É possível regularizar por Usucapião Extrajudicial imóveis cujo Inventário nem mesmo foi iniciado?

10/07/2024 às 17:53
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A REGULARIZAÇÃO de imóveis via usucapião deve ter como primeira iniciativa a pesquisa da origem registral junto ao Cartório de Imóveis competente pelo seu registro. Parece óbvio mas por incrível que pareça muitos são os casos onde os ocupantes - desavisados - já estão há anos na posse do bem mas em nenhum momento buscaram tais informações junto à Serventia Extrajudicial. Cabe anotar que hoje em dia através da Central Eletrônica dos Registros de Imóveis a cargo do SAEC de Atendimento Eletrônico Compartilhado - https://registradores.onr.org.br/ - a pesquisa pode facilmente ser realizada. Efetivamente será no momento da busca dessas informações que o interessado poderá verificar inclusive que o exercício da posse infelizmente poderão não resultar em Usucapião, por mais que ele ocupe o imóvel por muitos e muitos anos - como invariavelmente deverá acontecer no caso de bens públicos.

A investigação da origem registral é a primeira medida que recomendamos quando o interessado pretende a Usucapião de um imóvel - em que pese nosso exame inicial da documentação e do exercício da posse sobre o bem possa apontar outras soluções que não apenas a Usucapião como forma de regularização. É importante sublinhar que a apuração junto ao Cartório de Imóveis e à prefeitura pode apontar com muita frequência bens imóveis que pertencem a pessoas já falecidas. Nesse caso, será que a inexistência de um Inventário poderá representar óbice para a aquisição por terceiros via usucapião?

Inicialmente é preciso destacar que o fato de o titular registral ser falecido não pode representar óbice para a regularização via usucapião. A bem da verdade, pode nem mesmo haver proprietário registral (como acontece quando a resposta para o pedido de certidão da matrícula no RGI é uma "Certidão de NADA CONSTA"). Ora, se pode ser possível Usucapião de Imóveis que não possuem titular registral identificado com muito mais razão pode ser possível quando o mesmo existe no fólio registral mas já é falecido. O que importa nessa hipótese de Usucapião será efetivamente a comprovação dos requisitos necessários para a aquisição conforme a espécie de Usucapião manejada no caso. Um exemplo será a USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA, hipótese muito comum onde os pontos fortes serão o CURTO TEMPO DE POSSE exigido e a inexigibilidade de TÍTULO e BOA-FÉ. Reza o artigo 1.240 do atual Código Civil:

"Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural".

Como se observa acima (e da mesma forma como nas demais espécies de Usucapião) o legislador nada fala a respeito do fato de o imóvel pertencer ou não a pessoa falecida, razão pela qual esse detalhe desimporta, sendo irrelevante. Fato é que os requisitos exigidos pela espécie pretendida/escolhida precisam ser devidamente comprovados (especialmente a inocorrência de oposição por quaisquer interessados durante o período de posse exigida), podendo ao final o interessado valer-se tanto da via judicial quanto da via extrajudicial para obter o reconhecimento do seu direito. A propósito, a regulamentação atual da USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL egressa do Provimento CNJ 149/2023 traz importantes observações que se aplicam para o caso de titulares registrais falecidos, senão vejamos:

"Art. 409. Na hipótese de algum titular de direitos reais e de outros direitos registrados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula do imóvel confinante ter FALECIDO, poderão assinar a planta e memorial descritivo os herdeiros legais, desde que apresentem escritura pública declaratória de únicos herdeiros com nomeação do inventariante".

Naturalmente que na impossibilidade de se localizar os herdeiros do falecido (o que é muito comum inclusive, face ao possível desconhecimento de suas informações) a solução será aquela do art. 408 que prevê a notificação por EDITAL que pode ser inclusvie realizada por meio eletrônico, depois de constatada a impossibilidade de notificação pelos meios previstos no art. 407 da regulamentação.

POR FIM, em se tratando de pessoa sabidamente falecida, importa observar que na inexistência de inventário iniciado terão legitimidade passiva os eventuais herdeiros do falecido, diferentemente da hipótese onde o inventário seja conhecido, quando então a legitimidade passiva recairá sobre o Espólio, como aponta com acerto a jurisprudência do TJMG que nessa toada cassou a sentença do juízo de piso:

"TJMG. 5000673-77.2022.8.13.0557. J. em: 21/02/2024. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE USUCAPIÃO - NULIDADE DA SENTENÇA - PROCEDIMENTO LEGAL NÃO ATENDIDO - AUSÊNCIA DA MATRÍCULA DO IMÓVEL USUCAPIENDO E DA IDENTIFICAÇÃO DE SEU PROPRIETÁRIO - OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO - SENTENÇA CASSADA - EMENDA A SER OPORTUNIZADA. - As decisões do TJMG vêm no sentido da necessidade da juntada da matrícula do imóvel usucapiendo para identificar o proprietário e garantir o contraditório - Sem a prova da propriedade por meio da matrícula do imóvel usucapiendo, resta inviabilizada a citação do proprietário e, SE FALECIDO, como diz a parte autora, a citação do ESPÓLIO ou dos HERDEIROS, a depender da existência do inventário e do estado em que esse se encontra - A medida cabível é o reconhecimento da nulidade da sentença, por ter sido proferida sem apontar o legitimado passivo, devendo a petição inicial ser emendada para fazer constar o nome do proprietário registral e, se falecido, do espólio ou dos herdeiros, comprovando o domínio por meio da juntada da matrícula do imóvel (loteamento), destacando-se, ainda, o lote objeto da ação em memorial descritivo e croqui".

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Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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