A herança é um único imóvel, eu não quero dividi-lo com a minha irmã e nem abro mão da minha parte. E agora?

03/09/2024 às 16:48
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OS INVENTÁRIOS representam um processo nem sempre tranquilo e linear, porém necessários: quando possível, a melhor orientação será sempre pela adoção da VIA EXTRAJUDICIAL (nos moldes da Lei 11.441/2007 c/c Resolução 35/2007 do CNJ) onde os Inventários ainda que vultosos e complexos - envolvendo grande quantidade de herdeiros, contendo diversos bens, mesmo sediados em vários Estados ou ainda, de variadas naturezas (bens móveis, imóveis, saldos bancários, direito e ação, cotas e participações em empresas etc) - tenderão a ter uma solução mais célere que no tradicional processo judicial.

Ainda assim, nosso conselho é sempre pautado na INAFASTABILIDADE DA VIA JUDICIAL, considerando ser a via extrajudicial uma faculdade e jamais uma obrigatoriedade. Não por outra razão é clara a Resolução 35/2007 do CNJ que regula o procedimento em Cartório:

"Art. 2º. É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial".

Como em todos os processos extrajudicializados (ou desjudicializados, como queira) que temos até agora, devemos ter como regra que todos são facultativos, reservando às partes devidamente aconselhadas por seu Advogado a opção entre a via judicial e a via extrajudicial diante das peculiaridades de cada caso concreto. A via judicial como sabemos tem maior envergadura para a solução de problemas/conflitos, ainda que notemos com muita admiração a possibilidade de solução de determinados conflitos em sede extrajudicial, principalmente com assessoramento do Tabelião e presença dos Advogados das partes envolvidas.

Em sede extrajudicial o Inventário não poderá ser resolvido quando entre as partes um conflito insuperável não puder ser resolvido, como sempre ditou a Resolução regulamentadora e a Lei 11.441 desde os primórdios, todavia pensamos que havendo acordo entre todos os envolvidos pela venda dos bens (inclusive com o inventário extrajudicial em curso, nos termos do art. 11-A da Resolução 35/2007 do CNJ) a solução poderá ser alcançada extrajudicialmente. Não se pode perder de vista que um ponto importante e sempre presente nos Inventários diz respeito ao CONDOMÍNIO LEGAL que é formado pela transmissão da herança que acontece a partir do falecimento do "de cujus": é que por ocasião do falecimento a transmissão da herança ocorre automaticamente por pura ficção legal - mesmo sem Inventário aberto, como já explicamos em outras passagens. Trata-se do "Direito de Saisine" que tem embasamento legal no art. 1.784 do Código Civil atual:

"Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários".

Com o condomínio legal cada herdeiro terá uma COTA IDEAL sobre todo o acervo hereditário, o que pode significar a indesejável formação da copropriedade sobre os bens da herança se isso não for modificado por ocasião da partilha. Nem sempre manter uma propriedade (principalmente propriedade imobiliária) com outra pessoa (principalmente determinados parentes) pode ser uma boa ideia. Na verdade, em sede de partilha de bens o condomínio deve ser evitado como orienta a festejada doutrina assinada pelo ilustre Professor e Procurador de Justiça Fluminense, J.M. LEONI LOPES DE OLIVEIRA (Direito Civil - Sucessões. 2019) explicando o "Princípio da Prevenção de Conflitos Futuros":

"PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO DE CONFLITOS FUTUROS - O art. 648, II, do CPC estabelece que na partilha será observada a seguinte regra: a prevenção de litígios futuros. Já vimos que com a partilha se extingue o estado de comunhão hereditária, muitas vezes, causa de conflitos entre os herdeiros. Assim, no partilhar, deve-se evitar que bens fiquem em condomínio entre os herdeiros. Conforme alerta Silvio Rodrigues, 'cumpre evitar a indivisão, pois, ao ver de quase todos, o condomínio é um ninho de desavença e demandas'. (...)"

De fato, tanto o CPC quanto o CCB já trazem a solução que autoriza a venda judicial do bem componente da herança caso não haja entre os herdeiros consenso sobre a partilha, o que com todo acerto prestigiará o citado princípio, facilitará a divisão, realização e entrega do direito de cada um e a solução do impasse. O artigo 2.019 do Código Civil determina:

"Art. 2.019. Os bens insuscetíveis de divisão cômoda, que não couberem na meação do cônjuge sobrevivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor apurado, a não ser que haja acordo para serem adjudicados a todos.

§ 1º. Não se fará a venda judicial se o cônjuge sobrevivente ou um ou mais herdeiros requererem lhes seja adjudicado o bem, repondo aos outros, em dinheiro, a diferença, após avaliação atualizada.

§ 2º. Se a adjudicação for requerida por mais de um herdeiro, observar-se-á o processo da licitação".

Dessa forma, não sendo caso de solução pela via extrajudicial, uma vez adotada a via judicial para a solução do Inventário e não chegando os herdeiros a um consenso sobre a partilha, por exemplo, de um único bem imóvel, a solução do impasse poderá se dar nos termos do art. 2.019 do CCB e do art. 649 do Código Fux, com a venda judicial do bem e a partilha sendo feita diretamente no produto da venda, como inclusive reconhece a jurisprudência exarada pelo ilustre Professor e Desembargador do TJSP, Dr. FRANCISCO LOUREIRO:

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"TJSP. 21483257720238260000. J. em: 02/08/2023. INVENTÁRIO. Diversos herdeiros que não convergem quanto à partilha. Inventário que já dura seis anos sem regular solução. Imóvel único e indivisível. Alienação do bem em hasta pública. Admissibilidade. Bem insuscetível de divisão cômoda. Medida proporciona o imediato pagamento de passivos e repartição do saldo entre os herdeiros. Previsão de alienação de bem no art. 649 do CPC. Regime de comunhão entre os herdeiros, por força da saisine, sobre o único imóvel indivisível, que de qualquer modo seria convertido em condomínio do art. 1.314 do CC por força de futura partilha. Ressalva do direito de preferência dos herdeiros no momento da venda, na forma do art. 2.019, § 1º, do Código Civil. Recurso provido".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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