O direito e a Globalização: Perspectivas para a Pós-modernidade

19/11/2024 às 17:20
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Área do Direito: Sociologia jurídica

Resumo: O presente trabalho, por meio de uma revisão bibliográfica, faz uma breve análise dos momentos históricos pelos quais passou o Estado até que atingisse a configuração atual. Posteriormente, foi feito um apanhado geral sobre as mudanças trazidas pela globalização para o Direito e seus institutos jurídicos. Por derradeiro, são apresentados os principais problemas que acompanham o Direito da sociedade atual, complexa e pós-moderna, bem como as possíveis soluções que podem ser adotadas para fazer frente a esses novos paradigmas.

Palavras-chave: Sociedade pós-moderna. Direito. Problemas. Soluções.

Abstract: This work, through a bibliographical review, makes a brief analysis of the historical moments through which the State went through until it reached its current configuration. Subsequently, a general overview was made of the changes brought by globalization to Law and its legal institutes. Finally, the main problems that accompany the Law of today's complex and post-modern society are presented, as well as the possible solutions that can be adopted to face these new paradigms.

Keywords: Postmodern society. Right. Problems. Solutions. 


INTRODUÇÃO 

Na primeira parte deste artigo far-se-á uma breve análise dos momentos históricos por quais passou o Estado até que chegasse à configuração atual. De fato, as revoluções sociais dos séculos XIX e XX, se por um lado possibilitaram o reconhecimento de uma série de direitos e garantias, por outro desencadearam consequências que irradiaram nas diversas esferas do Estado, criando uma aprofundada crise no executivo (com a insuficiência de orçamento para efetivação dos direitos previstos), no legislativo (criando o citado fenômeno da inflação legislativa) e no judiciário (falta de credibilidade na capacidade de resolver conflitos e a morosidade dos processos).

Num segundo momento, um apanhado geral sobre as mudanças trazidas pela globalização para o direito e seus institutos jurídicos, tendo em vista que esse fenômeno é o principal responsável por importantes mudanças e rupturas institucionais nas estruturas jurídicas que presenciamos atualmente. Salientando-se que esse fenômeno apresenta múltiplas influências em quase todas as áreas do conhecimento, tais como a economia, a política, a ciência, a sociologia, etc.

Por fim, serão apresentados os principais problemas e dicotomias que acompanham o Direito da sociedade contemporânea (ou pós-moderna), bem como as possíveis soluções que deverão ser adotadas se pretendermos enfrentar esses novos paradigmas.


1. O ESTADO CONTEMPORÂNEO 

Em apertado resumo, devemos lembrar que o chamado Estado Moderno, conheceu três vertentes, ou seja, nasceu com os governos absolutistas após o fim da era medieval; transformou-se em Liberal, fruto das revoluções burguesas do século XVIII e, gradativamente, foi incorporando funções para atender às reinvindicações sociais, recebendo a denominação de Estado-providência, do bem-estar social ou, ainda, Estado-social, fruto em grande parte de revoluções socialistas do fim do século XIX e inciso do século XX.

O Direito oficial, sendo entendido como instrumento do Estado para o controle social, acompanhou as características próprias de cada modelo de Estado. De fato, o desenvolvimento do direito ao longo da história humana tem sido caracterizado por uma tranformação contínua, refletindo as mudanças nas sociedades, nas culturas e nas concepções de justiça.

Desse modo, o Estado Liberal, cuja principal característica apontada é a ausência de intervenção na esfera econômica, nas leis de mercado e na propriedade privada, possuía um modelo de Direito estritamente formal e legalista, restrito à mera previsão legal de direitos.

Uma das características distintivas dessa fase do direito é a formalidade dos procedimentos legais. Os tribunais seguiam rituais rígidos e solenes, e a aplicação da lei era muitas vezes baseada exclusivamente na interpretação literal do texto legal. Além disso, a autoridade dos juízes era limitada pela estrita adesão aos precedentes estabelecidos e à doutrina legal predominante.

Essa abordagem formalista e legalista do direito refletia uma visão de mundo hierárquica e autoritária, na qual a ordem social era mantida pela aplicação uniforme e impessoal e, precipuamente, literal, das leis.

A partir da Revolução Industrial e, precipuamente, com o crescimento das desigualdades sociais e econômicas entre os detentores dos meios de produção e a classe proletária, e fruto, em grande parte das revoluções socialistas, nasce a concepção de que o Estado tem que interferir nas regras econômicas e de mercado para tentar reduzir as desigualdades sociais.

Assim, o Estado passou a ter que assumir várias funções, que antes estavam restritas aos particulares. No campo legislativo esta fase foi acompanhada por uma crescente previsão de leis regulamentares de novos direitos e novas normas sociais que visavam reduzir as desigualdades existentes no seio da sociedade. Tais leis alertam para a necessidade de igualar os indivíduos não apenas no campo formal, mas principalmente no campo material, ou seja, garantir melhores condições de vida e equalizar as oportunidades para todos os membros da sociedade. Afinal, de nada adianta o sistema jurídico prever utopicamente que todos são iguais, se, de fato, políticas públicas que objetivem promover essa igualdade não forem implementadas pelo Estado.

No entanto, a constatação a que chegamos é de que a máquina estatal não estava preparada para assumir tantas funções quantas as que se viu obrigada a gerir, para implementar o novo modelo proposto, dando início à chamada crise do Estado contemporâneo.

Neste sentido, no campo jurídico, também foi observado o mesmo fenômeno, ou seja, devido à inflação legislativa, com a consequente previsão de novos direitos aos cidadãos e deveres ao Estado, e a crescente complexidade das novas relações sociais advindas da própria modernidade, acompanhadas da falta de aparelhamento e preparo da esfera judiciária para resolver estes novos conflitos, resultam na crise do Judiciário e do monopólio estatal da solução de conflitos sociais.

Passou-se, pois, a se questionar a eficácia do Poder Judiciário e do Estado na garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos. Esta crise se manifesta em diversos contextos, incluindo a morosidade do sistema judicial, a falta de acesso à justiça para grupos marginalizados, a corrupção no aparato estatal e a incapacidade de cumprir decisões judiciais.

Um dos principais desafios enfrentados pelo Poder Judiciário é a lentidão e a burocracia que caracterizam muitos sistemas judiciais ao redor do mundo. A demora na resolução de processos legais não apenas compromete a eficácia da justiça, mas também mina a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas e no Estado de Direito. Além disso, a morosidade da justiça frequentemente prejudica aqueles que não têm os recursos necessários para arcar com os custos e as exigências processuais, perpetuando assim as desigualdades de acesso à justiça.

Outro aspecto relevante da crise do Poder Judiciário é a sua incapacidade de garantir o cumprimento efetivo das decisões judiciais. Mesmo quando os tribunais emitem sentenças favoráveis aos direitos dos cidadãos, muitas vezes há obstáculos práticos e institucionais que impedem a sua implementação. Isso pode incluir a resistência por parte de agentes estatais, a falta de recursos para fazer cumprir as decisões ou a ausência de mecanismos eficazes de supervisão e controle.

Além dos desafios específicos enfrentados pelo Poder Judiciário, a crise também se estende ao próprio Estado como um todo, diante da sua incapacidade de fazer valer, na prática, o rol de direitos garantidos no papel.

Esta crise, agravada pelos efeitos da globalização econômica (que serão abordados no próximo tópico), se reflete na insatisfação da sociedade com o desempenho do Poder Judiciário, tendo como consequência o surgimento de novas esferas sociais de solução de conflitos, e de movimentos sociais como fontes de regras sociais. 


2. OS EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO

A globalização é um fenômeno multifacetado que tem impactado profundamente as sociedades contemporâneas em todo o mundo e espraia seus efeitos em diferentes aspectos da vida humana, incluindo economia, cultura, política e meio ambiente.

Embora seja inquestionável que esse fenômeno traz oportunidades de crescimento econômico, intercâmbio cultural e cooperação política, também apresenta desafios significativos, como desigualdade econômica, homogeneização cultural, perda de soberania nacional e impactos ambientais adversos. É crucial, portanto, adotar abordagens multidimensionais e holísticas para entender e lidar com os efeitos da globalização na sociedade contemporânea.

O sociólogo Octavio Ianni entende que o fenômeno da globalização, ou globalismo, se traduz em vários outros fenômenos setoriais e de mais fácil percepção, como mudanças nas fronteiras geográficas, nas relações de trabalho com consequente flexibilização das leis trabalhistas; revolução tecnológica, através da informática; velocidade da circulação de informações, pessoas e capitais, para enumerar apenas alguns.

Em aspectos mais amplos, Ianne ensina que o Globalismo: 

"(...) Sob muitos aspectos, as transformações que estão ocorrendo no mundo no fim do século XX, sugerindo os primeiros lineamentos do XXI, são manifestações de uma ruptura de amplas proporções, por suas implicações práticas e teóricas. Inicia-se outro ciclo da história, talvez mais universal do que outros, e cenário espetacular de outras forças sociais.

Na base da ruptura que abala a geografia e a história no fim do século XX está a globalização do capitalismo. Em poucas décadas, logo se revela que o capitalismo se tornou um modo de produção global."

(A era do globalismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. P. 238) 

José Eduardo Faria enumera alguns efeitos do fenômeno da globalização econômica, os quais, a partir da década de 80, vão gerar outras rupturas institucionais nas estruturas jurídicas e políticas legadas pelo Estado liberal, no século XIX, e pelo Estado Social, no século XX, sendo eles: 

“1) mundialização da economia, mediante a internaciolização dos mercados de insumo, consumo e financeiro, rompendo com as fronteiras geográficas clássicas e limitando crescentemente a execução das políticas cambial, monetária e tributária dos Estados nacionais;

2) Desconcentração do aparelho estatal, mediante a descentralização de suas obrigações, a desformalização de suas obrigações, a desformalização de suas responsabilidades, a privatização de empresas públicas e a deslegalização da legislação social;

3) Internacionalização do Estado, mediante o advento dos processos de integração formalizados pelos blocos regionais e pelos tratados de livre comércio e a subsequente revogação dos protecionismos tarifários, das reservas de mercado e dos mecanismos de inventivos e subsídios fiscais;

4) Desterritorialização e reorganização do espaço de produção, mediante a substituição das plantas industriais rígidas surgidas no começo do século XX, de cárater fordista, pelas plantas industriais flexíveis, de natureza toyotista, substituição essa acompanhada pela desregulamentação da legislação trabalhista e pela subsequente flexibilização das relações contratuais;

5) Fragmentação das atividades produtivas nos diferentes territórios e continentes, o que permite aos conglomerados multinacionais praticar o comércio inter-empresa, acatando seletivamente as distintas legislações nacionais e concentrado seus investimentos nos países onde elas lhes são menos favoráveis;

6) Expansão de um direito paralelo ao do Estado, de natureza mercatória (lex mercatória), como decorrência da proliferação dos foros de negociações descentralizados estabelecidos pelos grandes grupos empresariais

(Direito e globalização econômica: implicações e perspectivas. São Paulo: Malheiros, 1996. P.10)”. 

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Sobre estes efeitos, José Eduardo Faria entende haver uma característica comum passando por todos eles, qual seja, o esvaziamento da soberania e da autonomia dos Estados nacionais, no sentido de que: 

"(...) Incapazes de assegurar uma efetiva regulação social, no âmbito de uma economia globalizada, despreparados para administrar conflitos coletivos pluridimensionais por meio de sua engenharia jurídico-positiva concebida para lidar basicamente com conflitos unidimensionais e inter-individuais, impotentes diante da multiplicação das fontes materiais de direito e sem condições de deter a diluição de sua ordem normativa gerada pelo advento de um efetivo prulalismo jurídico, os Estados nacionais encontram-se, assim, em crise de identidade."

(Direito e globalização econômica: implicações e perspectivas. São Paulo: Malheiros, 1996. P. 12). 

Destarte, conseguiu-se até o presente momento, que se apurassem algumas das causas da crise que atravessa o Estado e, particularmente seu órgão encarregado de solucionar os conflitos sociais e aplicar o Direito, o Poder Judiciário.

No próximo tópico deste estudo, buscar-se-á, uma aproximação entre as características da crise do Estado contemporâneo, agravadas pela globalização econômica, e os reflexos sentidos nas ciências e instituições jurídicas, através de uma análise epistemológica sobre a pós-modernidade, do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos. 


3. A PÓS-MODERNIDADE 

A pós-modernidade emerge como um conceito complexo e multifacetado que desafia as noções tradicionais de modernidade e sua visão linear e progressista da história. Enquanto o termo "modernidade" historicamente denota um período caracterizado pelo racionalismo, pelo avanço científico, pelo desenvolvimento tecnológico e pelo otimismo no progresso humano, a pós-modernidade questiona essas ideias e propõe uma abordagem mais fragmentada, plural e cética em relação aos discursos dominantes.

No entanto, é importante reconhecer que a pós-modernidade não representa um rompimento completo com a modernidade, mas sim uma continuidade complexa e uma reconfiguração das condições sociais, culturais e políticas que surgiram no período moderno. Além disso, a pós-modernidade não é um fenômeno homogêneo; suas manifestações variam de acordo com contextos geográficos, históricos e culturais específicos.

O sociólogo português Boaventura de Sousa Santos acredita que o projeto da modernidade está repleto de dicotomias, como por exemplo público/privado; sociedade/indivíduo; homem/natureza; estando presente em todas elas a dicotomia formal/individual.

É característica também da modernidade a deficiência na mediação destas dicotomias e a consequente polarização delas. O que acarreta uma constante uma constante oscilação na vigência dos polos dicotômicos, ou seja, em determinada época histórica predomina o aspecto privado sobre o público, ou o formal sobre o informal, já no momento subsequente, predominará o inverso, e assim por diante.

Ocorre que, esta polarização, acrescida da deficiência na mediação e da oscilação de vigências dos polos dicotômicos, traz resíduos de um polo ao outro, desse modo, após determinada época em que tenha predominado aspectos formais, passará a predominar aspectos informais, porém não iguais aos que predominaram antes do formal, já que trará consigo inevitavelmente, resíduos de formalidade.

Para o professor Boaventura, este jogo tem acarretado a transformação dos polos dicotômicos, a medida em que eles vão se aproximando e se confundindo até o ponto em que se transforma no duplo do outro, quando há, portanto o colapso das dicotomias.

A identificação deste processo de colapso de dicotomias, a busca de soluções para o problema e a consequente procura de novos paradigmas conceituais é que o autor denomina de transição pós-moderna.

O multicitado autor fez um valioso estudo acerca do colapso da dicotomia, especificamente no que se refere à superação da dicotomia entre a justiça formal/oficial e a justiça informal/comunitária.

Nesse diapasão, Boaventura elenca como a principal inovação jurídica da modernidade[1] o monopólio da justiça formal pelo Estado e a consequente negação de todas as demais formas de justiça.

Essa situação só começou a mudar com o advento do Estado-providência e o seu intuito de constantes regulamentações. O conceito de Estado-providência, também conhecido como Estado de bem-estar social, refere-se a uma forma de organização política e econômica na qual o Estado desempenha um papel ativo na provisão de serviços e benefícios sociais com o objetivo de garantir o bem-estar e a segurança socioeconômica dos cidadãos.

O Estado-providência surgiu como uma resposta às crises sociais e econômicas do século XIX e XX, especialmente após a Segunda Guerra Mundial, quando muitos países buscaram implementar políticas e programas destinados a mitigar a pobreza, reduzir as desigualdades sociais e promover o desenvolvimento econômico e social. Essas medidas incluíram a criação de sistemas de seguridade social, como aposentadorias, seguro-desemprego, saúde pública, educação gratuita e assistência social.

Uma das características centrais do Estado-providência é a ideia de solidariedade social, na qual os cidadãos contribuem para um fundo comum por meio de impostos e contribuições sociais, e em troca recebem benefícios e serviços que garantem sua segurança e bem-estar ao longo da vida. Essa abordagem tem como objetivo promover a coesão social, reduzir as disparidades econômicas e fortalecer o sentimento de pertencimento e identidade nacional.

Além disso, o Estado-providência envolve uma intervenção ativa do Estado na economia, com o objetivo de regular os mercados, proteger os direitos dos trabalhadores e promover o desenvolvimento econômico sustentável. Isso pode incluir políticas de redistribuição de renda, investimentos em infraestrutura, subsídios para setores estratégicos e medidas para garantir o acesso equitativo aos recursos e oportunidades.

O grande número de normas que passaram a ser editadas acarretou o aumento significativo de direitos individuais e sociais e, por consequência, uma explosão da litigiosidade.

Ocorre que, em contraste à implementação Estado-providência, houve a redução dos recursos financeiros e, portanto, a natural incapacidade material da justiça em atender o aumento da demanda nas áreas de saúde, educação, previdência etc.

Além disso, mudanças demográficas, como o envelhecimento da população e a diminuição da taxa de natalidade, bem como a globalização econômica e as transformações tecnológicas, têm colocado pressão adicional sobre os sistemas de bem-estar social em todo o mundo, que passaram a enfrentar desafios significativos, incluindo questões de sustentabilidade financeira.

Surge assim, a informalização da justiça, ou seja, o Estado permite que segmentos da sociedade civil se organizem sob a forma de órgão jurisdicional, sendo apontadas como características desta justiça informal: está voltada para a resolução de litígios de pequeno valor (nos litígios de grande vulto, em que estão envolvidos grandes interesses econômicos, as partes preferem se socorrer de uma decisão formal); a ênfase está na busca por resultados acordados (naturalmente mais rápidos e facilmente cumpridos); capacidade processual das partes para agir sem a presença de advogados (como decorrência da informalidade); escolha de leigos para atuarem como árbitros ou juízes (com o fim de aproximar o julgador das partes); diminuto poder de coerção nas suas decisões (a ideia é que as decisões sejam construídas em vez de impostas, assim, serão cumpridas espontaneamente e a coerção típica das decisões judiciais não será tão necessária).

Todavia, nesta informalização da justiça, ao contrário do que é pregado por muitos, o Estado não age por motivos nobres como a democratização da justiça e do seu acesso, mas sim por critérios de eficácia lógico-formal.

Estes critérios são: financeiro ou de rentabilidade, onde o Estado desresponsabiliza-se financeiramente das prestações sociais, ao mesmo tempo em que mantém sobre elas um controle simbólico; critério de estabilização social, o Estado consegue controlar segmentos da sociedade onde não consegue chegar sua justiça oficial, sob uma forma aparentemente não-formal.

Mais uma vez, estamos, segundo o multicitado autor, diante da duplicação dos polos dicotômicos, onde justiça formal e informal se confundem, tornando difícil sua distinção. Porém, neste caso, o autor reconhece que existe também uma contramão de direção, ou seja, não é só o Estado que informaliza segmentos de sua justiça, mas há também mecanismos de justiça que nascem informais e apresentam tendências a formalizar-se.

O autor aponta que essa descaracterização recíproca, inconsciente e portanto, incontrolada, destes polos dicotômicos é um dos sintomas mais perturbadores da crise final da modernidade, constituindo um dos maiores desafios para a transição para a pós-modernidade, a ruptura com estes antigos conceitos, e o surgimento de novos paradigmas mais conceituais. 


CONCLUSÃO 

            De todo o exposto conclui-se que as perspectivas e previsões para os institutos jurídicos e o Direito como um todo, para o terceiro milênio ou pós-modernismo, passam pela análise histórica da situação do Estado contemporâneo, dos efeitos acarretados ao mesmo, pela Globalização, e pela chamada passagem para a pós-modernidade.

            Desta análise, resulta evidente o enfraquecimento do Estado e de sua esfera jurídica como solucionadora de conflitos sociais, e a emergência de novas formas de solução de conflitos sociais, centradas em movimentos e segmentos da sociedade, informais ou não-estatais. Ocorre que estes fenômenos ainda estão à procura de paradigmas conceituais, para que não repitam os erros cometidos pelo aparato estatal na tentativa de solução de conflitos sociais.

Nesta tentativa, impõe-se, primeiramente uma reformulação nas carreiras jurídicas, mormente na Magistratura, e principalmente no ensino jurídico, rompendo com a anacrônica dogmática jurídica pura e a concepção lógico-formal do Direito, adotando uma visão inter e multidisciplinar do Direito, com aspectos ético-valorativos e, principalmente como instrumento de transformação social, na busca do efetivo acesso universal à justiça e inclusão social.

Adotando essa visão e concepção do Direito como novo paradigma conceitual, estar-se-á dando início à reformulação necessária das esferas e carreiras jurídicas para que o sistema jurídico se adapte às novas exigências criadas pelo pós-modernismo.


REFERÊNCIAS 

AZEVEDO, Plauto Faraco. Direito, justiça social e neoliberalismo. São Paulo: RT, 1999.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

FARIA, José Eduardo (org.) Direitos Humanos, direitos sociais e justiça. São Paulo: Malheiros, 1994.

IANNI, Octavio. Teorias da globalização. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2000.

Santos, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez, 1997.


[1] Entenda-se modernidade como fenômeno que antecedeu a pós-modernidade, vivenciada por nós hoje.

Sobre o autor
Rafael Gomes de Queiroz Neto

Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e especialista em Direito Processual Civil pelo Complexo Educacional Renato Saraiva (CERS). Atualmente é Defensor Público no Estado do Rio Grande do Norte.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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