Direito da Maioria versus o direito da Minoria

10/10/2024 às 22:15
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Um tema importante e relevante em matéria de condomínio é aquele relacionado com a questão envolvendo a maioria versus a minoria, ou seja, questões que são decididas em Assembleia, Ordinária ou Extraordinária, onde a vontade da maioria prevalece sobre a vontade da minoria.

Em um primeiro olhar, poderia se afirmar que se uma matéria condominial foi decidida pela maioria a questão estaria resolvida, não existindo para a minoria nenhuma outra alternativa que não fosse observar o que foi decidido, sob  pena de ficar os vencidos sujeitos as consequência estabelecidas na convenção ou mesmo no regulamento do Residencial, horizontal ou vertical.

Mas, existem outros aspectos que precisam ser analisados, antes que se possa afirmar que a decisão da maioria deve produzir todos os seus efeitos legais sobre a minoria, sob pena de violação de outras normas previstas no sistema de leis.

A Convenção Condominial ou mesmo o regulamento de condomínio devem observar as regras estabelecidas no Código Civil de 2002, tendo em vista o sistema de hierarquia de leis que foi adotado pela República Federativa do Brasil.

Ao mesmo tempo as normas condominiais também devem estar em conformidade com as regras estabelecidas pela Constituição Federal de 1988 e as suas Emendas Constitucionais.

Na busca de um melhor entendimento da matéria, deve-se trazer a baila o seguinte exemplo. O Residencial Delta resolveu convocar uma Assembleia para deliberar se animais domésticos serão admitidos no condomínio. No dia aprazado os condôminos comparecem para deliberarem a respeito da matéria.

O residencial possui 10 condôminos com direito a voto e que estão em dia com as suas obrigações condominiais. A votação é feita de forma aberta e neste momento o resultado são 7 (sete) votos contrário a permanência dos animais domésticos no condomínio e 3 (três) votos pela possibilidade do condômino ter um animal de estimação.

Ao final da reunião ainda ficou estabelecido que o condômino que tem animal doméstico terá um prazo de 15 (quinze) dias para dar destinação ao animal sob pena de aplicação de multa conforme o regulamento do condomínio.

Tomando-se como base este exemplo poderia se afirmar que a decisão da maioria deve prevalecer sob todos os aspectos e que os condôminos que possuem animais de estimação terão que abrir mão de seus pets para que não sejam multados, e possam continuar morando no referido Residencial.

Acontece que a decisão da maioria fere preceitos constitucionais e ainda se mostra contrária aos entendimentos que tem sido estabelecidos pelos Tribunais Estaduais.

A Constituição Federal de 1988 estabelece expressamente que a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país são assegurados direitos fundamentais, dentre eles, a dignidade da pessoa humana.

No âmbito da dignidade da pessoa humana encontra-se o direito a ter um animal de estimação, o qual conforme já tem sido reconhecido pela própria Medicina contribuiu no tratamento de uma depressão, para o bem estar, entre outras vantagens para a vida do tutor do animal.

O que se percebe é que o fato de uma questão ter sido decidida pela maioria não significa que a minoria ao verificar que a matéria decidida violou algum aspecto constitucional, alguma norma do Código Civil de 2002, ou mesmo violação a uma lei Federal ou mesmo Lei Estadual, não possa busca a proteção do Poder Judiciário.

O texto constitucional de 1988 estabelece que, “nenhuma lesão ou ameaça a direito deixará de ser apreciada pelo Poder Judiciário”, art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988.

Deve-se observar que as decisões proferidas em Assembleia produzem os seus efeitos, mas ao mesmo tempo as decisões tomadas em Assembleia que eventualmente venham a contrariar normas constitucionais, ou normas infraconstitucionais, podem ser objeto de questionamento em atendimento ao estabelecido conforme mencionado no art. 5º, inciso XXV, da CF.

Outro exemplo que tem sido objeto de questionamento e que tem encontrado respaldo junto ao Poder Judiciário é a questão referente ao rateio de forma igualitária das despesas condominiais em condomínios residencial verticais onde existem coberturas.

Os proprietários de cobertura em atendimento ao estabelecido no Código Civil de 2002 podem pleitear ao síndico que este convoque uma Assembleia Condominial para decidir a respeito da igualdade no rateio das despesas condominiais, uma vez que não é justo que os proprietários de cobertura paguem um valor maior pelo simples fato de sua unidade condominial possuir uma área, fração, maior em relação aos apartamentos tipos.

Após a matéria ter sido decidido pela Assembleia a qual delibere por maioria que a desigualdade no rateio deva ser mantida, a minoria vencida poderá ingressar perante o Poder Judiciário questionando a forma como o rateio de despesas tem sido realizado.

A questão apresentada é um outro exemplo onde a decisão proferida pela maioria não condiz com a realidade e pode ser objeto de questionamento pela minoria, que não é obrigada a se submeter a decisões que contrariam a Constituição Federal, o Código Civil de 2002, ou mesmo outras normas infraconstitucionais que tratem de uma matéria a qual a maioria resolver deliberar sem se preocupar com a repercussão da decisão.

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Por fim, não se deve esquecer que o direito está sempre em evolução, tanto é  verdade que no atual sistema brasileiro foram editadas diversas normas com o intuito de proteger as minorias em relação as maiorias, e o mesmo acontece quando se trata de normas condominiais.

Nenhum condômino pode ser lesado em seus direitos fundamentais em nome da pretensão da maioria. As decisões proferidas pela maioria conforme foi demonstrado deve estar em conformidade com as demais normas do ordenamento jurídico, sob pena de serem questionadas perante o Poder Judiciário.

Desta forma, o caminho é buscar uma análise das questões antes que estas sejam levadas para deliberação perante a Assembleia. Um estudo prévio, e a busca da observância das normas já existentes permitirá uma vida harmoniosa e justa em condomínio, que é objetivo desta espécie de habitação.

Sobre o autor
Paulo Tadeu Rodrigues Rosa

PAULO TADEU RODRIGUES ROSA é Juiz de Direito. Mestre em Direito pela UNESP, Campus de Franca, e Especialista em Direito Administrativo e Administração Pública Municipal pela UNIP. Autor do Livro Código Penal Militar Comentado Artigo por Artigo. 4ª ed. Editora Líder, Belo Horizonte, 2014.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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