"Dispensa Discriminatória no Ambiente de Trabalho"

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A dispensa discriminatória é um ato injusto e desqualificante que resulta na demissão de um funcionário com base em características pessoais, como raça, gênero, religião, entre outros, que não estão relacionadas ao seu desempenho profissional. Nesse contexto, o artigo visa explorar a natureza e implicações legais da dispensa discriminatória, destacando as proteções oferecidas pela legislação trabalhista brasileira, incluindo a Constituição Federal e a CLT. Além disso, discute-se a Lei 9.029/1995, que proíbe práticas discriminatórias nas relações de trabalho, e a Súmula 443 do TST, que aborda a dispensa de empregados portadores de doenças graves. Por fim, examina as controvérsias e os desafios jurídicos associados à aplicação dessas leis e súmulas, oferecendo uma visão abrangente sobre o tema.

 

Introdução:

 

A dispensa discriminatória representa um desafio significativo nas relações de trabalho, caracterizando-se pela demissão de um funcionário com base em características pessoais desvinculadas da sua capacidade ou desempenho profissional. Este artigo explora os aspectos fundamentais da dispensa discriminatória, delineando seus contornos legais e implicações no cenário jurídico brasileiro.

 

Decerto, em consonância com os princípios constitucionais que regem a República Federativa do Brasil, a discriminação no ambiente de trabalho é inequivocamente rejeitada. O valor social do trabalho, aliado à dignidade da pessoa humana, impõe a proibição da dispensa discriminatória, conforme preceituado nos artigos 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, I e XLI, 6º, 7º, I, XXX e XXXI, 170, III, VIII e 193, da Constituição Federal.

 

Ademais, a legislação brasileira, incluindo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Lei 9.029/1995, estabelece diretrizes claras para coibir práticas discriminatórias no ambiente de trabalho. A Lei 9.029/95, em particular, proíbe explicitamente a adoção de práticas discriminatórias nas relações de trabalho e prevê penalidades para as empresas que as adotam.

 

Como resultado, a dispensa discriminatória no Brasil configura uma violação grave dos direitos do trabalhador, conforme estabelecido na Lei 9.029/1995.[1] Na sua ocorrência o empregado tem direito a reparação por danos morais, reintegração com ressarcimento integral do período afastado e percepção em dobro da remuneração durante o afastamento.

 

Não se pode olvidar que a discussão sobre a dispensa discriminatória se estende também à questão da saúde dos empregados. A Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) presume como discriminatória a demissão de empregados portadores de doenças graves, como o vírus HIV, que suscitem estigma ou preconceito. Contudo, a constitucionalidade dessa súmula tem sido questionada, especialmente em relação ao princípio do devido processo legal.

 

Diante desse contexto, este artigo se propõe a examinar detalhadamente os aspectos legais, os desafios e as controvérsias envolvendo a dispensa discriminatória no Brasil, oferecendo uma análise abrangente e atualizada sobre o tema.


 Em primeiro plano, é oportuno firmar que a dispensa discriminatória se caracteriza pela demissão do funcionário de empresa baseado em aspectos que não se relacionam com o seu desempenho profissional e, sim, sob o fundamento de estigmas ou preconceitos. Deste modo, a dispensa discriminatória é motivada por questões que nada se relacionam com o desempenho profissional.

 

Nesses termos, a discriminação é tratamento desigual por motivo desqualificante e injusto. É aquela que se funda em característica pessoal do empregado que, aos olhos do empregador [por intolerância ou preconceito], o tornaria impróprio para o exercício de sua função.[2]

 

Em suma, a dispensa discriminatória relaciona-se com uma circunstância em que um funcionário é dispensado com base em características pessoais ou atributos que podem incluir raça, cor, gênero, religião, origem nacional, idade, deficiência, orientação sexual, entre outras.[3]

 

A Consolidação das Leis do Trabalho [CLT] e a Constituição Federal estabelecem diretrizes importantes nesse sentido. Além disso, a legislação trabalhista aborda a questão através de lei específica.

 

Importante frisar que um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil é o valor social do trabalho, que, aliado aos pilares da dignidade da pessoa humana, da não discriminação e da função social da empresa (artigos 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, I e XLI, 6º, 7º, I, XXX e XXXI, 170, III, VIII e 193, da Constituição), proíbem a dispensa discriminatória.

 

Segundo Carlos Henrique Bezerra Leite, a dispensa discriminatória configura hipótese cujo o fundamento repousa na Lei 9.029/1995. Senão vejamos:[4]

 

Art. 1 º  É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7o da Constituição Federal. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)

 

Ipsis verbis, a Lei 9.029/95 proíbe a adoção de práticas discriminatórias nas relações jurídicas de trabalho e estabelece penalidades para aquelas empresas que adotem práticas discriminatórias.

 

Segundo o autor, o empregado faz jus, no rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, a reparação pelo dano moral, a reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento.[5]

 

Por outro norte, segundo a  melhor doutrina, o combate às práticas discriminatórias nas relações de trabalho pode ser direta, pela adoção de disposições que estabeleçam distinções baseadas em juízo crítico proibidos e, indireta, relacionada com situações, regulamentações ou práticas aparentemente neutras, mas que, na realidade, criam desigualdades em relação a pessoas que têm as mesmas características.[6]

 

Não se pode olvidar que o empregador tem o poder de dispensar seus funcionários quando lhe aprouver. É uma das prerrogativas que o risco do negócio lhe traz. Entretanto, não pode agir de maneira a discriminar trabalhadores.[7]

 

Ademais, tem sido cada vez mais corriqueiro questionamentos quanto à dispensa discriminatória de funcionários portadores de doenças graves.[8]

 

É importante frisar que o TST editou Súmula sobre o tema:[9]

 

Súmula 443-TST: Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.

 

Nos termos da Súmula nº 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), presume-se discriminatória toda dispensa sem justa causa de empregado que possua algum tipo de enfermidade grave ou que seja pessoa vivendo com HIV, uma vez tomada ciência desta enfermidade pela empresa.

 

Outrossim, importe trazer a lume que a Súmula 443-TST teve sua constitucionalidade questionada, visto que para parte da doutrina a referida súmula era usada de maneira genérica, ignorando, dessa forma, o princípio constitucional do devido processo legal [ADPF 648].[10]

 

Em contraste, a min. Cármen Lúcia, em seu voto, ao discutir a legalidade do tema, destacou que a edição da Súmula 443 do TST pacificou a matéria sobre dispensa de empregado com doença grave que implique em estigma ou preconceito.[11]

 

Decerto, a súmula 443 do TST considera discriminatória a despedida de empregado portador doença grave que suscite estigma ou preconceito, o que retira do empregador o poder potestativo de dispensa, ou seja, caberá a ele comprovar que a dispensa se deu por qualquer motivo que não a doença existente (de ordem disciplinar ou econômico).[12]

 

Conclusão: Entendendo os Desafios e Compromissos na Dispensa Discriminatória

 

A discussão em torno da dispensa discriminatória é complexa e crucial para garantir a equidade e a justiça nas relações de trabalho, obrigando os operadores do direito a um mergulho nos aspectos legais e nas implicações dessa prática no contexto jurídico brasileiro.

 

Nesses termos, ao examinar as disposições da Constituição Federal, da CLT e da Lei 9.029/1995, fica evidente que a discriminação no ambiente de trabalho é inaceitável e sujeita a penalidades. A legislação brasileira estabelece diretrizes claras para coibir práticas discriminatórias, protegendo os direitos fundamentais dos trabalhadores.

 

A Súmula 443 do TST, que presume como discriminatória a demissão de empregados portadores de doenças graves, tem sido alvo de debates quanto à sua constitucionalidade. No entanto, sua aplicação tem sido fundamental para proteger os trabalhadores vulneráveis e combater estigmas e preconceitos no ambiente de trabalho.

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Não obstante, é crucial reconhecer que o poder de dispensa do empregador não é absoluto e deve ser exercido de maneira justa e ética. A reintegração no emprego e a reparação por danos morais são medidas essenciais para corrigir as injustiças decorrentes da dispensa discriminatória.

 

Em suma, destaca-se a importância da proteção dos direitos dos trabalhadores e o compromisso com a igualdade e a justiça no ambiente de trabalho. Ao compreender esses desafios e compromissos, podemos avançar na construção de um ambiente laboral mais justo e inclusivo para todos.


Referências:

Oliveira, Douglas Romero Souza de Oliveira, Nascimento & Peixoto Advogados Associados. Artigos. Disponível em: https://nascimentopeixotoadvogados.com.br/artigos. Acesso em: 06/02/2024.

[1] Leite, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2023.

[2] SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 524, de 2021. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), [acrescente uma breve descrição do conteúdo do projeto, se desejar]. Disponível em: https://abrir.link/JZqcW. Acesso em: [31.01.2024].

[3] ARRAES & CENTENO. Dispensa Discriminatória: O que é e como evitar? Disponível em: https://abrir.link/qhBdv. Acesso em: [01.02.2024].

[4] Leite, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2023.

[5] Idem;

[6] Leite, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.

[7] TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO (TRT3). Justiça do Trabalho reconhece dispensa discriminatória de trabalhador diagnosticado com alcoolismo. Disponível em: https://portal.trt3.jus.br/internet/conheca-o-trt/comunicacao/noticias-juridicas/justica-do-trabalho-reconhece-dispensa-discriminatoria-de-trabalhador-diagnosticado-com-alcoolismo. Acesso em: [01.02.2024].

[8] MIGALHAS. Dispensa discriminatória - Súmula 443 do TST. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/347855/dispensa-discriminatoria--sumula-443-do-tst. Acesso em: [01.02.2024].

[9] COAD. Súmulas e Enunciados. Disponível em: https://www.coad.com.br/busca/detalhe_16/2436/Sumulas_e_enunciados. Acesso em: [06.02.2024].

[10] AMATRA1. STF afirma não caber ADPF para decisões sobre dispensa discriminatória. Disponível em: https://www.amatra1.org.br/noticias/?stf-afirma-nao-caber-adpf-para-decisoes-sobre-dispensa-discriminatoria. Acesso em: [01.02.2024].

[11] AMATRA1. Voto de Carmen Lúcia sobre a Súmula TST. Disponível em: https://www.amatra1.org.br/wp-content/uploads/2021/06/voto-carmen-lucia-sumula-tst.pdf. Acesso em: [01.02.2024].

[12] MIGALHAS. Dispensa discriminatória - Súmula 443 do TST. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/347855/dispensa-discriminatoria--sumula-443-do-tst>. Acesso em: [01.02.2024].

Sobre os autores
David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto

Advogado. Sócio do Escritório Nascimento & Peixoto Advogados Associados. Bacharel em Direito e pós-graduado em Ciências Criminais. Atualmente cursando extensão em Processo Administrativo e bacharelado em Ciências Econômicas. Membro da Comissão de Ciências Criminais na Ordem dos Advogados do Distrito Federal. Começou sua atuação no mundo jurídico junto às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal, atuando nos ramos do direito penal, penal militar e direito civil e família. Atuou como assessor jurídico junto ao Núcleo de Atendimento de Brasília da Defensoria Pública do Distrito Federal. Além disso, tem notória atuação em casos que envolvem fraudes bancárias e também no combate a golpes aplicados no mercado financeiro. Advogado atuante em fraudes bancárias, telefone e WhatsApp (61) 99426-7511.  [email protected]

Douglas Romero Souza de Oliveira

Advogado, Graduado pelo Centro Universitário do Distrito Federal [UDF]; Pós-Graduado em Direito Constitucional; Advogado atuante no Escritório Nascimento & Peixoto Advogados Associados, [email protected], telefone e WhatsApp (61) 9.8419-6767.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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