Principais aspectos do depósito em matéria tributária

08/07/2024 às 09:00

Resumo:


  • O depósito em matéria tributária possui natureza jurídica de garantia, suspendendo a exigibilidade do crédito tributário, mas não se confunde com o pagamento do tributo.

  • A diferença entre depósito administrativo e judicial está relacionada ao momento e efeitos dessas medidas, sendo o administrativo realizado perante a autoridade fiscal e o judicial perante o Poder Judiciário.

  • O depósito judicial é um direito subjetivo do contribuinte para suspender a exigibilidade do crédito tributário, conforme Súmula Vinculante 28 do STF, sendo necessário que seja integral e em dinheiro para surtir efeito.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Por: Estela Riggio1

  1. NATUREZA JURÍDICA DO DEPÓSITO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA

Embora a obrigação tributária advenha da ocorrência do fato gerador, a exigência do pagamento do tributo só pode surgir após a constituição definitiva do crédito tributário com o lançamento.

É a partir daí que passa a ser possível a suspensão da exigibilidade, conforme expressa previsão legal já vista anteriormente, por meio de, dentre outras depósito do montante integral do débito, sendo este uma faculdade do contribuinte.

Basicamente, o depósito em matéria tributária possui a natureza jurídica de uma garantia, prestada pelo contribuinte para suspender a exigibilidade do crédito tributário, conforme previsto no artigo 151, II do CTN.

Paulo de Barros Carvalho (2021) assim afirma:

O depósito, pelo sujeito passivo, da importância relativa ao crédito tributário, pode ser promovido em dois momentos distintos: a) no curso do procedimento administrativo; e b) no processo judicial. Não se configura uma diligência obrigatória e, na primeira eventualidade, tem unicamente o efeito de evitar a atualização do valor monetário da dívida (correção monetária). Na segunda hipótese, além do depósito impedir o ajuizamento da ação de execução, por parte da Fazenda Pública, manifestando seu efeito suspensivo da exigibilidade, também previne a incidência da correção monetária.

É somente quando efetuado na esfera judiciária que surge o depósito do montante integral da dívida como causa suspensiva da exigibilidade, posto que feito perante a Administração, seja ao impugnar o lançamento, seja ao interpor recurso aos órgãos superiores, a virtude suspensiva já está assegurada por tais expedientes.2

O depósito, além de gerar automaticamente a suspensão da exigibilidade, permite ao contribuinte contestar a cobrança sem sofrer imediatamente as consequências do não pagamento. Este mecanismo é importante, pois é uma maneira de equilibrar os interesses do Fisco e dos contribuintes, garantindo a segurança jurídica e a justiça na cobrança de tributos.

Ressalte-se, no entanto, que o depósito não pode ser tido como pagamento do tributo, sob pena de configurar modalidade de extinção do crédito tributário (artigo 156, I do CTN), ao invés de suspensão. Além disso, não se confunde com a ação de consignação em pagamento em matéria tributária, caso em que o contribuinte deseja pagar o tributo em face de uma recusa do Fisco. Não há suspensão da exigibilidade do crédito tributário na ação consignatória, pois o contribuinte deposita o valor que considera devido justamente com o intuito de quitar o débito.

Neste viés, Luciano Amaro (2011) afirma que o depósito não é o pagamento, mas a garantia dada ao credor por um devedor, decorrente de uma obrigação tributária. Portanto, se o depositante sucumbe, o valor depositado será levantado pelo credor após decisão definitiva, extinguindo-se a obrigação tributária em questão.3

Hugo de Brito Machado, por sua vez, reforça essa natureza de garantia do depósito quando leciona, em sua obra, que o depósito é ato do contribuinte que,

(...) O depósito a que se refere o artigo 151, II do CTN é um ato voluntário do sujeito passivo da obrigação tributária que pretenda ter suspensa a exigibilidade do crédito tributário ou do dever de efetuar o pagamento antecipado do tributo, nos casos em que este e legalmente exigido.4

No entanto, entendemos que o objetivo do depósito é suspender a exigibilidade do crédito tributário sendo, nada mais que um pagamento antecipado da dívida tributária sob condição resolutória. Se o tributo for considerado indevido, o valor será devolvido ao depositante e, se a cobrança for considerada legítima, o pagamento será convertido em renda para o Fisco.

  1. DEPÓSITO ADMINISTRATIVO X DEPÓSITO JUDICIAL

A diferença entre depósito judicial e administrativo em matéria tributária está relacionada ao momento e aos efeitos dessas medidas nestas esferas. Apesar do foco do presente trabalho ser o depósito realizado no curso de processo judicial, que será melhor destrinchado nos capítulos posteriores, para facilitar a compreensão e a visualização, abaixo as principais distinções entre ambos:

Depósito Administrativo:

  1. Finalidade: O depósito administrativo é realizado perante a autoridade fiscal (como a Receita Federal e as Secretarias de Fazenda Estaduais), após a constituição do crédito tributário pelo lançamento, pois é somente após a inserção da norma individual e concreta é que o contribuinte saberá o valor que estará sendo cobrado e poderá efetivar o depósito;

  2. Requisitos e Procedimento: O depósito administrativo segue requisitos estabelecidos pela legislação tributária e é feito diretamente na repartição fiscal competente. Geralmente, o contribuinte realiza o depósito acompanhado de uma impugnação/defesa administrativa formal.

  3. Suspensão da Exigibilidade: O depósito administrativo suspende automaticamente a exigibilidade do crédito tributário, podendo evitar até o aforamento de Execução Fiscal por parte do Fisco.

Depósito Judicial:

  1. Finalidade: O depósito judicial é realizado perante o Poder Judiciário como parte de um processo judicial em curso. Ele é utilizado pelo contribuinte para contestar judicialmente a exigibilidade ou legalidade de um crédito tributário;

  2. Requisitos e Procedimento: O depósito judicial deve seguir os requisitos estabelecidos pela legislação processual e tributária aplicável. Geralmente, o contribuinte deposita o valor contestado em uma conta judicial específica, autorizada pelo tribunal competente.

  3. Suspensão da Exigibilidade: O depósito judicial tem suspende automaticamente a exigibilidade do crédito tributário discutido, enquanto o processo está em andamento. Isso evita que o fisco adote medidas coercitivas de cobrança, como protesto ou inscrição em dívida ativa, exceto se for realizado no curso de uma Execução Fiscal.5

Em resumo, o depósito administrativo ocorre no âmbito da administração tributária como parte do procedimento de impugnação administrativa após a constituição do crédito tributário, enquanto o depósito judicial em matéria ocorre no âmbito de um processo judicial para contestar a exigência do tributo.6

  1. O DEPÓSITO JUDICIAL COMO DIREITO SUBJETIVO DO CONTRIBUINTE (SÚMULA VINCULANTE 28 DO STF)

A respeito do art. 151, II, do CTN, é consenso entre a jurisprudência e a doutrina brasileira, que o contribuinte tem o direito subjetivo de realizar o depósito do valor considerado devido pelo Fisco. Isso significa que ele pode, mediante este ato, suspender automaticamente a exigibilidade do crédito tributário, independentemente de decisão judicial homologatória, para evitar a cobrança do tributo e a incidência da correção monetária.

Oportuno consignar que o tema em questão recebe o seguinte tratamento por parte do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

PROCESSUAL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO CAUTELAR. DEPÓSITO INTEGRAL DO VALOR DA DÍVIDA. AUTORIZAÇÃO JUDICIAL DESNECESSIDADE. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO TRIBUTO. 1. O depósito de que trata o art. 151, II, do CTN constitui direito subjetivo do contribuinte, que pode efetuá-lo tanto nos autos da ação principal quanto em Ação Cautelar, sendo desnecessária a autorização do Juízo. 2. É facultado ao sujeito passivo da relação tributária efetivar o depósito do montante integral do valor da dívida, a fim de suspender a cobrança do tributo e evitar os efeitos decorrentes da mora, enquanto se discute na esfera administrativa ou judicial a exigibilidade da exação. 3. Agravo Regimental não provido.7

Nesta linha de pensamento, reforçando ainda mais este direito subjetivo e a não obrigatoriedade do depósito, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante nº 28 que assim dispõe: “É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade de crédito tributário.”

A exigência de depósito prévio como requisito para o manejo de ações viola não só o referido direito subjetivo mencionado anteriormente, como o princípio do acesso à justiça, consubstanciado no inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal. O precedente base desta súmula é a ADI nº 1074, na qual o STF julgou ser inconstitucional o art. 19 da Lei n. 8.870/94, que impunha a realização de depósito prévio do valor supostamente devido como condição para propor eventual ação que tenha por objeto discutir crédito tributário.

  1. FORMA, REQUISITOS E EFEITOS DO DEPÓSITO JUDICIAL (SÚMULA 112 DO STJ)

Atualmente, é pacífico o entendimento manifestado na jurisprudência pátria no sentido de que somente o depósito integral e em dinheiro é capaz de desempenhar o objetivo principal deste mecanismo, que é impedir a exigibilidade do crédito tributário.

Neste sentido é que foi editada pelo Superior Tribunal de Justiça a Súmula nº 112 que dispõe que “depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro”.

O termo “montante integral” expresso tanto na Súmula quanto na lei (artigo 151, II), é aquele calculado pela Fazenda Pública, e não o valor que o contribuinte considera justo. Para que suspenda a exigibilidade do crédito, o depósito tem de ser suficiente, a fim de garantir o crédito tributário, acautelando os interesses fazendários8. Aliás, neste sentido, expressa Hugo de Brito Machado (2022), que a efetivação do depósito:

(...) não significa, de modo algum, que o depositante esteja de acordo com a pretensão da Fazenda. Muito pelo contrário, o depositante geralmente se opõe a ela. Ou, mais exatamente, o valor a ser depositado para suspender a exigibilidade do crédito tributário ou do dever jurídico de fazer o pagamento antecipado é aquele que o depositante considera indevido.9

Com relação à forma que o depósito judicial deve ser realizado, a Súmula acima transcrita não deixa dúvidas que deve ser em espécie, dinheiro, que traduz sua característica mais marcante: a liquidez.

Pois bem. Para que o depósito judicial nas ações tributárias surta o efeito pretendido é necessário que se cumpram alguns requisitos:

  1. Valor Correto: O depósito deve ser feito no valor integral do tributo. É fundamental que o valor depositado seja exato e corresponda ao montante devido conforme o lançamento fiscal, calculado pela autoridade fiscalizadora. Caso o depósito seja realizado em valor parcial, o contribuinte corre o risco de não ter a exigibilidade do crédito suspensa;

  2. Instituição Financeira Autorizada: O depósito deve ser feito em instituição financeira autorizada pelo Poder Judiciário e estará vinculado, obrigatoriamente, a um processo judicial;

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  3. Identificação Correta: O depósito deve ser identificado corretamente, indicando a natureza do tributo, o período de apuração, o valor exato e a identificação do contribuinte;

  4. Motivo e Fundamentação: É essencial que o depósito seja acompanhado de uma fundamentação jurídica sólida, demonstrando os motivos de sua realização;

  5. Petição ou Manifestação Judicial: Em alguns casos, o depósito judicial pode requerer uma petição ou manifestação judicial formalizando sua realização e, eventualmente, a contestação do tributo.10

Já os efeitos do depósito, de acordo com o entendimento de Hugo de Brito Machado (2022), podem ser os seguintes:

  1. Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário: O depósito judicial suspende a exigibilidade do crédito tributário. Isso significa que o Fisco não pode executar a cobrança do tributo, nem praticar qualquer ato de constrição patrimonial enquanto o depósito estiver válido e eficaz;

  2. Garantia do Juízo: O depósito em juízo funciona como garantia para o discutir do tributo cobrado, assegurando que o valor correspondente esteja disponível caso a decisão judicial seja desfavorável ao contribuinte;

  3. Impedimento de Protesto ou Inscrição em Dívida Ativa: Enquanto o depósito judicial estiver em vigor, o débito em questão não pode ser protestado em cartório ou inscrito em dívida ativa pelo Fisco. Exceto quando for realizado após o aforamento da Execução, como veremos mais adiante.

  4. Paralisação de Execuções Fiscais: Se houver uma Execução Fiscal em curso relacionada ao tributo depositado judicialmente, esta será suspensa temporariamente, possibilitando, ainda a oposição de Embargos à Execução Fiscal.

  5. Possibilidade de Levantamento ou Conversão em Renda: Caso o contribuinte obtenha uma decisão favorável no processo judicial, o valor depositado em juízo pode ser levantado por este. Caso contrário, a Fazenda poderá convertê-lo em renda a seu favor.11

  1. CONCLUSÃO

Ainda há muitas questões relacionadas à realização de depósito pelo contribuinte em matéria tributária, que ainda estão sendo e serão enfrentadas pelo Poder Judiciário.

O fato é que, caso o contribuinte opte por apresentar esse tipo de garantia, deve ser feito uma análise detida dos impactos que isso pode causar ao seu patrimônio ou eventualmente à atividade econômica exercida, pois, apesar das claras vantagens que traz, é a forma mais onerosa de caução.


  1. Advogada tributarista, mestranda no Instituto Nacional de Estudos Tributários – IBET.

  2. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 31ª ed. São Paulo: Noeses, 2021, p. 478.

  3. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 17ª ed. São Paulo: Saraiva. 2011.

  4. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 42ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2022, p. 192.

  5. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 42ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2022.

  6. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 33ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2021.

  7. STJ, AgRg no REsp n. 517.937/PE, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/4/2009, DJe de 17/6/2009.

  8. PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 8ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2017, p. 265.

  9. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 42ª. ed. rev. e atual. – São Paulo: Malheiros Editores, 2022, p. 195.

  10. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 33ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2021.

  11. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 42ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2022.

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