AO TRATAR DA REGULARIZAÇÃO de imóveis através da Usucapião (que é um dos mais eficientes "remédios" para essa enfermidade que assola mais de 30 milhões de domicílios no Brasil - https://oglobo.globo.com/patrocinado/dino/noticia/2023/10/23/metade-dos-imoveis-no-brasil-possui-alguma-irregularidade.ghtml) é preciso ter em mente que nossa legislação descortina DIVERSAS ESPÉCIES desse importante instituto.
Os requisitos variam conforme a espécie defendida e, de modo geral, o estudo de todos eles revela uma regra peculiar: quanto maior for a quantidade de requisitos exigidos, menor será o tempo de posse qualificada necessário e o inverso é verdadeiro: quanto maior o tempo de posse qualificada for exigido, menores serão os demais requisitos. Exemplifica com clareza isso a USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA descrita no artigo 1.238 do CCB que inicialmente exige o prazo de posse qualificada de QUINZE ANOS mas também admite seu reconhecimento com prazo de DEZ ANOS:
"Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo".
Nessa modalidade não se exige, por exemplo, nem BOA-FÉ nem JUSTO TÍTULO. São desnecessários. Doutro turno, a USUCAPIÃO RURAL que tem base no artigo 191 da CRFB/88 e também no artigo 1.239 do CCB representa uma MODALIDADE ESPECIAL, adornada com outros requisitos que dificultam o acesso a esse reconhecimento dominial, todavia exigindo um prazo menor, de apenas CINCO ANOS. Reza o citado artigo 1.239 praticamente espelhando a redação do art. 191 da Carta Cidadã:
"Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade".
Como se percebe, conhecer as modalidades é importante, todavia é também muito valioso ter noção de que o PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE na Usucapião pode ser invocado tanto no reconhecimento feito pela tradicional via judicial quanto naquele realizado na via EXTRAJUDICIAL, com base no artigo 216-A da Lei de Registros Publicos, devidamente regulamentado pelo artigo 398 e seguintes do Provimento CNJ 149/2023. A lição é dos ilustres doutrinadores KÜMPEL e FERRARI (Tratado Notarial e Registral. 2020), para quem:
"Nessa seara, a análise do pedido pelo Registrador opera em congruência com a causa de pedir. Noutro dizer, sua QUALIFICAÇÃO deve apurar a coerência lógica entre os fatos e o pedido, de modo a garantir a correta subsunção do fato à norma. Disso decorre que, ainda que o pedido seja de usucapião ordinária, o Oficial, verificando tratar-se de outra modalidade de usucapião, cujos requisitos estejam todos presentes e provados, poderá aproveitar o requerimento, independentemente de aditamento".
A via extrajudicial também admite a regularização de imóveis situados em área rural, como Sítios, Fazendas etc, devendo ser observados os requisitos conforme a espécie de Usucapião que se pretenda reconhecer, nunca olvidando da prudente aplicação do princípio da fungibilidade. A jurisprudência gaúcha é nesse sentido:
"TJRS. 70069313609/RS. J. em: 10/08/2016. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL RURAL. ARTIGOS 191 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E 1239 DO CÓDIGO CIVIL. REQUISITOS PARA O RECONHECIMENTO DA USUCAPIÃO ESPECIAL RURAL NÃO DEMONSTRADOS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA A USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. Em que pese não preenchidos os requisitos para a usucapião especial rural, previstos no artigo 191 da Constituição Federal e 1.239 do Código Civil, porquanto o imóvel mede mais de 75 hectares, a autora demonstra o preenchimento dos requisitos para a usucapião extraordinária prevista no art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil, tendo comprovado a posse sobre os imóveis objetos de litígio, por prazo superior há dez anos, sem interrupção e oposição, e estabelecido nele a sua moradia, razão pela qual impositiva a declaração de domínio. Precedentes da Corte. Manutenção da sentença de procedência que se impõe.NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME".