INTRODUÇÃO:
Um grande desafio atualmente para os importadores que utilizam o tratamento tributário da exceção tarifária - “ex-tarifário” do imposto de importação-, é a espera excessiva do deferimento pela CAMEX (Câmara de Comércio Exterior) e decorrente publicação do ato administrativo de concessão no Diário Oficial da União.
Este referido tratamento tributário é aquele que reduz o imposto de importação, para os bens de capital, de informática e de telecomunicações, tendo por base a necessidade de inexistência de similar nacional.
Ocorre que, atualmente, ainda que o importador efetue com diligência o processo administrativo, o fato é que o prazo de análise e concessão tem causado grandes prejuízos para os importadores, haja vista que a publicação da concessão tem levado muitos meses, o que não raras vezes acaba causando sérios prejuízos para as empresas que necessitam efetuar o ingresso com celeridade, como é o caso por exemplo de bens para o ativo imobilizado como máquinas e equipamentos.
Desse modo, a presente abordagem restringe-se a expor alternativas para que o interveniente do comércio exterior possa avaliar o procedimento mais apropriado visando afastar os prejuízos originários do retardo da administração pública.
Assim sendo, destaca-se que uma opção cabível a fim de dar tratamento célere para a operação de importação é requerer provimento jurisdicional, inclusive com medida liminar, a fim de obter ordem judicial que possa dar celeridade ao seu projeto de ingresso dos bens assegurando assim o tratamento tarifário postulado.
Diante disso, passamos então a abordar qual o remédio jurídico apropriado e a sistemática jurídica adequada, visando elucidar assim pontos relevantes.
IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO E SEUS ASPECTOS FUNDAMENTAIS:
A doutrina dominante afirma que o imposto de importação não tem o viés arrecadatório, sendo pregado que se trata de um dos meios de estabelecer a proteção à indústria nacional. Para tanto, vale ressaltar que, por outro lado, ante o fenômeno da globalização da economia, o imposto de importação elevado é considerado como entrave, ou também denominado de barreira alfandegária.
Nesse corolário, assim reza nossa Carta Magna:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
(...)
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
I - importação de produtos estrangeiros;
§ 1º É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.
É relevante salientar que todo tributo nos termos da Lei Maior está sujeito ao princípio da legalidade, isto é, somente pode ser instituído ou alterado mediante lei como ensina Alexandre Rossato da Silva Ávila:
“A Constituição Federal atribuiu ao Poder Executivo a faculdade de aumentar ou reduzir as alíquotas dos impostos de natureza extrafiscal: Imposto de Importação, Imposto de Exportação, Imposto sobre Produtos Industrializados e Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos “1
Nesse sentido, cabe notar que a faculdade da União tem no caso restrição: as condições e os limites para modificações devem ser previstos em lei. A lei fixa os limites mínimo e máximo, porém, cabe ao poder Executivo estabelecer o percentual que entender oportuno e conveniente de acordo com sua política econômica.
É interessante ressaltar que muito embora o julgamento do Supremo Tribunal Federal tenha decidido acerca do imposto de exportação, cabe observar que se aplica ao imposto de importação a decisão que declarou que a alíquota do imposto de exportação pode ser alterada pela Resolução da Câmara de Comércio Exterior, órgão do Poder Executivo, logo então, tratando-se a matéria de lei ordinária, não há necessidade do Decreto ou outro ato normativo declarar os motivos para a modificação das alíquotas. Assim, também não está sujeito o imposto de importação ao princípio da estrita legalidade tributária.2
A nossa Constituição Federal de 1988 reforçou a segurança jurídica pelo princípio da anterioridade, que faz com que o contribuinte tenha ciência de fatos que futuramente venham a ocorrer em relação às obrigações tributárias, tomando por fundamento o princípio da não surpresa, todavia, o referido princípio também não se aplica para o imposto de importação.
Nesse corolário, o imposto de importação pode ser alterado a qualquer tempo e sua alíquota dentro dos limites de legalidade, o que é permitido pela Lei Maior.
2. EX-TARIFÁRIO – EXCEÇÃO TARIFÁRIA DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO:
No tocante às leis vinculadas ao imposto de importação existentes em nosso ordenamento jurídico cabe destaque:
A Lei nº 3.244, de 1957, reza que:
Art. 2º O imposto de importação será cobrado na forma estabelecida por esta lei e pela Tarifa que a acompanha, por meio de alíquota "ad-valorem", que poderá ser combinada com sua equivalente específica, aplicando-se, para o cálculo do imposto, a alíquota de que resultar tributação mais elevada.
Parágrafo único. A alíquota específica será reajustada, semestralmente, a fim de conservar sua equivalência com a alíquota "ad-valorem" correspondente.
Art. 3º Poderá ser alterada dentro dos limites máximo e mínimo do respectivo capítulo, a alíquota relativa a produto:
a) cujo nível tarifário venha a se revelar insuficiente ou excessivo ao adequado cumprimento dos objetivos da Tarifa:
b) cuja produção interna for de interesse fundamental estimular;
c) que haja obtido registro de similar;
d) de pais que dificultar a exportação brasileira para seu mercado, ouvido previamente o Ministério das Relações Exteriores;
e) de país que desvalorizar sua moeda ou conceder subsídio à exportação, de forma a frustrar os objetivos da Tarifa.
§ 1º Nas hipóteses dos itens a, b e c a alteração da alíquota, em cada caso, não poderá ultrapassar, para mais ou para menos, a 30% (trinta por cento) "ad-valorem".
§ 2º Na ocorrência de "dumping", a alíquota poderá ser elevada até o limite capaz de neutralizá-lo.
Art. 4º Quando a produção nacional de matéria-prima ou qualquer outro produto de base for ainda insuficiente para atender ao consumo interno poderá ser concedida isenção ou redução do imposto para a importação complementar.
Destarte, pelo que se depreende a concessão da redução do imposto é admitida para os bens de capital, de informática e de telecomunicações, tendo como requisito necessário a inexistência de similar nacional, ficando a cargo do Poder Executivo, obedecendo os ditames legais à concessão.
Por meio da Lei n. 8.035, de 23 de outubro de 1990, foi autorizado o Poder Executivo outorgar a competência para a CAMEX para emitir os atos que alterem as alíquotas do imposto de importação.3
É importante sublinhar que considerando que nosso País é membro do MERCOSUL e as alíquotas estão vinculadas as normas decorrentes da União Aduaneira, sendo assim previstas na Tarifa Externa Comum, (TEC), tendo então a questão prevista na Decisão CMC nº 25, de 2015, todavia, houve alteração de prazo através da Decisão CMC n.º 11/21, que em 07 de dezembro de 2021, estendeu o prazo para que os membros do Bloco mantenham suas respectivas Listas Nacionais de Exceções à Tarifa Externa Comum (LETEC), sendo assim o Brasil pode fazer uso até 31 de dezembro de 2028.
Em suma, os interessados devem postular o tratamento tributário de acordo com o que prevê a Resolução GECEX n.º 512, de 16 de agosto de 2023.
II.2 – A SISTEMÁTICA DA CONCESSÃO DA LIMINAR:
O ingresso de mercadoria estrangeira ocorre por meio do procedimento administrativo de despacho aduaneiro, o qual o importador efetua a declaração junto à repartição alfandegária, efetuando inclusive o pagamento dos tributos devidos. Efetuada a conferência e não havendo discordância por parte da autoridade aduaneira em relação às informações prestadas as mercadorias são imediatamente liberadas.4
Nesse compasso, ocorrendo ingresso das mercadorias antes da publicação do pleito efetuado pela empresa importadora e, tendo em vista que o fato gerador temporal ocorre no momento do registro da Declaração de Importação, sendo nesse momento devido os tributos aduaneiros, logo por sua vez ao efetuar a declaração aduaneira o importador deverá efetuar o pagamento do imposto com a alíquota vigente no momento do registro junto ao software - Portal único de Comércio Exterior. Considerando que já esteja vigente o tratamento tributário do “ex tarifário” poderá assim usufruir da redução do imposto no momento do despacho aduaneiro, caso contrário, o importador terá duas alternativas: (a) Efetuar o pagamento integral do imposto, ou (b) Aguardar primeiro a publicação do referido tratamento diferenciado que reduz a alíquota do imposto.
Entretanto, o dilema é que atualmente, como sublinhado alhures, o prazo para a publicação da concessão é expressivo, uma vez que anteriormente o prazo de decisão do postulado era de 03 (três) meses, todavia, atualmente não há previsão e não raras vezes a concessão ocorre com prazo superior a 08 (oito) meses.
Haja vista o retardo na concessão por parte do Poder Executivo, o importador pode buscar em juízo provimento jurisdicional, a fim de evitar o prejuízo pela ineficiência da administração pública, contudo, é importante adotar o remédio jurídico adequado a fim de evitar ainda maiores prejuízos.
O mandado de segurança com pedido de liminar é o remédio jurídico mais adequado, contudo, não é possível no caso em tela requerer em juízo a dispensa do pagamento.
No que tange ao pagamento, a questão deve ser primeiro analisada pelo Poder Executivo, ou seja, pela GECEX, para depois conforme o caso levar a juízo.
No que se refere ao depósito em juízo, a doutrina e a jurisprudência nesses casos entendem que o crédito tributário em questão e a liberação de mercadorias são procedimentos autônomos, logo sendo necessário nesse caso o depósito para garantir a lide. 5
A jurisprudência é pacífica, sendo que assim ficou decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. EX TARIFÁRIO. RESOLUÇÃO DA CAMEX POSTERIOR AO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. REDUÇÃO DE ALÍQUOTA. SEM EFEITOS RETROATIVOS. EFEITOS ESTENDIDOS. BENEFÍCIO POSTULADO ANTES DA IMPORTAÇÃO DO BEM. PRECEDENTES DO STJ.
Na Origem, cuida-se de mandado de segurança em caráter preventivo, impetrado contra ato coator do Senhor Inspetor Chefe de Alfândega do Porto de Paranaguá – Receita Federal do Brasil, processamento dos despachos aduaneiros, já iniciados (em curso), ou futuros, com observância do regime “ex-tarifário.”
O Tribunal de origem, à fl. 205, ao discorrer acerca da resolução n. 8/2015 da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), a qual possui a legitimidade para reduzir a alíquota do imposto de importação, consignou que: “a impetrante requereu a renovação do benefício “ex-tarifário”, em relação aos bens de capital que são objeto desta demanda, ao MDIC em 05/04/2016 e 17/05/2016, ou seja, antes do registro das declarações de importação (fato gerador do imposto de importação) e antes também do término da vigência da Resolução CAMEX n.º 8/2015 (...).
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que as resoluções da CAMEX que reconhecem o direito à redução da alíquota do imposto de importação de determinada mercadoria não possuem efeitos retroativos, mas podem ter seus efeitos estendidos ao momento do desembaraço aduaneiro quando o benefício foi postulado antes da importação do bem, como é o caso dos autos. Nesse sentido, confirmam-se: RESP 1464708/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 26/06/2017, e AgRg no RESP 1464778/PR, Rel. Min HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 03/02/2014).
Agravo Interno improvido. (AIRESP – AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 1.697.477.2017.02.32947-5. FRANCISCO FALCÃO, STJ -S EGUNDA TURMA, DJE DATA: 08/06/2018.)”
Na mesma linha tem decidido os Tribunais Regionais, no sentido da validade da alíquota reduzida aplicável na importação, mesmo que ainda não tenha sido deferido ou publicado no Diário Oficial da União o tratamento “ex-tarifário".6
Diante disso, parece-nos evidente que o importador tem dois caminhos para afastar o prejuízo decorrente da demora da administração em decidir sobre o pedido de “ex-tarifário”. (a) Ingressar em juízo, garantindo a demanda com depósito em dinheiro; (b) Registrar a importação efetuando o pagamento integral do imposto, podendo avaliar a possibilidade de requerer posteriormente em juízo a restituição do imposto pago.
Na verdade, entendemos que deve se buscar o caminho mais célere, que é o pedido em juízo mediante garantia, que deve se restringir a autorização para o registro da Declaração de Importação, (DI), com o tratamento do “ex-tarifário”, mediante o deposito do montante integral do valor, cuja descrição dos fatos por sinal deve ser incluída no campo complementares da DI, com a discriminação dos valores depositados em juízo, assim que concedida a liminar.7
É importante salientar que haja vista o novo entendimento do Supremo Tribunal Federal originário do TEMA 1.042, a jurisprudência não autoriza mais a continuidade do procedimento sem o depósito, sendo assim, o depósito é questão que se impõe.8
Desta feita, esse é o procedimento jurídico que melhor atende ao caso em testilha, tendo em vista que havendo posteriormente a concessão e consequente publicação do “ex-tarifário” no Diário Oficial da União, o importador deve por sua vez informar ao juízo da causa, o qual deverá autorizar o resgate do valor depositado, porém, se não for concedido o “ex-tarifário”, o valor depositado é convertido para a União Federal.
Ainda quanto à segunda opção supracitada, que é a possibilidade de efetuar o pagamento no curso do despacho aduaneiro e requerer o pedido em juízo posteriormente, o dilema reside no fato de que o custo nesse caso é mais significativo. Primeiro, porque o procedimento é mais complexo, não tem abrigo por meio de mandado de segurança, por sinal pode de até ser necessário inclusive perícia técnica. Segundo, porque é um processo que segue por meio de ação ordinária, se estende e pode levar alguns anos e sujeito a sucumbência.
De tudo o que foi dito, somos de opinião que o remédio jurídico mais eficaz é o ingresso em juízo com pedido de liminar em mandado de segurança com depósito do valor do imposto de importação integral previsto na TEC, procedimento jurídico capaz de reduzir o prejuízo decorrente da atual demora da administração pública em relação a concessão do referido tratamento tributário, até porque o resgate do valor depositado em juízo está vinculado a publicação do “ex-tarifário” no Diário Oficial da União.
Curso de Direito Tributário. Alexandre Rossato da Silva Ávila. 2017. Porto Alegre. Ed. Liv do Advogado. Pag. 369.︎
STF. Pleno. RE 570.680. Rel. Min. Ricardo Lewandoski. DJe-228 de 04/12/2009.︎
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Art. 1º O Poder Executivo poderá, atendidas as condições e os limites estabelecidos na Lei 3.244, de 14 de agosto de 1957, modificada pelo Decretos-Leis n. 63, de 21 de novembro de 1966, e 2.162, de 19 de setembro de 1984, alterar as alíquotas do imposto de importação. Parágrafo único. O Presidente da República poderá outorgar competência à CAMEX para as práticas dos atos previstos neste artigo. (redação dada pela Medida Provisória n. 2.158-35, de 2001.
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REGULAMENTO ADUANEIRO. Art. 542. Despacho de importação é o procedimento mediante o qual é verificada a exatidão dos dados declarados pelo importador em relação à mercadoria importada, aos documentos apresentados e à legislação específica.
Art. 543. Toda mercadoria procedente do exterior, importada a título definitivo ou não, sujeita ou não ao pagamento do imposto de importação, deverá ser submetida a despacho de importação, que será realizado com base em declaração apresentada à unidade aduaneira sob cujo controle estiver a mercadoria (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 44, com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1988, art. 2º). ︎
Mandado de Segurança em Matéria Tributária. 8ª Ed. Hugo de Brito Machado. SP. 2009. Ed. Dialética. Pag. 172.︎
MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. REGIME DO EX-TARIFÁRIO. DEPÓSITO DA DIFERENÇA TRIBUTÁRIA. Liberação. Pendente de apreciação o requerimento de ex-tarifário, não pode a autoridade impetrada impedir o prosseguimento do despacho aduaneiro quando o importador efetua o depósito judicial do valor controverso do imposto de importação. (TRF4 – PRIMEIRA TURMA. 5005236-66.2019.4.7101. Relator Romulo Pizzollatti. 13.05.2020).︎
CTN - Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:(...)II - o depósito do seu montante integral;︎
STF - RE 1.090.591/SC, que afastou a aplicabilidade da Sumula STF 323 para os casos vinculados a importação.︎