Por que a adjudicação compulsória não deve ser recomendada quando o imóvel não tem matrícula no RGI?

23/01/2025 às 16:25
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A Adjudicação Compulsória é uma importante ferramenta jurídica, utilizada na REGULARIZAÇÃO DE IMÓVEIS, que busca assegurar ao comprador de um imóvel o direito de obter o registro definitivo da propriedade em seu nome, quando o vendedor se recusa ou está impossibilitado de outorgar a Escritura (título necessário para a transferência, cf. regra do art. 1.245. do Código Civil), em que pese o cumprimento de todas as obrigações por parte do promitente comprador. Este mecanismo tem lugar nos contratos preliminares (como classicamente o "Contrato de Promessa de Compra e Venda"), onde o comprador já quitou integralmente o preço do imóvel, mas não consegue obter a transferência formal da propriedade já que tem, justamente, apenas a Promessa de Compra e Venda. Até então essa medida era obtida apenas judicialmente. Desde a Lei 14.382/2022 tornou-se possível a adoção da ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA EXTRAJUDICIAL diretamente no Cartório Extrajudicial sem a necessidade de um Processo Judicial, com assistência obrigatória de Advogado nos moldes do que acontece, por exemplo, com a Usucapião Extrajudicial e com o Inventário Extrajudicial.

A citada Lei 14.382/2022 introduzindo o art. 216-B na Lei de Registros Públicos traça as linhas do procedimento a ser realizado em Cartório, hoje regulamentado pelo Provimento CNJ 149/2023:

"Art. 216-B. Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo.

§ 1º São legitimados a requerer a adjudicação o promitente comprador ou qualquer dos seus cessionários ou promitentes cessionários, ou seus sucessores, bem como o promitente vendedor, representados por advogado, e o pedido deverá ser instruído com os seguintes documentos:

I - instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso;

II - prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos;

III - ata notarial lavrada por tabelião de notas da qual constem a identificação do imóvel, o nome e a qualificação do promitente comprador ou de seus sucessores constantes do contrato de promessa, a prova do pagamento do respectivo preço e da caracterização do inadimplemento da obrigação de outorgar ou receber o título de propriedade;

IV - certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação;

V - comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);

VI - procuração com poderes específicos.

§ 2º O deferimento da adjudicação independe de prévio registro dos instrumentos de promessa de compra e venda ou de cessão e da comprovação da regularidade fiscal do promitente vendedor.

§ 3º À vista dos documentos a que se refere o § 1º deste artigo, o oficial do registro de imóveis da circunscrição onde se situa o imóvel procederá ao registro do domínio em nome do promitente comprador, servindo de título a respectiva promessa de compra e venda ou de cessão ou o instrumento que comprove a sucessão".

Para que a adjudicação compulsória seja cabível - tanto na via Judicial quanto na via Extrajudicial - é necessário que o contrato de promessa de compra e venda esteja devidamente formalizado (mas não precisa estar registrado no RGI, embora sempre recomendemos tal medida para assegurar os direitos do promitente comprador principalmente) e que o promitente comprador tenha cumprido todas as suas obrigações, como o pagamento integral do preço. Além disso, é imprescindível que o imóvel deve esteja regularizado e registrado em nome do vendedor.

Parece óbvio que o imóvel prometido esteja previamente regularizado e registrado em nome do VENDEDOR para que ele seja oferecido para venda porém, na prática, não é tão raro nos depararmos com pessoas que infelizmente assinaram os mais variados tipos de contratos particulares para a compra de imóveis sem adotar as CAUTELAS MÍNIMAS e imprescindíveis na hora da compra de um imóvel. Realmente, uma vez que a Legislação não exige a assistência de Advogado na hora da compra de um imóvel o cenário se torna perfeito infelizmente para esse tipo de situação que pode envolver perdas muito grandes, não só de dinheiro mas também de tempo e frustração do sonho da aquisição do imóvel próprio.

A regularização/individualização do imóvel junto ao RGI é um requisito fundamental para a Adjudicação Compulsória, pois o registro é o ato que confere publicidade e eficácia à transferência de propriedade. Sem o registro, a propriedade não é oponível a terceiros, o que inviabiliza fatalmente a Adjudicação Compulsória, já que o objetivo do instituto é justamente assegurar a transferência formal e definitiva da propriedade. Quando o imóvel não está previamente regularizado no RGI, a Adjudicação Compulsória não será cabível, pois não há como compelir o vendedor a transferir um direito que ele próprio não possui formalmente. A ausência de registro implica que o imóvel não está juridicamente apto a ser transferido, o que faltamente impedirá a Adjudicação Compulsória de cumprir seu propósito, seja ela judicial ou extrajudicial.

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Importante observar que a falta de regularização do imóvel quase sempre vai indicar a existência de pendências legais ou administrativas, como dívidas fiscais, disputas de posse, ou questões urbanísticas, que precisam ser resolvidas antes que a propriedade possa ser negociada e transferida. Essas pendências podem representar RISCOS significativos para o adquirente - riscos esses que não poderão ser sanados pela Adjudicação Compulsória. Em tais casos, a depender das nuances do caso concreto, o adquirente poderá considerar buscar pela via judicial compelir o promitente vendedor à regularização do imóvel para que então promova a transferência regular.

A Adjudicação Compulsória é, portanto, um instrumento poderoso para garantir o direito de propriedade, mas sua adoção depender do exame prévio da situação do imóvel e do negócio realizado. Sem o registro no RGI, o comprador não poderá se valer dos benefícios da Adjudicação Compulsória pois sua pretensão esbarrará no princípio registral da continuidade e da especialização, como aponta com acerto a jurisprudência do TJSP:

"TJSP - Apelação Cível: 1003793-06.2020.8.26.0526. J. em: 26/02/2024. APELAÇÃO – COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA – Pedido de adjudicação de imóvel não desmembrado de área maior sem a individualização da matrícula junto ao cartório de registro de imóveis – Extinção da ação, sem julgamento do mérito – Irresignação – Descabimento – Imprescindibilidade de prévia averbação do desmembramento de imóvel urbano, em respeito ao princípio da especialidade e da continuidade do registro – Preexistência de matrícula individualizada que representa condição específica da ação de adjudicação compulsória – Tese jurisprudencial firmada pelo STJ (Informativo 672) – Jurisprudência do TJSP e desta Câmara – Decisão mantida – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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