Sou filho único e todos os bens da herança estão comigo. Ainda assim preciso mesmo fazer Inventário?

17/02/2025 às 12:00
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Uma dúvida recorrente diz respeito à necessidade de fazer o Inventário mesmo sendo filho único e estando em posse de todos os bens da herança. Será mesmo necessário passar por toda a conhecida burocracia dos Inventários mesmo nesse caso? O inventário é um procedimento legal que formaliza a transferência de bens do falecido para os herdeiros, garantindo que a titularidade dos bens seja devidamente registrada e reconhecida. Sem o inventário, a propriedade dos bens não é regularizada e transferida, o que pode gerar uma série de complicações legais e práticas, especialmente multas e em muitos casos, o perecimento dos bens.

Antes de mais nada não podemos nos esquecer que a finalidade maior do Inventário não é, como muitos podem imaginar, distribuir os bens deixados pelos falecidos aos seus herdeiros. A bem da verdade, a finalidade do Inventário é quitar todas as dívidas deixadas pelo falecido; somente sobrando patrimônio depois dessa finalidade atingida é que o que sobjear deverá ser entregue aos herdeiros, observada a ordem de vocação hereditária e todas as suas complexas regras. Assim determina o art. 1.997. do Código Civil:

"Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento das DÍVIDAS do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube".

Muitos bens só podem ser considerados regularizados se o seu cadastro oficial refletir a realidade fática; um exemplo disso é o RGI (Cartório do Registro de Imóveis): enquanto o imóvel estiver na posse do herdeiro mas no Cartório ainda em nome dos falecidos proprietários pode-se considerá-lo em situação tipicamente irregular. Uma das principais razões para realizar o inventário, nesse caso, é a necessidade de atualizar o registro de imóveis. Com a regularização o herdeiro passa a ser o novo titular legalmente, podendo com isso DISPOR do bem que agora repousa em sua esfera patrimonial, observados os requisitos legais e principalmente pagos os impostos devidos por essa transferência (ITCMD, ou ITD, como queira). Sem o inventário, o herdeiro não poderá vender ou utilizar esses bens como garantia em operações financeiras, pois a titularidade ainda estará em nome do falecido. Isso limita significativamente sua capacidade de gerir e aproveitar o patrimônio herdado.

Além disso, o inventário é necessário para resolver eventuais pendências fiscais. O processo de inventário inclui a apuração e o pagamento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que tem como fato gerador a transferência de bens por herança. Sem o inventário, observada a Legislação Estadual respectiva, certamente o herdeiro enfrentará problemas com a Receita Estadual, incluindo multas e juros por atraso no pagamento desse imposto.

Outro ponto importante é a segurança jurídica. O inventário formaliza a transferência de bens e evita disputas futuras sobre a titularidade. Mesmo sendo filho único, a ausência de um inventário pode abrir espaço para questionamentos de terceiros, como credores do falecido ou parentes distantes, que podem alegar direitos sobre a herança.

Não se desconhece que credores do falecido têm legitimidade para requerer a abertura do Inventário e a satisfação do seu crédito (que diante da não abertura poderá ser majorado por multas e outros encargos, consumindo toda a herança). Assim reza o Código de Processo Civil:

"Art. 615. O requerimento de inventário e de partilha incumbe a quem estiver na posse e na administração do espólio, no prazo estabelecido no art. 611. .

(...)

Art. 616. Têm, contudo, legitimidade concorrente:

(...)

VI - o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança";

A falta de inventário também pode, sem dúvidas, complicar questões sucessórias futuras. A cada falecimento que sobrevém a regularização de bens de pessoas falecidas só fica mais complexa e onerosa. Quando o herdeiro vem a falecer sem ter regularizado a herança recebida, seus próprios herdeiros enfrentarão dificuldades adicionais para resolver a sucessão, já que os bens ainda estarão em nome de outro(s) falecido(s). Com certeza isso pode resultar em um processo mais longo e custoso para seus sucessores.

Não restam dúvidas de que o inventário é uma oportunidade para organizar e avaliar o patrimônio herdado. Durante o processo, você pode identificar a necessidade de manutenção, reforma ou venda de determinados bens, otimizando a gestão do patrimônio. Isso pode aumentar o valor dos bens e melhorar sua rentabilidade.

Por fim, é importante considerar que hoje em dia, preenchidos os requisitos legais, o inventário pode ser realizado de forma EXTRAJUDICIAL, em cartório, com a assistência obrigatória de Advogado mas sem a necessidade de um longo e custoso processo judicial. Essa modalidade é mais rápida e menos onerosa do que o inventário judicial, oferecendo uma solução prática para regularizar a herança e é regulamentada pelo CNJ através da Resolução 35/2007 e suas modificações.

Em resumo, mesmo sendo filho único e estando em posse dos bens deixados por genitores falecidos, o inventário é essencial para garantir a regularização da herança, evitar problemas legais e fiscais, e assegurar a plena utilização e gestão do patrimônio herdado.

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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