Crítica ao Decreto nº 10.887/2021: avanço ou retrocesso na defesa do consumidor?

08/02/2025 às 11:29
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O Decreto nº 10.887, de 6 de dezembro de 2021, alterou significativamente o Decreto nº 2.181/1997, que regulamenta o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) e estabelece normas para a aplicação de sanções administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Embora algumas mudanças possam ser vistas como avanços na modernização das relações de consumo, há críticas sobre a efetividade e o real impacto dessas alterações na proteção do consumidor.

Um dos pontos que mais chama atenção na reforma é a previsão da averiguação preliminar antes da instauração de um processo administrativo. A medida é justificada como uma forma de evitar processos desnecessários e otimizar a atuação dos órgãos de defesa do consumidor. No entanto, há o receio de que esse novo mecanismo possa ser utilizado para postergar ou enfraquecer a fiscalização, favorecendo fornecedores que adotam práticas abusivas. Caso a averiguação preliminar se torne um filtro excessivamente burocrático, pode dificultar a proteção ágil e eficaz dos consumidores.

A introdução de regras mais detalhadas para o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) também suscita questionamentos. O TAC permite que empresas corrijam práticas ilegais sem a necessidade de uma sanção administrativa severa, estabelecendo compromissos compensatórios, geralmente em valor monetário. A intenção declarada é a resolução mais rápida de conflitos, evitando litígios prolongados. Contudo, há preocupação de que esse mecanismo possa ser utilizado como um "atalho" para empresas reincidentes evitarem penalizações mais severas, tratando infrações graves como simples custos operacionais.

O decreto também permite a participação de amicus curiae nos processos administrativos, possibilitando que entidades e especialistas contribuam com informações técnicas e jurídicas. Essa previsão pode ser positiva, pois amplia o debate e fortalece a fundamentação das decisões. No entanto, sem critérios bem estabelecidos, existe o risco de que grandes corporações utilizem essa prerrogativa para influenciar decisões em seu favor, aumentando a desigualdade de forças entre consumidores e empresas.

Uma das atualizações mais relevantes é a consideração das mensagens publicitárias veiculadas em meios digitais como passíveis de sanção pelo CDC. Em um mundo cada vez mais digitalizado, onde consumidores são bombardeados por publicidade online, essa mudança representa um passo importante para a regulação de propaganda abusiva e fake news publicitária. No entanto, para que essa medida seja eficaz, é fundamental que os órgãos fiscalizadores tenham estrutura adequada para monitorar o vasto universo das redes sociais e outras plataformas digitais.

O Decreto nº 10.887/2021 representa uma tentativa de modernização das regras de defesa do consumidor, trazendo elementos que podem aprimorar a fiscalização e a resolução de conflitos. No entanto, as mudanças também apresentam riscos consideráveis, especialmente no que diz respeito ao enfraquecimento da fiscalização e ao potencial uso inadequado do TAC.

Para que os consumidores realmente sejam beneficiados, é essencial que haja transparência e controle efetivo sobre a aplicação dessas novas normas. Caso contrário, a nova regulamentação pode acabar favorecendo apenas grandes empresas em detrimento dos direitos dos consumidores. O verdadeiro impacto do decreto dependerá não apenas do seu texto, mas da forma como será implementado e fiscalizado pelos órgãos competentes.

Sobre o autor
Estêvão Zizzi

Advogado e escritor, Pós-graduado em direito do consumidor

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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