Em busca da reforma (perdida) da Lei de Direitos Autorais

30/04/2024 às 11:44
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A atual Lei de Direitos Autorais precisa ser reformada para incorporar inovações tecnológicas e afastar disposições draconianas de propriedade intelectual.

A atual Lei de Direitos Autorais (LDA), frequentemente acusada de obsoleta, nos seus mais de vinte anos de vigência, é por vezes alvo de intensas discussões especializadas de acadêmicos e juristas, ou dos agentes das diversas cadeias econômicas e culturais que envolvem obras intelectuais, muito embora os seus dispositivos transbordem interesses setorizados. Nesta época do imaterial, difícil sustentar que o debate autoral não tenha que se ampliar para o interesse público em geral.

Desde o seu nascimento, entre a defesa de sua adaptação flexível às transformações tecnológicas da expansão da internet e a crítica às suas disposições draconianas e maximalistas defensivas da propriedade, há um hiato geracional em que as implicações de inovações disruptivas e os direitos fundamentais (humanos) de terceiros – supostamente estranhos às relações de criação e produção cultural – não têm sido levados em conta em qualquer tentativa de reformulação global e robusta da lei.

Aliás, a pauta legislativa recente sobre aspectos da matéria dá sinais para modificações pontuais que atendem muito mais a reivindicações de parcela de setores da produção cultural e do entretenimento, como o audiovisual, a música e até as empresas de streaming, do que propriamente a uma ampla e necessária reforma.

A última alteração da LDA, referente à gestão coletiva dos direitos autorais, foi resultado muito mais da pressão política dos trabalhos das Comissões Parlamentares sobre a atuação do ECAD e de sua condenação administrativa no CADE por abuso de poder dominante do que pelo esforço propositivo do Executivo e do Parlamento. Desde o primeiro governo Lula até o finado bolsonarismo, foram inúmeras as tentativas de reformulação geral para atender ao espírito do tempo, com a constituição de fórum, inúmeros seminários com apoio da academia, reuniões abertas e fechadas, audiências, anteprojeto do Ministério da Cultura, consultas públicas, relatório etc.; boa parte desse tempo perdido (?) dormita em alguma gaveta da Casa Civil da Presidência após inúmeros mandatos e mudanças de orientação e prioridade política em relação à matéria.

Nem a assinatura do Tratado de Marraqueche com estatura de emenda constitucional foi suficiente para desencadear pelo menos a regulamentação da facilitação do acesso de pessoas com deficiência visual às obras intelectuais. Os direitos autorais no debate legislativo foram reduzidos ao plano incidental, para não dizer diminuídos à condição de jabutis, no marco das propostas de combate à desinformação ou de regulação da inteligência artificial. Ainda assim, identificada sua presença confusa e (in)desejada nesses textos legislativos, devolvidos para um lugar de origem com sua remoção, retornam ensimesmados para compartimentos fragmentados e fatiados pelos interesses das indústrias do entretenimento, das plataformas ou dos meios de comunicação, para não mencionar dos modismos e do frenesi em torno das novas tecnologias.

É ainda possível discutir uma reforma sistemática da Lei de Direitos Autorais sem nos seduzirmos por matrizes tópicas? O Ministério da Cultura e parlamentares engajados nesse empreendimento hercúleo – pelo visto – poderiam nos dar minimamente uma resposta.

Sem colonialismo ou transplante irrestrito, outros lugares terrenos, como a União Europeia, com sua Diretiva relativa aos direitos de autor e direitos conexos no Mercado Único Digital, sinalizam que sim, é possível.

Queremos discutir mudanças conceituais relacionadas às transformações criativas, responsabilidade dos provedores de aplicação por conteúdo protegido compartilhado na rede, limites e exceções em nome do progresso científico, educacional e cultural – como por exemplo a mineração de textos e dados sem a qual não haveria vacina para Covid-19 e a de preservação do patrimônio cultural –, acesso aberto e ao conhecimento, direitos de remuneração a artistas e intérpretes, a aplicação ou não da LDA aos produtos culturais advindos de IAs generativas, obras sob encomenda e os vários tipos de licenças, equilíbrio contratual, prazo de proteção e domínio público, plágio, dentre vários outros assuntos e mais, de modo que a LDA seja atualizada.

Resta-nos perguntar: cadê a Reforma da LDA que necessitamos?

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Sobre o autor
Rodrigo Vieira

Docente do Curso de Direito e do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFERSA e Membro Fundador do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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