O movimento sútil do Judiciário para desestimular o ingresso de ações indenizatórias nos Juizados Especiais: segregação social e mercantilização do Poder Judiciário?

09/12/2024 às 09:30

Resumo:


  • Os Juizados Especiais Cíveis (JECs) foram criados para facilitar o acesso à justiça, oferecendo um rito mais simples e acessível.

  • Medidas adotadas pelo Judiciário têm desestimulado o ajuizamento de ações indenizatórias nos JECs, gerando debates sobre o amplo acesso à justiça.

  • Essas práticas têm impactado negativamente cidadãos economicamente vulneráveis, ampliando desigualdades sociais e gerando preocupações sobre a mercantilização do sistema judicial.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Os Juizados Especiais Cíveis (JECs) foram criados como uma ferramenta para facilitar o acesso à justiça, oferecendo um rito mais simples, célere e acessível, especialmente para questões de menor complexidade e menor valor econômico. Entretanto, nos últimos anos, o Judiciário brasileiro tem adotado medidas que indicam um desestímulo ao ajuizamento de ações indenizatórias nesses juizados, gerando debates sobre os impactos dessa prática no princípio do amplo acesso à justiça e na potencial mercantilização do sistema judicial.


Contexto Atual e o Movimento do Judiciário

A ideia inicial dos JECs, fundada na Lei 9.099/1995, era democratizar o acesso à justiça. Contudo, o alto volume de ações, muitas delas relacionadas a indenizações por danos morais e patrimoniais, levou à sobrecarga do sistema. Em 2023, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou dados alarmantes: mais de 84 milhões de processos estavam em tramitação no Brasil, sendo os JECs responsáveis por uma parcela significativa【8】.

Além disso, as metas estabelecidas pelo CNJ, como a Meta 1 de 2024, que exige dos magistrados o encerramento de mais processos do que os novos ingressados, têm pressionado os juízes a adotar medidas para conter a litigância excessiva【8】. Entre essas medidas estão:

  • Extinção de ações na fase inicial sob alegações de insuficiência probatória.

  • Imposição de custas processuais em hipóteses não previstas.

  • Aplicação rigorosa de multas por litigância de má-fé, mesmo em casos de boa-fé processual.

Essas práticas, embora justificadas como medidas para conter o uso abusivo do sistema, têm desestimulado especialmente os cidadãos economicamente vulneráveis de buscar reparação por danos, ampliando desigualdades sociais.


Impactos Sociais e Jurídicos

Segregação Social

O rigor na análise de ações indenizatórias e a imposição de custos inesperados afastam os menos favorecidos dos JECs, que tradicionalmente funcionavam como um mecanismo de inclusão social. A pesquisa de 2023 do CNJ também apontou que mais de 70% dos casos nos JECs envolvem demandas de consumidores contra grandes corporações (como bancos e empresas de telecomunicações)【9】【10】. Esses demandantes, ao enfrentarem dificuldades no acesso à justiça, perdem um canal importante para a defesa de seus direitos.

Mercantilização do Judiciário

Ao priorizar metas de produtividade e eficiência, o Judiciário corre o risco de transformar-se em um sistema de gestão de números, negligenciando sua função social. A "indústria do dano moral", frequentemente mencionada como justificativa para essas medidas, precisa ser abordada com equilíbrio, evitando punições excessivas a quem busca legítima reparação【9】.


Dados Estatísticos Relevantes

  • Litigância Concentrada: O relatório “Justiça em Números 2023” do CNJ revelou que 10 grandes empresas foram responsáveis por quase 50% das ações judiciais nos JECs【8】.

  • Custas Processuais: Em estados como São Paulo, o aumento das custas processuais em ações indenizatórias foi superior a 15% em 2023, tornando-se um entrave para demandantes de baixa renda【8】.

Esses dados reforçam a percepção de que a atuação do Judiciário está cada vez mais voltada para contenção quantitativa de ações, em detrimento do acesso equitativo à justiça.


Reflexões e Soluções Propostas

Diante desse cenário, é necessário repensar as práticas judiciais e equilibrar a eficiência administrativa com a garantia de direitos fundamentais. Algumas sugestões incluem:

  1. Fortalecimento dos Meios Alternativos de Solução de Conflitos (MASCs): Conciliação, mediação e arbitragem podem ser mais amplamente incentivadas, desde que respeitem os princípios da equidade e o direito de acesso à justiça【10】.

  2. Educação Jurídica e Transparência: É essencial que a população seja informada sobre seus direitos e os mecanismos disponíveis para exercê-los, especialmente os menos onerosos.

  3. Revisão das Metas do CNJ: As metas de produtividade precisam ser ajustadas para que não comprometam a análise de mérito e o princípio da ampla defesa.

  4. Monitoramento de Grandes Litigantes: Empresas com elevado número de demandas devem ser monitoradas, e mecanismos como acordos coletivos podem ser utilizados para reduzir a judicialização【9】.


Conclusão

O movimento de desestímulo ao ajuizamento de ações indenizatórias nos JECs, embora justificado por argumentos de eficiência, tem potencial para comprometer o acesso à justiça e aprofundar a exclusão social. O Poder Judiciário deve buscar soluções que harmonizem eficiência e inclusão, assegurando que o direito de reparar danos seja preservado como um dos pilares da cidadania.

Fontes consultadas:

  1. CNJ - "Justiça em Números 2023". Disponível em: cnj.jus.br【8】.

  2. Jus Navigandi - Acesso à Justiça e Juizados Especiais. Disponível em: jus.com.br【10】.

  3. JusBrasil - Danos Morais e Responsabilidade Civil. Disponível em: jusbrasil.com.br【9】.

Sobre o autor
Rodrigo Reis Ribeiro

Advogado, sócio-gerente da firma de advocacia Costa e Reis Advogados e Associados com sede em Porto Velho-RO, professor, empresário, escritor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos