A devolução em dobro em matéria tributária é viável?

06/06/2024 às 16:40

Resumo:


  • Empresas e pessoas físicas buscam o Judiciário para discutir tributos, o que é positivo para o Estado de Direito.

  • Devolver tributos em dobro é questionável, pois fundamentos do Código Civil e CDC não se aplicam à legislação tributária.

  • Jurisprudência aponta que não há previsão legal para devolução em dobro de tributos pagos indevidamente.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Muitas empresas e algumas pessoas físicas buscam diariamente o Poder Judiciário para discutir os seus tributos pagos, o que é natural e muito positivo para o Estado Democrático de Direito, precisamos sim de um tributação justa no Brasil.

No entanto, ao estudar alguns casos práticos enfrentados pelos Tribunais, notei alguns requerimento de repetição do indébito em dobro, o que me chamou a atenção e me fez redigir o presente artigo respondendo a seguinte pergunta: A devolução em dobro em matéria tributária é viável?

Pois bem, ao analisar a fonte dos pedidos de devolução dobrada, eu pude perceber que os fundamentos lançados nas petições são oriundos do art. 940 do Código Civil e do art. 42, Parágrafo Único do CDC (Normas de Direito Privado), inexistindo qualquer base no Código Tributário Nacional e tampouco em outras normas fiscais.

Portanto, ao considerar que os impostos estão disciplinados pelas Normas de Direito Público, percebi que os mencionados instrumentos não se aplicam à repetição do indébito tributária, logo a devolução dificilmente será em dobro para os tributos, assim caindo por terra as narrativas de alguns dos contribuintes.

A fim de melhor demonstrar a aplicabilidade prática da não possibilidade do ressarcimento dobrado, eu fiz uma busca na jurisprudência Paulista e ao analisar a Apelação n. 00038881220098260244 notei que "Não se aplica à repetição do indébito tributário o disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC, eis que a relação entre a Fazenda Municipal e o contribuinte não é de consumo", vejamos a sua ementa:

AÇÃO DECLARATÓRIA - IPTU - IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL RESTRIÇÃO PARCIAL À UTILIZAÇÃO DO IMÓVEL LIMITAÇÃO DE NATUREZA RELATIVA QUE, EM TESE, NÃO DESNATURA A OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR DO TRIBUTO BLOQUEIO DA MATRÍCULA DO TERRENO EM RAZÃO DE IRREGULARIDADES NO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO LOTEAMENTO REGISTRADO, PORÉM NÃO IMPLEMENTADO DE FATO SEVERAS RESTRIÇÕES À UTILIZAÇÃO ECONÔMICA IMÓVEL INCIDÊNCIA DO IPTU SOBRE OS LOTES CORRESPONDENTES IMPOSSIBILDADE REPETIÇÃO DO INDÉBITO RESTITUIÇÃO EM DOBRO IMPOSSIBILIDADE DANO MORAL INOCORRÊNCIA. O fato de o imóvel estar localizado em área de proteção ambiental APA (art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.985/2000), por si só, não afasta a incidência do IPTU, entretanto, havendo bloqueio da matrícula do terreno objeto de parcelamento, em razão da irregularidade na implementação do loteamento, é impossível a cobrança do imposto, em razão das severas limitações de uso, gozo, fruição e disposição decorrentes da medida, as quais impedem manifestação de riqueza tributável que justifique a exação art. 145, §1º da CF. Não se aplica à repetição do indébito tributário o disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC, eis que a relação entre a Fazenda Municipal e o contribuinte não é de consumo. A mera cobrança do IPTU, ainda que indevida, por si só, não gera dano moral. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 0003888-12.2009.8.26.0244; Relator (a): Carlos Giarusso Santos; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro de Iguape - 1ª. Vara Judicial; Data do Julgamento: 31/01/2013; Data de Registro: 05/02/2013 - grifei).

Igualmente foi notado que o art. 940 do Código Civil não pode ser aplicado à relação tributária, inexistindo o dever de restituição dobrada nos casos de cobrança de tributo pago, cito um caso prático:

1. RECURSO INOMINADO. TAXA DE COMBATE A INCÊNDIO. MUNICÍPIO DE PRES. PRUDENTE - SP. INEXIGIBILIDADE RECONHECIDA, COM IMPOSIÇÃO DE DEVOLUÇÃO DE FORMA SIMPLES. 2. Recurso da autora pedindo imposição da devolução em dobro pelo Município dos valores indevidamente recolhidos. 3. Decisão: Pretensão improcedente. Matéria tributária. Ausência de má-fé. Aplicabilidade do CTN . Ausência de previsão legal de penalidade de repetição em dobro de cobrança indevida de tributo. Restituição de indébito de forma simples bem decidida. 4. Recurso da autora não provido. Sentença mantida. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1014514-52.2020.8.26.0482; Relator (a): Paulo Gimenes Alonso; Órgão Julgador: 1ª Turma; Foro de Presidente Prudente - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 16/06/2021; Data de Registro: 16/06/2021 - grifei).

Assim sendo não restam dúvidas que as chances de êxito ao se pedir a devolução em dobro é bem remota, cabendo ao advogado e ao cliente analisarem os riscos de eventual improcedência desse pedido antes de fazê-lo.

Reforçamos que não há relação consumerista entre o Fisco e o contribuinte, tampouco há regulamentação da matéria no Código Tributário Nacional, o que deve ser considerado antes de confeccionar qualquer pedido de restituição dobrada em face do Fisco.

Sobre o autor
João Vitor Rossi

Advogado especializado em Direito Tributário e Imobiliário, com registro na OAB-SP nº 425.279. Possui MBA Executivo em Direito, Negócios e Operações Imobiliárias, especialização em Direito Imobiliário e Direito Processual Civil, que lhe proporciona uma visão ampla e estratégica para a resolução de problemas complexos e a liderança de equipes jurídicas de alta performance. Com experiência reconhecida no setor . Autor de diversas publicações em revistas jurídicas renomadas e responsável por casos de destaque na mídia, João Vitor Rossi está à frente de seu escritório, comprometido com a entrega de soluções inovadoras e eficazes para os seus clientes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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