Crimes contra Inviolabilidade do Domicílio e Crimes contra a Inviolabilidade de Segredos - Art. 150, 154 e 154-A, CP Comentados

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Introdução

Esse artigo vem com o objetivo de tornar mais didático e compreensível os tipos penais dispostos nos artigos 150, 154 e 154-A do Código Penal Brasileiro. Ademais, será abordado os objetos, a tipicidade, a conduta típica, dentre outros tópicos principais de cada dispositivo.

Violação de domicílio

Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:

Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

Objeto jurídico

Tutela-se a tranquilidade doméstica, abrangente da intimidade, da segurança e da vida privada proporcionadas pelo domicílio.

O fundamento constitucional do delito encontra-se no art. 5°, inciso XI, da Constituição Federal: "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".

Objeto material

É o domicílio invadido, que suporta a entrada ou permanência de alguém, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito.

Núcleos do tipo

A conduta criminosa possui dois núcleos: entrar e permanecer.

Entrar é a ação de penetrar, de ingressar totalmente em casa alheia ou em suas dependências. Permanecer, por seu turno, pressupõe a entrada lícita, seguida de uma omissão, consistente na negativa em sair do local. É possível a prática do crime, por tanto, por duas formas distintas: ação, caracterizada pelo ingresso no domicílio alheio, e omissão, relativamente à recusa em dele sair.

Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: entrando ilicitamente em casa alheia ou em suas dependências, e nela permanecendo, o agente responde por um único delito.

Elementos normativos do tipo

Não basta a entrada ou permanência de alguém em casa alheia ou em suas dependências.

O tipo penal possui elementos normativos: é necessário que a conduta seja praticada clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito.

O art. 150, caput, do Código Penal condiciona a existência do crime ao dissentimento expresso ou presumido de quem de direito, ou seja, daquele que tem o poder de proibir a entrada ou permanência de terceiros na sua casa ou em suas dependências (proprietário, locatário, possuidor etc.). Consequentemente, se presente o consentimento do morador, explícito ou implícito, o fato é atípico. Em consonância com o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

Mas, é um dado elementar da incidência da garantia constitucional do domicilio o não consentimento do morador ao questionado ingresso de terceiro: malgrado a ausência da autorização judicial, só a entrada invito domino a ofende, seja o dissenso presumido, tácito ou expresso, seja a penetração ou a indevida permanência, clandestina, astuciosa ou franca.

Entrar ou permanecer clandestinamente em casa alheia ou em suas dependências significa fazê-lo de forma oculta, sem se deixar notar pela última. Por essa razão, opera-se o dissentimento presumido, pois pressupõe-se ser contra a vontade de quem de direito, já que essa pessoa não sabe que o agente lá se encontra.

Por sua vez, entrar ou permanecer astuciosamente consiste em conduta fraudulenta, na qual o agente cria um estratagema para entrar ou permanecer em casa alheia ou em suas dependências maliciosamente. Exemplo: fingir-se funcionário do serviço de vigilância sanitária para tomar o recinto de determinada residência. Nessa hipótese, verifica-se também o dissentimento presumido.

Finalmente, entrar ou permanecer em casa alheia ou em suas dependências contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito enseja a entrada ou permanência francas. Nesses casos, o dissentimento de quem de direito pode ser expresso ou tácito.

Dissentimento expresso (vontade expressa) é aquele em que o ofendido revela peremptoriamente a vontade de excluir o agente do seu domicílio, tal como quando proíbe sua entrada em uma festa. Por outro lado, ocorre o dissentimento tácito (vontade tácita) nas situações em que os fatos anteriores indicam claramente o propósito do titular à inviolabilidade de domicílio em não permitir a entrada ou permanência de determinada pessoa na sua casa ou em suas dependências. Exemplo: sujeito anteriormente expulso por seguranças da vítima de sua residência.

Sujeito ativo

O crime é comum.

Pode ser praticado por qualquer pessoa, inclusive pelo proprietário do bem, quando entra ou permanece na residência ocupada pelo inquilino contra sua vontade expressa ou tácita. O Código Penal não protege a propriedade nem a posse indireta do locador. O locatário, possuidor direto do imóvel, não é ofendido em sua posse, e sim em sua tranquilidade doméstica.

A serviçal que permite o ingresso do amante em seu quarto pratica o crime em concurso com ele. Presume-se, nessa hipótese, o dissentimento do dono da residência.

O divorciado pode cometer o crime ao entrar ou permanecer na residência do seu ex-cônjuge contra sua vontade.

Não há crime, entretanto, quando uma mulher, na ausência do seu marido, permite a entrada do amante em sua residência. A Constituição Federal, nos arts. 5°, inciso I, e 226, § 5°, equiparou os cônjuges em direitos e deveres no âmbito do casamento. Não há hierarquia entre eles no tocante ao direito de permitir a entrada ou permanência de uma pessoa no lar doméstico. Frise-se, a propósito, que esta posição já era acolhida pelo Supremo Tribunal Federal inclusive anteriormente à atual ordem constitucional: "O consentimento da esposa do chefe da casa, na ausência deste, exclui a ação criminosa de quem penetra no lar, com o consentimento da mesma".

Sujeito passivo

É o titular do direito à tranquilidade doméstica. Na descrição típica é o "quem de direito", ou seja, o sujeito que tem o poder de admitir ou excluir alguém da sua casa, pouco importando seja ou não seu proprietário.

A expressão 'quem de direito' evidencia a intenção do legislador em assegurar somente a determinadas pessoas a prerrogativa de controlar a entrada, a permanência e a saída do domicilio. Nesse contexto, o sujeito passivo pode ser:

  1. Uma pessoa a quem os demais habitantes da casa estão subordinados (regime de subordinação); ou

  2. Diversas pessoas, habitantes da mesma residência, em relação isonômica (regime de igualdade).

Elemento subjetivo

É o dolo, abrangente do elemento normativo "contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito". Por corolário, o crime é incompatível com o dolo eventual, pois não se pode assumir o risco de entrar ou permanecer na residência alheia contra a vontade do morador. Ou o agente sabe que viola o domicilio de alguém, ou tem dúvida, o que afasta o dolo.

Há atipicidade, por ausência de dolo, nas condutas de entrar em casa alheia para esconder-se da polícia ou quando o sujeito supõe ingressar em local diverso do proibido (erro de tipo).

Não se admite a modalidade culposa.

Consumação

Cuida-se de crime de mera conduta ou de simples atividade, pois o tipo penal não contém resultado naturalístico. Consuma-se no momento em que o sujeito ingressa completamente na casa da última ("entrar"), ou então quando, ciente de que deve sair do local, não o faz por tempo juridicamente relevante ("permanecer").

Em relação ao primeiro núcleo, o crime é instantâneo, e, no tocante ao segundo núcleo, permanente.

É imprescindível a entrada concreta em casa alheia. Não há crime na conduta de olhar ou observar, ainda que com o uso de binóculos, a movimentação na residência de terceira pessoa.

Violações anteriores de domicílio toleradas ou perdoadas pelo sujeito passivo não afastam o crime posterior.

Tentativa

É possível na conduta "entrar". Exemplo: o sujeito é impedido por seguranças de ingressar em uma festa de casamento para a qual não foi convidado.

No que concerne ao núcleo "permanecer", é incabível o conatus. De fato, trata-se de conduta omissiva, e se consuma quando o sujeito permanece (deixa de sair) na casa alheia contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito. Destarte, ainda que resista (exemplo: determinada sua retirada de uma festa, o agente se recusa a deixar o local, trancando-se em um banheiro), o crime já estará consumado com sua negativa em abandonar o domicílio alheio.

Há, contudo, autores que consideram a tentativa compatível com a conduta de "permanecer".

Ação penal

É pública incondicionada.

§ 1º - Se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência.

Figuras qualificadas

A pena é de detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência, se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou de arma ou por duas ou mais pessoas.

  1. Noite

A razão da qualificadora repousa no fato de ser mais fácil praticar o crime durante a noite, quando a vítima tem reduzida sua possibilidade de defesa.

  1. Lugar ermo

Ermo é o local habitualmente abandonado e afastado dos centros urbanos, no qual o socorro é mais difícil, tornando deveras remota a chance de defesa por parte da vítima. A existência de uma casa nessas condições não faz com que o lugar deixe de ser ermo, e, se invadida, estará caracterizada a qualificadora do crime de violação de domicílio.

  1. Violência

Violência é o emprego de força física, tanto em relação à pessoa (exemplo: contra o morador) como também no tocante à coisa (exemplo: contra uma porta), uma vez que a lei não faz distinção. Não agiu como em diversos outros crimes, nos quais se reporta à "violência à pessoa".

Se a violência for empregada contra uma pessoa e ela sofrer lesões corporais, serão aplicadas cumulativamente as penas atinentes à violação de domicílio e à lesão corporal, ainda que leve. A lei impõe o concurso material obrigatório entre a violação de domicilio e a violência. A violência moral (grave ameaça) não qualifica o crime, por ausência de previsão legal.

  1. Emprego de arma

Arma é todo instrumento com potencialidade para matar ou ferir. Pode ser própria, quando criada com tal finalidade (exemplos: revólveres, pistolas, espingardas etc.), ou imprópria, que foi concebida para outra finalidade, nada obstante possa matar ou ferir (exemplos: navalhas, tacos de beisebol, machados etc.). Fala-se ainda em armas brancas, que são as revestidas de ponta ou gume, e podem ser próprias (exemplo: punhal) ou impróprias (exemplo: faca de cozinha).

É necessário que o sujeito se utilize da arma para intimidar a vítima. Basta, porém, a intimidação tácita, que se verifica com o seu porte ostensivo.

Fundamenta-se a elevação da pena na maior ofensa à liberdade individual, em decorrência do temor proporcionado pelo emprego da arma, bem como pelo maior perigo que acarreta ao ofendido.

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  1. Concurso de duas ou mais pessoas

A redação do dispositivo legal revela que somente incidirá a qualificadora quando duas ou mais pessoas efetivamente invadem a casa alheia. Todos devem praticar atos de execução (coautoria). A maior punição é justificada pela circunstância de a atuação simultânea dos agentes dificultar a defesa da vítima para impedir a violação de domicílio.

Exclusão do crime (excludentes de ilicitude):

§ 3º Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em suas dependências:

I – durante o dia, com observância das formalidades legais, para efetuar prisão ou outra diligência;

II – a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser.

CF, art. 5º, ampliou as hipóteses deste art. do CP:

XI – a casa é o asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou durante o dia, por determinação judicial

1ª hipótese: cumprimento de determinação judicial, ou para efetuar a prisão de alguém ou para realizar outra diligência, que só pode ser feito durante o dia, que é das 6h às 20h, ex.: mandado de busca e apreensão.

2ª hipótese: flagrante delito, desastre ou prestação de socorro, não havendo aqui limite temporal, ou seja, pode alguém ingressar em casa alheia, mesmo contra a vontade de quem de direito, de dia ou à noite.

Entretanto, a Constituição Federal menciona a situação de flagrante delito, enquanto o Código Penal aduz o fato de que algum crime esteja sendo praticado em casa alheia ou na iminência de o ser. Então, a iminência de o ser, contida na lei penal, deve, obrigatoriamente, ser entendida no sentido de que o agente, embora não houvesse ainda consumado o crime, já havia dado início à sua execução, oportunidade em que poderia ser interrompido com o ingresso de terceira pessoa em sua casa, fazendo, com isso, que a infração penal permanecesse na fase da tentativa.

Em caso de desastre, ou mesmo para prestar socorro, o particular que invade casa alheia com uma dessas finalidades atua em estado de necessidade, afastando-se a ilicitude de seu comportamento. Sendo um funcionário público que possua tal obrigação de prestar socorro, a exemplo do que ocorre com os bombeiros, atua acobertado pelo estrito cumprimento de dever legal.

Todas as situações elencadas tanto pela Constituição Federal quanto pelo próprio Código Penal dizem respeito a causas de justificação, que têm por finalidade excluir a ilicitude do comportamento realizado pelo agente.

Conceito legal de casa:

A norma penal explicativa, contida no § 4º do art. 150 do Código Penal:

§ 4º A expressão “casa” compreende:

I – qualquer compartimento habitado;

II – aposento ocupado de habitação coletiva;

III – compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

Cezar Roberto Bitencourt esclarece compartimento habitado abrange suficientemente qualquer moradia eventual e transitória, não é necessário que esteja fixa ou afixada em determinado local; pode ser móvel, flutuante, ‘errante’, como, por exemplo, barco, trailer, motor-home, cabina de um trem velho, vagão de metrô abandonado, abrigo embaixo de ponte ou viaduto etc., além de abranger, evidentemente, quarto de pensão, de pensionato etc.

Aposento ocupado de habitação coletiva, embora certamente abrangida pela situação pelo inciso I, pois pode ser compreendida de acordo com o conceito de qualquer compartimento habitado, traduz as hipóteses como pensionatos, hoteis, moteis etc.

Hungria entende que compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade, embora sem conexão com a casa de moradia propriamente dita, serve ao exercício da atividade individual privada. Como o escritório do advogado, o consultório do médico, o gabinete do dentista, o laboratório do químico, o atelier do artista, etc. Tendo a necessidade de tutelar essa atividade em todos os lugares onde ela se abriga, pois nos tempos atuais, a atividade do cidadão não se exerce apenas no limite estrito da casa de moradia.

Já o parágrafo 5º diz que não se compreendem na expressão “casa”:

I – hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição do inciso II, do § 4º do mesmo diploma legal;

II – taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

Casa vazia ou desabitada e casa habitada, com ausência momentânea do morador:

Considerando que o bem jurídico penalmente protegido é a tranquilidade doméstica, poderia se falar em violação de domicílio na hipótese de casa vazia ou desabitada? Não, uma vez que não há possibilidade de agressão ao bem jurídico mencionado, em face da sua inexistência.

“A entrada em casa vazia, ou construção em ruína, desabitada, não constitui violação de domicílio. Mas se a casa está ocupada, não é necessário para que se formalize o crime que o morador esteja presente no momento da violação.” – Aníbal Bruno

Violação do segredo profissional

Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa de um conto a dez contos de réis.

Parágrafo único - Somente se procede mediante representação.

O artigo tipifica o comportamento do agente, que, sem justa causa, revela a alguém um segredo que teve ciência em razão da sua função, ministério, ofício ou profissão, revelação essa capaz de produzir dano a outrem.

Existem atividades que requerem uma relação de confiança entre as pessoas, quando essa confiança é quebrada sem um motivo justo, abre-se a possibilidade de se responsabilizar criminalmente aquele que não cumpriu com os seus deveres de fidelidade.

Elementos que constituem o delito de violação de segredo profissional:

1. A existência de um segredo

2. O fato de ter esse segredo chegado ao conhecimento do agente em virtude da sua função, ministério, ofício ou profissão

3. Revelação a alguém

4. Ausência de justa causa

5. Potencialidade de dano a outrem

Núcleo do tipo: “Revelar”, equivale a contar algo a alguém, delatar, denunciar, manifestar.

Segredo é toda informação secreta, isto é, o assunto ou fato que não pode ser tornado público ou conhecido de pessoas não autorizadas, pois sua revelação pode produzir dano a outrem.

Função: toda determinação de encargos imposta pela lei a uma pessoa, esteja ou não ligada ao exercício de um cargo, haja ou não remuneração.

Ministério, em regra, entende-se aqueles que exercem atividades religiosas, a exemplo dos pastores, padres, irmãs de caridade.

Ofício: aquelas atividades habituais, consistentes na prestação de serviços manuais ou mecânicos, como acontece com as empregadas domésticas, costureiras etc.

Profissão diz respeito a toda atividade que, como regra, tenha finalidade de lucro, exercida por quem tenha habilitação.

Só há crime quando a violação do segredo profissional é realizada "sem justa causa", isto é, sem sustentação legal. Destarte, o fato será atípico, por ausência do elemento normativo, em diversos casos, tais como: estado de necessidade (exemplo: sujeito revela um segredo alheio para não ser incriminado), exercício regular de direito (exemplo: psicólogo revela ao médico um dado sigiloso acerca do paciente em comum), estrito cumprimento de dever legal (exemplo: art. 269 do Código Penal, do qual decorre a obrigação legal do médico de comunicar doença de notificação compulsória) e consentimento do ofendido.

Objeto Material

É o assunto transmitido ao profissional em caráter sigiloso.

Objetividade jurídica

Bem juridicamente protegido por esse tipo penal é a inviolabilidade do segredo profissional.

Sujeito ativo e passivo

O crime de violação do segredo profissional é próprio com relação ao sujeito ativo, uma vez que somente as pessoas que tiverem tomado conhecimento do segredo em razão de função, ministério, ofício ou profissão poderão praticá-lo.

Pode ser qualquer pessoa suscetível de ser prejudicada pela revelação do segredo, seja seu titular ou até mesmo um terceiro.

Consumação

Consuma-se o delito quando o segredo potencialmente lesivo é revelado a outrem, mesmo que tal revelação, tenha sido feita a uma única pessoa.

Tentativa

Tentativa, é admissível na revelação do segredo por escrito, tal como na carta que se extravia.

Elemento Subjetivo

O crime de violação de segredo profissional somente pode ser praticado dolosamente, seja o dolo direto, seja eventual.

Ação Penal

Ação penal pública condicionada à representação.

Classificação Doutrinária

Crime próprio quanto ao sujeito ativo (uma vez que o tipo delimita a prática da infração penal àqueles que tiverem tomado conhecimento do segredo em razão de função, ministério, ofício ou profissão), sendo comum no que diz respeito ao sujeito passivo; doloso; formal; de forma livre; unissubjetivo (regra); instantâneo; unissubsistente ou plurissubsistente (dependendo da forma com que a infração penal é levada a efeito, pois os atos podem ser concentrados ou diluídos pelo iter criminis).

Invasão de dispositivo informático

Art. 154-A. Invadir dispositivo informático de uso alheio, conectado ou não à rede de computadores, com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do usuário do dispositivo ou de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita.

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Objeto jurídico

O bem jurídico protegido é a liberdade individual, especialmente no tocante à inviolabilidade dos segredos

Objeto material

É o dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores. Esse dispositivo pode ser dividido em 4 grupos:

  1. Dispositivos de processamento: são responsáveis pela analise de dados, com o fornecimento de informações, visando a compreensão de uma informação do dispositivo de entrada para envio aos dispositivos de saída ou de armazenamento. São as placas de vídeo e os processadores de computadores, por exemplo;

  2. Dispositivos de entrada: relacionam-se à captação de dados (escritos, orais ou visuais). Exemplo: teclados, microfones, webcam);

  3. Dispositivos de saída: fornecem uma interface destinada ao conhecimento ou captação, para outros dispositivos, da informação produzida no processamento, como as impressoras e os monitores; e

  4. Dispositivos de armazenamento: dizem respeito à guarda de dados ou informações para posterior análise. Exemplo: pendrives, HDs e CD.

É irrelevante se o dispositivo se encontra ou não conectado à rede de computadores, ou seja, não se exige a sua interligação com outro dispositivo informático.

Núcleo do tipo

O núcleo do tipo é “invadir”, no sentido de devassar dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores.

Sujeito ativo

Trata-se de crime comum, podendo ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo

Pode ser qualquer pessoa, física ou jurídica.

Elemento subjetivo

Dados são elementos extraídos do mundo real e alocados no dispositivo informático, representados por números, símbolos, palavras ou imagens, que não podem ser compreendidas por quem os examina.

Informações são os dados processados e organizados de modo a apresentarem determinado significado, tornando-se compreensíveis.

Vulnerabilidades são falhas no projeto ou na implementação de um software ou sistema operacional, aptas a sujeitar o dispositivo informático a uma ameaça.

Não admite modalidade culposa.

Consumação

É crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com o simples ato de devassar dispositivo alheio. Dessa forma, o crime se consuma no momento em que o sujeito invade o computador alheio, por exemplo, com o fim de obter dados alheios, ainda que não consiga fazê-lo em razão de uma queda de energia. Destarte, a consumação se verifica no momento em que se invade o dispositivo, independente da obtenção dos dados desejados.

Tentativa

É possível, em face do caráter plurissubsistente do delito, permitindo o fracionamento do iter criminis. Exemplo: O sujeito realiza manobras para devassar o computador alheio, visando a destruição de dados, mas não consegue fazê-lo porque a vítima, especialista em informática, adota providencias eficazes para impedir o acesso a seu dispositivo pessoal.

Ação penal

Em regra, a ação penal é pública condicionada à representação. Excepcionalmente será pública incondicionada, nas hipóteses em que o delito envolver a Administração pública, como consta no art. 154-B:

Art. 154-B. Nos crimes definidos no art. 154-A, somente se procede mediante representação, salvo se o crime é cometido contra a administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios ou contra empresas concessionárias de serviços públicos.

Figuras equiparadas:

§ 1° Na mesma pena incorre quem produz, oferece, distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput.

Pune-se a conduta daquele que contribui, mediante produção, oferecimento, distribuição ou difusão de programa de computador para que um terceiro venha a devassar dispositivo alheio. O tipo penal reclama um especial fim de agir, então não basta apenas a distribuição, produção, oferecimento ou difusão de programa de computador, é necessária a intenção de permitir a prática da conduta definida pelo caput.

Classificação doutrinária

A invasão de dispositivo informático é crime simples (ofende um único bem jurídico); comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta criminosa, independentemente da superveniência do resultado naturalístico); de forma livre (admite qualquer meio de execução); comissivo; instantâneo ou permanente; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (normalmente cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e plurissubsistente.

Prejuízo econômico

§ 2º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se da invasão resulta prejuízo econômico.

A causa de aumento de pena foi modificada pela Lei n.º 14.155/2021. Para que o crime seja consumado, não é necessário que o indivíduo tenha a intenção de obter vantagem econômica, mas se a prática do crime resultar em prejuízo, haverá uma causa de aumento de pena.

Diversos fatores podem causar prejuízo econômico: divulgação de informações que possam manchar a honra da vítima, tempo de trabalho necessário para recriar os dados ou informações destruídas ou adulteradas, valores gastos para livrar o dispositivo informático de vírus, entre outros. Em qualquer um desses casos, o aumento da pena será obrigatório.

Caso o delito resulte em prejuízo econômico para a vítima, a pena será aumentada de um a dois terços (§ 2º). O aumento da pena depende do montante do prejuízo (quanto maior o dano, maior será a fração aplicada para incrementar a punição penal).

Qualificadora

§ 3° - Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

O § 3º estabelece a forma qualificada, na qual a invasão resulta na obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas conforme definidas em lei, ou no controle remoto não autorizado do dispositivo invadido. A pena foi alterada pela nova lei, passando a ser de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

A qualificadora constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios previstos na Lei 9,0991/1995, e vincula-se ao comportamento daquele que, além de devassar dispositivo informático alheio, vai mais longe. De fato, o sujeito obtém conteúdo de comunicações eletrônicas privadas ( tendo como exemplos: e-mails, mensagens restritas em redes sociais etc.), segredos comerciais ou industriais (exemplos: fórmula de um alimento, projeto de um automóvel etc.), informações sigilosas assim definidas em lei (norma penal em branco homogênea), ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido.

OBS. podemos caracterizar o “Controle remoto” como qualquer mecanismo idôneo a que permita o acesso sem fio ao dispositivo informático, mediante sinal infravermelho, bluetooth ou mesmo pela internet.

Podemos citar como exemplo o VNC (Virtual Network Computing) que consiste em um programa que se utiliza para acessar remotamente o dispositivo. Para evitar qualquer polêmica, o tipo penal foi expresso: somente é punível o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido. De maneira óbvia, não há crime se existe permissão para tanto, como ocorre nos desktops instalados em escolas infantis, pelos quais os pais acompanham à distância as atividades desenvolvidas pelos seus filhos.

Aumentos de pena

§ 4º - Na hipótese do § 3º, aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidas.

De acordo com o §4º, nas hipóteses da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido, a pena será aumentada de 1/3 a 2/3 se caso houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos, ou seja, se resulta prejuízo.

§ 5º - Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra

I - Presidente da República, governadores e prefeitos;

II - Presidente do Supremo Tribunal Federal

III - Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou

IV - dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.

Como disposto no §5º, o aumento de pena dar-se-á mediante crime praticado contra os sujeitos passivos de seus incisos, pois as mesmas gozam de proteção legal, devido ao cargo que requer atenção quanto aos informes sigilosos que se violados, podem atingir o bem comum e o interesse público.

Referências:

GRECO , Rogério . Curso de Direito Penal: Artigos 121 a 212 do código penal. 19. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2022. v. 2.

Masson, Cleber

Direito penal : parte especial (arts. 121 a 212) / Cleber Masson. - 16. ed. - Rio de Janeiro : Método,

2023.

Sobre as autoras
Iveline Oliveira Araújo

Sou estudante de Direito da Faculdade de Ilhéus, estou atualmente no 6° Semestre e venho com o objetivo de apresentar algumas sínteses de temas e conteúdos que são abordados em sala de aula.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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