A evolução do coaching: psicologia, tecnologia, religião, política e capitalismo no século xxi

21/10/2024 às 11:35
Leia nesta página:

Resumo:

Este artigo discute o desenvolvimento do coaching no Brasil e no mundo, destacando suas influências psicológicas, tecnológicas, religiosas, políticas e capitalistas. O coaching, desde sua ascensão nas empresas até a disseminação no ambiente virtual, é analisado sob uma perspectiva crítica, levando em consideração a ausência de regulamentação da profissão e a proliferação de práticas não fundamentadas cientificamente. Além disso, são propostas novas abordagens para o exercício do coaching no contexto contemporâneo, com base em teorias da psicologia e em considerações éticas e sociológicas.

Palavras-chave: Coaching, Psicologia, Tecnologia, Religião, Capitalismo, Neoliberalismo.

Abstract: This article discusses the development of coaching in Brazil and around the world, highlighting its psychological, technological, religious, political, and capitalist influences. Coaching, from its rise in corporate environments to its dissemination in the virtual space, is critically analyzed, considering the lack of professional regulation and the proliferation of scientifically unsubstantiated practices. Additionally, new approaches for practicing coaching in contemporary contexts are proposed, based on psychological theories and ethical and sociological considerations.

Keywords: Coaching, Psychology, Technology, Religion, Capitalism, Neoliberalism

1. Introdução

Nos últimos anos, o coaching emergiu como uma prática popular voltada para o desenvolvimento pessoal e profissional, especialmente no Brasil, onde sua disseminação acelerou a partir dos anos 2000.

No entanto, a falta de regulamentação e a proliferação de cursos online de qualidade duvidosa levantam questionamentos sobre a validade dessa prática.

Humildemente, este artigo busca abordar a evolução do coaching, suas relações com a psicologia, a tecnologia, a religião, a política e o capitalismo, propondo novas abordagens baseadas em princípios éticos e científicos.

2. Psicologia e Coaching: Diálogos e Tensões

O coaching se apropria de diversos conceitos da psicologia, como motivação, autoestima e autoconhecimento. Contudo, enquanto a psicologia busca uma compreensão profunda do comportamento humano e suas motivações, o coaching muitas vezes se baseia em fórmulas simplificadas de sucesso.

Segundo Robbins e Judge (2017), a psicologia organizacional já apontava a importância de um desenvolvimento integral, que vai além da simples produtividade.

No Brasil, autores como Maria Lúcia Castilho (2012) discutem como a psicologia pode oferecer uma base mais sólida para o coaching, evitando abordagens superficiais e potencialmente prejudiciais.

3. A Influência da Tecnologia e a Popularização do Coaching Virtual

Com o avanço da tecnologia, especialmente no âmbito digital, o coaching ganhou novas formas de disseminação, como os cursos e treinamentos virtuais.

No entanto, essa massificação trouxe consigo desafios.

Segundo Turkle (2011), a tecnologia pode aumentar a sensação de desconexão, o que contradiz o princípio do coaching de promover o autoconhecimento e o desenvolvimento humano.

Muitos coaches virtuais focam mais na obtenção de curtidas e seguidores, tornando o coaching uma atividade mercadológica, ao invés de uma prática transformadora.

4. Religião e o Fenômeno do Coaching Espiritual

O coaching espiritual tem ganhado espaço, especialmente em um contexto em que a teologia da prosperidade tem sido reatualizada por líderes religiosos, conforme discutido por Marília Santoni (2019).

No entanto, o coaching espiritual se diferencia por não estar necessariamente vinculado a uma religião específica, mas por promover um equilíbrio interior com base em princípios humanistas e espirituais.

Para o psicólogo Viktor Frankl (2006), a busca por significado e propósito na vida é central para o bem-estar humano, um ponto que o coaching espiritual tenta abordar, mas que muitas vezes se perde em discursos simplistas de sucesso.

5. O Impacto do Capitalismo e do Neoliberalismo no Coaching

O coaching também reflete as lógicas do capitalismo neoliberal, onde o sucesso individual é visto como a principal medida de valor. Segundo Bauman (2001), vivemos em uma sociedade líquida, onde as relações e valores se tornam instáveis, e o coaching, inserido nessa lógica, muitas vezes prioriza o sucesso material e imediato em detrimento de um desenvolvimento mais profundo e sustentável.

No entanto, o coaching pode repensar seu papel, adotando práticas mais éticas e comprometidas com o bem-estar coletivo.

6. O Coaching na América do Norte, Europa e China: Diferentes Abordagens Culturais e Econômicas

O coaching se desenvolveu de maneiras distintas ao redor do mundo, influenciado por contextos socioculturais e econômicos específicos. Nos Estados Unidos e na Europa, o coaching começou a se popularizar a partir da década de 1990, enquanto na China, o fenômeno ganhou força mais recentemente, impulsionado pelo rápido crescimento econômico e pela busca de alta performance no mercado global.

6.1. Coaching na América do Norte

Nos Estados Unidos, o coaching foi inicialmente impulsionado no ambiente corporativo, focado em produtividade e liderança. Empresas americanas rapidamente adotaram o coaching como uma ferramenta essencial para desenvolver habilidades de liderança e aumentar a eficácia organizacional. De acordo com Anthony Grant (2006), professor da Universidade de Sydney e pioneiro no campo, o coaching nos EUA tem fortes influências da psicologia positiva e da gestão empresarial, promovendo o crescimento individual dentro de uma lógica meritocrática e de alta performance.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Na América do Norte, o coaching também se expandiu para o coaching de vida (life coaching), focado no bem-estar pessoal e na autossatisfação, refletindo uma cultura onde o sucesso individual e a realização pessoal são vistos como objetivos principais. Essa prática, entretanto, também foi alvo de críticas, especialmente pela falta de regulamentação e pela ascensão de coaches sem formação adequada, conforme apontado por Whitmore (2010).

6.2. Coaching na Europa

Na Europa, o coaching se desenvolveu de maneira um pouco diferente, com uma abordagem mais humanista e colaborativa. Países como o Reino Unido, Alemanha e França incorporaram o coaching em seus contextos corporativos e educacionais, mas com maior ênfase no equilíbrio entre vida pessoal e profissional, alinhando-se às preocupações sociais europeias de bem-estar e qualidade de vida. Segundo Rosinski (2010), o coaching intercultural também se destacou no continente, considerando as interações entre diferentes culturas em um contexto de globalização crescente.

Além disso, a União Europeia tem feito progressos em regulamentar a prática de coaching, exigindo que profissionais tenham formação em áreas como psicologia e educação, o que confere maior credibilidade à profissão no continente. O coaching na Europa também tende a enfatizar a responsabilidade social e os valores éticos, refletindo a tradição filosófica e sociopolítica europeia.

6.3. Coaching na China

Na China, o coaching surgiu com força nas últimas duas décadas, impulsionado pelo rápido desenvolvimento econômico e pela necessidade das empresas chinesas de se alinharem às práticas ocidentais de gestão. O coaching corporativo na China se concentra em produtividade, inovação e liderança, com foco no sucesso empresarial em um ambiente de alta competitividade. De acordo com Tan (2014), o coaching na China foi inicialmente percebido como uma prática importada do Ocidente, mas aos poucos começou a se adaptar às tradições culturais chinesas, incluindo o confucionismo, que valoriza a harmonia e o respeito à autoridade.

Embora o coaching na China esteja em ascensão, ele ainda enfrenta desafios, como a falta de regulamentação formal e a dificuldade de adaptar as metodologias ocidentais ao contexto cultural chinês. O conceito de coaching, que enfatiza o autodesenvolvimento individual, pode entrar em conflito com valores tradicionais chineses que priorizam o coletivo sobre o individual, conforme apontado por Wang (2016).

6. Propostas para uma Nova Roupagem do Coaching no Século XXI

Diante dessas influências e variações regionais, o coaching precisa continuar evoluindo, levando em consideração as diferenças culturais e os novos desafios do século XXI. Algumas propostas incluem:

  • Adaptação cultural: garantir que as práticas de coaching sejam sensíveis às diferenças culturais, incorporando valores locais e regionais.

  • Formação e regulamentação internacional: promover padrões globais de qualidade, garantindo que coaches tenham a formação necessária para exercer a profissão de forma ética e eficaz.

  • Utilização de tecnologia para personalização: aproveitar a tecnologia digital para oferecer treinamentos mais personalizados, mantendo a qualidade e evitando a massificação sem critério.


7. Conclusão

O coaching, enquanto prática de autodesenvolvimento, apresenta uma evolução diferenciada em cada parte do mundo, influenciada por fatores culturais, econômicos e sociopolíticos. Na América do Norte, Europa e China, o coaching tomou formas específicas, adaptando-se às demandas e valores locais. No entanto, independentemente da região, é fundamental que o coaching seja reavaliado à luz de seus impactos sociais e éticos, e que se busque uma nova roupagem para sua prática no século XXI, alinhada às necessidades globais e regionais.

Referências

- BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

- CASTILHO, Maria Lúcia. Psicologia Organizacional: Teorias e Práticas. São Paulo: Atlas, 2012.

- FRANKL, Viktor E. Em Busca de Sentido: Um Psicólogo no Campo de Concentração. São Paulo: Vozes, 2006.

- ROBBINS, Stephen P.; JUDGE, Timothy A. Comportamento Organizacional. São Paulo: Pearson, 2017.

- SELIGMAN, Martin E.P. Florescer: Uma Nova Compreensão Sobre a Natureza da Felicidade e do Bem-estar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.

- SANTONI, Marília. A Teologia da Prosperidade no Brasil Contemporâneo. São Paulo: Edições Loyola, 2019.

- TURKLE, Sherry. Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other. New York: Basic Books, 2011.

Sobre o autor
Ademarcos Almeida Porto

Formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP Título de Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Superior de Advocacia - OABSP. Pós graduação em Direito Constitucional Cursos de extensão em: Direito imobiliário; Direito da Família e Sucessões; Direito do Consumido; Estatuto da Criança e do Adolescente e Direito do Trabalho. Especializando em Direito da Família e das Sucessões.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 37%
Logo JusPlus
JusPlus

R$ 24 ,50 /mês

Pagamento único de R$ 294 por ano
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos