O crime de Estelionato nas relações afetivas

Resumo:


  • O estelionato consiste em obter vantagem ilícita em prejuízo alheio, mediante artifício, ardil ou meio fraudulento, com penas mais graves para crimes eletrônicos.

  • O estelionato sentimental ocorre em relações afetivas, caracterizado pelo abuso de direito e pela obtenção de vantagens financeiras por meio de manipulação emocional.

  • Medidas de prevenção incluem não compartilhar cartões de débito/crédito, monitorar extratos bancários, formalizar empréstimos e protestar em cartório se houver descumprimento de acordos financeiros.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

  1. ESTELIONATO

De acordo com o artigo 171 do código penal o estelionato consiste em “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício, ardil ou qualquer meio fraudulento”.

Pode-se mencionar que a Lei nº 14.155 de 27 de maio de 2021 trouxe alterações no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), tornando mais graves os crimes de violação de dispositivo informático, furto e estelionato cometidos de forma eletrônica ou pela internet; e o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), para definir a competência em modalidades de estelionato.

Os fatos agravantes ao Estelionato são:

  • Furto qualificado por meio eletrônico, com pena de reclusão de 4 a 8 anos e multa.

  • Prejuízo significativo, que pode aumentar a pena em até dois terços.

  • Crime cometido contra uma entidade pública ou beneficente, que é considerado agravante.

Em relação a competência para o julgamento o STJ (2021) decidiu que:

​ por unanimidade, entendeu que no crime de estelionato, não havendo as hipóteses descritas no parágrafo 4º do artigo 70 do Código de Processo Penal (CPP), a competência para julgamento deve ser fixada no local onde o agente obteve, mediante fraude, em benefício próprio ou de terceiros, os serviços custeados pela vítima.

Segundo o dispositivo, alterado pela Lei 14.155/2021, nos crimes de estelionato praticados mediante depósito, emissão de cheques sem fundos ou com o pagamento frustrado, ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima e, em caso de pluralidade de vítimas, será fixada pela prevenção.   

A decisão veio após o colegiado analisar conflito de competência instaurado entre a 4ª Vara Criminal de Brasília e o juízo de direito criminal do Foro Central de Barra Funda, em São Paulo, nos autos de inquérito destinado a apurar estelionato contra uma empresa do ramo de turismo.

Na esfera civil podemos citar o art. 186 do atual Código Civil, onde positiva que aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Sendo que o próprio código civil conceitua ato ilícito quando diz que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Nesse sentido o estelionato pode acarretar responsabilidade civil, visto que ele causa danos na esfera patrimonial ou moral. Assim, pode-se solicitar a reparação deste dano.

Diniz (2005) defende que o dano seja um dos pressupostos da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem a existência de um prejuízo. Só haverá responsabilidade civil se houver um dano a reparar. Ainda sobre isso, a autora reparação do dano poderá processar-se: a) pela reparação natural, isto é, restauração do status quo alterado pela lesão, que poderá consistir na entrega da própria coisa, que, p. ex., havia sido furtada ou de objeto da mesma espécie, em troca do deteriorado; e b) pela indenização pecuniária quando for impossível restabelecer a situação anterior ao fato lesivo (DINIZ 2005, P 71).

Para que se configure um estelionato, é preciso que se pratique fraude. O que não precisa ser especificamente culposo (com intenção de se fazer), mas sim que cause danos a outra parte. Não há uma dupla aptidão ao que direciona a fraude, seja na ordem civil ou na ordem penal.

  1. O ESTELIONATO SENTIMENTAL (AFETIVO)

O estelionato sentimental (afetivo) é praticado dentro das relações. A utilização desse termo é oriundo de uma lide que ocorreu em 2015 por conta de um julgado da 7ª vara Cível de Brasília, onde um indivíduo fora condenado a ressarcir sua ex-namorada, que contraiu dívidas por conta dos atos ilícitos do ex-namorado que se aproveitou dos sentimentos da vítima. Nesse sentido julgou e decidiu por manter a sentença do juízo “a quo”:

PROCESSO CIVIL. TÉRMINO DE RELACIONAMENTO AMOROSO. DANOS MATERIAIS COMPROVADOS. RESSARCIMENTO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. ABUSO DO DIREITO. BOA FÉ OBJETIVA. PROBIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. Deve ser mantida a sentença a quo eis que, da documentação carreada para os autos, consubstanciados em sua maior parte por mensagens trocadas entre as partes, depreendendo-se que a autora/apelada efetuou continuadas transferências ao réu; fez pagamentos de dívidas em instituições financeiras em nome do apelado/réu; adquiriu bens móveis tais como roupas, calcados e aparelho de telefonia celular; efetuou o pagamento de contas telefônicas e assumiu o pagamento de diversas despesas por ele realizadas, assim agindo embalada na esperança de manter o relacionamento amoroso que existia entre os ora demandantes. Corrobora-se, ainda e no mesmo sentido, as promessas realizadas pelo varão-réu no sentido de que, assim que voltasse a ter estabilidade financeira, ressarciria os valores que obteve de sua vítima, no curso da relação. 2. Ao prometer devolução dos préstimos obtidos, criou-se para a vítima a justa expectativa de que receberia de volta referidos valores. A restituição imposta pela sentença tem o condão de afastar o enriquecimento sem causa, sendo tal fenômeno repudiado pelo direito e pela norma. 3. O julgador não está obrigado a pronunciar-se quanto a todos os dispositivos de lei invocados pelas partes, quando entender ser dispensável o detalhamento na solução da lide, ainda que deduzidos a título de prequestionamento.

4. Recurso conhecido e não provido

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Para o Juiz Luciano Santos Mendes

"Embora a aceitação de ajuda financeira no curso do relacionamento amoroso não possa ser considerada como conduta ilícita, certo é que o abuso desse direito, mediante o desrespeito dos deveres que decorrem da boa-fé objetiva (dentre os quais a lealdade, decorrente da criação por parte do réu da legítima expectativa de que compensaria a autora dos valores por ela despendidos, quando da sua estabilização financeira), traduz-se em ilicitude, emergindo daí o dever de indenizar".

Em relação ao Estelionato Sentimental o Projeto de Lei nº 6.444, de 2019, em seu artigo 4º, especifica que são acrescentadas penalidades para quem for idoso ou que, por doença ou deficiência mental, não tenha o discernimento necessário para cometer fraude emocional. Do ato: Aplica-se o § 4º A pena é dobrada se o objeto da infração for pessoa idosa ou pessoa que, por motivo de doença ou deficiência mental, não possua o discernimento necessário para a prática do ato.

Dessa maneira o objetivo da criação desse novo tipo de crime é como muitas pessoas se aproximam todos os dias com o objetivo de se apropriar indevidamente de seus bens, explorando possíveis vulnerabilidades emocionais e amorosas.

O Desembargador Carlos Pires Neto ressalta que o estelionato afetivo é caracterizado nas relações amorosas e emocionais, quais são necessariamente dotadas de afeto e carinho.

O estelionato sentimental decorre de um abuso de direito, visto que durante a manutenção de um relacionamento possa existir uma concepção de fidelidade, confiança, e por conta disso pode-se usar meios fraudulentos e ilícitos para obtenção de benefícios e vantagens, para si ou para outrem, a custas de um relacionamento afetivo.

  1. MEIOS DE PREVENÇÃO

Um dos métodos de prevenção é nunca emprestar ou compartilhar o uso de cartão de débito e crédito. Isso evita que os gastos pessoais ultrapassem aquilo que o indivíduo deseja.

Caso o casal compartilhe conta conjunta é necessário que sempre acesse os extratos bancários para verificar se está tudo em conformidade com acordado entre as partes. Sabemos que art. 1.568 do Código Civil descreve que “os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial”. Entretanto caso ocorra a retirada constante de valores, pode ser que haja o crime de apropriação indébita.

Quando durante o período de namoro, ou mesmo durante uma união estável ou casamento, há o empréstimo de valores para honrar questões privadas que não competem a questão de subsidiar os anseios e benefícios familiares, é bom que seja feito contrato e até mesmo promissórias (com a descrição de valor). È possível protestar perante o cartório de notas, no intuito de receber os valores que não foram devidamente honrados.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 6.444, de 2019. Altera o art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, Código Penal, para dispor sobre o estelionato sentimental. Brasília: Câmara dos Deputados, 2019.

_____. Tribunal de Justiça de Brasília. Processo nº 001XXXX-32.2013.8.07.0001.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 1 : teoria geral do direito civil/ Maria Helena Diniz – 22. ed. ver. e atual de acordo com o novo código civil (Lei n. 10.406, de 10-1-2002) e o Projeto de Lei n.6.960/2002. São Paulo: Saraiva, 2005.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil – v. 2– 14. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019.

Sobre a autora
Hayume Camilly Oliveira de Souza

Bacharela em Administração Pulica pela UNEMAT, graduanda no 10 período de Bacharelado em Direito na UNEMAT, Especialista em Gestão de RH, Especialista em Direito do Trabalho, e Pós- Graduanda em Interpretação e Tradução de LIBRAS, ambos pela FAMART.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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