Sigilo da fonte: Uma garantia de todos nós.

06/02/2025 às 16:23
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A Constituição Federal de 1988, em seu rol de garantias e direitos fundamentais, expressamente garantiu o direito ao sigilo das fontes aos jornalistas, tal estipulação tem o escopo de resguardar tanto a liberdade de imprensa quanto o direito fundamental à informação no Brasil.

O artigo 5º, inciso XIV, da Constituição Federal expressamente diz que é "assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional".

O sigilo da fonte é essencial para que jornalistas investiguem e divulguem informações de interesse público sem temor de coerção ou represálias, especialmente de agentes estatais e pessoas de grande poder e influência.

Reforçando o texto da Constituição, temos que a doutrina é bastante clara em afirmar que “o jornalista não pode ser obrigado, por qualquer autoridade, a revelar a identidade da fonte de informação, quando necessário ao trabalho.” (VIEIRA, 2012, p. 207)1. De mais a mais, temos que “a finalidade é permitir a ampla apuração de fatos comprometedores”. (PINHO, 2000, p. 82)2.

O Supremo, alinhado com a doutrina, em agosto de 2019, ao analisar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 601, concedeu uma liminar para impedir que autoridades públicas investigassem de maneira ilegal e coercitiva o jornalista Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil, responsável pela divulgação de mensagens trocadas entre membros da Operação Lava Jato.

Na decisão, o ministro Gilmar Mendes destacou que "o sigilo constitucional da fonte jornalística impossibilita que o Estado utilize medidas coercivas para constranger a atuação profissional e devassar a forma de recepção e transmissão daquilo que é trazido a conhecimento público" (ADPF 601 MC / DF, Brasília, 7 de agosto de 2019).

A decisão deixa bastante claro que o sigilo da fonte não apenas protege o profissional de imprensa, ele garante para a sociedade que informações de interesse coletivo possam ser publicadas sem que as fontes temam retaliações.

E por informação de interesse público, inclusive, encontram-se atos de corrupção, abuso de poder, abuso de autoridade, discriminação, violência contra a mulher, direito das minorias e outras mais.

Deve-se ressaltar que o ministro Gilmar Mendes não é e nunca foi posição isolada na Corte, o próprio Supremo já vem alertando há anos que o Poder Judiciário não pode servir à censura de matéria jornalística, não sendo correto afastar a prerrogativa do sigilo da fonte do profissional e do órgão de imprensa, principalmente para fins de coerção, represálias e censura:

A prerrogativa do jornalista de preservar o sigilo da fonte (e de não sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, em razão da prática legítima dessa franquia outorgada pela própria Constituição da República), oponível, por isso mesmo, a qualquer pessoa, inclusive aos agentes, autoridades e órgãos do Estado, qualifica-se como verdadeira garantia institucional destinada a assegurar o exercício do direito fundamental de livremente buscar e transmitir informações. Doutrina.

O exercício da jurisdição cautelar por magistrados e Tribunais não pode converter-se em prática judicial inibitória, muito menos censória, da liberdade constitucional de expressão e de comunicação, sob pena de o poder geral de cautela atribuído ao Judiciário transformar-se, inconstitucionalmente, em inadmissível censura estatal”. (STF, Rcl-AgR 21.504, Relator Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 17.11.2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-249 DIVULG 10.12.2015 PUBLIC 11.12.2015 - grifei).

Em um outro caso mais recente, desta vez envolvendo o jornalista Ben Mendes, a ministra Carmén Lúcia reforçou nos autos da Medida Cautelar na Reclamação Constitucional n. 73.312/MG que qualquer tipo de censura, inclusive promovida pelo Judiciário, tende a “frustrar o direito à liberdade de imprensa e de expressão, inibindo-se atividade essencial à democracia, como é o jornalismo político, e expondo a risco a garantia constitucional da liberdade de informar e ser informado e de não se submeter a imprensa à censura” (STF, RCL 73312 MC / MG, Brasília, 05 de novembro de 2024).

Além da ministra, Dias Toffili nos autos da RCL 47792 MC / ES, determinou “que as autoridades públicas e seus órgãos de apuração administrativa ou criminal abstenham-se de praticar atos que visem à responsabilização de jornalistas (pela proteção do sigilo da fonte jornalística) e de parlamentares federais (por usurpação de competência deste Tribunal) pela recepção, obtenção ou transmissão de informações publicadas em veículos de mídia.”, ratificando a proteção constitucional aqui estudada.(STF, RCL 47792 MC / ES, Brasília, 21 de junho de 2021).

Além disso, o agente estatal que obrigue um jornalista, sob pena de prisão, a revelar sua fonte não apenas cometerá uma inconstitucionalidade, mas incorrerá nas sanções do artigo 15 da Lei de Abuso de Autoridade, cuja pena prevê detenção de 1 a 4 anos e multa.

Em suma, a defesa do sigilo da fonte jornalística, conforme enfatizado nos parágrafos acima é extremamente vital para assegurar uma imprensa livre, capaz de investigar e informar o público sobre assuntos de interesse coletivo, sem interferências indevidas do Estado ou de outros poderes.

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Por isso, a pior decisão que se pode tomar é constranger o jornalista a entregar as suas fontes, ele jamais cumprirá essa ordem, mesmo que seguida de ameaça de prisão ou crime de desobediência, na realidade, quem redigir tal ordem, com certeza cometerá um crime e deverá responder com base na Lei de Abuso de Autoridade, artigo 15.

Por fim, é importante reforçar que o sigilo da fonte não é apenas um direito do jornalista ou de quem fornece a informação, mas uma garantia essencial à coletividade, assegurando a liberdade de imprensa e a manutenção do Estado Democrático de Direito


1 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. O sigilo da fonte de informação jornalística como limite à prova no processo penal. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, 2012. p. 207.

2 PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais. 17º V. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 76.

Sobre o autor
João Vitor Rossi

Advogado especializado em Direito Tributário e Imobiliário, com registro na OAB-SP nº 425.279. Possui MBA Executivo em Direito, Negócios e Operações Imobiliárias, especialização em Direito Imobiliário e Direito Processual Civil, que lhe proporciona uma visão ampla e estratégica para a resolução de problemas complexos e a liderança de equipes jurídicas de alta performance. Com experiência reconhecida no setor . Autor de diversas publicações em revistas jurídicas renomadas e responsável por casos de destaque na mídia, João Vitor Rossi está à frente de seu escritório, comprometido com a entrega de soluções inovadoras e eficazes para os seus clientes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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