Celular na mão é passe livre? Os limites éticos na produção de conteúdo

20/01/2025 às 15:42
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Se pudéssemos pontuar os maiores desafios contemporâneos, certamente lidar com as redes sociais e a pulverização espantosa de informações seria um deles. A internet é uma ferramenta poderosa e um caminho sem volta. Isso é inexorável e seria, no mínimo, ingênuo projetar os próximos anos da sociedade sem o avanço exponencial de seu uso e das diferentes tecnologias, incluindo aqui a tão propagada Inteligência Artificial.

Mas esse artigo não é sobre isso. Essa é uma realidade posta, com todos os seus ônus e incontáveis bônus, devendo todo desenvolvimento ser acolhido e bem-vindo. A reflexão de hoje é sobre base, sobre pavimentar todo avanço. E é fruto de uma experiência que recentemente vivenciei junto com a minha filha, ao sermos abordadas na rua por um criador de conteúdo em uma dessas “trollagens” virais, que nos inseriu, em uma fração de segundos, na incômoda situação de nos sentirmos invadidas.

Podemos discorrer muitas linhas sobre a privacidade na Era Digital, mas nada como uma vivência prática para dar o exato contorno da urgência de se regularizar determinadas práticas, até então defendidas por mim, sobretudo no campo teórico e acadêmico. É como se furtassem de você o direito de escolher como e o quanto se expor, uma linha tênue e um limite que, por direito, deveria ser exercido pelo próprio titular.

Esse é o real peso do uso indevido da imagem de alguém. Diante de uma potencial violação, pude perceber de forma visceral o quanto está intrinsecamente ligado à proteção da própria personalidade, afinal, é literalmente a nossa projeção para o mundo.

Seja por carta, que evoluiu para fax, email, mensagens em aplicativos, até chegar na nossa imensa teia frenética de troca de informações, toda comunicação parte de um ser humano para outro(s). Impregnado ou não da intenção de passar um ponto ou visão, todo conteúdo carrega em si uma mensagem e, inevitavelmente, gera efeitos.

Há tempos tenho me debruçando sobre essa temática, na qualidade de advogada especializada em propriedade intelectual e uso de imagem. E sempre reforço que, como tudo no Direito, há que se fazer uma ponderação tendo como norte o princípio da dignidade humana. Se de um lado temos o direito de liberdade de expressão, hoje potencializado pela facilidade das tecnologias e alcance da internet, do outro temos o direito à privacidade que engloba e garante o uso protegido da imagem, voz e demais dados biográficos. Ou seja, nada é absoluto e há que se analisar caso a caso.

Mas o que é, sim, absoluta (ou idealmente deveria ser) é a responsabilidade com a ética e a veracidade na produção de todo e qualquer conteúdo.

Comprometer a verdade gera o efeito oposto pretendido com a internet e as redes sociais, pois se a informação se torna majoritariamente viciada, prevalece a dúvida que gera o isolamento em bolhas. Disseminação de fake news e criação de conteúdo forjado, visando o engajamento pelo ódio e desinformação, não amplia, mas sim, reduz o seu alcance. É como transformar um único idioma em diferentes dialetos incompatíveis.

A visão imediatista por likes e engajamento é como uma semente de colheita única que tornará, em pouco tempo, todo o solo infértil. A comunicação depende de pessoas que precisam se sentir seguras e confortáveis para consumir um conteúdo. Não abordo nesse artigo a necessária responsabilização das plataformas na moderação de conteúdo e no combate à desinformação porque isso demanda um outro espaço para aprofundarmos essa questão que está no centro das atenções.

Uma sociedade que se orgulha do próprio avanço não deveria se omitir na defesa da sua própria base: ética, verdade e responsabilidade com os direitos de terceiros, incluindo, em instância de destaque, o direito à proteção da própria imagem.

Sobre a autora
Carol Bassin

Advogada. Sócia fundadora do escritório Bassin Advocacia Cultural, especializado em propriedade intelectual, legislação de incentivo e proteção autoral, membro Efetivo da Comissão de Direitos Autorais, Direitos Imateriais e Entretenimento da OAB/RJ

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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