Meu companheiro morreu e não deixou filhos. A herança é toda minha, certo?

21/11/2024 às 11:11
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A ordem de vocação hereditária determinará como deverá ser feita a distribuição da herança deixada pelo (a) falecido (a). Segundo regra expressa do Código Civil, a sucessão e a legitimação para suceder deverão ser regulados pela LEI vigente ao tempo da abertura da sucessão (art. 1.787), pelo que deve-se entender que se a pessoa faleceu antes de 10/01/2003 devemos aplicar as regras do Código Civil de 1916 e se o falecimento foi depois dessa data, as regras serão do Código Civil de 2002 - porém a questão não é tão simples, na medida em que, por exemplo, regras do atual Código Civil (de 2002) já têm aplicação diferenciada, por exemplo, se for o caso de União Estável, incidindo sobre o art. 1.790 do Código Civil as decisões do STF lapidadas nos Temas 498 e 809.

O atual Código Civil assim determina:

"Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais".

De acordo com o decido nos referidos Temas 498 e 809 do STF ("É inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002") não deverá prevalecer qualquer distinção de tratamento nas situações de UNIÃO ESTÁVEL e CASAMENTO no que diz respeito à ordem de vocação hereditária. Em outras palavras, nas hipóteses em que o sujeito era casado (ou vivia em união estável), sobrevindo seu falecimento e não deixando descendentes (filhos, netos etc), caso a sucessão se dê na vigência do Código de 2002, não deixando ele nem mesmo ascendentes (pais ou avós vivos) a herança deverá ser recolhida INTEGRALMENTE pelo seu cônjuge ou companheiro (a), observadas as regras do art. 1.830 e seguintes.

Com certa recorrência se observam casos onde os IRMÃOS DO FALECIDO (os chamados colaterais, cf. regra do art. 1.592 c/c 1.839 e 1.843 do Código Civil) tentam recolher a herança por inteiro afastando eventual companheira deixada pelo "de cujus". Tal situação, como se viu acima, não deve prevalecer, nem mesmo quando o relacionamento não tenha União Estável documentada (via Escritura Pública de União Estável ou Contrato particular de União Estável) na medida em que, como sabemos, a União Estável não exige Escritura Pública ou Contrato Escrito para projetar direitos patrimoniais (inclusive sucessórios) entre os envolvidos, sendo certo que contrato escrito não é exigência do art. 1.723 do Código Civil. O reconhecimento do instituto, como se sabe, pode ser feito JUDICIAL ou EXTRAJUDICIALMENTE (Resolução 571/2024 do CNJ) e fica aqui desde já o conselho para quem vive em União Estável para regularizar sua situação e assegurar seus direitos, especialmente os sucessórios.

POR FIM, decisão recente do TJGO que com todo acerto reconhece o direito sucessório da companheira afastando a pretensão dos irmãos do "de cujus" em recolher a herança:

"TJGO. 55651508520228090000. J. em: 06/03/2023. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVENTÁRIO. AUSÊNCIA DE ASCENDENTES E DESCENDENTES DO" DE CUJUS ". CÔNJUGE SOBREVIVENTE. TOTALIDADE DA HERANÇA. DECISÃO CONFIRMADA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS DO ARTIGO 1.022 DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. REJEIÇÃO. 1. Não havendo descendentes e ascendentes, ao cônjuge sobrevivente cabe a TOTALIDADE DA HERANÇA, independentemente do regime de bens adotado no casamento, ressalvada disposição de última vontade. 2. Os parentes COLATERAIS, tais como irmãos, tios e sobrinhos, são herdeiros de quarta e última classe na ordem de vocação hereditária, herdando apenas na ausência de descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro, em virtude da ordem legal de vocação hereditária. Precedentes do STJ. (...). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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