Atribuição da nacionalidade brasileira originária ao nascido no exterior conforme emenda constiticunal nº 54/2007

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RESUMO

O artigo ressalta a importância da aplicação do estudo da nacionalidade, vez que é conhecida a elevação do número de brasileiros que saem do país e quando do seu retorno à pátria, com seus descendentes, filhos estes nascidos no exterior, se deparam com a necessidade de registro em solo brasileiro daquele nascimento lavrado por autoridade consular ou estrangeira, a fim de garantir aos mesmos direitos em igualdade aos nacionais. Tal registro é feito perante Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais, através do procedimento de Traslado de Nascimento, no qual devemos estar atentos às disposições da Emenda Constitucional nº 54/2007. O objetivo desta pesquisa é sanar quaisquer dúvidas supervenientes para proceder à lavratura do assento no conhecido livro E, com segurança, autenticidade, eficácia, e com indicação expressa, se for o caso, de tratar-se de brasileiro nato, para produção de efeitos jurídicos no território brasileiro. Dessa forma, contextualizaremos o estudo no tempo e no espaço, com utilização de uma ampla pesquisa bibliográfica, embasamento na doutrina, legislação constitucional e infraconstitucional, com o intuito de que sejam delimitados quais pressupostos deverão ser preenchidos para a atribuição da nacionalidade brasileira originária, ou sua condicionante ao processo de Opção pela Nacionalidade Brasileira, sendo o registro consular brasileiro documento hábil para atender a tais pressupostos.

Palavras-chave: Nacionalidade. Opção. Consulado.

1 INTRODUÇÃO

O mundo vivencia hoje um enorme fluxo de cidadãos saindo do seu país de origem, para ingressar em outro, ora de passagem por período curto, ora com intuito de fixar residência, estudar, trabalhar, buscar novos sonhos, novas oportunidades, entre outros tantos motivos que poderíamos elencar, bem como formar suas famílias, fora do território nacional, advindo filhos. Tais filhos, nascidos no exterior, seriam brasileiros ou não? Teriam direitos iguais aos nascidos no Brasil? Várias dúvidas surgem quanto ao fato jurídico nascimento, ainda mais se nascido no exterior e filho de brasileiro. Assim, impõe-se relevante aprofundar os estudos quanto à necessidade ou não de pedido de Opção pela Nacionalidade Brasileira, perante a Justiça Federal, bem como requisitos que devem ser preenchidos por filho de brasileiro nascido no exterior, bem como a aplicação da Emenda Constitucional nº 54/2007.

Salienta-se que muitos problemas poderão surgir quando do retorno ao Brasil, e necessitarem a proteção do Estado. Será que terão os direitos garantidos como nacionais? No entanto, nos deparamos ainda com a questão dos documentos grafados em língua estrangeira. Como tais documentos terão validade em nosso país? E se lavrado em Consulado Brasileiro é o mesmo procedimento? São muitas perguntas que ao longo desta pesquisa iremos resolvê-las.

Ressalta-se, a necessidade de que o documento que comprova tal nascimento submeta-se ao procedimento de Traslado de Assento de Nascimento, perante Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais, a fim de atribuir a nacionalidade brasileira originária ao mesmo, se for o caso, e produzir efeitos jurídicos.

Para tanto, deve-se estudar o registro consular brasileiro e sua diferenciação ao registro de autoridade estrangeira competente, bem como investigar o tipo de nacionalidade concedida aos filhos de brasileiros nascidos no exterior, e identificar os brasileiros abrangidos pela Emenda Constitucional nº 54/2007.

Mais ainda, analisar normas com vigência em âmbito nacional, tornando efetivo o seu cumprimento pelos oficiais de registro, na concretização dos direitos e garantias constitucionais e na dignidade da pessoa humana.

Verifica-se também, sanar dúvidas quanto à necessidade ou não de pedido de Opção pela Nacionalidade Brasileira, perante a Justiça Federal, bem como requisitos que devem ser preenchidos por filho de brasileiro nascido no exterior.

Na sequencia, perceberemos o quanto é importante e presente em nossas vidas o nascimento e a emigração, sendo de extrema importância estudar profundamente sobre o assunto, podendo servir de subsídio aos oficiais de registro e até juízes federais ao se depararem com caso concreto, tendo que decidir se procede ou não o traslado do assento, se defere ou não o pedido, respectivamente.

2 NACIONALIDADE BRASILEIRA

Conforme ensina, Novelino (2008, p. 381), “A nacionalidade é um vínculo jurídico-político entre o Estado e o indivíduo que faz deste um componente do povo.”. Ou seja, nacionalidade diz com a naturalidade do indivíduo, sua origem, cidadão, pertencente a uma nação, sobre a qual possuidor de direitos e deveres.

Tal nacionalidade pode advir em decorrência do sangue que carrega em seu corpo (direito pela ascendência, isto é, filho de) ou pela sua origem (ou seja, vinculado ao solo/ território do nascimento).

Cada país, de maneira soberana, possui o seu critério a fim de determinar quem pertence à sua nação. (Portela, 2014, p.294)

Ao Estado brasileiro interessa o que acontece com seu povo, a sua soberania e a ordem política, no sentido de garantir o bem comum do povo situado dentro do seu território.

Lenza (2019) esclarece que há dois tipos de nacionalidade:

  1. Primária ou originária: decorre em razão do nascimento, involuntária, imposta pelo Estado no momento do nascimento, unilateral, independe da vontade do indivíduo. Para tanto, há critérios sanguíneos (nacionalidade dos pais, a fim de se manter o vínculo com os descendentes), territoriais (local de nascimento) ou mistos (O Brasil adota este sistema).

  2. Secundária ou adquirida: adquirida por ato de vontade do indivíduo, voluntária, depois do nascimento, tendo como exemplo a naturalização.

A Constituição da República do Brasil (BRASIL, 1988), delimita em seu dispositivo legal, art. 12, quais as hipóteses de nacionalidade originária (refere-se ao brasileiro nato) e secundária, quais sejam:

Art. 12. São brasileiros:

I - natos:

a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país;

b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil;

c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira;         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 54, de 2007)

II - naturalizados:

Assim, nossa Constituição da República com redação dada pela EC 54/2007, adota em seu art. 12, I:

- a: critério territorial (ius solis, território do nascimento);

- b: critério sanguíneo nas alíneas (ius sanguinis + serviço do Brasil);

-c(primeira parte): ius sanguinis + registro;

-c(segunda parte): ius sanguinis + opção confirmativa.

Ou seja, a opção confirmativa trata-se de nacionalidade potestativa, com caráter personalíssimo, vez que a aquisição depende da exclusiva vontade do filho, depois de atingida a maioridade, a qualquer tempo, completa Novelino (2008) e Lenza (2019).

Escolhendo em não fazer a opção, permanece com a nacionalidade estrangeira para todos os efeitos legais, se for reconhecido dessa forma pelo país de sua origem.

Esclarecemos que a Emenda Constitucional nº54/2007, estabeleceu a possibilidade de aquisição da nacionalidade brasileira originária pelo simples requisito de registro na repartição brasileira competente (Consulado, Embaixada).

Caso os pais não façam o registro do filho nessa repartição, o pedido de Opção pela Nacionalidade Brasileira só poderá ocorrer após atingida a maioridade e desde que o indivíduo venha a residir no Brasil, mediante processo judicial, perante a Justiça Federal. Neste último caso, a pessoa abre mão de eventual outra nacionalidade (do território onde nasceu) pela brasileira.

No Brasil ainda há vedação a qualquer tipo de distinção entre brasileiros natos e naturalizados. Porém há diferenciações em hipóteses taxativas previstas na nossa Constituição Federal, (BRASIL, 1988), como por exemplo, cargos privativos de brasileiros natos, e a extradição, uma vez que o brasileiro nato nunca poderá ser extraditado, já o naturalizado poderá em duas situações.

Em síntese, são duas as situações, de reconhecimento da nacionalidade originária aos filhos de brasileiros nascidos no exterior (Portal Consular do Ministério das Relações Exteriores, acesso em 17.7.2020):

  1. Tendo sido registrado em repartição brasileira competente (Consulado ou Embaixada), sendo suficiente esse ato para o reconhecimento da nacionalidade originária.

O assento de nascimento lavrado no exterior por agente consular possui a mesma eficácia jurídica daqueles formalizados no Brasil por oficiais do registro civil das pessoas naturais, não havendo necessidade de qualquer opção; gozando plenamente dos direitos inerentes ao brasileiro nato.

Para tanto, deverá proceder ao Traslado de Assento de Nascimento, no Livro

E, no 1º Ofício de Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca do domicílio do interessado, ou no Distrito Federal (caso não resida no Brasil), para produzir efeitos no território brasileiro, garantindo direitos decorrentes da cidadania.

  1. Não tendo sido registrado em repartição consular, venha a residir no Brasil e opte pela nacionalidade depois de atingida a maioridade.

Porém, também procede- se ao traslado, mas mediante apresentação do documento legal, devidamente legalizado ou apostilado, emitido por autoridade estrangeira, conforme o caso, traduzido por tradutor registrado perante a Junta Comercial do seu Estado.

Tal traslado é lavrado no Livro E, o qual aguardará sentença judicial de deferimento pelo pedido de opção pela nacionalidade brasileira, que deverá ser averbado à margem de tal assento.

A Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, (Decreto-Lei nº 4.657/1942) esclarece:

Art. 18. Tratando-se de brasileiros, são competentes as autoridades consulares brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de Registro Civil e de tabelionato, inclusive o registro de nascimento e de óbito dos filhos de brasileiro ou brasileira nascido no país da sede do Consulado.    

Destaca-se, que os nascidos no exterior e registrados perante autoridade local (e não registrados em repartição consular brasileira), ou que não tenham providenciado a transcrição da certidão estrangeira de nascimento em cartório competente no Brasil, são considerados estrangeiros pelas autoridades nacionais, ficando desprotegidos, não tendo acesso aos serviços consulares.

Atenção terá que se ter, ainda, acerca da vedação legal à duplicidade de registros de nascimento, bem como com a possibilidade de o registro ter sido lavrado por autoridade estrangeira ser traduzido e transcrito em livro próprio no Consulado/Embaixada brasileira.

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Tal situação poderá ser observado com leitura atenta do próprio registro, que traz as informações pertinentes ao Livro no qual o ato foi registrado.

3 ESTUDO DE CASO CONCRETO

Andréia Roberta nascida na Espanha, no ano de 2000, filha de pai Oldemar e mãe Lodi, ambos brasileiros, teve seu nascimento registrado no Consulado da Embaixada Brasileira em Madri, local de residência de seus pais na época, vinda a residir em Santo Ângelo-RS, neste ano de 2020.

Em suma, a certidão de nascimento foi submetida ao processo de Traslado com subsequente registro no L ºE, com aplicação do art. 12, I, “c” da Constituição Federal de 1988 e Resolução nº 155, do Conselho Nacional de Justiça, publicada em 2012. Foi necessário adequação do registro com averbação da observação de tratar-se de brasileira nata, para todos os efeitos legais.

Independentemente de residir no Brasil ou de optar pela nacionalidade brasileira, sendo desnecessário provimento jurisdicional para este desiderato, bastando a apresentação do registro consular.

Esmiuçando a situação, verifica-se que sendo sua residência o município de Santo Ângelo-RS, tal informação é de extrema importância apenas para fixação do critério territorial para lavratura do traslado, uma vez que não havendo residência no Brasil, o procedimento poderá ser realizado, no entanto deverá tramitar junto ao 1º Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais do Distrito Federal, nos termos do art. 32, parágrafo 1º da Lei nº 6015/73.

Constatamos que o fato de a certidão ser expedida por entidade consular brasileira, é instrumento suficiente para o reconhecimento da nacionalidade brasileira à postulante Andréia Roberta, com aptidão para averbação da condição de brasileira nata, incorporando-se ao seu patrimônio jurídico.

Orienta ainda, a Resolução nº 155/2012, do Conselho Nacional de Justiça, que o Oficial de Registro Civil deverá efetuar o traslado das certidões assentos de nascimento, casamento e óbito de brasileiros ocorridos em país estrangeiro,ainda que o requerente relate a eventual necessidade de retificação de seu conteúdo.

Prevê ainda, que os nascidos no exterior entre 07 de junho de 1994 e 21 de setembro de 2007, cujos registros de nascimento consular apresentarem, no campo “observação”, as condições de residência no Brasil e opção de nacionalidade para a confirmação da nacionalidade brasileira, poderão, com base no artigo 12 da referida Resolução, requerer junto ao cartório de registro a retirada, para tornar sem efeito tais informações e expressões como registro provisório, não devendo prevalecer diante do disposto no art. 12, I, c e artigo 95 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição da República.

Deverá ser averbado pelo registrador civil, de ofício ou a requerimento da pessoa interessada ou de seu procurador, para que em tal ato seja declarada a registrada Andréia Roberta é brasileira nata.

4 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 03/1994 (07/06/1994) E EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 54/2017 (20/09/2007)

Impõe-se tecer alguns esclarecimentos, ainda que de forma resumida, acerca das modificações a que se submeteu o regramento acerca da nacionalidade no plano constitucional. A redação original do art. 12, I, “c”, da CRFB/88, dentre outras hipóteses, atribuía a condição de brasileiro nato ao filho de pai ou mãe brasileira nascido no exterior, desde que “registrado em repartição brasileira competente”.

Tal requisito constituía condição suficiente para o reconhecimento da nacionalidade, sendo desnecessária a sua opção ao atingir a maioridade. Contudo, por exigência do direito registral (art. 32 da Lei nº 6015/73), o interessado deveria promover a transcrição de Registro de Nascimento no Cartório do 1º Ofício de Registro Civil, providência que asseguraria a produção de efeitos no território nacional ao ato consular.

A partir de 07/06/1994 com o advento da Emenda Revisional de Revisão nº 03, restou afastado a possibilidade de se conferir nacionalidade originária as pessoas nascidas no estrangeiro mediante simples registro em Consulado Brasileiro no exterior, necessitando residência no Brasil e opção pela nacionalidade brasileira depois de atingida a maioridade (em virtude do caráter personalíssimo).

Tal alteração promoveu inequívoco retrocesso nas regras do direito de nacionalidade, visto que, além de suprimir forma de obtenção da nacionalidade originária já consagrada nas constituições anteriores, passou a exigir a fixação da residência e a realização da opção para obtenção da nacionalidade, tornando apátrida o filho de brasileiro residente em país que apenas reconhece o “jus sanguinis” como forma de aquisição da nacionalidade.

A questão somente foi corrigida com o advento da Emenda Constitucional nº 54 de 20/09/2007, que promoveu nova alteração no art. 12, I, “c” da CRFB/88, resgatando a possibilidade de aquisição da nacionalidade originária mediante registro em “repartição brasileira competente”.

A Emenda Constitucional nº 54/2007 acrescentou ainda, o art. 95 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, analisa Loureiro, (2016, p. 299), permitindo o registro em repartição diplomática ou consular dos nascidos no estrangeiro entre 07/06/94 e 20/09/2007, ou, se fixarem residência no Brasil, em ofício de registro, verbis:

Art. 95. Os nascidos no estrangeiro entre 7 de junho de 1994 e a data da promulgação desta Emenda Constitucional, filhos de pai brasileiro ou mãe brasileira, poderão ser registrados em repartição diplomática ou consular brasileira competente ou em ofício de registro, se vierem a residir na República Federativa do Brasil. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 54, de 2007)           

Assim, nascido naquele período, subsumem-se à exceção prevista no art. 95 do ADCT, bastando para adquirir a nacionalidade brasileira seu registro em ofício de registro e a residência em solo brasileiro, consoante dicção legal da referida norma.

Ora, trata-se de regramento pensado para os casos em que nascida a pessoa após a edição da EC 3/94, ela o foi antes que houvesse a volta da possibilidade do registro em repartição diplomática ou consular no exterior (suprimida por esta emenda e ressurgida com a EC 54/2007).

Ou seja, a alteração promovida na alínea “c” do inciso I do artigo 12 da Constituição Federal veio acompanhada de uma norma de transição dirigida aos nascidos no estrangeiro no interregno compreendido em 07/06/1994 a 20/09/2007 (período de vigência da redação determinada pela Emenda de Revisão nº 03/1994), garantindo a aquisição da nacionalidade originária aos filhos de brasileiros nascidos no exterior, mesmo durante o período de vigência da EC-R nº 03/94.

Assim, o citado art. 95 da ADCT se refere ao registro feito no Brasil dos nascidos no estrangeiro, e não ao traslado de assento estrangeiro já existente.

Nesse sentido, Loureiro (2016, p.298) diz:

Desse modo, o nascimento de filho de pai brasileiro ou mãe brasileira pode ser registrado por autoridade consular brasileira ou por autoridade competente do país onde ocorreu o evento, nos termos da lei local. No primeiro caso, o registrado é considerado desde logo brasileiro nato. Na segunda hipótese, a nacionalidade brasileira dependerá de opção, em qualquer tempo, após a pessoa vir a residir no Brasil e completada a maioridade.

Aprofundando o estudo, Lenza (2019, p. 1350), completa “corrigindo a imperfeição trazida pela ECR n. 3/94, a EC n. 54/2007 (fruto da conversão da denominada “PEC dos brasileirinhos apátridas”)”, restabeleceu o fato de certidão expedida por entidade consular brasileira, é instrumento suficiente para o reconhecimento da nacionalidade brasileira.

Com brilhantismo, Portela, (2014, p.297), conceitua as hipóteses de ocorrência de um apátrida (sem nacionalidade), “pode ocorrer ou pela perda arbitrária da nacionalidade, normalmente por motivos políticos, ou pela não incidência de nenhum critério de atribuição de nacionalidade sobre uma pessoa”.

Seguindo, a Emenda Constitucional nº 3/94 exigiu a fixação da residência e a realização da opção para obtenção da nacionalidade, tornando apátridas os filhos de brasileiros residentes em países que apenas reconhecem o critério sanguíneo como forma de aquisição de nacionalidade.

5 TRASLADO

É mero assento de nascimento civil de pessoa natural efetuado por Ofício de Registro. Ou seja, o conteúdo da certidão apresentada é transcrita, copiada, para o registro, que está assentado no chamado Livro E, pertencente à serventia registral.

Muitos fatos importantes da vida civil do ser humano podem ocorrer no exterior, tais como nascimento, casamento e óbito, e serem registrados naquele local.

Porém, para que surtam efeitos jurídicos no Brasil, tais atos necessitam passar por um procedimento, que chamamos de Traslado, ou seja, transcrição em 1º Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais do seu domicílio, ou 1º Ofício do Distrito Federal, caso não tenha residência no Brasil, Debs (2020, p. 224).

Para o traslado a pessoa deve ser brasileira, ou ser filha de brasileiro, no caso de nascimento. Não é permitido, por exemplo, traslado de casamento realizado no exterior de ambos nubentes estrangeiros.

Até por que um dos documentos apresentado ao procedimento de traslado deve ser a comprovação de que seus ascendentes, ao menos um deles, é brasileiro (a), mediante certidão brasileira que conste tal condição.

Conforme nossa Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei 4657/1942), os Consulados Brasileiros, possuem autoridades competentes para praticar os atos da vida civil de brasileiros, ocorrido no país da sede do Consulado.

Podem realizar casamentos, registrar nascimentos e óbitos, e demais atos que lhe são próprios (exemplo de atos notariais: procurações, autenticações,...), com garantia de autenticidade, eficácia e fé pública. Dispensado o reconhecimento de de firma da autoridade consular brasileira (Decreto nº 8.742/ 2016).

O brasileiro residente no exterior possui também a opção de praticar seus atos da vida civil, perante autoridade competente do país onde residem ou se encontram momentaneamente. Tal documento será redigido em língua estrangeira, oficial daquele território.

Porém, para que tais atos realizados no exterior produzam efeitos no Brasil, e atinjam a desejada publicidade, é necessário o registro do traslado no Livro E. Tal traslado independe de autorização judicial.

Podendo ser transcrito tanto o assento consular quanto o assento realizado perante autoridade estrangeira competente, desde que devidamente legalizado (ou apostilado), traduzido por tradutor público registrado na junta comercial do Estado Brasileiro competente.

Dispensa-se a legalização nos países em que há acordo bilateral, em que o Brasil faça parte, e que prevejam a dispensa de legalização de documentos públicos originados em um Estado a serem apresentados no território de outro Estado.

A legalização consiste no reconhecimento da assinatura da autoridade competente nos termos da legislação consular.

Também, não é necessário, o registro prévio do Registro de Títulos e Documentos, de documentos estrangeiros, para que produza efeitos no Brasil, vez que a Resolução 155 do CNJ não manteve tal procedimento.

O traslado de assento de nascimento ocorrido em país estrangeiro poderá ser requerido a qualquer tempo, apenas a opção pela nacionalidade brasileira é que deve ser manifestada, a qualquer tempo, após o registrado completar dezoito anos e vier a residir no Brasil, no caso de assento realizado por autoridade estrangeira.

Na hipótese de registro de nascimento realizado no consulado o registrado é considerado brasileiro nato independentemente de opção de nacionalidade.

Por fim, utilizamos no presente artigo essencialmente o tipo de pesquisa exploratória aplicada e explicativa qualitativa, a fim de aprofundar os estudos de maneira ampla e geral quanto à questão da nacionalidade brasileira, estudo de caso concreto, legislação em vigor e o Procedimento de Traslado.

A forma de coleta de dados aconteceu através de ampla e aprofundada pesquisa bibliográfica e observação estruturada na vida real. Ressaltamos ainda, que toda a pesquisa teve embasamento teórico doutrinário e em normas constitucionais e infraconstitucionais.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, percebe-se o quão importante é o estudo da aplicabilidade da nacionalidade aos nascidos no exterior, uma vez que, a cada ano que passa aumenta o número de brasileiros que “tentam” a vida em outro país, fixando sua residência e formando sua famílias.

Porém, estes brasileiros que são, possuem direitos e obrigações perante a pátria amada, a qual se estende aos seus descendentes, desde que preenchidos os requisitos legais.

Tal não poderia ser diferente, em virtude da proteção jurídica que nossa Constituição Federal estabelece, não somente ao brasileiro fora do território nacional, mas também ao seu filho nascido no exterior.

No entanto, a carta magna foi promulgada em 1988, tendo sido modificada em 1994, com a publicação da Emenda Constitucional nº 04, a qual extinguiu a possibilidade de se estender direitos aos nascidos no exterior, mesmo que filhos de brasileiros, tornando-os apátridas, conforme o critério de nacionalidade adotado pelo país de origem, e obrigando aos mesmos a optarem pela nacionalidade brasileira, mediante processo judicial.

Tal imperfeição casou muito transtorno, e somente foi corrigida em 2007, pela Emenda Constitucional número º 54 de 2007, a qual restabeleceu o estado anterior, resgatando a possibilidade de, desde que registrado em repartição brasileira competente (Consulado, Embaixada), seja considerado brasileiro nato, independentemente de pedido de opção pela nacionalidade.

Até por que o Consulado/Embaixada é território brasileiro situado em país estrangeiro, sob o qual impera normas brasileiras, não havendo possibilidade normas estrangeiras imperarem em tal local.

Os efeitos desta emenda constitucional retroagiram aos registros lavrados em 07/06/1994 a 21/09/2007 (período este de vigência da EC nº 3/94), nos quais constou efetivamente que o registro era provisório dependendo de opção.

Para solucionar a questão, a Resolução nº 155 do CNJ foi muito precisa, em dispor em seu conteúdo a necessidade de adequar o registro de traslado, tornando sem efeito tais expressões, pois todos os registros lavrados naquela época, saíram com observações em seu teor indicando a necessidade de opção.

Assim, a nacionalidade originária caracteriza-se pelo ato de registro no consulado brasileiro, sendo que possui a mesma eficácia jurídica dos registros formalizados no Brasil por oficiais de registro civil.

O traslado segue como exigência do direito registral, na efetivação e concretização das normas constitucionais, devendo o interessado promover a transcrição de registro de nascimento, providência que assegura a produção de efeitos no território nacional ao ato consular.

Por fim, ressaltamos o papel importantíssimo dos oficiais de registro, na medida em que são operadores do direito, aplicando ao caso concreto as normas federais, estaduais e municipais, praticando atos com fé pública, segurança, autenticidade e publicidade, com o fim de produção efeitos.

Pois o fato jurídico mais importante de uma pessoa, que é seu nascimento, e garante-se a partir de seu registro, mesmo que nascido no exterior, proteção do Estado, saúde básica e educação, entre tantos direitos que o cidadão brasileiro. Tais direitos são assegurados pela Constituição Federal da República Federativa do Brasil.

REFERÊNCIAS

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______. Decreto nº 8.742, de 4 de maio de 2016. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 5 maio. 2016. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Decreto/D8742.htm> Acesso em 07.08.2020.

DEBS, Martha El. Legislação Notarial e de Registros Públicos Comentada – artigo por artigo-. 4ª Ed, rev. ampl. atual., Salvador: Editora Juspodivm, 2020.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 23ª Ed, São Paulo: Editora Saraiva Educação, 2019.

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros públicos: teoria e prática. 7ª Ed rev. atual. ampl., Salvador: Editora Juspodivm, 2016.

PORTAL CONSULAR DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES: http://www.portalconsular.itamaraty.gov.br/brasileiros-natos. Acesso em 17.07.2020.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 6ª Ed rev. ampl. atual., Salvador: Editora Juspodivm, 2014.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 2ª Ed rev. atual. Ampl, São Paulo: Editora Método, 2008.

Sobre as autoras
Andreia Roberta Schafer

Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pelo Instituto Cenecista de Ensino Superior de Santo Ângelo. Pós-Graduanda em Direito e Gestão Notarial e Registral.

Amanda Cecatto Alcantara

Especialista em Direito Processual Civil pelo Centro Universitário UNINTER. Especialista em Direito Público pela FEMPAR-PR. Graduada em Direito pela UNICURITIBA. Professora orientadora de TCC no Centro Universitário UNINTER.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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