O novo regime especial de regularização cambial e tributária (rerct) - lei nº 14.973/2024: uma análise comparativa

18/10/2024 às 18:51
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O Novo Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) - Lei nº 14.973/2024: Uma Análise Comparativa

1. Introdução

O Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) tem sido uma ferramenta importante na política fiscal brasileira, visando a regularização de ativos não declarados mantidos no exterior por residentes ou domiciliados no Brasil. A recente promulgação da Lei nº 14.973/2024 trouxe à tona uma nova iteração deste regime, suscitando a necessidade de uma análise aprofundada de suas disposições e uma comparação com as versões anteriores.

2. Contextualização Histórica

O RERCT foi inicialmente instituído pela Lei nº 13.254/2016, com uma segunda rodada implementada pela Lei nº 13.428/2017. Estas iniciativas buscavam não apenas aumentar a arrecadação fiscal, mas também promover a conformidade tributária e cambial, alinhando-se com os esforços globais de combate à evasão fiscal e lavagem de dinheiro.

3. Principais Aspectos da Lei nº 14.973/2024

3.1 Abrangência Temporal

A nova lei amplia o escopo temporal para a regularização de ativos, permitindo a declaração de bens e direitos de origem lícita mantidos no exterior até 31 de dezembro de 2023. Esta extensão é significativa, pois abrange um período mais recente em comparação com os regimes anteriores.

3.2 Alíquota e Base de Cálculo

A Lei nº 14.973/2024 estabelece uma alíquota única de 15% sobre o valor total dos ativos a serem regularizados, e incidência de multa de 100%, o que gerará uma alíquota efetiva em torno de 30%.

3.3 Anistia Criminal

Mantendo a tradição dos regimes anteriores, a nova lei também prevê a extinção da punibilidade de crimes relacionados à manutenção de ativos não declarados no exterior, desde que estes sejam de origem lícita. Esta disposição continua sendo um forte incentivo para a adesão ao programa.

3.4 Prazo de Adesão

O prazo para adesão ao novo RERCT foi estabelecido em 120 dias a partir da regulamentação da lei pela Receita Federal do Brasil. Este período é relativamente curto, o que pode incentivar uma rápida tomada de decisão por parte dos potenciais aderentes. Para aderir ao RERCT-Geral, os contribuintes devem declarar voluntariamente os bens, direitos e recursos que possuíam em 31 de dezembro de 2023. O prazo para adesão ao regime é, impreterivelmente, até 15 de dezembro de 2024. A ampliação do prazo não costuma ser aceita pelo Poder Judiciário, mesmo em casos em que há comprovada intercorrência. Vale lembrar, programas de isenção, ainda que parcial, são interpretados de forma literal pelas normas do Código Tributário Nacional.

4. Análise Comparativa com Regimes Anteriores

4.1 Carga Tributária

A carga tributária efetiva alterou nos regimes RERCT 1, 2 e 3, em função do câmbio a ser calculado para conversão do patrimônio em reais e multa efetiva. A título de exemplo, no RERCT 2 a multa foi de 135%. No presente caso de 2024, a porcentagem total é por volta de 30% (15% de alíquota e 100% de multa sobre o valor do tributo).

4.2 Abrangência Temporal Atualizada

A extensão do período de cobertura até 31 de dezembro de 2023 é uma atualização importante, permitindo a regularização de ativos mais recentes. Isto contrasta com os regimes anteriores, que tinham datas de corte mais antigas.

4.3 Manutenção da Anistia Criminal

A continuidade da previsão de extinção da punibilidade para crimes relacionados mantém um dos aspectos mais atrativos do RERCT, alinhando-se com as versões anteriores do programa, inclusive quanto a crimes como evasão de divisas, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal.

5. Considerações Críticas

5.1 Equidade Fiscal

A redução da carga tributária total, em comparação ao RERCT 2, com multa de 135%, pode suscitar questionamentos sobre equidade fiscal, especialmente em relação aos contribuintes que mantiveram seus ativos regularizados ao longo do tempo.

5.2 Eficácia na Prevenção de Futuras Irregularidades

Embora o programa ofereça uma oportunidade de regularização, é importante considerar se medidas adicionais estão sendo implementadas para prevenir futuras ocorrências de não declaração de ativos no exterior. Algumas condutas ainda parecem escapar do radar fiscal, especialmente quanto a criptomoedas adquiridas em plataformas no exterior que, em tese, ainda não trocam informações fiscais. Vale afirmar que toda conduta com vistas a sonegar rendimentos das autoridades fiscais brasileiras pode ser nefasta, com implicações, inclusive, criminais.

6. Impacto nas Relações Internacionais

A implementação de sucessivos programas de regularização pode impactar a percepção internacional sobre o compromisso do Brasil com a transparência fiscal e o combate à evasão de divisas. Além disto, mostra o conceito de fisco global.

7. Implicações Práticas para os Contribuintes

7.1 Oportunidade de Regularização

O novo RERCT oferece uma oportunidade significativa para contribuintes que ainda não regularizaram seus ativos no exterior. A redução da carga tributária total para 15% torna o programa mais atrativo financeiramente, podendo incentivar uma maior adesão.

7.2 Necessidade de Avaliação Cuidadosa

Apesar dos benefícios aparentes, os potenciais aderentes devem realizar uma análise criteriosa de sua situação. Isso inclui a avaliação da origem dos recursos, a documentação disponível e as possíveis consequências da não adesão.

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7.3 Planejamento Tributário Futuro

A regularização através do RERCT deve ser vista como parte de um planejamento tributário mais amplo. Os contribuintes precisarão considerar como manterão a conformidade fiscal após a adesão ao programa.

8. Desafios na Implementação

8.1 Capacidade Operacional dos Órgãos Fiscalizadores

O processamento de um grande volume de declarações e a verificação da origem lícita dos recursos representarão um desafio para a capacidade operacional da Receita Federal e outros órgãos envolvidos. Fato é que muitos contribuintes continuam com bens não declarados e a Receita Federal do Brasil parece não ter implementado, ainda, um método eficaz de processar as informações oriundas dos fiscos internacionais.

8.2 Integração com Sistemas de Informação Internacional

A implementação do novo RERCT deverá considerar a integração com sistemas internacionais de troca de informações fiscais, como o Common Reporting Standard (CRS) da OCDE.

9. Impacto Econômico e Fiscal

9.1 Potencial de Arrecadação

O novo RERCT tem o potencial de gerar uma arrecadação significativa, especialmente se atrair um grande número de aderentes que não participaram das rodadas anteriores.

9.2 Repatriação de Recursos

A regularização pode resultar na repatriação de parte dos recursos mantidos no exterior, potencialmente beneficiando a economia doméstica através de novos investimentos.

9.3 Ampliação da Base Tributária

A longo prazo, a regularização desses ativos pode contribuir para a ampliação da base tributária, gerando receitas adicionais nos anos subsequentes.

10. Perspectivas Futuras

10.1 Tendência de Maior Transparência Fiscal

O RERCT deve ser visto no contexto de uma tendência global de maior transparência fiscal. É provável que futuros regimes de regularização sejam mais restritos, tornando esta possivelmente uma das últimas oportunidades de regularização em condições favoráveis.

10.2 Necessidade de Políticas Complementares

Para maximizar a eficácia do RERCT, será crucial implementar políticas complementares que incentivem a manutenção da conformidade fiscal e cambial após o período de regularização.

10.3 Evolução da Cooperação Internacional

O sucesso do programa e suas implicações para a posição do Brasil no cenário internacional de cooperação fiscal podem influenciar futuras negociações e acordos de troca de informações fiscais.

11. Conclusão Final

A Lei nº 14.973/2024, ao instituir um novo RERCT, têm o potencial de incentivar uma maior adesão, contribuindo para a regularização de ativos e o aumento da base tributária.

No entanto, é crucial que esta iniciativa seja acompanhada de medidas estruturais que promovam uma cultura de conformidade fiscal e cambial a longo prazo. Além disso, o equilíbrio entre o incentivo à regularização e a manutenção da equidade fiscal deve ser cuidadosamente considerado nas futuras políticas tributárias.

O sucesso deste novo RERCT dependerá não apenas de sua implementação eficaz, mas também de como ele se integrará a uma estratégia mais ampla de governança fiscal e transparência financeira internacional.

No entanto, o sucesso do programa não deve ser medido apenas pela arrecadação imediata, mas também por sua capacidade de promover uma mudança duradoura na cultura de conformidade fiscal.

Além disso, é fundamental que o governo equilibre cuidadosamente os incentivos oferecidos pelo programa com a necessidade de manter a equidade fiscal e a credibilidade do sistema tributário como um todo. A percepção de que regularizações frequentes podem incentivar o não cumprimento das obrigações fiscais deve ser ativamente combatida através de políticas complementares e educação fiscal.

Por fim, o novo RERCT deve ser visto como parte de uma estratégia mais ampla de inserção do Brasil no contexto global de transparência fiscal e combate à evasão de divisas. O sucesso desta iniciativa pode fortalecer a posição do país em fóruns internacionais e contribuir para um ambiente econômico mais transparente e competitivo.

A comunidade jurídica e acadêmica terá um papel crucial na análise contínua dos impactos desta legislação, fornecendo insights valiosos para o aprimoramento das políticas fiscais e cambiais do país nos anos vindouros.

Sobre o autor
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Pós-Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP) com bolsa integral concedida pela CAPES. Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP) com bolsa integral concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ, governo federal), Visiting Researcher oficialmente convidado pelo International Bureau of Fiscal Documentation (IBFD - Amsterdam). Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). LLM em Direito Societário pelo INSPER. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET/USP), Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC SP), MBA em Legal Administration pela Escola Paulista de Direito (EPD), Pós-graduado em International Tax Law pelo International Tax Center (ITC) Leiden, Holanda, Pós-graduado em Teoria Geral do Direito (IBET), Pós-graduado em Direito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV SP), Técnico em Gestão/graduação universitária (Unisul), Professor palestrante e Professor orientador da Pós-graduação Lato Sensu em Direito Processual Tributário da PUC-SP/COGEAE, Professor Assistente da Graduação em Direito (PUC-SP), Assistente da Pós graduação Stricto Sensu no Mestrado em Direito Processual Tributário (PUC SP), Professor do Mestrado CEDES/SP, Professor de Direito Tributário convidado CIESA/Manaus, Palestrante convidado em diversos cursos de Pós-graduação pelo Brasil, tais como OAB, rede de ensino LFG e Escola da Magistratura da Terceira Região ( Emag TRF3), Experiência na atuação jurídico consultivo internacional nos âmbitos comercial, indenizatório e fiscal, Autor de livros e artigos em Direito Tributário, com destaque para a obra Execução Fiscal e Dignidade da Pessoa Humana com primeira edição esgotada em todo o Brasil, Membro efetivo do Instituto Brasileiro de Direito Tributário IBDT sob o número 2179, Membro efetivo da Associação Brasileira de Direito Fiscal ABDF, Membro efetivo da International Fiscal Association IFA sob o número 41822

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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