Relacionamento abusivo: uma análise multidimensional do abuso sentimental, material, físico, sexual e financeiro.

28/01/2025 às 10:18
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RESUMO

O presente artigo visa analisar os diferentes tipos de abuso presentes em relações abusivas, abordando suas manifestações sentimental, material, física, sexual e financeira. Por meio de um levantamento doutrinário, legal e jurisprudencial, busca-se demonstrar as consequências psicológicas, sociais e jurídicas dessas práticas, bem como os mecanismos legais de proteção às vítimas. Utilizam-se jurisprudências recentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e de Tribunais Estaduais, além de doutrinas contemporâneas, com o objetivo de oferecer uma visão abrangente e atualizada sobre o tema. O estudo também considera a contextualização de tais abusos em relações entre homens e mulheres, idosos e crianças, evidenciando a universalidade do problema. Adicionalmente, são incorporados fundamentos jurídicos atualíssimos, pontos controversos e apontamentos de pesquisadores na área da psicologia e sociologia familiar forense, tanto no aspecto do direito civil como no criminal.

**Palavras-chave:** Relacionamento abusivo, abuso sentimental, abuso material, abuso físico, abuso sexual, abuso financeiro, jurisprudência, psicologia forense, sociologia familiar.

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**INTRODUÇÃO**

Os relacionamentos abusivos configuram-se como uma relação desigual e opressora, na qual uma das partes exerce poder e controle sobre a outra. Tais relações podem assumir múltiplas formas, como abuso sentimental, material, físico, sexual e financeiro, sendo todas potencialmente devastadoras para as vítimas. Este artigo propõe-se a abordar os aspectos multidimensionais dessas práticas abusivas, com enfoque nas implicações jurídicas e sociais, destacando instrumentos legais de proteção e conscientização. Ademais, inclui-se a análise do assédio nas relações conjugais, penalidades legais e perspectivas doutrinárias e jurisprudenciais internacionais.

A partir de uma abordagem interdisciplinar, o estudo incorpora contribuições da psicologia e da sociologia familiar forense, que destacam os impactos psicológicos e sociais do abuso, como a Síndrome da Mulher Baterizada (SMB) e o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Além disso, são explorados pontos controversos, como a dificuldade de comprovação do abuso psicológico e a efetividade das medidas protetivas em casos de violência doméstica.

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**1. ABUSO SENTIMENTAL**

O abuso sentimental caracteriza-se por manipulação emocional, gaslighting e desqualificação sistemática, o que leva a vítima a duvidar de si mesma e de sua percepção da realidade. O Código Penal Brasileiro (art. 129, § 9º) prevê punição para a violência psicológica.

**Doutrina:** Segundo Maria Berenice Dias, “a violência psicológica é tão ou mais devastadora do que a física, pois destrói a autoestima e subjuga a vítima”. Pesquisas na área da psicologia forense, como as de Lenore Walker, destacam que o abuso emocional é um dos principais fatores que mantêm as vítimas em ciclos de violência.

**Jurisprudência:**

- "RECURSO ESPECIAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA. LEI MARIA DA PENHA. CONFIGURAÇÃO. RECURSO PROVIDO." (REsp 1.758.849/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, STJ, j. 13/06/2019)

- Nos Estados Unidos, o caso *People v. Humphrey* (13 Cal.4th 1073, 1996) destacou a relevância do abuso emocional como fator na concessão de medidas protetivas.

**Pontos controversos:** A dificuldade de comprovação do abuso psicológico, que muitas vezes depende de perícias psicológicas e testemunhos subjetivos, é um desafio para a aplicação da Lei Maria da Penha.

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**2. ABUSO MATERIAL**

O abuso material envolve o uso de recursos ou bens da vítima de forma exploratória, sem seu consentimento ou para fins alheios aos seus interesses. A legislação civil e penal oferece amparo para casos de apropriação indébita e extorsão.

**Doutrina:** De acordo com Pablo Stolze, “a proteção do patrimônio pessoal e familiar é essencial para a preservação da dignidade humana”. A sociologia familiar forense aponta que o controle sobre os recursos materiais é uma forma de manter a vítima dependente e subjugada.

**Jurisprudência:**

- "APELAÇÃO CÍVEL. RELACIONAMENTO ABUSIVO. APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE BENS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PROCEDÊNCIA." (TJSP, Apelação 1004568-92.2020.8.26.0000, j. 10/12/2021)

- Na Alemanha, o Código Civil também prevê reparação em casos de exploração patrimonial.

**Pontos controversos:** A falta de clareza na definição de abuso material em relações conjugais pode dificultar a aplicação de sanções, especialmente quando há compartilhamento de bens.

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**3. ABUSO FÍSICO**

O abuso físico refere-se a qualquer forma de agressão corporal contra a vítima. A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) é o principal instrumento de proteção nesse contexto.

**Doutrina:** Para Luiz Flávio Gomes, “a violência física é a expressão mais visível e brutal do desequilíbrio de poder em relações abusivas”. Estudos psicológicos evidenciam que o abuso físico está frequentemente associado a ciclos de violência que incluem fases de tensão, explosão e reconciliação.

**Jurisprudência:**

- "HABEAS CORPUS. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PRISÃO PREVENTIVA. LESÃO CORPORAL. NECESSIDADE DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA." (HC 598.051/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, STJ, j. 03/11/2020)

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- Na Índia, a “Protection of Women from Domestic Violence Act, 2005” aborda amplamente a violência física em ambientes domésticos.

**Pontos controversos:** A efetividade das medidas protetivas em casos de violência física é questionada, especialmente quando há reincidência do agressor.

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**4. ABUSO SEXUAL**

O abuso sexual em relações abusivas é caracterizado pela coerção ou imposição de atos sexuais sem consentimento. A legislação penal brasileira trata o tema como estupro (art. 213, CP) ou importunação sexual (art. 215-A, CP).

**Doutrina:** Segundo Guilherme de Souza Nucci, “a caracterização do estupro conjugal reflete a evolução do entendimento sobre a autonomia sexual”. A psicologia forense destaca que o abuso sexual pode causar traumas profundos, como o TEPT.

**Jurisprudência:**

- "RECURSO EM HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RELACIONAMENTO ABUSIVO. COERÇÃO MORAL E PSICOLÓGICA." (RHC 128.345/MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, STJ, j. 09/03/2021)

- Na Itália, o Código Penal (art. 572) aborda a violência sexual em âmbito doméstico, prevendo sanções específicas.

**Pontos controversos:** A dificuldade de comprovação do estupro conjugal, especialmente em relações onde há consentimento prévio, é um desafio para a Justiça.

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**5. ABUSO FINANCEIRO**

O abuso financeiro consiste em explorar ou controlar os recursos financeiros da vítima. O Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) prevê penalidades para esse tipo de prática, principalmente em casos envolvendo idosos.

**Doutrina:** Maria Sylvia Zanella Di Pietro destaca que “a exploração financeira compromete não apenas a autonomia, mas também a dignidade do indivíduo”.

**Jurisprudência:**

- "APELAÇÃO CRIMINAL. ESTATUTO DO IDOSO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. ABUSO FINANCEIRO." (TJMG, Apelação 1.0024.17.289654-3/001, j. 20/08/2020)

- No Japão, o “Act on the Prevention of Spousal Violence and the Protection of Victims” também trata da exploração financeira em relacionamentos abusivos.

**Pontos controversos:** A falta de conscientização sobre o abuso financeiro como forma de violência doméstica é um obstáculo para a aplicação da lei.

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**6. ASSÉDIO NAS RELAÇÕES CONJUGAIS**

O assédio nas relações conjugais pode assumir formas psicológicas, físicas e financeiras, sendo frequentemente associado ao controle extremo e à degradação emocional da vítima.

**Doutrina Internacional:** Nos Estados Unidos, a doutrina jurídica destaca a importância de leis específicas, como a “Violence Against Women Act” (VAWA), que protege vítimas de assédio e abuso doméstico.

**Pontos controversos:** A dificuldade de diferenciar o assédio de conflitos conjugais comuns é um desafio para a aplicação da lei.

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**7. PENALIDADES E CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS**

As penalidades para relações abusivas variam conforme o tipo de abuso. No Brasil, incluem:

- Prisão para casos de violência física (art. 129, § 9º, CP);

- Reclusão em casos de estupro (art. 213, CP);

- Multas e penas pecuniárias para apropriação indevida ou abuso financeiro (art. 171, CP).

**Pontos controversos:** A efetividade das penas e a reincidência de agressores são questões que demandam maior atenção do sistema jurídico.

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**8. POSICIONAMENTOS CRÍTICOS**

Este capítulo aborda críticas à legislação e à aplicação das leis de proteção às vítimas de relacionamentos abusivos. Destacam-se:

- A necessidade de maior capacitação dos operadores do Direito para lidar com casos de abuso psicológico;

- A falta de políticas públicas eficazes para a reintegração social das vítimas;

- A importância de uma abordagem interdisciplinar, envolvendo psicologia, sociologia e Direito, para o enfrentamento do problema.

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**CONSIDERAÇÕES FINAIS**

O enfrentamento dos relacionamentos abusivos exige uma abordagem multidisciplinar e o aprimoramento constante dos mecanismos legais de proteção. A análise de legislações e doutrinas estrangeiras enriquece a compreensão do tema e fortalece a adoção de medidas eficazes de combate e prevenção ao abuso em todas as suas formas.

**REFERÊNCIAS**

- DIAS, Maria Berenice. *Manual de Direito das Famílias*. 11ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.

- GOMES, Luiz Flávio. *Violência Doméstica*. São Paulo: Saraiva, 2020.

- NUCCI, Guilherme de Souza. *Código Penal Comentado*. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2023.

- STOLZE, Pablo. *Novo Curso de Direito Civil*. São Paulo: Saraiva, 2022.

- WALKER, Lenore. *The Battered Woman Syndrome*. 4ª ed. Springer, 2016.

- UNITED STATES. *Violence Against Women Act (VAWA)*, 1994.

- ALEMANHA. *Código Penal Alemão (StGB)*, 2023.

- ITÁLIA. *Código Penal Italiano*, Art. 572.

** Artigo complementado com a AI

Sobre o autor
Ademarcos Almeida Porto

Formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP Título de Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Superior de Advocacia - OABSP. Pós-graduação em Direito Constitucional Cursos de extensão em: Direito imobiliário; Direito da Família e Sucessões; Direito do Consumido; Estatuto da Criança e do Adolescente e Direito do Trabalho. Especializando em Direito da Família e das Sucessões.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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