A presença da concordância nominal na fala dos estudantes do município de Jitaúna - BA

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RESUMO

Este artigo baseia-se nos estudos da sociolinguística, tendo como principal alicerce os estudos Labovianos, também conhecido como a Teoria da Variação e Mudança Linguística. Seu objeto de estudo é a variação e mudança da língua no contexto social perpassando a comunidade de fala. O objetivo geral desta pesquisa é observar a variação linguística entre os estudantes do ensino médio, baseando na zona de moradia, a idade e o grau de formação, por meio de entrevista com os estudantes. Os objetivos específicos são: analisar a concordância da marcação dos sintagmas nominais; analisar marcação do plural na posição do sintagma nominal; analisar as contribuições das variantes para marcação do sintagma nominal. Foi realizada uma entrevista semiestruturada nos dias 27 e 28 de novembro de 2018, na cidade de Jitaúna, com os estudantes do ensino médio, do Colégio Estadual Gilda Ramos dos Santos por meio de entrevistas gravadas através de aparelhos celulares, foram obtidos resultados dos fatores linguísticos que a marcação do plural no sujeito foi de uso recorrente, quanto dos fatores extralinguísticos, e percebeu-se que a faixa etária influenciou no desvio de concordância.

Palavras-chave: Sociolinguística; Estudantes; Fatores Linguísticos; Fatores Extralinguísticos.

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INTRODUÇÃO

A língua em uma sociedade é importante para comunicação significativa. Os estudos de Saussure para a linguística foram de suma importância para o entendimento da língua, o linguista estruturalista acreditava nos estudos da língua em si para si mesma. Outro linguista conhecido pela corrente linguística gerativista é Noam Chomsky com a teoria da língua internalizada no falante desde seu nascimento.

Contrapondo os linguistas, na década de 1960, com a divulgação das primeiras pesquisas realizadas por Labov (2008), cujo modelo teórico-metodológico abordou questões que caracterizou o inglês falado na ilha de Martha’s Vineyard, no Estado de Massachusetts, Estados Unidos, a sociolinguística ganhou adeptos e importância em vários países. Essa teoria observa a língua por variações correlacionadas a diversos fatores que contribuem para variação e mudança linguística, bilinguismo, contato linguístico, línguas minoritárias, regionalismo, dialetos, entre outras.

Desse modo, o estudo tem como objetivo geral observar e analisar a variação linguística nos estudantes, baseando a zona de moradia, a idade e o grau de formação, por meio de entrevista com os estudantes. Os objetivos específicos são analisar a concordância da marcação dos sintagmas nominais; analisar marcação do plural na posição do sintagma nominal; analisar as contribuições das variantes para marcação do sintagma nominal.

1. UMA REFLEXÃO HISTÓRICA E SÍNTESE LABOVIANA

Para compreendermos os pressupostos teóricos da Sociolinguística, desde já se faz necessário observar um recorte contextual em termos gerais dos estudos da linguagem do século XX, iniciado pelos tradicionais e nomeados linguistas Ferdinand de Saussure (1913) e Noam Chomsky (1928).

Por meio de seu curso de linguística geral Saussure lança a linguística moderna, na qual delineia e define seu objeto de pesquisa, define o objeto da linguística: a língua, destacando-a como um fenômeno unitário, e denomina o signo linguístico como substancialista, consistindo na união de um significante a um significado. Nessa linha de pensamento, o signo linguístico não une um nome a uma coisa, mas um conceito a uma imagem acústica; e isso não está ligado apenas ao som material, mas a impressão psíquica dos sons associada à materialização dessa imagem, aquilo que pensamos e compreendemos da palavra. Nessa linha de pensamento, delimita dicotomias básicas (língua / fala, sincronia / diacronia, sintagma / paradigma), como elementos que se inter-relacionam.

Saussure era considerado o centro da corrente linguística nomeada estruturalismo, acreditando que a língua é apreendida em si mesma e desprendida de fatores externos, sendo observada como uma estrutura independente, de valor simplesmente linguístico, estabelecidos entre seus elementos, segundo Saussure, “a linguística tem por único e verdadeiro objetivo a língua considerada em si mesma e por si mesma” (Saussure, 1995).

Na década de 1960, nos Estados Unidos, a visão padrão da língua ganha destaque com Noam Chomsky a partir da corrente denominada gerativismo, para a qual a língua se compreende como um sistema de princípios universal, e visualizado pelo conhecimento internalizado que um falante tem de sua língua, sob a perspectiva do modo inicial da capacidade natural da linguagem, isto é, a competência. Para tanto, o foco gerativista é o modelo abstrato de regras e construção das sentenças gramaticais.

Para tanto, a abordagem estruturalista e gerativista, ambas consideram a língua uma realidade abstrata, sem qualquer ligação com fatores históricos e sociais. Em contradição a essas duas correntes, é que a sociolinguística quantitativa surge nos Estados Unidos, na década de 1960, tendo como um dos principais representantes William Labov (1972).

A Sociolinguística Quantitativa ou Laboviana, também conhecida por Teoria da Variação e Mudanças Linguísticas, tem por base de pesquisa a variação e mudança da língua, no contexto social na comunidade de fala. Essa abordagem proposta por Labov objetiva refletir sobre a estrutura e evolução da língua no contexto social da comunidade, em contraponto ao campo meramente linguístico como estudos fonéticos, morfológicos, morfossintáticos, sintáticos e semânticos. (Labov, 2008)

Figueroa (1996) pontua que as expressões habitualmente utilizadas na língua, não precisa ser mal interpretada, visto que a sociolinguística laboviana não segue um propósito exclusivo da teoria da fala de modo a detalhá-la, e sim, a pesquisa da utilização da língua no intuito de investigar o que ela esclarece sobre a estrutura linguística (langue).

Labov fala sobre a variação, ao se referir à heterogeneidade, mas seu interesse está na variação que pode ser explicada de forma sistemática, ou seja, formas variadas que podem dizer a mesma coisa, de modo que essas formas tenham o mesmo significado referencial. Assim, a linguística Laboviana passou a ser símbolo de pesquisa da variação e mudança linguística.

Nota-se invariável compreender o desenvolvimento de variação e mudança linguística fora da vida social da comunidade, visto que influências sociais estão a todo tempo agindo sobre a linguagem, a exemplo das diferenças entre o jeito de falar de uma região e outra, e atingem não apenas a pronúncia e o léxico, mas também a gramática, são conhecidas como variedades regionais ou “dialetos”, e para a sociolinguística dialetos significam uma variação regional. Essa localidade de moradia dos falantes, trazendo a marca da diferença da língua se dá em função do espaço geográfico, da sociedade, da situação e do tempo, dando origem a nomenclaturas diversas para um mesmo objeto, fruta, comida etc. (Gomes, 2003).

Segundo Mollica (2004), os dialetos advindos dos falantes chamados variação linguística está presente geralmente em todas as línguas naturais e pode parecer que a sua convivência seja caótica e aleatória se olharmos na perspectiva estruturalista, mas em atenção às variáveis linguísticas e extralinguísticas torna-se possível a comunicação, variáveis que são facilmente encontradas geograficamente dentro de uma sociedade, apresentando diferenças inclusive na fala entre os gêneros.

2.1 CONCORDÂNCIA NOMINAL

Nas palavras de Evanildo Bechara (2006, p. 416) “a concordância consiste em se adaptar a palavra determinante ao gênero, número e pessoa da palavra determinada.” Por sua vez, Perini (2002, p.180), trazendo a perspectiva descritiva da gramática, fala da concordância como uma “espécie de harmonização de flexões entre os diversos constituintes de uma construção.” Assim, na língua portuguesa, há uma regra gramatical que exige a marcação do plural em todos os constituintes do sintagma nominal (SN).

Os conceitos apresentados das gramáticas (normativa, descritiva) convergem, os dois autores afirmam que é preciso haver “harmonização” entre as palavras de um enunciado, porém para o gramatico Perini (2009), todas as palavras devem se adequar para a frase obter coerência. Para Bechara (2006), apenas a “palavra determinante” deve se adequar a pessoa determinada, gênero ou número.

No que diz respeito à concordância de palavra para sentido (referência), Bechara (2006, p. 419-420) informa que a palavra determinante pode deixar de concordar em gênero e número com a forma da palavra determinada devido a uma questão de sentido. “Não compres livro somente pelo título: ainda que pareçam bons, são muitas vezes péssimos.” Observamos que os determinantes (bons e péssimos) estão se referindo ao livro; contudo para uma adequação de sentido, notamos que os determinantes concordam com o sujeito oculto, eles.

METODOLOGIA

A coleta de dados da pesquisa seguiu a metodologia da sociolinguística variacionista (Labov, 2008; Tarallo, 1990), no intuito de comparar o resultado obtido entre as variedades linguísticas. Foi realizada uma consulta de campo na cidade de Jitaúna, entre os dias 27 e 28 de novembro de 2018, com 13 estudantes do ensino médio do Colégio Estadual Valmir Oliveira Gomes (CEVOG), turno vespertino e o Colégio Estadual Gilda Ramos dos Santos, turno matutino. Por meio de entrevistas semiestruturadas gravadas através do aparelho celular, com termo de concessão de dados foram obtidas algumas respostas do informante com perguntas direcionadas, tratando sobre educação. Como exemplo:

O que você acha dos profissionais da educação?

Após as entrevistas, as respostas foram transcritas e os dados de áudios foram excluídos. Foram extraídos da amostra de dados, os enunciados que apresentavam a unidade em análise – marcação de plural nos sintagmas nominais. Assim também com fatores extralinguísticos – faixa etária, gênero e escolaridade.

2. DADOS OBTIDOS

Nesta pesquisa, com os dados analisados foram encontradas 12 ocorrências de da marcação do plural no sintagma nominal produzidas pelos 13 informantes do Colégio Estadual Valmir Oliveira Gomes e Colégio Estadual Gilda Ramos dos Santos. Desse modo, vejamos os fatores extralinguísticos e linguísticos que contribuíram para esse fenômeno.

2.1 IDADE

Em relação à idade, foram observados dos 13 informantes, da faixa etária de 14 a 18 anos, que a maioria deles fazem concordância nominal no enunciado. Contudo, na faixa etária de 14 a 15 anos há um equilibro entre a marca da concordância, enquanto na faixa etária de 16 anos houve ocorrência de não concordância, vejamos no gráfico:

Gráfico 1. Distribuição da variável idade em relação à concordância nominal dos estudantes do municipal de Jitaúna.

[CHART]

Fonte: Dados da pesquisa.

2.2 GÊNERO

Nesse fator encontra-se um equilíbrio entre os gêneros na utilização das marcas do plural, porém é perceptivo o cuidado no enunciado advindo das meninas. Uma hipótese para essa observação seria o contato maior com os livros estruturalistas, já que em uma conversa inicial, todas as entrevistadas falaram da sua perspectiva de vida que era seguir carreira acadêmica. Os meninos tiveram espontaneidade nas falas, mas a maioria usou de forma coerente a concordância, possível hipótese seria pela presença do universitário.

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Gráfico 2. Distribuição da variável gênero em relação à concordância dos estudantes.

[CHART]

Fonte: Dados da pesquisa.

2.3 POSIÇÃO DO SINTAGMA NOMINAL

Em relação a posição do sintagma nominal, observa-se que há maior ocorrência da marca do plural no sujeito. Ex.: “Porque tem tanta matéria aí escondida que os professores nem dá direito”. [C, M, N, I, IV, MP1, MP2]1, seguido do predicativo do sujeito. Ex.: “Ah... Às vezes deveria ser mais aprimoradas”. [B, M, N, V, MP3]; em seguida complemento nominal e adjunto adnominal, empatados. Ex.: “Esse é meu primeiro ano na escola pública e assim pelo que eu vejo não generalizando todas as escolas...” [A, M, S, III, MP4] e “Porque tem tanta matéria aí escondida que os professores nem da direito” [C, M, N, I, IV, MP1, MP2]. Respectivamente. Por fim, o objeto. Ex.: “Tem de melhorar também, porque alguns professores eles cumprem suas funções de maneira excelente.” [C, F, S, I, II, MP1, MP2, MP3]. como ilustra o gráfico abaixo:

Gráfico 3. Presença e ausência de marca do plural nos elementos do sintagma nominal quanto suas funções sintáticas.

[CHART]

Fonte: Dados da pesquisa.

2.4 A MARCA DO PLURAL

Nesse fator linguístico foi perceptivo que o determinante e o núcleo do sintagma recebem maior marcas do plural. Um exemplo, “Não, não. Os Profissionais tenho nada a dizer não, são tudo gente boa.” [C, M, S, I, IV, MP1, MP2], seguido de complemento nominal. Exemplo: “Eles não interagem com os alunos.” [C, M, S, I, III, MP4] e por fim o modificador. Exemplo: “...porque alguns professores eles cumprem suas funções de maneira excelente” [C, F, S, I, II, MP1, MP2, MP3]. Vejamos o gráfico abaixo:

Gráfico 4. Presença e ausência de marca do plural nos elementos do sintagma nominal quanto à posição do sintagma nominal.

[CHART]

Fonte: Dados da pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A apuração dos dados relacionada à concordância nominal dos estudantes do ensino médio dos colégios estaduais do município de Jitaúna permitiu para corroborar com as variáveis linguísticas discutidas na sociolinguística.

Os falantes participantes da pesquisa contribuíram para evidenciar a teoria da sociolinguística. Os levantamentos extralinguísticos revelaram a heterogeneidade na língua falada. Os pontos que levaram a isso foram as variáveis de gênero, idade, escolaridade e geográfico. A língua sistêmica como Saussure defendia se compromete quando analisamos o falante.

Os fatores extralinguísticos discutido na seção anterior, mostra que há um equilíbrio entre os gêneros. Uma hipótese para isso está no nível de escolaridade e zona de moradia, a qual se faz necessário usar língua mais próxima do padrão. O fator idade mostra que a faixa etária de 17 a 18 anos entre os falantes não fazem a marcação do plural como preconiza a gramática normativa, acredita-se que seja pelas influências das pessoas mais velhas com baixo nível de escolarização.

Segundo estudos da gramática normativa e descritiva os estudantes do ensino médio usam de forma recorrente a marcação do plural no sintagma nominal. Em alguns informantes foram percebidas a falta de concordância verbal correlacionando com o sujeito da oração.

REFERÊNCIAS:

ALKMIN, T. A. Sociolinguística: parte I. In: MUSSULIM, F.; BENTES, A. C. (Orgs.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. V. 1.

BECHARA, Evanildo. Gramática escolar da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006.

FIGUEROA, Ester. Sociolinguistic metalheory. Oxford: Pergamon, 1996.

LABOV, Willian. Padrões sociolinguísticos. Trad. De M. Bagno; M. M. P. Scherre; C. R. Cardoso. São Paulo: Parábola Editorial, 2008 [1972].

LABOV, William. Where does the linguistic variable stop? Sociolinguistic working papers. Austin, Texas, n. 44, abril, 1978.

LABOV, William. Where does the linguistic variable stop? A Response to Beatriz Lavandeira. In: ___________. Sociolinguistic working Papers, 44. p. 43 – 88. 1978.

PERINI, Mario A. Gramática descritiva do português. São Paulo: Ática, Ed.4ª, 2002.

SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 1995 [1916].

PAIVA, Maria da Conceição. A variável gênero/sexo. In: MOLLICA, Maria Cecília; BRAGA, Maria Luiza (orgs). Introdução à sociolinguística: o tratamento da variação. 2 ed. São Paulo: Contexto, 2004. p. 33-42.

MONTEIRO, José Lemos, 1944. Para compreender Labov. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. São Paulo: Ática, 1990.


  1. Códigos linguísticos utilizados para etiquetar enunciados proferidos dos informantes. Esses códigos estão no anexo 2 desse artigo.

Sobre os autores
Adriana dos Reis

Professora assistente da Universiada do Estado da Bahia-UNEB, DCHT – Campus XXI

Jefferson Manoel da SIlva

Graduando do Curso de letras vernáculas da Universidade do Estado da Bahia- uneb, DCHT-campus XXI

Informações sobre o texto

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