Por cota eleitoral de gênero compreende-se a ação afirmativa que visa garantir espaço mínimo de participação de homens e mulheres na vida política do País (GOMES, 2020). Pretendeu o legislador, com o § 3º do artigo 10 da Lei n.º 9.504/97, garantir o preenchimento de um percentual mínimo de 30% (trinta por cento) e máximo de 70% (setenta por cento) de candidaturas para cada sexo.
Embora a Legislação não faça menção expressa, o intuito do legislador foi o de garantir a efetiva participação do sexo feminino no processo eleitoral, que, apesar de representar a maioria da população, ainda carece de uma maior representatividade e participação política. O instituto encontra fundamento na Constituição Federal, nos valores relacionados à cidadania, dignidade da pessoa humana e pluralismo político, e representa uma limitação ao princípio da autonomia partidária.
Contudo, o que se verifica eleição após eleição é o descaso e até, a má-fé, por parte das agremiações em garantir o percentual mínimo de 30% (trinta por cento) de candidaturas femininas, muitas vezes evidenciada através do lançamento de candidaturas fictícias – as chamadas candidaturas “laranjas”- visando apenas garantir a regularidade do registro da federação ou partido interessado em participar das eleições.
Felizmente, o Tribunal Superior Eleitoral tem sido firme na punição às agremiações que de forma dissimulada desrespeitam o percentual mínimo de candidaturas femininas. Se constatada a fraude, a pena é a nulidade dos votos de toda a legenda, o que, na prática, implica na perda das cadeiras conquistadas e o recálculo do quociente eleitoral e, em alguns casos, na inelegibilidade dos envolvidos.
Entende a Corte que é responsabilidade das greis a implementação efetiva das candidaturas femininas, de modo que cabe a estas, inclusive, substituir candidatas que eventualmente desistam do pleito e, até mesmo, que venham a falecer no curso da campanha eleitoral, conforme externado no voto da Min. Cármen Lúcia:
"A desistência formal de candidatas depois do deferimento do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários - DRAP e no último dia previsto na legislação eleitoral para a substituição de candidaturas, a inviabilizar a manutenção da proporção mínima de candidaturas femininas, caracteriza fraude ao disposto no § 3º do art. 10 da Lei n. 9.504/1997" (TSE, AgReg no AREspE: 06004701920206170092, Rel. Min. Carmem Lúcia, DJE 05.12.2023).
Ou seja, é responsabilidade do partido político auxiliar no que for necessário na condução das ações de campanha, formalizar a desistência das candidaturas, informar o falecimento de candidata no curso da campanha, e substitui–las por quem efetivamente almeje concorrer, evitando a manutenção de candidaturas fictícias com o intuito de preencher o percentual mínimo, burlando a legislação eleitoral.
Portanto, o partido não fica eximido da observância da ação afirmativa em caso de renúncias, desistências ou falecimento de candidata no curso da campanha, devendo sempre manter a proporção minimamente estabelecida em lei para os gêneros, sob pena de desconstituição da decisão anterior que deferiu o DRAP e anulação de todos os votos obtidos.
Em que pese possa parecer uma solução drástica, a medida é adequada e proporcional, pois visa garantir a efetiva participação política do sexo feminino, em total harmonia com os valores da cidadania, dignidade da pessoa humana e pluralismo político, previstos na Constituição Federal.
Fontes:
BRASIL. Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 1 out. 1997.
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Agravo Regimental No Agravo Em Recurso Especial Eleitoral 060047019/PE, Relator(a) Min. Cármen Lúcia, Acórdão de 23/11/2023, Publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 240, data 05/12/2023
GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2020.