Herança e Meação: a viúva ainda tem direito a receber os dois no Inventário em virtude do falecimento do seu marido?

12/07/2024 às 10:51
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EM SEDE de Direito Sucessório é importante distinguir dois institutos importantes muito comuns no momento do partilhar os bens deixados pelas pessoas falecidas: HERANÇA e MEAÇÃO. Herança é tudo aquilo que o morto transmite por ocasião do seu falecimento, ainda aderida a essa massa a "meação". A meação, que tem origem no Direito de Família, pode ou não existir em alguns casos e, existindo, deve ser destacada do patrimônio total deixado, sendo que o que sobrar será efetivamente a herança. Nesse linha a doutrina abalizada do professor FLAVIO TARTUCE (Manual de Direito Civil. 2017) destaca explicando sobre o atual Código Civil:

"(...) como se nota, o objetivo do legislador foi separar claramente a meação da herança. Assim, pelo sistema instituído, quando o cônjuge – e agora também o companheiro – é meeiro não é herdeiro; quando é herdeiro não é meeiro. Nunca se pode esquecer que a MEAÇÃO não se confunde com a HERANÇA, sendo esta confusão muito comum entre os operadores do Direito. MEAÇÃO é instituto de Direito de Família, que depende do regime de bens adotado. HERANÇA é instituto de Direito das Sucessões, que decorre da morte do falecido".

Com toda razão; por ocasião do Inventário é preciso avaliar muito bem o estado civil do (a) falecido (a) para apurar se de fato haverá MEAÇÃO a ser destacada (que inclusive não se "transmite" e, por tal razão, não deve ser objeto de tributação, diferentemente do que ocorre com a HERANÇA que é transmitida e por isso deve ser tributada). A ilustre Desembargadora Aposentada do TJRS e Advogada, MARIA BERENICE DIAS (Manual das Sucessões. 2021) também esclarece com sua já reconhecida didática:

"Antes de se quantificar a HERANÇA, é preciso atentar ao ESTADO CIVIL do falecido para apartar eventual MEAÇÃO. Tanto a existência como a extensão dos bens que integravam a meação dependem do regime de bens do CASAMENTO ou da UNIÃO ESTÁVEL. (...) Desse modo, se o falecido era casado ou vivia em união estável, primeiramente dividem-se os BENS COMUNS do casal em duas partes iguais: uma corresponde à meação do cônjuge ou do companheiro. A outra metade faz parte da HERANÇA do falecido. (...) A meação do sobrevivente não integra o acervo hereditário, não é herança. Precisa ser apartada do acervo sucessório destinado aos herdeiros. Assim, é necessário excluir a meação antes de se apurar a legítima dos herdeiros necessários: a meação do falecido e mais os seus bens particulares".

Na atualidade (e algumas regras mudarão em breve já que a REFORMA DO CÓDIGO CIVIL tramita atualmente no Senado) pode ser possível à VIÚVA (O) (e também à(ao) companheira (o) sobrevivente, se esse for o caso) recolher além de MEAÇÃO também a HERANÇA, caso inexistam herdeiros outros que a prefiram na ordem de vocação hereditária (art. 1.829 do CCB). Nesse sentido a lição dos ilustres Desembargadores Aposentados do TJSP, SEBASTIÃO AMORIM e EUCLIDES DE OLIVEIRA (Inventário e Partilha - Teoria e Prática. 2020):

"Apurada a MEAÇÃO, que corresponde a 50% dos bens comuns, o patrimônio restante, que constitui a HERANÇA, caberá ao cônjuge sobrevivo, na falta de descendentes ou ascendentes (art. 1.829, III, do CC). Nesse caso, NÃO INTERESSA o regime adotado, seja o de comunhão de bens ou o de separação, uma vez que apenas o cônjuge será herdeiro, salvo se, por ocasião da abertura da sucessão, já estivesse dissolvida a sociedade conjugal (art. 1.838 do CC)".

Cabe ressaltar, por fim que, havendo outros herdeiros - ou seja, deixando o falecido descendentes, por exemplo - destacada a meação não deverá mesmo a viúva participar da herança mas apenas com relação aos bens comuns (onde justamente já tem meação), sendo possível, sem prejuízo de já estar contemplada com meação em alguns bens, herdar naqueles bens onde não tem meação (como por exemplo, os bens particulares adquiridos anteriormente ao casamento ou aqueles clausulados, onde sua meação não alcança) como aponta a jurisprudência paulista:

"TJSP. 20063151020238260000. J. em: 21/09/2023. CIVIL. SUCESSÕES. INVENTÁRIO. ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. CÔNJUGE SUPÉRSTITE CASADA SOB O REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. BEM PARTICULAR HERDADO PELO" DE CUJUS "COM CLÁUSULA DE INCOMUNICABILIDADE. IRRELEVÂNCIA. 1. Tratando da ordem de vocação hereditária, dispõe o art. 1.829, I, do Código Civil que a sucessão legítima defere-se, primeiramente, aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares. 2. O instituto da MEAÇÃO não se confunde com o da HERANÇA, razão pela qual a cláusula de incomunicabilidade imposta a um bem não se relaciona com a vocação hereditária. Assim, se o indivíduo recebeu por doação ou testamento bem imóvel com a referida cláusula, sua morte não impede que seu herdeiro receba o mesmo bem. Precedentes do C. STJ e deste E. TJSP. 3. Agravada que, enquanto cônjuge supérstite do autor da herança, DEVE CONCORRER com os agravantes na sucessão hereditária relativa ao imóvel discutido. 4. Cláusula de INCOMUNICABILIDADE, ademais, instituída com a finalidade expressa de evitar redução patrimonial dos herdeiros em razão do DIVÓRCIO, cenário distinto do apresentado nos autos. 5. Decisão mantida. RECURSO DESPROVIDO".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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