Tema complexo e por demais inquietante para os Chefes dos Poderes nos últimos anos é a forma de alteração dos estipêndios dos servidores públicos, maiormente em face dos últimos julgados do STF, declaratórios da inconstitucionalidade de inúmeros diplomas legais relacionados à “REVISÃO”.
Doutrinariamente, inexiste controvérsia sobre o assunto. Segundo os Administrativas/Constitucionalistas,
“REAJUSTE” é o aumento concedido sem qualquer relação com perdas inflacionárias, havendo o processo legislativo de ser deflagrado por cada Poder, no âmbito da sua independência e autonomia.
Já a “REVISÃO” constitui modelo de disciplinamento estipendial exclusivo do Chefe do Poder Executivo, concedida a todos os servidores dos respectivos Entes Federados e sem distinção de índices. Seu escopo constitucional é recuperar as perdas decorrentes da corrosão da moeda.
Nessa ordem de ideias, é vedado aos Chefes do Legislativo e Judiciário o encaminhamento de projetos de lei atinentes à “REVISÃO”. Ou seja, ditas Autoridades só podem deflagrar o processo de “REAJUSTE”.
Todavia, consuetudinariamente, vê-se a elaboração de minutas com alvoroço conceitual, ora tratando de recomposição, o que pressupõe “REVISÃO”, ora referenciando “REAJUSTE”, sem qualquer nexo de ganho real.
Por conseguinte, o Excelso Pretório tem sido instado a se manifestar sobre a (in)constitucionalidade dessas leis, com resultados, às vezes, nefastos aos respectivos agentes Públicos.
Exemplo maior dessa assertiva pode ser visto no julgamento da ADI 3840, relatada pelo Ministro Gilmar Mendes, em Acórdão assim ementado:
“Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Servidor público do Poder Judiciário. Revisão geral das remunerações. 3. Lei 1.637, de 6 de junho de 2006, do Estado de Rondônia. Iniciativa do Tribunal de Justiça. 4. Violação aos arts. 37, X, e 61, §1º, II, a, da Constituição Federal. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. 6. Modulação de efeitos da decisão. Manutenção do pagamento do valor correspondente ao reajuste, até que seja absorvido por quaisquer reajustes futuros”.
Nesse julgado, malgrado tenha se modulado seus efeitos, o decisum terminou por impor certo revés aos serventuários contemplados, os quais deverão ter seus “REAJUSTES” futuros compensados com os índices da “REVISÃO” indevidamente editada.
Em idêntico norte, vale a lembrança, a ADI 3538:
“Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei 12.299 de 2005 do Estado do Rio Grande do Sul que concedeu reajuste de vencimentos aos servidores do Poder Judiciário. 3. Revisão Geral Anual. Iniciativa Privativa do Chefe do Poder Executivo. 4. Lei de iniciativa do Tribunal de Justiça local. Inconstitucionalidade. Violação aos arts. 37, X, e 61, §1º, II, a, da Constituição Federal. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente”.
Mais recentemente, na ADI 5562, agora da relatoria do Ministro Dias Toffoli, voltou a decidir o STF:
[…] Ação direta de inconstitucionalidade. Leis nºs 14.910, 14.911, 14.912, 14.913 e 14.914 do Estado do Rio Grande do Sul, de 18 de julho de 2016. Recomposição remuneratória. Leis de iniciativa do Poder Judiciário (Lei nº 14.910/16), da Defensoria Pública (Lei nº 14.911/16), da Procuradoria Geral de Justiça (Lei nº 14.912/16), do Tribunal de Contas (Lei nº 14.913/16) e da Mesa da Assembleia Legislativa (Lei nº 14.914/16). Natureza jurídica de revisão geral. Iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo. Violação do art. 37, inciso X, c/c o art. 61, §1º, inciso II, alínea a, da Constituição Federal. Inconstitucionalidade formal. Procedência […].
No aludido precedente, datado de 1º de julho último, a Corte Suprema exauriu, sob todos os ângulos, o enfrentamento da matéria, constando da sua subementa:
[…] 1. Define-se o instituto da revisão geral quando o propósito do aumento remuneratório concedido for apenas o de recompor a perda do poder aquisitivo da moeda, devendo-se, nesse caso, observar a iniciativa do chefe do Poder Executivo para se deflagrar o processo legislativo respectivo. De outro modo, se o aumento remuneratório trouxer um ganho real, ou seja, for além da perda do poder aquisitivo, a competência para se deflagrar o processo legislativo será de cada um dos poderes ou órgãos com autonomia administrativa, financeira e orçamentária. Precedentes. 2. No caso, para além do fato de que todas as leis hostilizadas preveem percentual idêntico para as recomposições respectivas, as justificativas apresentadas nos respectivos projetos de lei mencionam que o objetivo da recomposição salarial pretendida é recuperar a perda do poder aquisitivo da moeda naquele período. 3. Na espécie, o incremento salarial é conferido de forma linear a todos os servidores, independentemente da carreira. Ademais, é concedido de forma ampla, sobre os vencimentos e funções gratificadas, estendendo-se aos aposentados e pensionistas. Consubstancia, assim, revisão geral, a qual deve observância à iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo, conforme reiterada jurisprudência do STF. 4. Ação julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade das Leis nºs 14.910, 14.911, 14.912, 14.913 e 14.914 do Estado do Rio Grande do Sul, de 18 de julho de 2016. 5. Modulação dos efeitos da decisão, atribuindo-se a ela eficácia ex nunc, nos termos do art. 27. da Lei nº 9.868/99, para se garantir a manutenção dos pagamentos dos valores correspondentes a recomposição concedida até que sejam absorvidos por quaisquer aumentos futuros, sejam eles dados em virtude de reajustes, recomposições ou revisões gerais […].
Não se desconhece, é verdade, a linha intelectiva outrora defendida por muitos e que já serviu de alicerce retórico para se legitimar à “REVISÃO”, ali rotulada de “SETORIAL”. Nos dias atuais, contudo, não mais subsiste margem para polêmica sobre a distinção e consequências jurídicas dos prefalados institutos, subsistindo a inconstitucionalidade de todo Diploma disciplinador da “REVISÃO”, gerado com vício de competência.
Adequando-se à diretriz suso, na derradeira proposta de alteração de vencimentos dos seus Agentes, o TJ/RN, corrigindo impropriedade contida na propositiva do SINDJUSTIÇA, foi por demais zeloso e técnico, dispondo da temática como “REAJUSTE” na edição da LCE 763/24, sendo seguido pelo TCE/RN com a LCE 764/24.
Daí, a despeito de se apresentar a temática, a olhos ligeiros, como ingênua irregularidade de técnica redacional, fato é que a Excelsa Corte não tem tergiversado no controle constitucional desses Diplomas, sendo imperativa, por conseguinte, a adoção da linguagem conceitual adequada.