aplicação no contexto dos conflitos de leis trabalhistas no âmbito internacional revela os desafios inerentes à harmonização de sistemas jurídicos variados. Não obstante, a teoria do "Conglomerado Mitigado", surge como um esforço para mitigar os impactos negativos desses conflitos, acrescenta uma dimensão intrigante ao debate sobre a resolução de disputas trabalhistas transnacionais.

O aumento da demanda de teletrabalho transnacional traz à tona uma nova série de questões legais, à medida que trabalhadores e empregadores se envolvem em arranjos laborais que transcendem fronteiras geográficas. Esse contexto levanta diversos desafios em relação à aplicação de normas trabalhistas nacionais e internacionais, destacando a necessidade de adaptar o quadro legal às realidades em evolução das relações empregatícias.

Através de dos casos práticos analisados nos tribunais, torna-se evidente que os conflitos entre leis nacionais e estrangeiras no âmbito trabalhista são situações recorrentes. No entanto, esses casos também representam oportunidades valiosas para desenvolver precedentes legais

que possam orientar futuras decisões e moldar abordagens mais eficazes para a resolução de

disputas trabalhistas globais.

Nesta exploração abrangente dos temas relacionados ao direito do trabalho internacional, mergulharemos nas complexidades dessas questões, examinando suas implicações, desafios e soluções potenciais. Ao fazê-lo, buscamos lançar luz sobre o caminho a seguir para garantir a justiça, a equidade e a harmonização nas relações trabalhistas em um mundo cada vez mais interligado.

E para nortear todo esse contexto, a metodologia adotada, envolve uma abordagem interdisciplinar que combina pesquisa jurisprudencial, análise comparativa de legislações, estudos de casos práticos e revisão de literatura acadêmica. Esse método multifacetado permite

uma compreensão abrangente das dinâmicas legais, econômicas e sociais envolvidas, enquanto também capacita a formulação de percepções fundamentadas e soluções para os desafios

enfrentados no contexto das relações trabalhistas globais.

A ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO - OIT E A CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS – CLT.

A OIT e a CLT são dois pilares fundamentais para proteção dos direitos trabalhistas. A OIT é uma agência especializada das Nações Unidas, fundada em 1919 com o viés de promover a justiça social, enquanto a CLT é uma consolidação de leis brasileira que entrou em vigor em 1943. Ambas possuem como objetivo principal promover o trabalho digno e decente para todos, estabelecendo padrões e diretrizes para as relações laborais e garantindo a proteção dos direitos dos trabalhadores.

A OIT foi criada logo após a Primeira Guerra Mundial, com o intuito de promover a justiça social e melhorar as condições de trabalho em todo o mundo. O seu compromisso é a promoção de oportunidades de emprego produtivo, garantindo condições de trabalho justas, promovendo a proteção social e fortalecendo o diálogo entre empregadores, trabalhadores e governos. Para a OIT é condição imprescindível para erradicar a pobreza, a diminuição das desigualdades sociais, a preservação de um governo democrático e o avanço sustentável.

A OIT é responsável por desenvolver e promover normas internacionais do trabalho, que abrangem temas como liberdade sindical, direitos dos trabalhadores, segurança e saúde no trabalho, igualdade de gênero e combate ao trabalho infantil. Além disso, a organização realiza pesquisas, fornece assistência técnica e desenvolve programas para apoiar seus Estados- membros na implementação de políticas trabalhistas.

A OIT já legitimou mais de 190 convenções, que são acordos internacionais legalmente vinculativos aos estados membros que estabelecem padrões mínimos em questões trabalhistas. Essas convenções discorrem sobre temas como a proibição do trabalho forçado, a abolição do trabalho infantil, a igualdade salarial e a segurança e saúde no trabalho, em âmbito internacional.

Já a CLT foi criada no Brasil durante o governo de Getúlio Vargas, no ano de 1943, ocorrendo sua reforma no ano de 2017 durante o governo de Michel Temer e possuindo diversas modificações perante aos anos. Ela unificou toda legislação trabalhista brasileira e estabeleceu direitos e deveres tanto para os empregadores quanto para os empregados. A CLT foi uma conquista significativa para a classe trabalhadora, garantindo direitos fundamentais e regulamentando as relações de trabalho.

Ademais, a CLT abrange um amplo conjunto de questões trabalhistas, incluindo jornada de trabalho, férias remuneradas, salário-mínimo, décimo terceiro salário, aviso prévio, estabilidade no emprego, entre outros. Ela também prevê a criação de sindicatos e o estabelecimento de negociações coletivas, visando a proteção dos interesses dos trabalhadores. Logo, a CLT tem passado por atualizações ao longo dos anos para se adequar às mudanças sociais, tecnológicas e econômicas. É uma legislação fundamental para a garantia de direitos trabalhistas no Brasil, servindo como base para as relações entre empregadores e

empregados, bem como para a solução de conflitos trabalhistas.

Assim, importa dizer que tanto a OIT, quanto a CLT desempenham papéis essenciais na proteção dos direitos trabalhistas em âmbito internacional e nacional. Enquanto a OIT estabelece padrões globais e promove o diálogo entre as partes envolvidas, a CLT oferece um conjunto abrangente de direitos e regulamentações trabalhistas no âmbito interno do Brasil.

Ambas são importantes ferramentas para a promoção de um trabalho digno, justo e decente, contribuindo para o bem-estar dos trabalhadores e o desenvolvimento socioeconômico.

  1. PRINCÍPIOS NO ÂMBITO DO DIREITO DO TRABALHO

BRASILEIRO E DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO TRABALHO (OIT)

O Direito do Trabalho brasileiro e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) como verificamos no tópico anterior, são dois elementos essenciais para a proteção dos direitos trabalhistas e a promoção do trabalho decente. Nesse sentido, foram estabelecidos diversos princípios que norteiam a criação e aplicabilidade das normas do direito trabalhista tanto no âmbito nacional, quanto no âmbito internacional.

No ano de 1998, a OIT aprovou a Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, que foi visto como um marco civilizatório, devido à grande relevância do conteúdo humanista que apresenta, uma vez que os princípios e direitos fundamentais no trabalho por ela apresentado, são reconhecidos como fontes de direitos humanos dos trabalhadores. Nesse sentido, é também visto como um marco regulatório, por ser documento pioneiro de um “giro estratégico” na atividade normativa da OIT, caracterizado pelo investimento na proclamação de Declarações.

A declaração 1998 reafirma o compromisso da OIT em promover o trabalho decente e assegurar condições justas para os trabalhadores em todo o mundo, evidenciando os direitos humanos trabalhistas, sendo composta por quatro grandes princípios e direitos fundamentais no trabalho, sendo a liberdade de associação e de negociação coletiva, no qual defende a liberdade de associação sindical, permitindo que os trabalhadores se organizem em sindicatos e exerçam seus direitos de negociação coletiva para proteger e promover seus interesses. A Eliminação de

todas as formas de trabalho forçado ou compulsório, pelo qual proíbe o trabalho forçado, escravo e todas as formas de servidão involuntária, garantindo que os indivíduos não sejam submetidos a condições de trabalho coercitivas. A abolição efetiva do trabalho infantil, na qual reforça a necessidade de proteger as crianças contra a exploração laboral, assegurando que elas recebam educação adequada e não sejam obrigadas a realizar trabalhos que prejudiquem seu desenvolvimento físico, mental ou social e pôr fim a eliminação de discriminação em matéria de emprego e ocupação, no qual visa garantir a igualdade de oportunidades e tratamento no

emprego, combatendo qualquer forma de discriminação baseada em raça, cor, sexo, religião, opinião política, origem social ou nacionalidade.

Ademais, esses direitos humanos dos trabalhadores estão formalmente previstos nas convenções internacionais da OIT mencionados como convenções fundamentais. Essa convenção são, a Convenção n. 29 sobre Trabalho Forçado ou Obrigatório (adotada pela OIT em 1930); a Convenção n. 87 sobre Liberdade Sindical e Proteção ao Direito de Sindicalização (adotada pela OIT em 1948); Convenção n. 98 sobre Direito de Sindicalização e de Negociação Coletiva (adotada pela OIT em 1949); a Convenção n. 100 sobre Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres Trabalhadores em Trabalho de Igual valor (adotada pela OIT em 1951); a Convenção n. 105 sobre Abolição do Trabalho Forçado (adotada pela OIT em 1957); a Convenção n. 111 sobre Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação (adotada pela OIT em 1958); a Convenção n. 138 sobre Idade Mínima para Admissão (adotada pela OIT em 1973); a Convenção n. 182 sobre Proibição das piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação (adotada pela OIT em 1999).

O Brasil ratificou todas essas convenções fundamentais no âmbito trabalhista, com exceção a convenção nº 87 que versa sobre Liberdade Sindical e Proteção ao Direito de

Sindicalização. As retificações dessas convenções foram refletidas na Constituição Federal brasileira, sendo utilizadas como normativas no âmbito interno do Brasil.

Assevera ainda, que o Brasil além de utilizar os princípios internacionais estipulados pela OIT, ele possui no âmbito interno de normas trabalhistas, princípios que norteiam a aplicação da Consolidação da Leis Trabalhista – CLT e que são citados sempre pelos juízes nas suas fundamentações de decisões sobre a lide.

Verifica-se, pois, que são diversos princípios que norteiam a aplicação da legislação trabalhista brasileira, sendo alguns princípios de grande relevância e incidência nas decisões dos tribunais, como podemos citar o princípio Protetor, que apesar da reforma trabalhista e a lei da terceirização terem tentado diminuir sua eficácia, ele ainda tem prevalecido como fundamentação em muito julgados e sendo subdividido em Princípio da norma mais favorável, princípio da condição mais benéfica e princípio in dúbio pro operário.

O princípio da Norma mais favorável, deve ser utilizado em caso concreto, observando que em caso de conflito de normas incidentes em mesma matéria, deverá prevalecer a norma que seja mais favorável ao empregado. No entanto, esse princípio comporta exceções, não sendo absoluto, não podendo ser aplicado quando existir lei de ordem pública a respeito da matéria, a título de exemplo podemos citar o prazo prescricional, no qual não pode ser alterado por acordo coletivo do trabalho, devendo prevalecer o prazo previsto no texto constitucional. Outra situação de tentativa de flexibilização desse princípio, é o artigo 620 da CLT que dispõe que as condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho.

Já o princípio da Condição mais benéfica, dispõe sobre as cláusulas contratuais, estipulados nos contratos de trabalho ou em regulamento interno da empresa, que podem ser mais benéficas ao trabalhador do que a legislação vigente e devido a isso devem ser mantidas

durante o período de vigência do vínculo empregatício. Nesse sentido, levando em consideração este princípio, será invalido a supressão de cláusula contratual, desde que entenda que seja prejudicial ao trabalhador, conforme disposto no artigo 468 da CLT e também na súmula 51 do TST.

No Princípio in dubio pro operário, quando a situação se encontre mediante duas opções totalmente válidas, a hermenêutica deverá prevalecer sobre a opção mais vantajosa ao trabalhador.

Não obstante, outro princípio de grande influência no direito do trabalho brasileiro, é o princípio da primazia da realidade dos fatos, princípio este que busca privilegiar a realidade em detrimento da forma. Esse princípio é muito utilizado para combater a pejotização, ou seja, em casos de típica relação de emprego mascarado por contrato de prestação de serviço, será aplicado esse princípio e reconhecido a relação empregatícia. Diante esse princípio, fica claro que os fatos ocorridos são mais importantes e devem prevalecer em relação aos ajustes formais, ou seja, ao contrato formulado entre as partes, conforme dispõe o artigo 9º da CLT.

Outrossim, o princípio da continuidade da relação de emprego, também se destaca, pois esse princípio garante ao obreiro a permanência no mesmo vínculo empregatício, devidos as vantagens que isso possa proporcionar, pois no decorrer do tempo na mesma relação de trabalho, o obreiro adquire mais capacitação, aumento salariais, vantagens remuneratórias como anuênios ou quinquênios, entre outros. Nesse sentido, o TST firmou a súmula 212, na qual dispõe que o ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado.

Indubitavelmente, assim como esses princípios citados, há outros diversos princípios estabelecidos pela OIT e pela CLT que regem a aplicabilidade do direito do trabalhado na seara

nacional e internacional, desempenhando um papel crucial na proteção dos direitos dos trabalhadores e na busca por relações laborais justas e equilibradas. A aplicação desses princípios contribui para a construção de um ambiente de trabalho digno, respeitando a dignidade humana e promovendo a igualdade de oportunidades e tratamento para todos os trabalhadores.

  1. O FENÔMENO DA PEJOTIZAÇÃO TRABALHISTA EM UMA PERSPECTIVA NACIONAL E GLOBAL E OS SEUS DESAFIOS AOS DIREITO HUMANOS.

    1. Introdução aos Direitos Humanos Universal

Ao abordamos a matéria Direitos Humanos, devemos entender que ela possui caráter universal, podendo ser conceituada como um conjunto de direitos voltados à dignidade da pessoa humana, mediante a limitação do poder Estatal e a instituição de igualdade como o aspecto central das relações sociais.

Os direitos humanos são históricos, passando por diversas mudanças significativas ao decorrer da evolução da sociedade. Os Direitos Humanos são a representação da proteção à dignidade da pessoa, logo, nunca poderão ser suprimidos, sendo vedado o retrocesso, de forma que a cada fase da história, os Direitos Humanos assumem uma dimensão cada vez maior havendo uma busca incessante por novas dimensões, no qual já há autores posicionando no sentido de já existir a 5ª dimensão. Entretanto, temos três dimensões basilares, sendo a primeira dimensão envolvendo os direitos da liberdade, que são os direitos civis e políticos; a segunda

geração envolvendo os direitos relacionados à igualdade, no qual abrange os direitos sociais,

direitos econômicos e os direitos culturais e a terceira geração envolvendo os direitos de solidariedade ou fraternidade, que abrange os direitos difusos e coletivos.

Não obstante, a essência dos Direitos Humanos centra-se na proteção ao direito mais importante das pessoas, notadamente, a dignidade, na qual visa garantir ao ser humano o respeito e o tratamento de forma igualitária, independentemente de quaisquer condições sociais, culturais ou econômicas. Os direitos fundamentais, como a dignidade, a liberdade e a igualdade de todos os seres humanos, são inerentes a todas as pessoas, independentemente de sua nacionalidade, raça, gênero, religião ou status socioeconômico. No contexto da área trabalhista transnacional, os direitos humanos desempenham um papel crucial na promoção e na garantia de condições de trabalho justas e dignas para os trabalhadores em um mundo cada vez mais globalizado. Desta forma, as diretrizes de Direito Internacional do Trabalho surgem do trabalho legislativo dos órgãos e membros da OIT (Convenções e Recomendações) que disciplinam normas com o objetivo de promover direitos humanos de forma universal abrangendo diversos trabalhadores.

Dos Direitos Humanos Regionais

Os direitos humanos não se limitam apenas ao âmbito internacional; muitas regiões do mundo também estabelecem suas próprias normas regionais que complementam os padrões internacionais, garantindo a proteção a dignidade, a liberdade e a igualdade de todos os seres humanos.

Os direitos humanos regionais referem-se aos direitos que são protegidos e promovidos em níveis regionais, ou seja, por organizações ou tratados que abrangem uma determinada região geográfica, como uma área específica de um continente. A título de exemplo, temos um

importante sistema regional de proteção dos direitos humanos, sendo o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, que atualmente abrange todos os países das Américas e Caribe.

No âmbito dos direitos trabalhistas, a proteção ao trabalhador é um aspecto fundamental dos direitos humanos, e muitos sistemas regionais direcionados aos direitos humanos incluem disposições que visam garantir os direitos dos trabalhadores. Esses direitos incluem, entre outros, o direito a um trabalho digno, o direito à igualdade de oportunidades no emprego, o direito à segurança e saúde no trabalho e o direito à liberdade sindical.

O Sistema Interamericano de Direitos Humanos, por exemplo, protege os direitos dos trabalhadores em vários de seus instrumentos. A Organização dos Estados Americanos – OEA, no qual é o órgão responsável pelo Sistema Interamericano De Direitos Humanos, aduz em sua carta, logo em seu preâmbulo, diversos direitos humanos, destacando a importância de manter o verdadeiro sentido da solidariedade americana e da boa vizinhança, com o objetivo de consolidar um regime de liberdade individual e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do homem. A carta da OEA foi assinada em 1948, sendo o Brasil, um dos países a assinar essa carta.

A Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem reconhecem o direito ao trabalho como um direito humano fundamental. Além disso, a Carta Social das Américas e a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas com Deficiência incluem disposições relacionadas à proteção dos direitos dos trabalhadores com deficiência.

Outras regiões do mundo também possuem sistemas de proteção aos direitos humanos regionais que abordam questões relacionadas aos direitos dos trabalhadores. No caso da Europa, o Sistema Europeu de Direitos Humanos é orientado pelo Conselho da Europa, tendo como membros atualmente 47 países europeus. Não obstante esse conselho conta com um órgão

consultivo, conhecido como Comissão de Veneza. Essa Comissão de Veneza, embora seja um órgão do Sistema Europeu de Direitos Humanos, a partir do ano de 2002, passou a admitir o ingresso de países não europeus em sua comissão, oportunidade esta que o Brasil aderiu em 2008, tornando-se membro efetivo da Comissão de Veneza.

Ademais, a União Europeia em no ano de 1961, assinou a Carta Social Europeia, no qual disciplina sobre os direitos de segunda dimensão, sendo os direitos sociais, econômicos e culturais. A carta aborda em seu conteúdo, o direito ao trabalho, direito a condições de trabalho justas, direito a uma remuneração justa, direito a proteção a saúde, á seguridade social, a assistência social e médica, a proteção no caso de despedimento, á dignidade no trabalho etc.

Nesse passo, as diretrizes sobre direitos humanos regionais desempenham um papel importante na proteção dos direitos dos trabalhadores em níveis regionais, complementando os padrões globais de direitos humanos estabelecidos por tratados como a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esses sistemas regionais ajudam a garantir que os trabalhadores tenham acesso a condições de trabalho justas e dignas em suas respectivas regiões.

Entretanto, a natureza transnacional das atividades econômicas, impulsionada pela globalização, trouxe consigo diversos desafios e oportunidades para a proteção dos direitos humanos no local de trabalho. À medida que as empresas ampliam suas operações para além das fronteiras nacionais, surge a necessidade de abordar questões complexas relacionadas aos direitos trabalhistas em uma escala global. Isso inclui a preocupação com práticas corriqueiras como a pejotização no trabalho, a exploração de mão de obra barata e a falta de regulamentação eficaz em muitos contextos transnacionais.

4.2 O fenômeno da Pejotização

A pejotização trabalhista é um fenômeno que tem se espalhado pelo mundo, afetando a vida de milhões de trabalhadores. Esse termo é utilizado como referência à prática de contratar trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ), ao em vez de mantê-los como empregados formais, sendo muitas vezes com o objetivo de reduzir os custos trabalhistas e evitar as obrigações trabalhistas e previdenciárias existentes em relação de emprego. Embora a pejotização possa parecer uma questão puramente econômica, ela abrange profundas implicações para os direitos humanos dos trabalhadores em uma perspectiva global.

Outrossim, a pejotização trabalhista não é um problema restrito a um único país ou região. Ela é um fenômeno global que pode ser observado em diferentes formas e contextos em todo o mundo, incluindo os países desenvolvidos e também os em desenvolvimento que enfrentam desafios relacionados à pejotização. As empresas multinacionais muitas vezes se beneficiam da pejotização ao ampliar suas atividades em várias nações, explorando as diferenças nas leis trabalhistas.

A pejotização trabalhista afasta a dignidade dos trabalhadores ao negar-lhes os benefícios e as proteções que os empregados formais normalmente recebem. Essa situação abrange também o acesso limitado à segurança social, assistência médica, licença remunerada, entre outros direitos fundamentais. Os trabalhadores pejotizados muitas vezes enfrentam jornadas de trabalho exaustivas e insegurança financeira, o que afeta sua saúde física e mental. Não obstante, a pejotização trabalhista também entra em conflito com o princípio do direito ao trabalho digno, um dos pilares dos direitos humanos. O princípio do trabalho digno implica que todo trabalhador deve ter acesso a condições de trabalho justas, salário adequado e proteção contra a exploração.

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No âmbito do direito trabalhista interno no Brasil, há a Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, que disciplina as relações de trabalhos e busca a proteção do trabalhador nas relações empregatícias e aplicabilidade dos direitos humanos.

A CLT dispõe em seu artigo terceiro, que a relação de emprego se configura quando presentes os elementos fático-jurídicos componentes da relação de emprego, que são os trabalhos prestados por pessoa física, com pessoalidade, subordinação, onerosidade e não eventualidade. No entanto, a subordinação é vista como elemento basilar para configuração de relação empregatícia, sendo muito utilizada pelos juízes na fundamentação do reconhecimento de vinculo empregatício. A subordinação é analisada quando em um contrato de trabalho, o contratado não possui poder diretivo sobre a execução do seu trabalho, sendo o contratante, no caso o empregador, quem possui o poder diretivo sobre o trabalho do empregado, fiscalizando, coordenando e dirigindo a prestação de serviço.

Nesse caso, por mais que as partes elaborem um contrato de prestação de serviços, determinando que não há relação de emprego e que a prestação de serviços será regida a luz do código civil ou de acordo com a legislação de outro país, será válida a realidade dos fatos, ou seja, os fatos ocorridos durantes a execução do contrato se sobrepõem o contrato estipulado, afastando as previsões nele constantes. Esse fenômeno de afastamento do contrato pactuado entre as partes, é previsto pelo direito do trabalho brasileiro, como o princípio da primazia da realidade dos fatos, princípio que é amplamente reconhecido no direito do trabalho e em outras áreas do direito para garantir a proteção dos direitos dos trabalhadores e a justiça nas relações contratuais.

Impende destacar, que apesar de existir essa previsão legislativa em que já é pacifica entre os tribunais, ainda há no cenário brasileiro grandes demandas sobre essa questão. A fraude trabalhista é corriqueira nas relações de trabalho. Santana, dispõe o seguinte sobre essa situação:

Agora está acontecendo também o seguinte: estão criando as empresas pessoais, como por exemplo, no setor de informática lá da empresa. Tiraram o contrato de uma grande empresa, pegaram o funcionário que tem o domínio da realidade do trabalho da empresa, que conhece tudo e mandaram esse trabalhador montar a empresa dele. Ele virou uma empresa. O que eles fazem para quebrar com a pessoalidade? “Você não precisa vir todo dia mais, não”. Você vem aqui dia tal e dia tal: e quando eu precisar numa emergência a gente liga. [...] “Onde é possível individualizar a terceirização e criar essas situações inusitadas, estão fazendo. Às vezes, na porta da empresa se vê entrar um bocado de empresa de uma única pessoa, empresa de uma pessoa só, que é a própria pessoa. (SANTANA, 2007, p 170).

Ora, face a essa consideração aduzida por Santana, podemos dizer que não é uma situação estranha em nosso meio, nos dias atuais a maioria dos trabalhadores já depararam com essa proposta no mercado de trabalho e se submeteram a esse cenário por não possuir outras opções e não terem poder de barganha.

Outrossim, mediante esse cenário a reforma trabalhista ocorrida no Brasil em 2017, acrescentou o artigo 442- B, no qual passou a dispor que o trabalhador autônomo exclusivo, poderá prestar serviços para um único empregador de forma contínua, mantendo afastada a relação de emprego. Vejamos:

Art. 442-B. A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação.

Ora, podemos perceber que com essa previsão legislativa o reconhecimento de vínculo empregatício acabou sofrendo uma limitação, reduzindo a previsão do artigo terceiro da CLT. No entanto, o requisito de subordinação ganhou destaque e acabou por ser um ponto crucial para reconhecimento de fraude no contrato de trabalho e admissão do vínculo empregatício.

O deslinde da questão ainda possui muitas controvérsias e a pejotização levanta sérios conflitos de direitos humanos. Os trabalhadores contratados como PJ frequentemente enfrentam condições de trabalho precárias, ausência de benefícios trabalhistas, como férias remuneradas e décimo terceiro salário, e insegurança financeira devido à falta de estabilidade no emprego. Isso viola princípios fundamentais dos direitos humanos, como o direito ao trabalho digno, à igualdade e à não discriminação.

Além disso, a pejotização muitas vezes compromete a segurança social dos trabalhadores, uma vez que eles contribuem menos ou até mesmo não contribuem para a previdência social. Isso pode resultar em sérias consequências a longo prazo, incluindo a falta

de proteção financeira em caso de doença, acidente ou aposentadoria.

Por outro lado, a pejotização é frequentemente promovida como uma forma de empreendedorismo, na qual os trabalhadores têm mais autonomia e liberdade para gerenciar sua própria atividade econômica. Muitos trabalhadores contratados como PJ veem essa prática como uma oportunidade de se tornarem empresários independentes.

No entanto, essa perspectiva na maioria das vezes não se concretiza na prática. Os trabalhadores pejotizados frequentemente continuam dependentes de um único empregador, com pouca autonomia real sobre suas atividades. Eles podem ser pressionados a aceitar condições de trabalho desfavoráveis, pois temem perder contratos e fontes de renda.

E ao mesmo tempo, temos a situação, que embora a pejotização tenha sido objeto de debate devido às preocupações com os direitos dos trabalhadores, é importante reconhecer que essa prática oferece benefícios significativos para os empresários. A redução de encargos trabalhistas, a flexibilidade contratual, a redução de riscos legais e a promoção do empreendedorismo são aspectos positivos que atraem muitos empregadores e alavancam a economia de um país. No entanto, é crucial que as empresas adotem essa prática dentro dos

limites da lei e respeitem os direitos dos trabalhadores para garantir uma relação de trabalho justa e equilibrada.

Exsurge diante deste cenário, grandes controvérsias que ainda precisa ser legislada e pacificada para melhor desempenho das relações de trabalho. Atualmente ainda não há consenso entre as decisões da Justiça do Trabalho e muitas lacunas legislativas para serem preenchidas. Um exemplo recente disso, é o cenário brasileiro, no que se refere a aos transportes por aplicativos, que não possui uma lei específica para eles e parte da justiça do trabalho entende que há vínculo empregatício e outra parte entende que não há. O caso já chegou ao STF, no qual tem demonstrado não reconhecer o vínculo empregatício, mas ainda não há uma repercussão geral. A controvérsia tem ganhado tanto destaque, que o Procurador Geral Da República, chegou a pedir para que a jurisprudência seja uniformizada, o que é necessário, até para que haja segurança jurídica nas relações de trabalho.

Portanto, a pejotização é um fenômeno que apresenta desafios complexos para os direitos humanos, tanto em nível nacional quanto global. É essencial buscar soluções que garantam um equilíbrio entre a flexibilidade empresarial e a proteção dos direitos dos trabalhadores, promovendo uma visão de trabalho digno e igualdade em todo o mundo. Isso requer esforços coordenados, conscientização pública e um compromisso contínuo com os princípios fundamentais dos direitos humanos.

CÓDIGO BUSTAMANTE E O CONFLITOS DE LEIS TRABALHISTAS NO ESPAÇO.

O Código Bustamante, também conhecido como o "Código de Direito Internacional Privado", é um tratado internacional que tem como objetivo principal regular as relações

jurídicas privadas entre os países signatários. Foi assinado em 1928 e entrou em vigor em 1929, sendo adotado inicialmente por países da América Latina e, posteriormente, por outros países. No Brasil foi incorporado ao direito brasileiro no ano de 1932 e utilizado como fonte para países não signatários, para suprir lacunas existentes na legislação interna.

No âmbito trabalhista, o Código Bustamante aborda a questão do conflito de legislação trabalhista no espaço, ou seja, quando ocorre um conflito entre as leis trabalhistas de diferentes

países em casos envolvendo trabalhadores estrangeiros ou situações transnacionais. O código dispõe em seu artigo 198, que é territorial a legislação sobre acidentes do trabalho e proteção social ao trabalhador.

O princípio central do Código Bustamante nesse contexto é conhecido como o "Princípio do Centro da Gravidade" ou "Princípio da Unidade Essencial das Relações de Trabalho". Esse princípio estabelece que, nos casos em que há um conflito entre as leis trabalhistas de diferentes países, deve-se buscar a legislação mais próxima e mais conexa com a relação de trabalho em questão.

Ou seja, ao analisar um caso que envolva um trabalhador estrangeiro ou uma situação transnacional, deve-se identificar qual legislação possui uma ligação mais estreita com a relação

de trabalho em termos de local de execução do trabalho, local de contratação, nacionalidade das partes envolvidas, entre outros fatores relevantes.

O objetivo desse princípio é garantir que a legislação mais adequada e aplicável à situação seja utilizada, evitando lacunas legais ou a sobreposição de normas que poderiam gerar insegurança jurídica e prejuízo aos direitos dos trabalhadores.

No entanto, é importante ressaltar que o Código Bustamante não estabelece uma regra absoluta ou uma fórmula fixa para resolver os conflitos de legislação trabalhista no espaço.

Cada caso deve ser analisado individualmente, levando em consideração as circunstâncias

específicas e os princípios gerais do direito internacional privado.

Além do Código Bustamante, outros instrumentos internacionais e convenções bilaterais ou multilaterais também podem ser aplicáveis para resolver questões relacionadas ao conflito de legislação trabalhista no espaço, dependendo dos países envolvidos e das situações específicas.

Desta forma, o Código Bustamante desempenha um papel relevante ao estabelecer princípios e diretrizes para resolver o conflito de legislação trabalhista no espaço e vem sido citado em diversos julgados pelos tribunais brasileiros. O Princípio do Centro da Gravidade visa determinar a legislação mais adequada e conexa com a relação de trabalho em questão, buscando assegurar a proteção dos direitos dos trabalhadores em situações transnacionais.

A TEORIA DO CONGLOGAMENTO MITIGADO NA RELAÇÃO TRABALHISTA INTERNACIONAL.

A teoria do Conglogamento Mitigado na relação Trabalhista internacional refere-se a um princípio que busca harmonizar os direitos trabalhistas de diferentes países em casos envolvendo trabalhadores estrangeiros ou situações transnacionais. Essa teoria reconhece que, diante da diversidade das legislações trabalhistas ao redor do mundo, é necessário encontrar um equilíbrio entre a aplicação rigorosa da legislação nacional de um país e o respeito aos direitos fundamentais dos trabalhadores.

O conglobamento mitigado propõe uma abordagem flexível que leva em consideração as normas internacionais de direitos humanos, os princípios fundamentais do trabalho estabelecidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e outras convenções

internacionais relevantes. Essa abordagem visa garantir que os trabalhadores estrangeiros sejam protegidos de forma adequada, mesmo quando estão sujeitos a diferentes leis trabalhistas.

O conceito de conglobamento refere-se à incorporação de diferentes elementos de leis

nacionais e internacionais em uma relação trabalhista internacional. No entanto, a teoria do conglobamento mitigado reconhece que a aplicação estrita da legislação de um único país pode levar à sobreposição de normas ou criar obstáculos excessivos para o exercício dos direitos dos trabalhadores.

Assim, o conglobamento mitigado busca um equilíbrio entre as exigências legais de cada país envolvido na relação de trabalho e os direitos fundamentais dos trabalhadores. Isso pode implicar na aplicação de normas mais favoráveis ao trabalhador, independentemente da legislação nacional em vigor.

No entanto, é importante ressaltar que a aplicação da teoria do conglobamento mitigado pode variar de acordo com os sistemas jurídicos de cada país e as convenções internacionais ratificadas por eles. Além disso, a interpretação e aplicação desse princípio podem depender do contexto específico de cada caso e das decisões dos tribunais.

Em resumo, a teoria do conglobamento mitigado busca conciliar as legislações trabalhistas de diferentes países, considerando os direitos fundamentais dos trabalhadores e as normas internacionais de proteção. Essa abordagem flexível procura garantir a justiça e a equidade nas relações trabalhistas internacionais, levando em conta a diversidade legal e respeitando os direitos humanos.

CONFLITOS ENTRE AS LEIS NACIONAIS E ESTRANGEIRAS NA SEARA TRABALHISTA: DESAFIOS E SOLUÇÕES.

Na atualidade com aumento da globalização e da interconectividade entre as nações, os conflitos entre leis nacionais e estrangeiras têm se tornado cada vez mais comuns. Esses conflitos surgem quando diferentes sistemas jurídicos entram em choque, resultando em incertezas legais e desafios na aplicação das leis.

Os conflitos entre leis nacionais e estrangeiras podem surgir em várias áreas, como comércio internacional, direitos humanos, propriedade intelectual, família, direito do trabalho e direito internacional privado. Isso ocorre devido cada país possuir legislação própria e sistemas judiciais próprios, que refletem suas tradições, cultura e valores únicos. Logo, quando essas leis entram em confronto, surgem dilemas sobre qual legislação deve prevalecer.

Assim, importa dizer que os desafios que ocorrem são diversos, podendo gerar incertezas jurídicas, na qual a existência de conflitos entre leis nacionais e estrangeiras cria imprecisão sobre qual lei deve ser aplicada em determinada situação. Pode ocorrer também, um conflito de jurisdição, quando uma questão legal envolve partes de diferentes países, podendo ocorrer disputas sobre qual tribunal tem autoridade para decidir o caso. Outro ponto a ser citado, é a divergência de cultura e de valores, que acarreta embates entre leis nacionais e estrangeiras podendo refletir diferenças culturais e de valores, dificultando a busca de um consenso.

As soluções para esses conflitos de normas são muitas vezes solucionadas através de Tratados e convenções internacionais, no qual a celebração de tratados e convenções entre países podem ajudar a estabelecer regras e princípios comuns para resolver conflitos de leis. A título de exemplo, podemos citar exemplos notáveis com a Convenção de Viena sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias, a Convenção de Haia sobre Aspectos Civis

do Sequestro Internacional de Crianças, as Convenções da Organização do Trabalho -OIT, entre outras. Não obstante, a solução pode se dar também através de escolha da lei aplicável, em alguns casos, as partes envolvidas podem especificar em seus contratos qual lei desejam que seja aplicada em caso de conflito, fornecendo maior previsibilidade. Nesse sentido, a escolha por um tribunal arbitral para dirimir eventuais conflitos é viável, facilitando e tornando mais ágil a solução de conflitos. Entretanto, é de suma importância observar que na legislação brasileira trabalhista, a arbitragem só poderá ocorrer, de acordo com o previsto no art. 507-A da CLT, em que contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996. Logo, caso não seja observado esses requisitos, a cláusula arbitral constante no contrato de trabalho será desconsiderada, tornando nula e prevalecerá tribunal judicial.

Ademais, outra hipótese de solução de conflitos de normas, seria a harmonização legislativa, na qual os países podem buscar a harmonização de suas legislações para minimizar os conflitos. Nesse sentido, podemos citar os esforços visíveis na União Europeia, onde se busca a harmonização de leis em várias áreas para facilitar a integração entre os países-membros. Não obstante, o reconhecimento e respeito mútuo, é também de suma importância, pois o diálogo e a cooperação entre as nações são fundamentais para o reconhecimento e respeito mútuo de suas leis e sistemas jurídicos. Desta forma, através de um entendimento compartilhado, os países podem buscar soluções equitativas para os conflitos.

No contexto jurídico brasileiro, possuímos dois importantes marcos legais que são a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e a lei que dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior, lei nº 7.064/82.

Essas leis são de grande relevância para o ordenamento jurídico e para os trabalhadores envolvidos em relações extraterritoriais.

A LINDB, também conhecida como Lei de Introdução ao Código Civil, é uma norma

jurídica que estabelece diretrizes e princípios fundamentais para a aplicação das leis no Brasil, na qual regulamenta, por exemplo, a aplicação da lei no tempo e no espaço, a interpretação das normas jurídicas e a validade dos atos jurídicos. A LINDB também trata de questões relacionadas ao direito internacional privado, como a determinação da lei aplicável em situações de conflito de leis. Logo, podemos citar o art. 9º da LINDB dispõe que as obrigações serão regidas pela lei do país em que se constituírem, bem como o art. 435 do CC no qual prevê que é considerado celebrado o contrato no lugar em que fora proposto. Vejamos:

LINDB:

Art. 9o Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.

§ 1o Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.

§ 2o A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.

Código Civil

Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.

Alude, conforme acima, o Artigo 9º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) que as obrigações serão regidas pela lei do país em que se constituírem.

Isso significa que, em uma relação jurídica, as regras que regem as obrigações assumidas pelas partes serão determinadas pelas leis do país onde a obrigação foi constituída.

Essa previsão legislativa é de suma importância para garantir segurança jurídica às partes envolvidas, pois estabelece que as normas do país onde a obrigação foi constituída serão aplicáveis na interpretação e execução do contrato. Essa previsão preza por evitar conflitos de leis e proporciona um critério objetivo para determinar qual legislação deve ser aplicada em caso de disputas ou litígios, sendo válida também para o direito do trabalho. No entanto, a aplicabilidade no direito do trabalho deve ser analisada a cada fato isolado, pois se tratando de relação de trabalho, é importante sempre verificar o princípio da norma mais favorável ao trabalhador.

Já no que refere ao artigo 435 do Código Civil estabelece que o contrato é considerado celebrado no lugar em que foi proposto, ou seja, o local onde a proposta foi feita que será considerado o ponto de referência para a formação do contrato. Desta forma, essa previsão legislativa é suma importância e se perfaz em consonância o artigo 9º da LINDB para determinar a competência territorial dos tribunais em casos de litígios contratuais.

É oportuno consignar que esses artigos, tanto o 9º da LINDB quanto o 435 do Código Civil, desempenham um papel indispensável na definição das regras aplicáveis em contratos e na determinação da jurisdição competente. Ao estabelecerem critérios de forma clara, essas normas contribuem para a segurança jurídica e também para previsibilidade nas relações contratuais, proporcionando estabilidade e confiança nas transações comerciais e jurídicas.

Nessa esteira, o artigo 12 da LINDB, também dispõe que será competência da autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação, ou seja, estabelece que as obrigações assumidas no Brasil são regidas pela lei brasileira, independentemente da nacionalidade das partes envolvidas.

Ademais, o Código de Processo Civil em seu capitulo I, estabelece sobre os limites da jurisdição nacional, colaborando também para o saneamento de conflito entre litígios transnacionais. Vejamos

Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que: I - O réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;

  1. - No Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;

  2. - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.

Isto posto, não pode se olvidar, que o inciso I dispõe que o réu, independentemente de sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil, o critério a ser utilizado será a do domicílio do réu, sendo esse o fator determinante para a competência ser do Poder Judiciário brasileiro, ou seja, se o réu possuir domicílio no Brasil, a autoridade judiciária brasileira terá competência para processar e julgar a ação, independentemente da nacionalidade do réu.

Já no inciso II, dispõe que se obrigação tiver que ser cumprida no Brasil, o critério a ser utilizado, será o que refere à competência da autoridade judiciária brasileira quando a obrigação que é objeto da ação deve ser cumprida no Brasil, ou seja, sendo a obrigação decorrente de um contrato ou de qualquer outro fato que demande o cumprimento de uma determinada obrigação em território brasileiro, a autoridade judiciária brasileira será competente para processar e julgar a ação.

Ademais, o inciso III, dispõe que quando o fundamento da ação for fato ocorrido ou ato praticado no Brasil, será estabelecido o critério da autoridade judiciária brasileira, na qual será competente para julgar ações em que o fundamento esteja relacionado a fatos ocorridos ou atos praticados no território brasileiro, ou seja, se a causa de pedir ou o motivo da ação estiverem

ligados a um fato ou ato ocorrido no Brasil, a autoridade judiciária brasileira terá competência para processar e julgar o caso.

É premente que se deixe claro que o Código de Processo Civil, é utilizado de forma subsidiária no âmbito do Direito Trabalhista, sendo uma prática comum e relevante para preencher lacunas e complementar as normas específicas trabalhistas.

O Direito do Trabalho como já verificamos, possui legislação própria, como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e outras normas trabalhistas, que estabelecem regras específicas para as relações de trabalho. No entanto, em algumas situações, essas normas podem não abordar detalhadamente questões relacionadas ao processo judicial trabalhista, deixando algumas lacunas. Nesses casos, o Código de Processo Civil poderá ser aplicado de forma subsidiária para suprir essas lacunas, pois o Código de Processo Civil é uma lei geral na qual estabelece regras e procedimentos aplicáveis aos processos judiciais em geral, abrangendo as diversas áreas do Direito.

A aplicação subsidiária do Código de Processo Civil ao Direito Trabalhista permite uma uniformização dos procedimentos judiciais e contribui para uma maior segurança jurídica. Além disso, o Código de Processo Civil possui princípios e normas processuais que podem ser aplicados de forma adequada ao processo trabalhista, como os princípios do contraditório, da ampla defesa, da isonomia e da celeridade processual.

Cumpre ressaltar que a aplicação de forma subsidiária do Código de Processo Civil não significa uma sobreposição ou substituição das normas trabalhistas, pois as normas trabalhistas

específicas deverão prevalecer sobre as regras do Código de Processo Civil, sempre que ocorrer conflito ou incompatibilidade entre elas.

Outrossim, esclarecido essa conexão do código de processo civil com as normas trabalhista, voltamos à análise das normas que norteiam as soluções dos conflitos de competência entre as normas nacionais e estrangeiras.

Entre as normas que versam sobre competência e jurisdição das normas, não podemos deixar de citar o artigo 651 da CLT, no qual dispõe que a competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.

De acordo com o referido artigo, essa regra procura garantir que as demandas trabalhistas sejam apreciadas pelo órgão judicial competente com base na relação efetiva de trabalho, ou seja, a competência é estabelecida com base na vinculação territorial do empregado ao local onde exerce suas atividades laborais. Isso significa que, mesmo o contrato de trabalho sendo celebrado em outra localidade ou até mesmo no exterior, o fator determinante para a competência será o local onde o empregado de fato executa suas atividades para o empregador. Logo, essa previsão legislativa visa facilitar o acesso à justiça trabalhista, permitindo que o empregado possa buscar seus direitos no local onde efetivamente exerce sua atividade laboral, sem a necessidade de percorrer distâncias significativas ou enfrentar dificuldades adicionais.

Além disso, no Brasil ainda está pleno vigor a lei nº 7.064/1982, na qual estabelece regras e direitos específicos para os trabalhadores brasileiros que são contratados ou transferidos para prestar serviços em outros países. Ela busca garantir a proteção desses trabalhadores, assegurando condições adequadas de trabalho, direitos laborais e prevenção de abusos. Logo, o seu artigo 3º é de suma importância para dirimir eventuais conflitos entre aplicação da legislação brasileira e a legislação estrangeira, vejamos:

Art. 3º - A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços:

  1. - Os direitos previstos nesta Lei;

  2. - A aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em relação a cada matéria.

Á vista do exposto, o referido artigo deixa claro que a empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido tem a obrigação de assegurar-lhe determinados direitos, independentemente da legislação do local onde os serviços serão executados. Nessa seara podemos dizer que esses direitos são os seguintes:

  1. - Os direitos previstos na própria lei: Aqui diz respeito, a empresa ser responsável por garantir ao trabalhador transferido os direitos estabelecidos na Lei específica que regula essa situação. Isso inclui as proteções e condições previstas nessa legislação específica, que visa assegurar direitos básicos e adequadas condições de trabalho para os trabalhadores em expatriação.

  2. - A aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho: Já nesse item, aduz que além disso, a empresa é responsável por aplicar a legislação brasileira de proteção ao trabalho, desde que mais favorável ao trabalhador do que a legislação territorial do local onde os serviços são executados. Isso significa que, mesmo estando em um país estrangeiro, o trabalhador deve receber o benefício da legislação trabalhista brasileira sempre que ela for mais vantajosa do que a legislação local.

Exsurge clara e insofismável que essa disposição busca garantir a proteção dos direitos

trabalhistas dos empregados transferidos para o exterior, assegurando que eles não sejam prejudicados em relação aos direitos previstos na legislação brasileira. Isso é especialmente

importante quando a legislação trabalhista do país estrangeiro oferece menor proteção e garantias aos trabalhadores em relação as normas brasileiras. Não obstante esse artigo está sempre sendo citado em fundamentações dos juízes nacionais nas lides que envolvem conflitos de normas nacionais e estrangeiras.

Nesse sentido, o Artigo 3º da referida lei visa proteger o empregado transferido, assegurando que ele não perca os direitos previstos na lei específica e que possa usufruir das proteções da legislação brasileira, levando em conta mais uma vez o princípio da norma mais favorável em relação a cada matéria, desde que não seja incompatível com o disposto na própria lei de transferência de trabalhadores para o exterior.

Não obstante, por muito tempo o TST manteve consolidado a súmula nº 207 (lex loci executionis), na qual estabelecia que a relação de trabalho seria regida pelas leis vigentes no país onde ocorre a prestação de serviço, e não pelas leis do local da contratação. Essa interpretação perdurou por anos com objetivo garantir que as normas trabalhistas do país onde o trabalho é devidamente executado fossem aplicadas, evitando a extraterritorialidade das leis do local da contratação. No entanto, ela foi cancelada, pois com o processo de globalização da economia e de avanço das empresas brasileiras para novos mercados no exterior, passou a perceber a insuficiência e inadequação do critério normativo inserido na antiga Súmula 207 do TST, para regulação dos fatos congêneres multiplicados nas duas últimas décadas. Nesse contexto, já vinha ajustando sua dinâmica interpretativa, de modo a atenuar o rigor da velha Súmula 207/TST, restringido sua incidência, ao mesmo tempo em que passou a alargar as hipóteses de aplicação das regras da Lei n. 7.064/1982. Logo, com advento da Lei n. 11.962/2009, artigo 1º da Lei n. 7.064/1982, foi alterado, passando a dispor que a Lei 7.064/1982 regula a situação de trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus

empregadores para prestar serviço no exterior, ou seja, a lei brasileira irá regular as relações trabalhistas de trabalhadores contratados no brasil, mesmo que a empresa seja estrangeira.

Portanto, podemos verificar que com aumento da globalização e da interconectividade entre as nações, os conflitos entre leis nacionais e estrangeiras têm se tornado cada vez mais comuns para dirimir esses conflitos. Logo, a legislação brasileira dispõe de diversas normas para dirimir esses conflitos como a Lei 7.064/1982, que dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior, a LINDB – Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, a Consolidação das Leis Trabalhistas -CLT, o Código Civil, o Código de Processo Civil e Constituição Federal.

TELETRABALHO TRANSNACIONAL E SEU DESAFIO MEDIANTE AOS CONFLITOS ENTRE NORMAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS.

O teletrabalho transnacional é uma modalidade de trabalho em que o colaborador realiza suas atividades a distância, mediante utilização de TICS – Tecnologia da Informação e Comunicação, fora do país de origem da empresa ou empregador. Essa modalidade de trabalho tem se tornado cada vez mais comum devido ao avanço da tecnologia e à globalização.

Sobre teletrabalho Cavalcante, enfatiza que:

O teletrabalho é mais uma forma de organização da atividade do empresário do que necessariamente um novo tipo de trabalho, com uma autorregulamentação. Logo, em qualquer das suas modalidades, o teletrabalho poderá ser autônomo ou subordinado (relação de emprego). A caracterização do teletrabalho, como subordinado ou autônomo, depende da análise das condições concretas de execução da prestação dos serviços, constatando-se, pelas suas peculiaridades, se há ou não a presença de controle, direção e fiscalização quanto ao trabalho prestado.

Nesse sentido, podemos verificar que o teletrabalho não se trata de um novo tipo de trabalho, mas sim de uma nova ferramenta de trabalho que possibilita exercer determinado trabalho em qualquer local ou até mesmo em qualquer país, sendo necessário estar apenas conectado a uma tecnologia. Ademais, as características de contrato de trabalho não se alteram, podendo ser tanto autônomo, quanto subordinado.

No entanto, quando se trata de teletrabalho transnacional, é importante considerar as diretrizes estabelecidas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), bem como a legislação trabalhista do Brasil.

A OIT reconhece que o teletrabalho pode oferecer benefícios, como flexibilidade, redução de deslocamentos e melhor equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Entretanto, também destaca a necessidade de proteção dos direitos trabalhistas e a importância de garantir condições adequadas para os trabalhadores.

Na OIT, o teletrabalho, pode se dizer que é normatizado pela Convenção n. 177.201 de 1996, que estabelece os princípios básicos para a regulamentação do trabalho em domicílio, com o objetivo de garantir condições justas e equitativas para os trabalhadores que exercem suas atividades fora do local de trabalho tradicional. Ela aborda questões como remuneração, proteção social, segurança e saúde ocupacional, entre outros aspectos relevantes. E podemos citar também a Recomendação n. 184, na qual complementa a Convenção, fornecendo orientações práticas e recomendações para a implementação das disposições da Convenção. Embora as recomendações da OIT não tenham força legal vinculante, elas servem como orientações para os países membros no desenvolvimento de suas legislações nacionais.

Todavia, impende destacar que o Brasil não ratificou a Convenção n. 177 e a Recomendação n. 184 da OIT, ou seja, esses instrumentos internacionais não têm efeito direto na legislação trabalhista brasileira.

Assim, importa dizer que em eventuais lides sobre trabalhos transnacionais envolvendo o Brasil, ainda não há normas da OIT que forneça auxilio para dirimir essas lides, devendo ser analisado o direito interno e direito internacional privado.

Destarte, que a falta de normas específicas para o teletrabalho transnacional é uma questão relevante no cenário global. Com o avanço da tecnologia e a crescente conectividade, cada vez mais as pessoas estão tendo a oportunidade de trabalhar remotamente para empresas localizadas em outros países. No entanto, essa forma de trabalho apresenta desafios regulatórios, uma vez que as leis trabalhistas tradicionais nem sempre são aptas para lidar com essa nova realidade.

O teletrabalho transnacional envolve os trabalhadores que executam suas atividades em um determinado país, enquanto o empregador ou a empresa está localizada em outro país, podendo ocorrer nessa situação lacunas legais e ambiguidades em relação aos direitos e responsabilidades dos trabalhadores, bem como aos aspectos fiscais e previdenciários.

Uma das principais dificuldades é determinar qual a legislação trabalhista aplicável ao teletrabalho transnacional, pois pode ocorrer da prestação de trabalho envolver até três países diferentes. A maioria das leis trabalhistas é projetada para regular o trabalho em um contexto nacional, levando em consideração a legislação, as normas e os acordos coletivos do país em questão. No entanto, no teletrabalho transnacional, o trabalhador pode estar sujeito a leis de diferentes países, o que cria incertezas sobre seus direitos e proteções. Não obstante, outro desafio é a ausência de um mecanismo eficaz para a resolução de disputas relacionadas ao teletrabalho transnacional. Caso surjam problemas entre o trabalhador e o empregador, pode

ser difícil determinar qual jurisdição tem autoridade para resolver a questão e qual lei deve ser aplicada.

Para enfrentar esses desafios, seria benéfico estabelecer normas internacionais claras e abrangentes para o teletrabalho transnacional. Essas normas poderiam abordar questões como direitos trabalhistas básicos, remuneração, segurança e saúde ocupacional, proteção social e resolução de disputas. Além disso, seria importante promover a cooperação entre os países para garantir uma aplicação efetiva dessas normas e uma coordenação adequada entre as autoridades competentes.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) poderia desempenhar um papel de suma importância na elaboração de diretrizes e recomendações nesse sentido, incentivando os países a adotarem medidas para regulamentar o teletrabalho transnacional e proteger os direitos dos trabalhadores envolvidos. Os esforços colaborativos entre governos, organizações internacionais, sindicatos e empregadores são necessários para enfrentar essa lacuna regulatória e promover condições de trabalho justas e decentes para os teletrabalhadores transnacionais.

No entanto, enquanto isso não ocorre, os operadores de direito, devem se respaldar nas normas internas para dirimir eventuais conflitos de aplicação de normas.

No caso do Brasil, como verificamos, há diversos dispositivos normativos que norteiam a relação de trabalho transnacional, no entanto, os dispositivos não dizem respeito exatamente ao teletrabalho transnacional. Mas filio-me ao entendimento que esses dispositivos, sejam aplicados na relação de teletrabalho transnacional, em que dependendo da situação fática, se o trabalhador for brasileiro, domiciliado no Brasil, contratado no Brasil e labora remotamente para uma empresa estrangeira, a aplicabilidade da legislação será a lei brasileira, devendo levar em consideração o princípio da norma mais favorável.

Nesse sentido, é oportuna a transcrição do artigo 75, b § 8 da Consolidação das Lei Trabalhistas - CLT, que dispõe:

Art. 75-B. Considera-se teletrabalho ou trabalho remoto a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, que, por sua natureza, não configure trabalho externo.

...

§ 8º Ao contrato de trabalho do empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional aplica-se a legislação brasileira, excetuadas as disposições constantes da Lei nº 7.064, de 6 de dezembro de 1982, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.

O dispositivo § 8º exposto acima, estabelece a aplicação da legislação brasileira ao contrato de trabalho de empregado admitido no Brasil, no qual opta por realizar teletrabalho fora do território nacional, excetuando no caso das disposições da Lei nº 7.064/1982, o que nos proporciona uma medida importante para fornecer clareza e segurança jurídica nesse cenário específico.

Essa disposição reconhece que, embora o empregado esteja trabalhando remotamente fora do Brasil, o contrato de trabalho mantém uma conexão com o país de origem, e, portanto, a legislação trabalhista brasileira continua sendo aplicável em grande parte.

A exclusão das disposições da Lei nº 7.064/1982 pode indicar que determinados aspectos relacionados ao teletrabalho transnacional serão regidos pela legislação do país em que o trabalho está sendo realizado. Essa exceção pode ser justificada pelo fato de que essa lei específica pode não ser aplicável fora do território nacional, ou talvez haja legislação mais adequada no país em que trabalha para tratar de algumas questões específicas.

Entretanto, é importante ressaltar que cada caso pode ter suas próprias nuances e

particularidades, sendo necessário o analise de cada fato isolado. Mas, como o próprio artigo

aduz, poderá ainda, ocorrer a existência de uma disposição contrária estipulada entre as partes para alterar a aplicação da legislação. Isso significa que as partes envolvidas podem entrar em acordo referente condições diversas das que estão previstas pela legislação brasileira, desde que estejam de acordo com a lei do país de trabalho, não possuindo caráter absoluto sobre as relações de trabalho.

ANÁLISE DE CASOS PRÁTICOS NOS TRIBUNAIS: ASSIMILANDO OS DESAFIOS E SOLUÇÕES LEGAIS.

A análise de casos práticos a respeito da matéria é de grande relevância para entendimento de como essas normas são utilizadas pelo judiciário. Logo, os julgados recentes norteiam a análise das situações reais e sua aplicação, esclarecendo os conhecimentos teóricos adquiridos nesse artigo. Neste tópico, será apresentado casos práticos jurídicos e as estratégias utilizadas para solucionar os desafios legais em conflitos de aplicação da legislação trabalhista nacional e internacional.

Durante a realização de pesquisa sobre casos práticos jurídicos relacionados a relações

de aplicabilidade de normas de trabalho transnacionais, foi identificado principalmente julgados referentes a trabalhadores de cruzeiros. É oportuno consignar que esses casos específicos fornecem orientações e argumentos para a solução de conflitos entre normas trabalhistas nacionais e internacionais, que podem ser utilizadas em diversas situações de relação de trabalho, não se limitando apenas na relação de trabalho em cruzeiro, ou seja, embora a pesquisa, não tenha encontrado julgados específicos para outros tipos de relações de trabalho, é importante ressaltar que os princípios estabelecidos nesses casos de relação de trabalho em cruzeiros podem ser aplicados e serem norteadores para a resolução de conflitos existente em

diferentes contextos de trabalho. A interpretação das leis e dos precedentes estabelecidos nesses julgados podem fornecer insights valiosos para a compreensão e a aplicação da legislação trabalhista em todas as relações de trabalho.

Ora, face as considerações aduzidas, o caso prático apresentado será o processo nº 0020448-12.2020.5.04.0016, do Poder Judiciário da Justiça Do Trabalho, Tribunal Regional Do Trabalho Da 4ª Região, na 16ª Vara Do Trabalho De Porto Alegre/RS. A sentença proferida pelo magistrado Horismar Carvalho Dias, foi a seguinte:

Fundamentos da decisão:

  1. Preliminares

    1. Documentos em idioma estrangeiro. Tradução Diferente do que aduz a autora na inicial, os documentos em idioma estrangeiro trazidos aos autos devem estar acompanhados de tradução para o idioma nacional. Contudo, entendo que os documentos trazidos pelas rés com a defesa são suficientes ao deslinde do feito, sendo desnecessária a nomeação de tradutor para transcrição dos documentos trazidos. NADA A PROVER.

    2. Inexistência de jurisdição brasileira. Incompetência da Justiça do Trabalho. Legislação aplicável

As rés suscitam a falta de jurisdição da autoridade judiciária brasileira e desta Especializada para conhecer e julgar a presente ação, pois firmados contratos internacionais de trabalho com empresas estrangeiras, sem domicílio em território nacional, bem como a prestação de serviços ocorreu em águas internacionais.

Aduzem que a 1ª ré (MSC Cruise S/A) e a empresa MSC Malta, esta que não integra o polo passivo, não possuem domicílio no Brasil, pois tratam-se de pessoas jurídicas internacionais com sede na Suíça e na República de Malta. Aduzem que a 2ª ré (MSC Cruzeiros do Brasil), embora integre o mesmo grupo econômico da MSC Cruises e MSC Malta, jamais contratou a autora ou se valeu de sua força de trabalho, pois sua atividade se limita ao agenciamento de viagens e passeios turísticos. Dizem, ainda, que os navios mantidos pelas rés ostentam bandeira panamenha, sujeitando-se à MLC (Maritime Labor Convention), convenção internacional editada pela organização internacional do

trabalho e ratificada pelos três países antes citados. Alegam que o art. 651, § 2º, da CLT, estabelece a regra de exceção à jurisdição nacional sempre que houver convenção internacional em sentido contrário, e que o Brasil ratificou a convenção das Nações Unidas sobre o direito do mar, celebrada em 1982, a qual utiliza como critério definidor o país de bandeira do navio, sendo, portanto, a jurisdição exclusiva para resolver a conflitos envolvendo a embarcação e seus tripulantes.

Afirmam que a contratação da autora não ocorreu no Brasil, mas em águas internacionais, pois as agências brasileiras não fazem a intermediação da contratação, mas apenas realizam cursos de capacitação e treinamento para tripulantes, e não possuem nenhuma relação societária com as rés. Dizem que o primeiro contrato entre o candidato e as rés ocorre no navio, sendo este o local da seleção e da contratação. Citam, ainda, termo de ajustamento de conduta firmado pelas rés com o Ministério Público do Trabalho, no qual há ressalva de que, para os trabalhadores contratados em território brasileiro para trabalhar durante a temporada em águas brasileiras, deve ser aplicada a legislação nacional. Alegam, por fim, que o contrato de trabalho da autora é regido por normas internacionais ratificadas e internalizadas pelo Brasil, tais como o código de Bustamante e a convenção das Nações Unidas do direito do Mar.

(...)

Analiso (...)

Nesse contexto, os argumentos das rés não merecem ser acolhidos, ante a previsão dos §§ 2º e 3º, do art. 651, da CLT: “§ 2º - A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento, estabelecida neste artigo, estende-se aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregado seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário.

§ 3º - Em se tratando de empregador que promova realização de atividades fora do lugar do contrato de trabalho, é assegurado ao empregado apresentar reclamação no foro da celebração do contrato ou no da prestação dos respectivos serviços”.

No mais, o art. 3º da Lei nº 7.064/82, que regula a situação de trabalhadores nacionais contratados ou transferidos para trabalhar no exterior, assim estabelece:

“A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços: I - os direitos previstos nesta Lei; II – a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em relação a cada matéria”. Sobre a controvérsia, assim já decidiu o e. Regional:

“EMENTA COMPETÊNCIA TERRITORIAL BRASILEIRA. LEGISLAÇÃO

APLICÁVEL. A Justiça do Trabalho Brasileira é competente para julgar reclamatória movida por empregado brasileiro, contratado no Brasil para trabalhar embarcado em navio estrangeiro de cruzeiro marítimo, conforme dispõe o art. 651, § 2º, da CLT. Ainda, o art. 3º da Lei nº 7.064/82 assegura a aplicação da legislação brasileira ao empregado brasileiro que trabalha no exterior, quando esta for mais favorável ao trabalhador. Recurso ordinário das reclamadas desprovido. GRUPO ECONÔMICO. CRUZEIROS MARÍTIMOS. O autor prestou serviços em benefício do grupo econômico, sendo a primeira ré um braço da armadora italiana, representando os negócios desta em território nacional. Logo, mantém-se a sentença de origem que reconhece a existência de vínculo de emprego entre o autor e a primeira reclamada”. (TRT da 4ª Região, 4ª Turma, 0020850 51.2019.5.04.0203 ROT, em 06/05/2021, Desembargador Andre Reverbel Fernandes) “TRABALHADOR BRASILEIRO DE NAVIO DE CRUZEIRO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM ÁGUAS INTERNACIONAIS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Não obstante a

prestação de serviços tenha ocorrido em navio de cruzeiro, em águas internacionais, considerando que todo o processo seletivo do trabalhador ocorreu em solo brasileiro, é aplicável a legislação brasileira, a teor do disposto no art. 3º da Lei nº7.064/82, que regula a situação de trabalhadores nacionais contratados ou transferidos para trabalhar no exterior”. (TRT da 4ª Região, 4ª Turma, 0020289- 19.2018.5.04.0702 ROT, em 25/06/2021, Desembargador George Achutti).

Cito, ainda, decisão recente do c. TST em caso análogo ao ora analisado: “AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/2017. RECLAMADAS - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL. LABOR EM NAVIO DE CRUZEIRO

INTERNACIONAL. TRABALHO EM ÁGUAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL 1 - As reclamadas insurgem-se apenas em relação ao que foi decidido quanto ao tema "COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL. LABOR EM NAVIO DE CRUZEIRO INTERNACIONAL. TRABALHO EM ÁGUAS NACIONAIS E

INTERNACIONAIS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL", o que configura a aceitação tácita da decisão monocrática, quanto aos demais assuntos examinados. 2 - Na decisão monocrática foi reconhecida a transcendência da causa quanto à matéria objeto do recurso de revista, e negado provimento ao agravo de instrumento. 3 - Os argumentos da parte não conseguem desconstituir os fundamentos da decisão monocrática. 4- No caso, o TRT reputou competente a Justiça do Trabalho brasileira para processar e julgar o presente feito, ao fundamento de que, desde o cancelamento da Súmula 207 do TST, passou a incidir, na hipótese, o disposto na Lei nº 7.064/82. 5 - Registrou ainda que o recrutamento, a contratação e o treinamento se deram no Brasil e parte da prestação de serviços ocorreu em águas territoriais brasileiras. 6 - Do quadro fático delineado pelo TRT, verificou-se que: a) a reclamante é de nacionalidade brasileira;

b) a sua pré contratação ocorreu em território nacional; c) " É incontroverso que a assinatura do segundo contrato de trabalho ocorreu, em 28/11/2014, a bordo do navio de cruzeiro MSC Lirica no porto de Santos, no qual a demandante embarcou para trabalhar como assistente de garçom". e; d) parte da prestação de serviços ocorreu em águas territoriais brasileiras. 7 - O TRT destacou que " embora tal embarcação ostente bandeira do Panamá, o contrato foi assinado em águas brasileiras. Tanto assim o é que, no instrumento respectivo, "São Paulo" é indicado no campo ' Local' ". 8 - E que " no período pré-contratual, a primeira demandada (MSC Cuises S/A, atual denominação de MSC Crociere S/A) praticou atos que inequivocamente revelam a formalização da admissão em momento anterior à assinatura ". 9 - E que " É certo que a primeira demandada não tem domicílio no Brasil e que a segunda demandada (MSC Cruzeiros do Brasil Ltda.), domiciliada no Brasil, é pessoa jurídica distinta. Entretanto, elas expressamente reconhecem que pertencem ao mesmo grupo econômico ". 10 - Nesse contexto, o TRT reputou competente a Justiça do Trabalho brasileira para processar e julgar o presente feito, ao fundamento de que, desde o cancelamento da Súmula 207 do TST, passou a incidir, na hipótese, o disposto na

Lei nº 7.064/82. 11- Registrou ainda que " Não beneficia as demandadas a argumentação sobre a exigência, nos termos da Convenção Internacional do Trabalho Marítimo, de prévia exibição de certificado médico e de capacitação do candidato a tripulante. É que, como já assentado nesta decisão, não foram apenas esses os atos praticados antes da assinatura do contrato a bordo do navio. O embarque da demandante foi precedido da proposta e do aceite do contrato (fl. 396). Assim, mesmo considerada a especificidade dos serviços prestados pela demandante, as legislações internacionais invocadas pelas demandadas não se afiguram mais favoráveis, de sorte que não devem reger o contrato de trabalho em questão ". 12- Com efeito, deve ser mantida a decisão monocrática, pois, consoante nela bem assinalado, a jurisprudência desta Corte Superior, quanto à hipótese de trabalhador brasileiro contratado para desenvolver suas atividades em navios estrangeiros em percursos em águas nacionais e internacionais, é de que, nos termos do art. 3º, II, da Lei nº 7.064/82, aos trabalhadores nacionais contratados no País ou transferidos do País para trabalhar no exterior, aplica-se a legislação brasileira de proteção ao trabalho naquilo que não for incompatível com o diploma normativo especial, quando for mais favorável do que a legislação territorial estrangeira - sendo competente a Justiça do Trabalho para processar e julgar o feito. 13 - Agravo a que se nega provimento" (Ag-AIRR- 1000280-24.2017.5.02.0374, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT30/04/2021) (grifei)

Resta plenamente configurada a jurisdição brasileira, sendo esta Especializada competente para conhecer e julgar a presente ação. É aplicável a legislação brasileira aos contratos de trabalho firmados pela autora, razão pela qual não há falar em tratamento diferenciado ou ausência de isonomia em relação aos demais tripulantes que laboraram com a reclamante. Ressalto, também, que a assinatura de termo de ajustamento de conduta pelas rés não afasta a aplicação da legislação brasileira e a apreciação do poder judiciário, ante o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF/88). REJEITO, assim, as preliminares suscitadas.

Ora, vejamos que a referida sentença expõe o contexto jurídico pertinentes à competência da justiça do trabalho brasileira para o julgamento de uma ação em a parte autora, uma operária, contesta sua relação de trabalho em relação a contrato internacional de trabalho.

As rés, por sua vez, indagam que a Justiça do Trabalho Brasileira, é incompetente, uma vez que não possui jurisdição para julgamento do caso, pois se trata de contrato internacional que foi firmado com empresas estrangeiras e que a prestação de serviço ocorreu em águas internacionais, na qual deve ser regido por tratados internacionais e a jurisdição aplicável é estipulada pelo país de bandeira do navio.

Entretanto, o juiz, observou o texto do artigo 651, §§ 2º e 3º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), no qual estabelecem que a competência das Juntas de Conciliação e Julgamento da Justiça do Trabalho se estende aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o trabalhador seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário. Além disso, o artigo 3º da Lei nº 7.064/82 assegura a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho para trabalhadores brasileiros contratados para trabalhar no exterior, quando mais favorável do que a legislação territorial, note-se que o princípio da norma mais favorável, está embasado tanto na CLT, como na Lei nº 7.064/82.

Corroborando, o magistrado para fundamentar sua decisão, cita decisões proferidas pelos tribunais regionais de trabalho (TRT´s) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), nos quais sustentam a competência da Justiça do Trabalho Brasileira para fatos congêneres, evidenciando a competência da legislação brasileira para proteção do trabalhador brasileiro, mesmo que a prestação de serviço seja no exterior.

Nesse passo, o magistrado com base nas legislações vigentes e seguindo o entendimento os tribunais regionais e superiores, findou que a jurisdição brasileira é indubitavelmente competente para julgar a ação proposta pela autora, sendo mantida essa decisão em instância

superior. Logo, a proteção da lei trabalhista é aplicável ao contrato firmado entre a autora e as rés, rejeitando, as alegações suscitadas pelas reclamadas de incompetência da norma nacional. Assim, importa dizer, que a análise desse caso prático, evidência toda proteção ao trabalhador brasileiro, não afastando a competência da legislação brasileira sobre a relação de Trabalho em casos de trabalhadores brasileiros contratados para prestarem serviços em contextos internacionais, como em navios de cruzeiro ou em demais situações que envolva relações transnacionais. A decisão ressalta a aplicação da legislação brasileira em benefício dos trabalhadores e a jurisdição da Justiça do Trabalho mesmo em situações internacionais,

embasando toda teoria apresentada ao longo desse artigo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A convergência entre a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) do Brasil e a Organização Internacional do Trabalho exprime uma busca ininterrupta por harmonização e equidade no cenário trabalhista global. Os princípios que norteiam o direito trabalhista brasileiro e a OIT enfatizam a importância de proteção aos direitos dos trabalhadores, independente das fronteiras nacionais.

Outro ponto importante, como vimos, é a pejotização trabalhista, um fenômeno corriqueiro nos tribunais trabalhistas brasileiros, mas que abrange também a dimensão internacional. Como podemos analisar, essa prática afeta os direitos humanos dos trabalhadores, levantando preocupações sobre a dignidade, igualdade e segurança no trabalho. Neste contexto, é fundamental entender como a pejotização afeta os direitos humanos dos trabalhadores, gerando implicações na dignidade, na igualdade e na segurança dos indivíduos, bem como os desafios que apresenta para a proteção de direitos fundamentais no ambiente de

trabalho. Ao longo deste trabalho, percebemos como a pejotização pode afetar os direitos trabalhistas, como o acesso a benefícios previdenciários, férias remuneradas e licenças médicas, além de contribuir para a precarização das condições de trabalho. Também verificamos as consequências sociais e econômicas desse fenômeno, destacando a necessidade de uma análise crítica e a busca por soluções que promovam a justiça social e o respeito aos direitos humanos dos trabalhadores. Não obstante, a pejotização é um tema relevante que merece atenção, pois tem implicações diretas nos direitos humanos dos trabalhadores e pode desencadear uma série de desafios para a garantia de uma sociedade mais justa e equitativa.

Já no contexto do Código Bustamante e dos conflitos ocorridos entre leis trabalhistas no espaço internacional, eleva-se o desafio de conciliar diferentes sistemas legais e garantir a justiça para todos os indivíduos. A teoria do Conglobamento Mitigado, manifesta-se com uma abordagem promissora para mitigar tensões e harmonizar interesses diversos em relação aos trabalhadores transnacionais.

A existência de conflitos entre leis nacionais e estrangeiras na esfera trabalhista não é apenas uma realidade, mas também um campo fértil para o desenvolvimento de soluções inovadoras. Os desafios promovem a busca por diretrizes claras e sistemas de resolução de conflitos mais eficazes, onde a cooperação entre as nações se mostra de suma importância para criação de normas que norteiam a relação trabalhista transnacional.

Ademais, com a globalização e evolução tecnológica, o teletrabalho transnacional incorpora uma complexidade aos conflitos entre aplicação das normas nacionais e internacionais. A flexibilidade que o teletrabalho apresenta é contrabalançada pela grande necessidade de abordagens legais sólidas que garantem tantos os direitos como os deveres adequados na relação de trabalho entre empregado e empregador.

Outrossim, a análise de casos práticos nos tribunais apresenta uma visão concreta dos desafios e soluções no cenário do direito do trabalho transnacional. As instâncias judiciais desempenham papel fundamental na adequação de jurisprudências que norteiam os futuros casos e contribui para uma uniformização nas lides trabalhista envolvendo a legislação nacional e internacional.

Assim, importa dizer que os conflitos entre leis nacionais e estrangeiras são complexos que surgem na era da globalização. Enquanto os sistemas jurídicos são moldados pelas tradições e valores de cada país, é fundamental buscar soluções que promovam a segurança jurídica e a justiça nas relações internacionais. Os tratados internacionais, a escolha de leis aplicáveis, a harmonização legislativa e diálogo entre as nações, são algumas das estratégias que podem ajudar a enfrentar esses conflitos e avançar em direção a um sistema legal global mais coeso e colaborativo. Os conflitos entre normas nacionais e estrangeiras são inevitáveis, mas através da cooperação, diálogo e inovação jurídica, é possível avançar em direção a soluções que promovam os direitos dos trabalhadores, a estabilidade econômica e a justiça social em escala global.

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Sobre a autora
Dayane Lange Magalhães

Advogada credenciada pela Ordem dos Advogados do Brasil, sob o nº 459.820, pós graduada em Direito Tributário e pós graduando em Direito Médico e da Saúde e Direito Imobiliário e Mestre em Direito Internacional pela Must University - Flórida USA.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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