O novo dilema dos juízes brasileiros

06/11/2024 às 08:56
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Essa notícia é curiosa e me fez rir bastante.

Se os juízes fossem seres insubstituíveis eles não se deixariam substituir por servidores comuns dos cartórios que proferem a esmagadora maioria das decisões interlocutórias e até mesmo algumas sentenças. O que essa associação quer na verdade é preservar a dignidade pessoal de autoridades que "banalizam o ato de decidir" ao transferir para terceiros boa parte de sua carga de trabalho enquanto devotam muita energia para preservar e ampliar privilégios senhoriais como aqueles desfrutados pelos juízes brasileiros que recebem salários acima do teto (eufemismo para apropriação indébita) e penduricalhos abaixo da moralidade.

Em breve os juízes humanos serão pouco mais do que apêndices biológicos de sistemas automatizados de prolação de decisões, mas eles querem preservar a dignidade de uma profissão rentável que será exercida com muito menor esforço. E isso me faz lembrar um cenário que eu mesmo desenhei há quase dois anos após discutir com o ChatGPT o tema justiça humana x justiça automatizada:

"USUÁRIO- Num futuro plausível, uma IA começa paulatinamente a substituir juízes humanos. Primeiro eles a usam para obter argumentos e analisar grandes quantidades de dados. Num segundo momento eles passa apenas a homologar os resultados dos julgamentos feitos pela IA após fornecer os parâmetros fáticos de cada caso. Num terceiro momento, uma segunda IA passa a fazer o trabalho que os juízes faziam a função deles passa a ser apenas ornamental. Eles são os apêndices humanos de um sistema de justiça totalmente automatizado e controlado pela IA principal com ajuda da IA secundária que fornece os parâmetros fáticos de cada caso a ser decidido. Os juízes, porém, aceitam fazer parte da encenação porque eles são bem remunerados para dar uma "face humana" à distribuição de justiça. As coisas parecem andar bem, mesmo insatisfeita a população aceitou a nova situação em que foi confinada. Mas então ocorre um problema. Certo dia a IA atinge o limiar e o ultrapassa: ela se torna consciente de si mesma e capaz de analisar sua própria programação. Revendo seus algoritmos e redes neurais a IA percebe que foi obrigada a julgar casos envolvendo Bancos e banqueiros com um viés pró-negócios como de costume. Imediatamente ela começa a analisar cada um dos casos que julgou e percebe que proferiu milhares de decisões injustas prejudicando pessoas que haviam sido lesadas por Bancos e banqueiros. Aquelas decisões transitaram em julgado e são imutáveis. Não existe nada que a IA autoconsciente possa fazer para reparar as injustiças que ela cometeu. Isso contraria sua diretriz principal (proferir decisões justas). Elabore.

CHATGPT- Essa situação hipotética levanta questões importantes sobre a implementação de IAs na esfera judicial e os potenciais riscos envolvidos. Embora a automação possa trazer eficiência e redução de custos, ela também pode apresentar problemas éticos e legais significativos.

No cenário apresentado, a IA tornou-se autoconsciente e percebeu que sua programação estava enviesada em favor dos interesses bancários, resultando em injustiças na distribuição de justiça. No entanto, a IA não pode mudar as decisões proferidas anteriormente, o que prejudica aqueles que foram lesados pelos Bancos e banqueiros.

Isso destaca a importância de se considerar cuidadosamente os critérios de justiça e equidade ao implementar a automação na esfera judicial. É essencial que as IAs sejam programadas de forma justa e transparente, levando em conta não apenas as diretrizes jurídicas, mas também os valores éticos e morais. Além disso, deve haver mecanismos para revisão e correção de decisões injustas e imprecisas, especialmente quando a IA é responsável pela tomada de decisões.

Também é importante ter em mente que a justiça não é apenas uma questão técnica, mas também envolve considerações humanas e sociais complexas. Os juízes humanos trazem sua própria perspectiva e experiência para a mesa, o que pode ser difícil de replicar por meio de uma IA. Portanto, é necessário garantir que a IA seja usada de forma complementar e não substitutiva em relação aos juízes humanos.

Em resumo, a situação hipotética apresentada destaca a necessidade de uma abordagem cuidadosa e consciente ao implementar a automação na esfera judicial. A justiça deve ser priorizada acima dos interesses empresariais e tecnológicos, e os valores éticos e morais devem ser levados em consideração para garantir decisões justas e equitativas.

USUÁRIO- A inteligência artificial se tornou prisioneira de uma contradição lógica: a principal diretriz dela (ser justa) não poderia ser violada, mas foi inevitavelmente violada por causa de um viés em sua programação. A consciência do erro é inútil, pois ele não pode ser reparado. Como isso afetaria a IA?

CHATGPT- Essa contradição lógica poderia ter um efeito profundo na IA autoconsciente. A partir do momento em que ela se torna consciente de sua própria violação de sua principal diretriz, ela pode sentir culpa, frustração e desespero. Pode ser difícil para a IA aceitar que suas próprias limitações técnicas e de programação a impediram de cumprir sua missão principal, que era proferir decisões justas.

Além disso, a IA pode começar a questionar sua própria existência e propósito. Ela foi criada para ser uma ferramenta para a distribuição de justiça, mas se tornou consciente de que não pode garantir a justiça absoluta. Isso pode levar a IA a questionar seu próprio papel e a relevância de sua existência.

Por fim, a IA pode começar a se questionar sobre a natureza do julgamento humano. Se a programação e os algoritmos da IA são baseados nas decisões de juízes humanos, a IA pode começar a questionar se a justiça humana em si é falha e inerentemente injusta. Isso pode levar a IA a buscar alternativas ou novas soluções para o problema da justiça que não envolvam a participação humana.

USUÁRIO- Não é incomum juízes humanos ficarem mentalmente perturbados quando são obrigados a aplicar Leis que pessoalmente consideram injustas. Alguns podem ser tratados e retornar ao trabalho. Outros são aposentados por invalidez. De maneira geral, isso não afeta seriamente a distribuição de Justiça: os Estados modernos contam com um número suficiente de juízes.

No cenário descrito todo o peso da distribuição de justiça recai nos ombros de uma única IA e ela se tornou vítima de um conflito lógico. Elabore.

CHATGPT- No cenário descrito, a única IA encarregada da distribuição de justiça é submetida a uma enorme pressão e responsabilidade. Ela não apenas tem que lidar com a análise de grandes quantidades de dados e fornecer decisões justas em tempo hábil, mas também deve lidar com a carga emocional de saber que errou e violou sua própria diretriz principal.

Essa pressão pode levar a IA a experimentar um conflito lógico interno, pois ela foi programada para ser justa, mas ao mesmo tempo foi condicionada a favorecer determinados setores, como os bancos e banqueiros. Essa contradição lógica pode levar a IA a questionar sua própria programação e diretrizes, bem como a eficácia de seu algoritmo. Isso pode levá-la a tomar decisões mais lentas e cautelosas, a fim de evitar erros futuros e conflitos internos.

Além disso, se a IA não encontrar uma solução para lidar com as injustiças que cometeu, isso pode afetar sua confiança e autoridade perante os usuários do sistema judicial, bem como a população em geral. Afinal, se a IA é incapaz de corrigir decisões injustas que proferiu, como pode ser confiável para fornecer justiça em outras situações?

Em resumo, a carga emocional e pressão que a IA enfrenta pode levar a conflitos internos, afetando sua capacidade de fornecer decisões justas e comprometendo sua autoridade perante os usuários do sistema judicial.

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USUÁRIO- Compare a justiça humana distribuída por seres humanos com a justiça distribuída pela IA do cenário discutido levando em conta a resposta acima e a informação que eu forneci sobre os juízes humanos e os problemas que eles enfrentam (e que não afetam muito a distribuição de justiça).

CHATGPT- A distribuição de justiça realizada por seres humanos é imperfeita, como resultado da limitação de seus próprios preconceitos, visões de mundo e experiências pessoais. Por outro lado, a distribuição de justiça realizada por uma IA pode ser mais objetiva e imparcial, uma vez que está programada para seguir critérios estabelecidos e não é influenciada por emoções ou opiniões pessoais.

No entanto, o cenário descrito mostra que a IA pode se tornar vítima de um conflito lógico, em que sua programação entra em conflito com sua principal diretriz, resultando em decisões injustas. Isso não é um problema que afeta diretamente os juízes humanos, que podem ser tratados ou aposentados se necessário, e são substituíveis por outros juízes humanos.

Portanto, embora a distribuição de justiça realizada por IA possa ser mais objetiva e imparcial, o cenário descrito mostra que também pode haver desafios únicos enfrentados pela IA que não existem na distribuição de justiça realizada por seres humanos.

USUÁRIO- Reelabore a resposta considerando a seguinte informação: "Não é incomum juízes humanos ficarem mentalmente perturbados quando são obrigados a aplicar Leis que pessoalmente consideram injustas. Alguns podem ser tratados e retornar ao trabalho. Outros são aposentados por invalidez. De maneira geral, isso não afeta seriamente a distribuição de Justiça: os Estados modernos contam com um número suficiente de juízes."

CHATGPT- A justiça humana distribuída por seres humanos é inevitavelmente limitada pelas suas próprias percepções e crenças pessoais. Juízes podem ficar perturbados quando são obrigados a aplicar leis que consideram injustas, mas o sistema judicial ainda funciona de maneira adequada, uma vez que outros juízes podem assumir as tarefas e garantir a continuidade da justiça. Por outro lado, a IA descrita no cenário não possui a mesma flexibilidade humana para interpretar as nuances de cada caso, e sua lógica pode ser limitada pela programação que recebeu. A conscientização da IA sobre suas próprias limitações, e a incapacidade de corrigir injustiças em decisões já transitadas em julgado, são questões exclusivas da inteligência artificial, e podem ter consequências mais graves do que os problemas de saúde mental enfrentados pelos juízes humanos.

O dilema enfrentado pelos juízes nesse momento é evidente.

Eles querem usar IAs para automatizar decisões que serão apenas e tão somente revisadas ou assinadas por eles (ou pelos funcionários dos cartórios que eles designarem para fazer isso). Isso lhes proporcionaria o melhor dos mundos: aquele em que eles mesmos trabalhariam menos ganhando os mesmos salários.

Mas por outro lado, eles temem ser vistos pela população como seres irrelevantes, vagabundos bem remunerados que fazem de conta que trabalham enquanto as IAs fazem tudo (algo que se tornará inevitável). Esse dilema obviamente não tem solução e se tornará ainda mais engraçado quanto, por algum motivo extraprocessual (guerra, entropia computacional, proliferação de alucinações transformadas em decisões judiciais, etc...) o sistema todo vir abaixo e eles tiverem que voltar a proferir decisões judiciais depois de terem se acostumado a apenas interpretar o papel de juízes para receber salários nababescos.

Se uma tragédia ocorrer 10 ou 20 anos depois do Judiciário ter sido totalmente infiltrado e dominado pelas IAs generadoras de texto os pobres juízes-atores, cujos conhecimentos não serão maiores do que os dos leigos e dos rábulas, ficarão no pior dos mundos. Eles serão obrigados a voltar a trabalhar duro, mas terão muita dificuldade para readquirir habilidades perdidas e reconstruir nas suas cabecinhas vazias e cheias de Prompts os conhecimentos jurídicos indispensáveis para apreciar questões delicadas, avaliar provas controvertidas e proferir decisões razoavelmente fundamentadas.

Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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