A morte rasteja entre os homens: a discussão sobre a interrupção voluntária da vida humana em fase intrauterina

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Que o Brasil esteja em tempos de polarização, não é novidade para ninguém. Entretanto, que isso possibilite a qualquer nacional exercer funções legislativas, executivas ou judiciárias sem que para elas esteja devidamente preparado, é inadmissível.

Os Poderes da República Federativa do Brasil devem cumprir, cada qual, com a sua função específica, e compete aos membros que os compõem, estarem alinhados em suas ideias, propostas e decisões. Atos normativos, cartilhas, instrumentos de orientação advindos de Comissões, Secretarias ou Ministérios, devem estar alinhavados com o Chefe do Poder em questão, para que se promova a unidade e o bem comum de todos os brasileiros. Quando não, há o avanço da polarização, crescem as especulações e questiona-se a autoridade e a capacidade de quem fora constituído como representante, e, quem mais sofre é a sociedade civil, o povo brasileiro.

Nesse sentido, se há veracidade nos discursos e decisões dos Chefes dos Poderes, e estamos certos de que há, não pode haver divergências nos discursos daqueles que os representam. Dada a incongruência, faz-se mister que a autoridade se pronuncie e esclareça, a fim de que se evidencie a unidade e o diálogo para o bem da nação.

Questiona-se: até quando pessoas comuns poderão ascender aos altos cargos da sociedade civil e neles ocasionarem um “rombo” incorrigível onde, claramente, escolhe-se pela morte à vida, pelo bem de um em detrimento do outro, pelo respeito e cumprimento do direito de um em substituição ao direito de outro?

Responde-se: títulos acadêmicos ou influência política não devem ser decisivos para a investidura em cargos políticos, mas, somados às experiências profissionais, considerar-se-ão os estudos científicos. Se forem contrários às ciências, que sejam destituídos e substituídos, sem exclusão de possíveis penalizações quando necessárias. Ademais, não são favoráveis os discursos dos Chefes dos Poderes em defesa da vida? Toma-se, por exemplo, as campanhas eleitorais em que os presidenciáveis expuseram as suas propostas e, nitidamente, expressiva foi a posição favorável à vida.

É imprescindível ressaltar o valor e a primazia da vida e da dignidade da pessoa humana, bem como a igualdade de direitos a todos os brasileiros, natos ou naturalizados, em todas as fases de vida, sobretudo a de maior vulnerabilidade: a etapa intrauterina.

Esclarece-se: são indiscutíveis os horrores narrados pela história: as injustiças da escravidão, as malícias do colonialismo, a inferioridade da mulher, a desumanidade do holocausto, as diversas formas de discriminação, preconceito e racismo, além da ausência da prescrição dos direitos inalienáveis e imprescritíveis trazidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948).

Não obstante, o aborto provocado não passa de um retrocesso à história cruel e horrenda, onde uns sobrepuseram interesses particulares à frente dos direitos dos outros com o argumento de estarem promovendo o bem, o respeito, a equidade e a justiça, enquanto, na verdade, apenas uns poucos restam beneficiados.

Em tempos de tamanho avanço social, político, tecnológico e jurídico, sem contar o crescente desempenho das ciências biológicas e biomédicas, ainda há o pensamento de que a vida humana se inicia semanas após identificada a gestação ou, até mesmo, após o nascimento, ignorando todos os contrapontos oferecidos pela genética e a embriologia que estabelecem o princípio da vida humana a partir da fecundação.

Em síntese, a ciência explica que através da união do gameta masculino e do gameta feminino, dá-se origem ao zigoto e, a partir de então, todo um processo próprio se desenvolve até chegar ao estágio de embrião, feto, criança, adolescente, adulto e idoso, ou seja, o que se inicia no útero, tem o seu término com a morte natural, se respeitado o processo biológico do ser humano.

Sem interrupções ou pequenas mortes, ocorre o processo natural próprio do ser uno, indivisível e diferente dos genitores (pelo DNA próprio de cada ser humano) que, em fase de desenvolvimento, carece do espaço cedido pela gestante para cumprir o seu curso natural, mas, dela não depende enquanto qualificação de ser, visto que todo o seu processo celular se desenvolverá naturalmente por si mesmo como ser humano, cujo resultado (nascimento) perceber-se-á um ser humano, assim gerado desde a concepção.

Sendo assim, qualquer intervenção voluntária que impeça o desenvolvimento natural da vida gestada, em qualquer lapso temporal da gravidez, configura um desrespeito ao direito à vida e, consequentemente, a homicídio (CP/41, art. 121). Esta é a verdadeira designação de “aborto”, com todos os seus penduricalhos: “aborto legal”, “marco temporal para abortar”, “direito da mãe”, “liberdade da mulher”, “saúde pública”... o que conceitua o aborto voluntário é: HOMICÍDIO.

Não há outra explicação aceitável que expresse o que se realiza na prática abortiva, senão a morte de um embrião humano que, se fosse respeitado o direito à vida, nasceria humano como qualquer outro ser humano, da mesma natureza daquele que o quer assassinar em fase intrauterina.

Uma nação que não admite tortura, tratamento desumano ou degradante (CF/88, art. 5º, III), pena de morte (CF/88, art. 5º, XLVII, a), para adultos, será regida por uma lei que permite a morte de crianças em fase intrauterina?

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O que se requer com a legalização do aborto? R. Múltiplas são as respostas: uma sociedade cada vez mais sexualizada, crianças precocemente inseridas na vida sexual; comércio sexual facilitado, visto que como consequência de uma “gravidez indesejada”, toma-se o aborto por resolução; a prevalência das ideologias e apoio à confusão mental em detrimento da “educação sexual” nas escolas e a orientação do planejamento familiar; a indústria do prazer sem o mínimo de responsabilidade; enfim, a liberdade mal interpretada onde se prevê, permite e suporta quaisquer comportamentos em favor da “felicidade pessoal”. Isso é, evidentemente, RETÓRICA de quem sabe o que é o bem e o mal, o que contribui para o crescimento pessoal ou o que lhe degrada, o que faz evoluir ou paralisar a sociedade civil.

Por fim, faz-se necessário e cada vez mais imprescindível o apoio da sociedade civil às ações, iniciativas e movimentos a favor da família, da vida, da dignidade da pessoa humana e do bem comum. Sem baderna, desrespeito ou violência, mas, com precisão e objetividade de vontade. O sentido e o valor da vida humana podem não ser mais óbvios, mas é crucial demonstrá-los e defendê-los, para que o ser humano se torne ainda mais “humano”.

REFERÊNCIAS (utilizadas por base para a construção do pensamento, embora não citadas diretamente):

ASSEMBLEIA GERAL DA ONU (1948). Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos

BICUDO, Hélio Pereira. Direitos Humanos e sua proteção. São Paulo: FTD, 1997.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Vade Mecum Saraiva. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.

BRASIL. Código Penal. Vade Mecum Saraiva. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.

FERNANDES, André Gonçalves. Livre para nascer: o aborto e a lei do embrião humano. São Paulo: Vide Editorial, 2018.

JOÃO PAULO II. Carta Encíclica Evangelium Vitae. Vaticano. 25 mar 1995. Disponível em: https://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_25031995_evangelium-vitae.html#_ftn95.

SANTOS, Lília Nunes dos. Aborto: a atual discussão sobre a descriminalização do aborto no contexto de efetivação dos Direitos Humanos. Curitiba: Juruá, 2016.

Sobre o autor
Flávio Wender Meireles Paladino

Graduado em Filosofia pela Universidade Católica de Petrópolis. Graduando em Teologia pela mesma Universidade. Formação acadêmica incompleta em Direito, pela Universidade do Grande Rio..

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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