UM ASSUNTO SEMPRE polêmico diz respeito às edificações levantadas em terreno alheio. Como sempre falamos aqui, a regra será a perda da construção, sementes e/ou plantas em favor do DONO DO TERRENO. Alguns desdobramentos podem se revelar diante do caso concreto, como por exemplo, o fato da pessoa ocupante da construção ser "pessoa idosa" e também o tempo em que a solução (judicial, muitas vezes) da regularização do imóvel demandará, especialmente quando se tratar de proprietários falecidos, o que exigirá para regularização da propriedade imobiliária a realização de um Inventário. Enquanto pende a discussão seria possível a estipulação de um aluguel em virtude da ocupação do bem edificado sobre o solo alheio?
Inicialmente é preciso rememorar o que diz a Lei. Reza o artigo 1.255 do Código Civil:
"Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio PERDE, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; SE PROCEDEU DE BOA-FÉ, terá direito a indenização.
Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo".
O dispositivo legal deixa claro que a PERDA de tudo que foi levantado no terreno alheio em favor do proprietário do terreno é a regra e, somente poderá haver indenização em favor de quem construiu se for demonstrada a boa-fé deste que manejou a construção, plantio ou lançamento das sementes no terreno alheio. A exceção é descrita no par. único (acessão inversa) para as hipóteses onde restar demonstrado que o interessado obrou com boa-fé e o valor da construção ou plantação for consideravelmente maior que o valor do terreno, quando então haverá pagamento de indenização fixada judicialmente em favor do dono do terreno, se não houver acordo.
O ponto em questão afeta à ocupação muitas vezes realizada por terceiros que ocupam edificação levantada sobre imóvel que pertença à pessoa falecida. Como sabemos, com o falecimento do titular dos bens, o acervo hereditário é transferido imediata e automaticamente para seus herdeiros - ainda que esses nem mesmo saibam do falecimento ou ainda, da existência de patrimônio. A pretensão de receber aluguel pela ocupação de imóvel levantado em seu terreno, uma vez não mais admitida a ocupação gratuita, também compõe o Espólio e se transmite aos herdeiros na carga deste acervo transmitido. Tal regra estampa o artigo 1.784 do Código Civil, senão vejamos:
"Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários".
A ocupação de bem edificado sobre terreno alheio, até que manifestada a OPOSIÇÃO dos herdeiros (ou do Espólio) face ao ocupante é tida como tolerada, por isso afastando qualquer cobrança até essa manifestação. Isso significa dizer que o marco inicial para a cobrança de eventual contraprestação pela ocupação (aluguel) se dá com a manifestação inequívoca da oposição à ocupação presumidamente gratuita. Esse ponto especificamente já foi inclusive objeto de apreciação pelo STJ em didático julgado (REsp 1.782.828/PR, j. em 05/11/2019). Tal oposição pode (e é muito recomendável) que seja feita através de NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL, que pode ser viabilizada rapidamente pela via eletrônica através das Centrais de REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS, em evidente prestígio ao Registro Público Eletrônico. A notificação extrajudicial caracterizará a MORA necessária para embasar o pedido de arbitramento. Na atualidade tal Central pode ser acessada através do endereço https://www.rtdbrasil.org.br.
A jurisprudência do TJGO ilustra bem solução conferida a caso onde se mostrou devida tanto a indenização por construção levantada em terreno alheio quanto o pagamento de alugueis pela ocupação exclusiva de bem edificado sobre o terreno:
"TJGO. 50362090520178090051. J. em: 25/10/2023. Apelação Cível. Ação de indenização de acessões c/c retenção. I. Construção realizada no terreno de propriedade dos genitores falecidos. Boa-fé presumida. Ausência de má-fé dos autores. Vedação ao enriquecimento ilícito. Direito à indenização. O consentimento dos antigos proprietários (genitores) acerca da posse exercida pelo filho/apelante é presumida, tendo em vista ser incontroverso o fato de que as acessões foram realizadas na presença daqueles, que residiram, no mesmo imóvel, por aproximadamente 10 anos, sem qualquer objeção dos pais. O caso amolda-se ao princípio jurídico de que a boa-fé se presume e a má-fé deve ser comprovada por quem a alega, o que de fato não ocorreu na hipótese. As circunstâncias do caso em julgamento demonstram a boa-fé dos apelantes que acreditavam atuar de forma lícita. À luz dos artigos 884 e 1.255, caput, do Código Civil, as acessões realizadas pelo filho no imóvel, que compõe o espólio dos genitores, deve ser indenizada aos autores, sob pena de ficar caracterizado o enriquecimento sem causa daqueles que se beneficiam com o investimento realizado por outrem no imóvel litigioso. II. Pedido reconvencional. Pagamento de alugueis. Princípio da saisine. À luz do princípio da indivisibilidade em relação aos bens do espólio, o uso exclusivo do bem por um dos condôminos gera para os outros o direito à compensação, a título de indenização, correspondente à cota parte do sucessor que se opõe à utilização. Comprovado o uso exclusivo do imóvel por um dos herdeiros, mostra-se devida a fixação de indenização em favor daquele que se encontra privado de fruição do bem, nos termos do artigo 1.322 do Código Civil, sob pena de enriquecimento ilícito da parte que o usufrui. III. Termo inicial dos alugueis. O marco inicial para arbitramento conta-se a partir do momento em que exista uma efetiva oposição dos demais herdeiros, ocasião em que cessa, indiscutivelmente, o ?comodato gratuito? que antes vigorava. Na hipótese, não demonstrada a existência de notificação formal anterior, o pedido reconvencional apresentado no bojo da ação de indenização deve ser considerado como oposição à ocupação exclusiva do imóvel pelo autor/apelante. Apelação conhecida e provida. SENTENÇA REFORMADA".