STJ:como a fixação da tese sobre a data-base para progressão de regime prisional pode colapsar o sistema penitenciário?

21/08/2024 às 16:37
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Recentemente, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, a qual é composta pelas Quinta e Sexta Turmas, colegiados com competência em matéria penal, por maioria de votos, firmou a seguinte tese sob o rito dos recursos repetitivos:

 “A decisão que defere a progressão de regime não tem natureza constitutiva, senão declaratória. O termo inicial para a progressão de regime deverá ser a data em que preenchidos os requisitos objetivo e subjetivo descritos no artigo 112 da Lei 7.210, de 11/07/1984 (Lei de Execução Penal), e não a data em que efetivamente foi deferida a progressão. Essa data deverá ser definida de forma casuística, fixando-se como termo inicial o momento em que preenchido o último requisito pendente, seja ele o objetivo ou o subjetivo. Se por último for preenchido o requisito subjetivo, independentemente da anterior implementação do requisito objetivo, será aquele (o subjetivo) o marco para fixação da data-base para efeito de nova progressão de regime.”

 Para entender a questão envolvida no julgamento da Corte Superior, é necessário compreender os requisitos necessários para a progressão de regime prisional (artigo 112 da Lei 7.210/84): 1º) porcentagem de pena a ser cumprida; 2º) natureza do crime cometido e; 3º) condições comportamentais e pessoais do sentenciado, as quais deverão ser constatadas por atestado de conduta carcerária e exame criminológico.

 Nesta perspectiva, a questão enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça foi a seguinte: quando deve se dar o inicio da contagem de prazo para uma segunda progressão de regime prisional na execução de pena?

 Pois bem, em relação ao primeiro marco inicial para a progressão de pena não existe maior discussão: é o inicio da execução da pena, com a expedição da guia de recolhimento e confecção do cálculo de pena, o qual deverá considerar eventual detração penal.

 Como dito acima, a questão ganha polêmica quando se trata da data-base relacionada à segunda progressão de regime (regime aberto) ou fruição de outro benefício em execução penal (exemplo livramento condicional). A tese firmada pela Corte Superior enfrenta duas hipóteses possíveis: 1ª) a partir da data da sentença de deferimento da progressão de regime ou, 2º) quando do preenchidos dos requisitos objetivo e subjetivo descritos no artigo 112 da LEP, não importando a ordem.

 A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça ao firmar a tese acima referida, nada mais fez que reafirmar a sua Jurisprudência já consolidada, qual seja ,"a data inicial para progressão de regime deve ser aquela em que o apenado preencheu os requisitos do art. 112 da Lei de Execução Penal, e não a data da efetiva inserção do reeducando no regime atual". (AgRg no REsp n. 1.582.285/MS).

Isso porque, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC n. 115.254/SP, firmou entendimento de que a decisão que concede a progressão de regime tem natureza declaratória e não constitutiva, ou seja, apenas declara uma realidade jurídica já preexistente à decisão – o preenchimento dos requisitos legais.

 Mas uma importante critica se faz necessária.

 Com o advento da Lei nº 14.843/24, a progressão de regime prisional para todos os crimes está condicionada à realização do exame criminológico. Entretanto, preocupado com as consequências da novidade legislativa, o CNJ fez um levantamento, que demonstrou a possibilidade do sistema carcerário entrar em colapso, uma vez que cerca de 283 mil presos deixariam de avançar em suas penas, num prazo de apenas um ano em razão da existência insuficiente de corpo técnico na realização das perícias (psicólogo, psiquiatras e assistentes sociais). Sem contar, ainda, que a avaliação do custo do esperado prolongamento no cumprimento da pena demonstrou que poderá haver um impacto de aproximadamente R$ 6 bilhões anuais.

 Feitas estas breves considerações, parece evidente que a consolidação da tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, que está no mesmo sentido da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, deverá causar reflexos na vindoura analise da constitucionalidade da obrigatoriedade do exame criminológico em sede de execução penal, sob pena da iminente implosão do sistema prisional brasileiro.

Sobre o autor
Henrique Gonçalves Sanches

Advogado responsável pela área penal do escritório Gilberto Rodrigues Gonçalves e Advogados Associados. Mestrando em Direito Político e Econômico e membro do Grupo de Pesquisa de Direito Penal Econômico e Internacional da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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