Sou Usufrutuária, o dono do imóvel morreu e moro lá há quinze anos. Tenho direito de pedir Usucapião desse imóvel?

20/02/2024 às 12:48
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COMO JÁ VIMOS AQUI diversas vezes, o êxito da demanda que visa o reconhecimento da Usucapião e, consequentemente, a aquisição do bem imóvel ocupado está intimamente ligado ao preenchimento dos requisitos exigidos em Lei para a modalidade escolhida pelo interessado. Diante das diversas espécies de Usucapião autorizadas pela Legislação brasileira se mostra muito importante a consulta ao Advogado Especialista para que avalie diante do caso concreto qual será(ão) a (s) alternativa (s) que mais favoreça (m) os interesses do seu cliente.

Via de regra a matriz que autoriza a aquisição de imóveis via Usucapião exigirá a POSSE qualificada (com ânimo de dono) exercida pelo TEMPO necessário sobre COISA suscetível de ser adquirida por Usucapião (já que, bom recordar, não são todos os imóveis que podem ser adquiridos por Usucapião). Dessa forma, fica claro compreender desde já que de nada adiantará exercer a posse qualificada pelo tempo necessário sobre bem que não está sujeito à usucapião (como os bens públicos), nem adiantará também exercer a posse qualificada sobre coisa hábil à usucapião mas por tempo insuficiente e nem tampouco o exercício da posse desqualificada sobre coisa hábil pelo tempo necessário ou mesmo por mais tempo que o necessário.

Não são todas as posses que frutificarão a USUCAPIÃO: para que a posse seja válida para a Usucapião ela precisa revestir o ânimo de dono (e também deve ser ininterrupta e incontestada, pelo menos durante o lapso exigido em Lei para sua perfectibilização). Sobre o "ânimo de dono", é preciso exteriorizar os sinais que identificam o ocupante como dono. O espírito de dono. Na clássica lição do mestre CAIO MARIO (Instituições de Direito Civil. Direitos Reais. 2017) temos que:

"(...) 'posse ad usucapionem' é aquela que se exerce com INTENÇÃO DE DONO – 'cum animo domini'. Este requisito psíquico de tal maneira se integra na posse, que adquire TÔNUS DE ESSENCIALIDADE. De início, afasta-se a mera detenção, pois, conforme visto acima não se confunde ela com a posse, uma vez que lhe falta a vontade de tê-la. E exclui, igualmente, toda posse que não se faça acompanhar da intenção de ter a coisa para si – 'animus rem sibi habendi', como por exemplo a posse direta do locatário, do usufrutuário, do credor pignoratício, que, tendo embora o 'ius possidendi', que os habilita a invocar os interditos para defesa de sua situação de possuidores contra terceiros e até contra o possuidor indireto (proprietário), não têm nem podem ter a faculdade de usucapir".

Como explica o saudoso e notável civilista não é mesmo qualquer posse que poderá conduzir à aquisição pela Usucapião. Salvo nos casos onde se admitir o fenômeno da INTERVERSÃO DA POSSE (como também já explicamos em outras passagens) a posse se manterá com as mesmas características que lhe obstaculizam a usucapião - tal como ocorre na posse que tem o locatário, o comodatário e também aquele que exerce a posse direta do bem como USUFRUTUÁRIO, que como também já vimos, é um direito real sobre coisa alheia.

Nem mesmo na hipótese de falecimento do nu-proprietário haverá a extinção do usufruto, como acontece no caso da morte do usufrutuário (inc. I do art. 1.410 do CCB). A jurisprudência gaúcha confirma a lição doutrinária com acerto, impedindo Usucapião pelo Usufrutuário:

"TJRS. 70077365377/RS. J. em: 18/10/2018. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO. AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. POSSE DECORRENTE DE USUFRUTO. A usucapião especial urbana submete-se aos requisitos previstos nos arts. 183 da Constituição federal e art. 1.240 do Código Civil. Para adquirir-se o bem por usucapião não basta a fluência do prazo estabelecido em lei. É necessário que a posse sobre o bem usucapiendo seja exercida com o ânimo de dono, ou seja, posse qualificada de modo contínuo, mansa e pacífica. Posse sem ânimo de dono, posse decorrente de usufruto, não induz à usucapião; a morte do nu-proprietário não tem o condão de extinguir o usufruto, o que ocorrerá somente com a morte da autora/usufrutuária. A posse exercida pela autora, que no caso em comento, não pode ser tida por ad usucapionem, por revestir-se do jus possidendi, considerando a sua condição, de usufrutuária. Sentença confirmada. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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