RESUMO: A averbação da escritura de compra e venda no registro imobiliário é requisito formal para a efetivação do direito de propriedade. Desse modo, a realização de um negócio infere que as partes ajam com honestidade e boa-fé, respeitando o patrimônio e o direito alheio. O Enunciado Sumular nº 375 do STJ preconiza que para configurar fraude à execução, é necessário haver registro da penhora ou, ainda, má-fé do terceiro adquirente. No entanto, o Enunciado Sumular nº 84, também do STJ, confere proteção ao possuidor de boa-fé que tenha adquirido o imóvel, sem, contudo, averbar a compra junto ao registro imobiliário. Dessa forma, o credor que confia na verdade registral para fins de pedir a constrição da penhora sobre o patrimônio do devedor poderá ser surpreendido pela oponibilidade da posse, independentemente, do registro do compromisso de compra e venda. Posto isso, os embargos de terceiro têm como finalidade afastar a apreensão judicial de bens imóveis de quem não seja parte no processo. Nesse sentido, Fabio Caldas de Araújo (2018) aponta os requisitos que subordinam os embargos de terceiro: a) protegem sua posição jurídica (posse ou propriedade); e b) impedem a formação defeituosa e ineficaz da relação processual pela afetação de bem indevido ao processo de conhecimento ou de execução. Nesse contexto, o terceiro de boa-fé pode ajuizar a ação a qualquer momento, desde que não transitada em julgado a sentença do pleito executivo. Isso, porém, não elimina a necessidade eventual de arcar com as despesas processuais e os honorários advocatícios em relação ao princípio da causalidade e ao princípio da sucumbência.
PALAVRAS-CHAVE: Terceiro de boa-fé. Penhora. Embargos de terceiro.
1 INTRODUÇÃO
O terceiro de boa-fé é uma figura jurídica de grande importância no âmbito da proteção da propriedade imóvel, sendo aquele que, de boa-fé, adquire uma propriedade e não registra em seu nome, o que faz com que o ônus recaia sobre o antigo proprietário.
Desse modo, o registro imobiliário é de extrema importância para proteger a propriedade imóvel e garantir a segurança jurídica nas transações imobiliárias. Ou seja, o registro é o meio pelo qual se faz a publicidade da propriedade e das suas limitações, como ônus e gravames, permitindo que terceiros conheçam a real situação jurídica do imóvel.
Nesse sentido, para proteger o terceiro de boa-fé, existe a possibilidade de oposição de embargos de terceiro, que é uma ação judicial que visa cancelar a constrição indevida sobre o bem imóvel adquirido. Com efeito, para que os embargos sejam aceitos, é necessário que o terceiro de boa-fé preencha alguns requisitos, como provar que adquiriu o bem de boa-fé e que não possuía conhecimento sobre a existência da dívida que motivou a constrição judicial.
Portanto, o objetivo deste artigo é demonstrar a posição do terceiro de boa-fé sob a propriedade do bem imóvel, abordando, para isso, a importância do registro imobiliário e os caminhos e requisitos necessários para a oposição de embargos de terceiro e o cancelamento da penhora indevida.
Sendo assim, com este artigo, espera-se contribuir para a compreensão desse tema importante e para a garantia da proteção da propriedade imóvel.
2 PROPRIEDADE IMÓVEL: A IMPORTÂNCIA DO REGISTRO
De acordo com o art. 1.228 do Código Civil, “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha” (BRASIL, 2002, p. 95). Estas faculdades e direitos conferidos ao proprietário são fundamentais para delimitar o escopo do direito de propriedade, pois estabelecem as prerrogativas e as proteções legais ao titular desse direito.
Sobre esses princípios, o doutrinador Gonçalves (1952) traz sua concepção:
"O direito de propriedade é aquele que uma pessoa singular ou coletiva efetivamente exerce numa coisa determinada em regra perpetuamente, de modo normalmente absoluto, sempre exclusivo, e que todas as outras pessoas são obrigadas a respeitar" (GONÇALVES, 1952, p. 186).
Assim, o direito de propriedade é o direito que uma pessoa física ou jurídica possui sobre uma coisa específica, sendo esse caracterizado por alguns predicados fundamentais, que, em primeiro lugar, é exercido de forma efetiva por aquele que o detém. Isso significa que o proprietário possui a capacidade de usar, gozar e dispor da coisa conforme sua vontade, dentro dos limites estabelecidos pela lei. Em segundo, o direito de propriedade é geralmente exercido de maneira perpétua, ou seja, sem um prazo determinado. Dessa forma, confere ao proprietário a possibilidade de usufruir da coisa ao longo do tempo, desde que não haja uma causa legal ou contratual que limite ou extinga esse direito.
Além disso, o direito de propriedade é, em sua essência, um direito absoluto, em que o proprietário possui o controle exclusivo sobre a coisa. Isso implica que outras pessoas estão obrigadas a respeitar esse direito e não podem interferir indevidamente na propriedade.
Por fim, o direito de propriedade é exclusivo, de modo que apenas o titular do direito tem o poder de exercê-lo. Nesse sentido, outras pessoas não podem utilizar a coisa sem a autorização ou consentimento do proprietário, a menos que haja uma permissão legal específica.
Desse modo, essas características destacadas são fundamentais para compreender a natureza e os limites do direito de propriedade, sendo esses princípios básicos que embasam a proteção desse direito no ordenamento jurídico.
Nesse viés, o registro de uma propriedade imóvel é de extrema importância, pois confere segurança jurídica e proteção aos direitos do proprietário. Dessa forma, quando o registro é efetuado, o imóvel passa a ser oficialmente reconhecido como pertencente a uma pessoa ou uma entidade específica e essa informação é devidamente registrada nos órgãos competentes, como o Cartório de Registro de Imóveis.
Atualmente, cabe evidenciar, a transferência da propriedade imóvel se encontra prevista no art. 1.245 do Código Civil de 2002, que diz: “transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no registro de imóveis” (BRASIL, 2002, pp. 96 e 97).
Portanto, o registro de propriedade imóvel é um documento legalmente reconhecido que assegura a autenticidade da propriedade e o seu histórico de transferências.
2.1 Requisitos para a efetivação do direito de propriedade
O direito de propriedade é um dos mais importantes direitos garantidos (Art. 5°, XXIII, CF). De acordo com Monteiro (2000):
"Para a aquisição da propriedade imóvel não basta simples acordo de vontade entre adquirente e transmitente. O contrato de compra e venda, por exemplo, não basta, por si só, para transferir o domínio. Essa transferência somente se opera com a transcrição do título no registro imobiliário" (MONTEIRO, 2000, p. 99).
Diante disso, para que a aquisição da propriedade imóvel seja efetivada, é necessário que alguns requisitos sejam observados. Dentre eles, é possível citar:
- Registro do imóvel: o registro do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis é o primeiro passo para a efetivação do direito de propriedade. É ele que garante a segurança jurídica e a proteção da propriedade contra terceiros.
- Boa-fé do adquirente: para que o terceiro que adquiriu o imóvel de boa-fé possa ser protegido, é necessário que tenha agido com diligência e tomado todas as precauções necessárias para garantir a legalidade da transação.
- Ausência de fraude: é fundamental que a aquisição do imóvel pelo terceiro de boa-fé não tenha sido realizada com o intuito de prejudicar terceiros, por meio de fraude ou má-fé.
- Inexistência de gravames: o imóvel deve estar livre de qualquer ônus ou gravame que possa prejudicar a sua propriedade. Caso contrário, o terceiro de boa-fé pode perder o direito de propriedade, mesmo que tenha agido com diligência e boa-fé na aquisição.
- Cumprimento das obrigações fiscais e tributárias: o proprietário do imóvel deve estar em dia com todas as suas obrigações fiscais e tributárias, como o pagamento do IPTU e a regularização do imóvel perante os órgãos competentes.
Sendo assim, é fundamental que todos esses requisitos sejam observados para que o direito de propriedade seja efetivado e protegido contra terceiros de má-fé ou contra eventuais gravames que possam prejudicar a sua propriedade. Por fim, cabe destacar que o terceiro de boa-fé pode recorrer aos embargos de terceiro para defender o seu direito de propriedade em caso de constrição judicial indevida.
3 PROTEÇÃO AO TERCEIRO DE BOA-FÉ
A boa-fé subjetiva, no âmbito jurídico, refere-se à falta de conhecimento por parte do comprador sobre eventuais defeitos ou problemas na negociação.
Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça emitiu a Súmula 375, com o seguinte teor: "o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da comprovação de má-fé por parte do terceiro adquirente" (BRASIL, 2009).
Desse modo, o reconhecimento de fraude à execução na venda de um bem imóvel pelo devedor só é possível quando o bloqueio judicial foi registrado no registro de propriedade no momento da venda, ou quando há prova de que o adquirente agiu em conluio com o vendedor.
Com isso, o STJ proporcionou estabilidade e segurança jurídica aos contratos firmados com terceiros que agiram de boa-fé durante a celebração do negócio, baseando-se no princípio da boa-fé na interpretação dos negócios jurídicos.
Portanto, se o comprador obteve as devidas certidões pessoais do vendedor e tomou as precauções razoáveis e normais para a transação, ele é considerado um adquirente de boa-fé.
3.1 Enunciado Sumular 84 do STJ e a proteção conferida ao terceiro de boa-fé
A Súmula 84 do STJ diz respeito a questão relacionada à posse e aos direitos do terceiro de boa-fé, em que estabelece que "é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro" (BRASIL, 1993). Assim, o terceiro que adquire um imóvel por meio de um contrato de compra e venda, mesmo que não tenha registrado o contrato no cartório de registro de imóveis, tem o direito de defender sua posse, caso haja uma ação judicial ou processo de execução que envolva esse imóvel. Sobre essa conjuntura, Araújo (2018) aponta que:
"posição atual do STJ reflete a valorização da função social da posse, uma vez que a publicidade registral, muito embora seja essencial para o sistema jurídico, necessita de interpretação coerente com a situação econômica e social de nosso País. Aquele que exerce a posse mansa e pacífica sobre bem adquirido, de modo irretratável, não pode ser prejudicado pela inexistência do registro do seu compromisso de compra e venda. O manejo dos embargos de terceiro será lícito e viável ao possuidor " (ARAÚJO, 2018, p. 27).
Nessa senda, essa proteção conferida ao terceiro de boa-fé busca garantir a segurança jurídica nas transações e evitar prejuízos para pessoas que adquiriram bens de forma legítima, confiando na aparente regularidade da transação. Logo, mesmo que o contrato de compra e venda não tenha sido registrado, o terceiro que agiu de boa-fé e está na posse do imóvel pode opor embargos de terceiro para defender seus direitos.
Por conseguinte, o enunciado sumular 84 estabelece uma salvaguarda para proteger o terceiro de boa-fé que esteja na posse do bem, mesmo sem o registro formal da transferência. Dessa forma, o terceiro de boa-fé pode utilizar os embargos de terceiro como uma ação judicial para proteger a sua posse contra eventuais medidas judiciais que busquem a retomada do imóvel.
Sob essa lógica, é importante ressaltar que a proteção conferida ao terceiro de boa-fé em casos de alienação de bens também está respaldada pelo art. 1.201 do Código Civil “É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa” (BRASIL, 2002, p. 93). Nesse contexto, fica estabelecido que a posse de boa-fé é protegida, garantindo ao possuidor o direito de ser mantido na posse do bem, mesmo que posteriormente se constate algum vício ou irregularidade na transferência de propriedade, no qual o terceiro que adquire um bem de boa-fé, mesmo sem registro, tem o direito de defender sua posse contra eventuais reivindicações de terceiros.
No entanto, a proteção conferida ao terceiro de boa-fé não é absoluta e não significa que a propriedade seja automaticamente transferida. Isto é, caso surja um conflito entre o terceiro de boa-fé e o verdadeiro proprietário, caberá ao Poder Judiciário analisar as circunstâncias do caso e decidir sobre a validade da aquisição e os direitos das partes envolvidas.
Portanto, a proteção conferida ao terceiro de boa-fé busca conciliar a segurança jurídica e a proteção da posse adquirida de forma legítima, a fim de evitar que terceiros sejam prejudicados por atos fraudulentos ou irregulares de outras partes envolvidas na transação de bens imóveis.
3.2 Penhora indevida
A penhora indevida ocorre quando um bem é erroneamente incluído em um processo de execução judicial. Ou seja, quando um bem pertencente a um terceiro é indevidamente apreendido para satisfazer uma dívida ou obrigação de outra pessoa. Assim, com efeito, esse terceiro é denominado "terceiro de boa-fé".
Nesse viés, cabe resgatar que a proteção ao terceiro de boa-fé é um princípio jurídico que visa resguardar os direitos daqueles que adquiriram um bem de boa-fé. Isto é, sem saber que ele estava sujeito a uma penhora ou a alguma restrição judicial. Desse modo, esse princípio busca evitar que pessoas que adquiriram um bem de forma legítima sejam prejudicadas por dívidas ou obrigações de terceiros.
Sobre esse âmbito, o Código de Processo Civil, em seu artigo 805, prevê mecanismos de proteção ao terceiro de boa-fé, no que diz “quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado” (BRASIL, 2015, p. 120) Assim, se um bem penhorado pertencer ao terceiro de boa-fé, esse terceiro pode apresentar sua reclamação ao Juiz, demonstrando que adquiriu o bem de forma legítima e que não tinha conhecimento da existência da penhora. Nesse caso, o Juiz poderá excluir o bem da constrição judicial, resguardando os direitos do terceiro adquirente. Sobre essa questão, Araújo (2018) estabelece que:
A inexistência de registro anterior da ação permite que a fraude seja detectada de modo objetivo pela construção da Súmula 375 do STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. Por meio dela se institui o registro da penhora como fato objetivo para tornar indevida a transmissão do bem ao terceiro, nos termos do art. 792, III, do CPC, após a penhora, muito embora o ato de constrição não gere intransmissibilidade, apenas a indisponibilidade relativa sobre o bem (ARAÚJO, 2018. p. 38).
Portanto, o embargo de terceiro é a ação judicial utilizada pelo terceiro que se considera prejudicado pela penhora indevida, na qual visa obter a declaração judicial de que a penhora é indevida e, consequentemente, a liberação do bem apreendido.
4 EMBARGOS DE TERCEIRO
Embargos de terceiros são uma medida judicial utilizada quando uma pessoa ou empresa afirma possuir direitos sobre determinado bem que foi objeto de penhora ou bloqueio judicial em uma ação de execução ou processo judicial. Assim, os embargos de terceiro, conforme preceitua o artigo 674 do Código de Processo Civil:
Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro (BRASIL, 2015, p. 101).
Assim, fica evidente o seu fito de proteger os direitos de terceiros que possam ser prejudicados pela constrição judicial.
Por conseguinte, quando ocorre a penhora ou o bloqueio de um bem, geralmente, o oficial de justiça ou o sistema bancário responsável pela execução notifica o proprietário ou detentor do bem, que é chamado de terceiro, para que esse possa se manifestar sobre a constrição. Com efeito, se o terceiro alegar que o bem pertence a ele ou que possui algum direito sobre o bem, pode apresentar os embargos de terceiro.
Para tanto, os embargos de terceiro devem ser protocolados no processo em que ocorreu a constrição judicial e devem ser fundamentados juridicamente, por meio da apresentação de provas e documentos que comprovem a posse ou propriedade do terceiro sobre o bem em questão.
Desse modo, uma vez apresentados os embargos de terceiro, o juiz responsável pelo caso analisará as alegações e provas apresentadas. Assim, ele pode, caso entenda pertinente, suspender a penhora ou o bloqueio judicial do bem enquanto o caso é decidido. Ademais, o Juiz também poderá determinar a citação das partes envolvidas para que apresentem suas manifestações sobre os embargos.
Portanto, caso o Juiz acolha os embargos de terceiro, o bem em questão será liberado e não poderá ser utilizado para satisfazer a dívida do processo principal. No entanto, se os embargos forem rejeitados, a penhora ou o bloqueio judicial do bem serão mantidos e o terceiro poderá buscar outras formas de defesa ou reparação, como ação de indenização por danos materiais ou morais.
Sobre esse revés, Cunha (1986) afirma que:
"Objetivo dos embargos de terceiro não é pôr fim à execução, obstar a execução. Antes, excluir da execução o que está no patrimônio de terceiro. O que a penhora atingiu, e que esteja no patrimônio de terceiro deve ser excluído: com a sentença proferida nos embargos a penhora, nessa parte, torna-se ineficaz. A execução prossegue, tendo como objeto aquilo que, no bem penhorado, pertença ao executado" (CUNHA, 1986, p. 228).
Sendo assim, a sentença proferida nos embargos de terceiro e a penhora que recai sobre os bens do terceiro se tornam ineficazes. Ou seja, não produzem mais efeitos e a execução prossegue, mas, agora, tendo como objeto, apenas aquilo que, no bem penhorado, efetivamente pertence ao executado, excluindo-se os bens que foram reconhecidos como propriedade do terceiro embargante. Isso significa que a execução deve prosseguir somente sobre os bens do devedor que foram corretamente penhorados e não sobre os bens do terceiro.
4.1 Requisitos que subordinam os embargos de terceiro e sua importância para proteger a posição jurídica do terceiro de boa-fé
Os embargos de terceiro são uma ação judicial que permite que uma pessoa, denominada terceiro, conteste a constrição de um bem de sua propriedade ou posse, em decorrência de uma penhora que envolva o patrimônio de outra pessoa. Essa medida é importante para proteger a posição jurídica do terceiro de boa-fé, que pode ter seus direitos afetados de forma indevida.
Nesse sentido, para propor a ação de embargos de terceiro, basta uma ameaça real, que demonstre a possibilidade de ser utilizada em situação de prevenção ou repressão. Sobre esse prisma, Araújo (2018) afirma os requisitos que:
"os embargos de terceiro acomodam-se como procedimento especial por meio do qual o terceiro exerce duas funções importantes: (a) protege sua posição jurídica (posse ou propriedade); (b) impede a formação defeituosa e ineficaz da relação processual pela afetação de bem indevido ao processo de conhecimento ou de execução" (ARAÚJO, 2018, p. 02).
Diante disso, os embargos de terceiro permitem que um terceiro que possui a posse ou propriedade de um bem conteste a constrição desse bem no processo de conhecimento ou de execução. Essa medida é fundamental para proteger a posição jurídica do terceiro, assegurando que esse não seja prejudicado indevidamente pela constrição judicial.
Desse modo, o terceiro pode buscas, por meio dos embargos, comprovar sua relação jurídica com o bem e alegar que sua posse ou propriedade não deve ser afetada pelo processo em questão. Com efeito, ele pode salvaguardar seus direitos sobre o bem, evitando, assim, sua perda ou alienação.
Outrossim, os embargos de terceiro também têm o propósito de evitar a formação de uma relação processual defeituosa ou ineficaz, na qual um bem indevido é afetado ao processo de conhecimento ou de execução. Ou seja, quando um bem que pertence a um terceiro é erroneamente incluído no processo, os embargos de terceiro proporcionam um meio para contestar essa inclusão e garantir que a relação processual se desenvolva de maneira correta e eficaz. Desse modo, ao exercer esse papel, o terceiro busca impedir que seus bens sejam equivocadamente envolvidos em disputas judiciais que não lhe dizem respeito.
Sendo assim, é inegável o quanto esses requisitos são essenciais para garantir a proteção dos direitos do terceiro de boa-fé, uma vez que eles visam evitar que terceiros sejam prejudicados indevidamente por medidas judiciais que afetem seu patrimônio, quando não possuem qualquer relação com o processo principal. Dessa forma, ao estabelecer tais requisitos, busca-se equilibrar a necessidade de efetividade das decisões judiciais com a proteção dos direitos individuais dos terceiros envolvidos.
5 INTERPOSIÇÃO DOS EMBARGOS
O terceiro interessado em apresentar os embargos deve ter legitimidade para fazê-lo. Isso significa que deve ser o verdadeiro titular do bem ou direito que está sendo afetado pela ação judicial. Além disso, o terceiro não pode ser uma parte envolvida no processo, ou seja, não pode ser o próprio autor ou réu da ação.
Nesse contexto, a interposição dos embargos de terceiro é um instituto jurídico que permite que uma pessoa (terceiro) que não é parte em um processo judicial apresente um recurso para proteger seus bens ou direitos que possam ser afetados pela decisão judicial.
Assim, conforme já mencionado, essa medida é especialmente importante em processos de execução, em que a justiça determina o pagamento de uma dívida por meio da penhora de bens do devedor. Nesse cenário, um terceiro que alega ser o verdadeiro proprietário do bem penhorado pode interpor os embargos de terceiro para reivindicar seus direitos sobre esse bem e afastar a penhora.
Ademais, cabe salientar que a interposição dos embargos de terceiro deve ser feita no mesmo tribunal ou vara em que tramita o processo principal, visto que, “nos termos do art. 676 do CPC/15, é competente para o processamento dos embargos de terceiro o mesmo juízo que ordenou a constrição judicial, pois se trata de regra de competência funcional [...]” (SILVA e CASTILHO 2020, p. 104).
Por conseguinte, no contexto da competência eventual do Juízo Deprecado, quando a penhora do imóvel é realizada por meio de carta precatória, é importante observar o que diz o artigo 676 do Código de Processo Civil (CPC), especialmente, seu parágrafo único. Veja:
Art. 676. Os embargos serão distribuídos por dependência ao juízo que ordenou a constrição e autuados em apartado.
Parágrafo único. Nos casos de ato de constrição realizado por carta, os embargos serão oferecidos no juízo deprecado, salvo se indicado pelo juízo deprecante o bem constrito ou se já devolvida a carta (BRASIL, 2015, p. 101).
Esse artigo estabelece as regras para a penhora de bens imóveis. Assim, quando a penhora recair sobre imóvel situado em comarca diversa daquela onde tramita o processo, a carta precatória será expedida.
Nesse viés, cabe elucidar que a carta precatória é um instrumento pelo qual o juízo onde tramita o processo emite uma ordem ao juízo da comarca onde o imóvel está localizado, para que esse proceda à penhora e os demais atos necessários.
Outrossim, torna-se imperativo pontuar que a competência para processar e julgar os embargos de terceiro, nesse caso, normalmente, será do juízo onde tramita o processo principal. Isto é, o juízo deprecante, e não do juízo deprecado (comarca onde o imóvel está situado). Essa decisão ocorre, porque os embargos de terceiro estão diretamente relacionados ao processo principal e à constrição realizada. Assim, mesmo que a penhora do imóvel tenha sido realizada por meio de carta precatória, a competência para julgar os embargos de terceiro será do juízo que emitiu a carta precatória, ou seja, o juízo deprecante.
No entanto, se a ordem de penhora partir do próprio juízo deprecado, este será o competente para julgar os embargos.
Diante disso, se a decisão de penhora do imóvel em questão for tomada pelo juízo que recebeu a comunicação da penhora (juízo deprecado), qualquer questionamento ou recurso contra essa penhora deve ser apresentado no próprio juízo deprecado, e não no juízo que solicitou a penhora (juízo deprecante).
Para tanto, o procedimento envolve a apresentação de uma petição fundamentada, na qual o terceiro demonstra suas razões e provas de que o bem ou direito em questão lhe pertence e não ao executado, para fins de contestar a constrição sobre seus bens ou direitos.
Além disso, a interposição dos embargos de terceiro possui efeito suspensivo, na qual a decisão judicial que determinou a constrição dos bens fica temporariamente suspensa até que o Tribunal julgue os embargos. Isso ocorre para evitar que os interesses do terceiro sejam prejudicados antes de uma análise mais aprofundada da situação.
Portanto, uma vez apresentados os embargos de terceiro, o juiz responsável pelo processo deverá analisar os argumentos e as provas apresentadas pelo terceiro e decidir se aceita ou não o pedido. Caso os embargos sejam julgados procedentes, a constrição sobre os bens do terceiro é afastada e seus direitos são protegidos. Todavia, se os embargos forem rejeitados, a constrição sobre os bens prossegue e o terceiro ainda pode buscar outras medidas judiciais, caso se sinta prejudicado.
5.1 Prazo para propositura dos embargos de terceiro
Os embargos de terceiro são uma medida utilizada por terceiros que possuem bens ou direitos ameaçados de constrição judicial para defender seus interesses.
De acordo com o artigo 675 do CPC (2015), existem dois momentos distintos para contagem do prazo para opor os embargos de terceiro, sendo esses: a) No processo de conhecimento, ou seja, antes de iniciar a fase de cumprimento de sentença, uma vez que os embargos podem ser opostos a qualquer momento antes do trânsito em julgado da sentença e b) Após o trânsito em julgado, na fase de cumprimento de sentença ou processo de execução, em que os embargos devem ser opostos dentro de até 5 dias após a adjudicação, alienação por iniciativa particular ou arrematação, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta.
Nessa esteira, é importante destacar que a carta mencionada é um documento emitido pelo cartório após a assinatura do auto de adjudicação, alienação ou arrematação de bens imóveis. Isso significa que para bens móveis, seria expedida a ordem de entrega do bem.
Além disso, há uma exceção para a contagem do prazo em casos de fraude à execução, em que o terceiro adquirente tem um prazo de 15 dias para opor os embargos a partir da sua intimação. Desse modo, caso a carta de arrematação seja assinada antes dos 5 dias após a alienação judicial, a propositura dos embargos de terceiro será considerada extemporânea, ou seja, fora do prazo legal. Nessa situação, o terceiro interessado terá que utilizar outras vias, como propor uma ação autônoma para defender seus direitos.
Assim, quando o terceiro não tem ciência do ato que possibilitou a arrematação, a adjudicação ou a remição, Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2015) afirmam que não havia como ter o conhecimento necessário para ajuizar a medida. Por isso, a jurisprudência tem admitido que, nesses casos, o prazo passe a ser contado da data da efetiva turbação ou do efetivo esbulho – ou seja, da ciência concreta do ato de constrição judicial-, não obstante seja outra data da arrematação, da adjudicação ou da remição (ARENHART E MITIDIERO, 2015, p. 220).
Nesse sentido, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. PRAZO PARA OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO. TERMO INICIAL. DATA DO CONHECIMENTO DO ATO DE TURBAÇÃO. 1. Conforme jurisprudência pacífica desta Corte, o prazo para a oposição de Embargos de Terceiro é contado da data em que se configurou a turbação da posse. 2. Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 419697 SC 2002/0029278-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 26/02/2008, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 04/03/2009).
Desse modo, essa abordagem visa garantir que o terceiro tenha tempo razoável para exercer sua defesa, quando não teve conhecimento prévio da medida que possibilitou a alienação ou constrição do bem. Com isso, o prazo para ajuizar os embargos passa a contar da ciência efetiva do ato de constrição, mesmo que a data da arrematação, adjudicação ou remição seja anterior.
Portanto, é fundamental estar atento aos prazos legais para garantir o uso efetivo dos embargos de terceiro como meio de defesa de bens e direitos em processos judiciais.
6 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Os honorários advocatícios, em geral, são a remuneração ou o pagamento de serviços considerados imateriais e nobres, prestados por profissionais de certas profissões liberais. No contexto específico da advocacia, os honorários advocatícios se referem à contraprestação pelo exercício profissional do advogado, remunerando o conhecimento e o trabalho dedicado em favor da pessoa que o contrata para defender seus interesses e direitos.
Segundo Cahali (1997), existem três correntes doutrinárias:
"A primeira admitia a condenação ao ressarcimento das despesas processuais somente nos casos de culpa extracontratual; a segunda defendia a aplicação do princípio da sucumbência, devendo ser responsabilizado pelo ressarcimento das despesas processuais o vencido; a terceira posição, por sua vez, defendia o caráter punitivo da condenação ao pagamento das despesas processuais, sendo desenvolvida a partir do pressuposto da culpa extracontratual e, em alguns casos, da culpa contratual" (CAHALI, 1997, p. 47).
No sistema jurídico brasileiro, os honorários podem ser de duas formas:
- Honorários Contratuais: são a remuneração paga pelo cliente em virtude dos serviços intelectuais prestados pelo advogado. Esses honorários decorrem do contrato firmado entre o advogado e o cliente e são fixados de comum acordo entre as partes. Nesse caso, a remuneração do advogado é devida independentemente do resultado da atuação na demanda.
- Honorários de Sucumbência: são uma retribuição paga ao advogado em virtude da vitória na demanda. Quando a parte contratante do advogado obtém sucesso na ação judicial, a parte vencida é obrigada a pagar os honorários de sucumbência ao advogado da parte vencedora. Esses honorários estão diretamente ligados ao resultado da atuação do advogado e são fixados pelo juiz, geralmente, com base em parâmetros previstos em lei.
Portanto, enquanto os primeiros estão relacionados principalmente à atuação jurídica em si, os segundos estão vinculados ao resultado da atuação, sendo pagos apenas em caso de êxito na demanda e estabelecidos pelo juiz. Essa dualidade busca garantir a remuneração adequada ao advogado pelo seu trabalho, incentivando a qualidade dos serviços prestados e, ao mesmo tempo, protegendo as partes de pagar honorários em casos de insucesso na demanda.
Nesse âmbito, no caso dos embargos de terceiro, os honorários advocatícios são as despesas legais referentes aos serviços prestados pelo advogado que representa o terceiro embargante. Assim, quando o terceiro embargante contrata um advogado para representá-lo na ação de embargos de terceiro, é comum que haja a fixação de honorários advocatícios referentes aos serviços prestados pelo profissional. Esses honorários serão devidos pelo próprio terceiro embargante, que contratou o advogado, e não pelas partes envolvidas no processo principal.
Ademais, cabe mencionar que a quantia dos honorários advocatícios nos embargos de terceiro pode variar de acordo com diversos fatores, como a complexidade da causa, o tempo dedicado pelo advogado, a região em que o processo está sendo conduzido e a experiência do profissional. Desse modo, esses honorários podem ser fixados de comum acordo entre o advogado e o cliente (o terceiro embargante), ou ainda, em alguns casos, podem ser determinados pelo juiz responsável pelo processo.
Por fim, além dos honorários advocatícios, o terceiro embargante também pode ser responsável por outras despesas processuais, como custas judiciais e eventuais despesas com peritos, quando necessários para o desenrolar do processo.
6.1 Responsabilidade pelos ônus sucumbenciais
A responsabilidade pelos ônus sucumbenciais em litígios civis é de extrema relevância, principalmente, quando se trata dos embargos de terceiro. Nesse contexto, é fundamental compreender como os princípios da sucumbência e da causalidade orientam a atribuição dos custos e das despesas relacionadas aos processos judiciais.
Nesse viés, o princípio da sucumbência estabelece, essencialmente, que a parte que sai derrotada no processo deve arcar com os custos e as despesas relacionadas a essa derrota. No entanto, a complexidade surge em situações específicas em que um terceiro, o embargante, toma medidas para proteger um bem, como um imóvel, sem estar ciente de que esse bem pertence a outra parte, o embargado. Isso pode acontecer devido à existência de falhas na transferência adequada do bem para o nome do comprador.
Nesses casos, quando o embargado opta por não se opor aos embargos, reconhecendo a validade do pedido do embargante, surge uma importante questão: quem deve arcar com os custos e as despesas resultantes desses embargos? Se seguíssemos estritamente o princípio da sucumbência, o embargado seria responsabilizado por essas despesas, uma vez que os embargos seriam considerados procedentes.
O princípio da sucumbência no artigo 85 do Código de Processo Civil (2015) determina que a parte vencida em uma ação deve arcar com as despesas e os honorários advocatícios da parte vencedora. Isso tem o objetivo de incentivar a litigação responsável, desencorajando ações judiciais frívolas ou sem fundamentos, uma vez que quem perder a ação será responsável pelos custos do processo e pela defesa da parte vencedora.
Assim, a jurisprudência, como exemplificada pelo Tribunal de Justiça do Paraná, tem reforçado esse princípio, estabelecendo que a parte que não resistiu à pretensão e não contestou adequadamente não pode pleitear a inversão do ônus de sucumbência:
"APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. ÔNUS SUCUMBENCIAL. FRAÇÃO IDEAL PENHORADA. IMÓVEL INDIVISÍVEL E BEM DE FAMÍLIA. LEVANTAMENTO DA CONSTRIÇÃO. RESISTÊNCIA DO EMBARGADO. PRINCÍPIO DA SUCUMBÊNCIA. MINORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARBITRAMENTO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. NÃO ACOLHIMENTO. TEMA 1076 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO." (TJPR - 13ª Câmara Cível - 0023853-82.2021.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR FABIO ANDRE SANTOS MUNIZ - J. 04.08.2023).
Além disso, a jurisprudência e a doutrina jurídica também têm adotado uma interpretação que leva em consideração o princípio da causalidade. Isso significa que a responsabilidade pelos ônus sucumbenciais deve recair sobre o próprio embargante, pois a necessidade de apresentar os embargos surgiu devido à omissão do embargante em transferir o imóvel para seu nome de maneira adequada e oportuna.
Essa interpretação encontra respaldo em um julgamento repetitivo do Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme o RESP 1452840/SP, que estabeleceu:
"Embargos de terceiro – Bem de família - Posterior desistência da penhora pelo embargado – Reconhecimento jurídico do pedido - Insubsistência da penhora - Verbas sucumbenciais - Imposição ao embargado - Princípios da sucumbência e da causalidade - Súmula 303 do STJ – Precedentes. Recurso provido." (TJ-SP - AC: 10121127720198260564 SP 1012112-77.2019.8.26.0564, Relator: Henrique Rodriguero Clavisio, Data de Julgamento: 18/02/2020, 18ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 20/02/2020).
Desse modo, a aplicação do princípio da causalidade implica que o embargado não pode, após concordar com a penhora e renunciar à contestação anterior, posteriormente, contestar o mesmo assunto, uma vez que isso seria contrário ao princípio da causalidade. Logo, para que os embargos sejam válidos, é necessário que o embargado tenha se oposto à pretensão de proteção da posse sobre o imóvel no passado, de modo que o pedido feito pelo embargante tenha uma base jurídica para contestação.
Nesse sentido, o princípio da causalidade nos embargos de terceiro exige que o terceiro embargante demonstre uma relação de causa e efeito entre o ato judicial contestado e seu interesse legítimo na propriedade ou posse dos bens objeto da constrição judicial. Além disso, os honorários advocatícios nos embargos de terceiro podem ser influenciados por esse princípio, a fim de atribuir os ônus da demanda à parte que deu causa ao processo.
Diante disso, o Tribunal de Justiça do Paraná já se manifestou:
"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. CONSTRIÇÃO SOBRE O VEÍCULO DA EMBARGANTE, CUJO REGISTRO, ENTRETANTO, CONSTA EM NOME DA PARTE EXECUTADA NA DEMANDA DE ORIGEM. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CONDENAÇÃO DA EMBARGANTE AO PAGAMENTO DAS DESPESAS E CUSTAS PROCESSUAIS, BEM COMO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, POR FORÇA DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. INSURGÊNCIA. PLEITO DE INVERSÃO DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. EMBARGANTE QUE DEIXOU DE PROMOVER A TRANSFERÊNCIA DO VEÍCULO. AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA À PRETENSÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. SÚMULA 303 DO STJ. ORIENTAÇÃO DO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N.º 1.452.840/SP. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM VALOR FIXO, NA FORMA DO § 8º DO ART. 85 DO CPC/15. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO." (TJPR - 4ª Câmara Cível - 0021038-59.2020.8.16.0030 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR HAMILTON RAFAEL MARINS SCHWARTZ - J. 02.03.2022).
Nesse viés, a Súmula 303 do STJ reforça esse princípio ao estabelecer: "Em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios" (BRASIL, 2019). Portanto, o princípio da causalidade visa responsabilizar a parte que provocou a necessidade dos embargos de terceiros pelos custos e as despesas decorrentes do processo, considerando que a constrição judicial indevida não teria ocorrido se a parte tivesse devidamente registrado o bem em seu nome.
Portanto, a responsabilidade pelos ônus sucumbenciais em embargos de terceiro é uma questão complexa, mas os princípios da sucumbência e da causalidade são aplicados para garantir que aquele que deu causa à constrição indevida seja responsabilizado pelos custos e pelas despesas do processo. Esses princípios promovem uma litigação mais consciente e justa, equilibrando os ônus entre as partes envolvidas.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo abordou de forma abrangente e analítica a figura do terceiro de boa-fé no contexto da proteção da propriedade imóvel e dos embargos de terceiro. Com isso, foi possível constatar a relevância e a complexidade desse tema no âmbito do direito civil, bem como, sua influência nas relações jurídicas que envolvem bens imóveis.
Ademais, cabe salientar que a proteção da propriedade imóvel é um princípio basilar do ordenamento jurídico, que visa assegurar a estabilidade das relações patrimoniais e a confiança nas transações imobiliárias.
Assim, os embargos de terceiro, por sua vez, surgem como um instrumento processual destinado a salvaguardar os direitos do terceiro que sofre constrição judicial sobre bem de sua propriedade ou posse. Nessa esteira, através desse meio, o terceiro busca afastar a constrição indevida, demonstrando seu vínculo legítimo com o bem.
Portanto, é essencial que o Poder Judiciário atue de forma equilibrada e coerente ao decidir casos que envolvam a proteção da propriedade imóvel e os embargos de terceiro, considerando as particularidades de cada situação e os princípios que regem o sistema jurídico.
Sendo assim, a proteção da propriedade imóvel e os embargos de terceiro desafiam o jurista a buscar soluções que conciliem os interesses do terceiro de boa-fé, a segurança jurídica e a integridade do sistema registral. Logo, a interpretação adequada das normas e a análise detalhada das circunstâncias fáticas são elementos cruciais para alcançar essa harmonia.
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BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 84. Disponível em: https://www.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2009_6_capSumula84.pdf. Acesso em: 29 jun 2023.
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